Sintomazebet service client'atraso tropical' no século 20, febre amarela volta por desatenção com lições da História:zebet service client

Febre Amarela (foto histórica/início século 20)
Legenda da foto, Campanha sanitária no início do século 20 foi comandada por Oswaldo Cruz, que recebeu prêmiozebet service clientBerlim pelazebet service clientatuação | Acervo Casazebet service clientOswaldo Cruz

No início do século, epidemiaszebet service clientfebre amarela eram constanteszebet service clientgrandes capitais portuárias da América Latina - como Rio, Buenos Aires e Havana.

Os surtos no Brasil, associados a males como varíola, malária, tuberculose e peste bubônica - deram ao país a alcunhazebet service client"túmulo dos estrangeiros".

"A febre amarela atingia sobretudo os recém-chegados. Acreditava-se que os aclimatados ganhavam algum tipozebet service clientimunidade", conta o historiador Jaime Benchimol, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e especialista na turbulenta história da vacina contra a doença.

A má fama era justificada por episódios como o tenebroso destino do navio italiano Lombardia. Em 1895, quase todos os embarcados que chegaram ao Rio morreramzebet service clientfebre amarela - e uma nova tripulação teve que ser enviada da Itália para resgatar a embarcação no porto.

No Rio, último surto urbano há 88 anos

Benchimol conta que a primeira grande epidemia no Rio ocorreu entre 1849 e 1850, e atingiu 90 mil pessoaszebet service clientuma população entãozebet service client266 mil. Segundo dados da época, 4.160 morreram; segundo estimativas não oficiais, foram 15 mil mortos.

"Naqueles tempos, todo mundo conhecia alguém que tinha morridozebet service clientfebre amarela, não importava a classe social", conta o historiador.

A última epidemiazebet service clientfebre amarela no Rio foi entre 1928 e 1929, quando um surto inesperado na cidade ezebet service client43 localidades do Estado deixou 436 mortes.

Foi um choque para a população e a comunidade científica. Acreditava-se que a cidade tinha se livrado da doençazebet service client1907, após as campanhas bem-sucedidaszebet service clientOswaldo Cruz.

Serviço Nacionalzebet service clientFebre Amarelazebet service clientManguinhos
Legenda da foto, Demonstração, publicadazebet service clientmanual,zebet service clientaberturazebet service clientovo e retiradazebet service clientembrião para preparo da vacina anti-amarílica, produzida pelo Serviço Nacionalzebet service clientFebre Amarelazebet service clientManguinhos | Foto Silvio Cunha, 1943/Casazebet service clientOswaldo Cruz

'Símbolozebet service clientatraso'

No início do século 20, vencer a doença e outros males "tropicais" eram condição para catapultar à modernidade um Brasil que havia recém abolido a escravidão e ainda era uma jovem república.

"As doenças tropicais eram um símbolozebet service clientatraso, a provazebet service clientque o Brasil não conseguia controlar suas epidemias", afirma a historiadora da ciência Ilana Löwy, pesquisadora do Instituto Nacionalzebet service clientPesquisa Médica ezebet service clientSaúde, na França.

"Eliminar a febre amarela era necessário para que o país pudesse se abrir para fora, se abrir para o comércio, imigrantes e turistas", diz Löwy, que é polonesa e está no Rio como pesquisadora visitante da Fiocruz. Ela é autora do livro Vírus, mosquitos e modernidade. A febre amarela no Brasil entre ciência e política (Fiocruz, 2006).

Em muitos momentos, diz Löwy, o esforço foi uma questão política. Impulsionou o comércio externo, a política interna (na esteira do avanço das campanhaszebet service clientsaneamento pelo território nacional) e foi uma portazebet service cliententrada para a influência norte-americana, através do papel central no combate à doença exercido pela Fundação Rockefeller.

No projeto modernizador do presidente Rodrigues Alves (1902-1906), o arquiteto e urbanista Pereira Passos foi nomeado prefeito do Rio com a missãozebet service client"consertar os defeitos da capital que afetam e perturbam todo o desenvolvimento nacional", nas palavras do então presidente; e o médico e sanitarista Oswaldo Cruz recebeu a missãozebet service clientsanear o Rio - o que implicava combater as três maiores ameaças na época, a febre amarela, a varíola e a peste bubônica.

Caça a ratos e mosquitos

Produçãozebet service clientvacina contra febre amarela na Fiocruz

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Combate à doença impulsionou pesquisa científica e desenvolvimentozebet service clientvacinas no Brasil

Cruz virou um herói nacional ao conseguir cumprirzebet service clientmissãozebet service clientpoucos anos, implementando a campanhazebet service clientvacinação obrigatória contra varíola - que causou,zebet service client1904, a Revolta da Vacina - e combatendo os vetores da peste bubônica e da febre amarela - respectivamente, ratos e mosquitos.

Em 1907, recebia a medalhazebet service clientouro na premiação do Congressozebet service clientHigiene e Demografiazebet service clientBerlim, na Alemanha, pelos feitos no combate a doenças no Rio.

"A conquistazebet service clientOswaldo Cruz foi importante porque mudou a percepção do Rio no exterior", diz o historiador Marcos Cueto, da Casazebet service clientOswaldo Cruz.

"A cidade começou a ser percebida como um lugar seguro para o comércio marítimo, que era o motor da economia mundial. Começou a se criar a percepçãozebet service clientque um país tropical podia ter boa saúde pública, o que até então parecia impossível", ressalta Cueto, editor científico da revista História, Ciências, Saúde - Manguinhos.

"Pouco depois, o presidente (norte-americano) Theodore Roosevelt visitou o Rio e a Fiocruz. Era uma demonstraçãozebet service clientque aqui era um lugar seguro para o comércio."

Até então, navios que saíssem da capital tinham que cumprir quarentena anteszebet service clientvoltar para seus destinos para evitar que doenças como a febre amarela se alastrassem.

A mudança contribuiu para atrair mais imigrantes ao país. Naquele tempo, quem vinha para a "América" ainda ficava dividido entre Brasil, Argentina e Estados Unidos, lembra Cueto, já que as situações econômicas ainda estavam bem distantes das que se consolidaram ao longo do século.

Senhazebet service cliententrada para os EUA

Febre Amarela (foto histórica/início século 20)
Legenda da foto, Campanha sanitária: Serviçozebet service clientProfilaxia da Febre Amarela; partidazebet service clientuma turma para isolamentozebet service clientum doente | Foto: Acervo Casazebet service clientOswaldo Cruz

Mas o poderio dos EUA crescia, e a maior fortuna petroleira do mundo, da família Rockefeller, criou, no começo do século 20, seu braço filantrópico, a Fundação Rockefeller. Em 1918, o grupo lançou uma campanha internacionalzebet service clienterradicação da febre amarela, que teve atuação decisiva no Brasil - e, a partir da era Vargas, desfrutouzebet service clientautonomia para gerenciar as atividadeszebet service clientcombate à febre amarela no país.

A ambiciosa meta da fundação era eliminar a doença nas Américas e, depois, na África, conta o historiador Rodrigo Cesar da Silva Magalhães, que estudou a atuação da Rockefeller no Brasil emzebet service clienttesezebet service clientdoutorado, transformada no livro A erradicação do Aedes aegypti - Febre amarela, Fred Soper e saúde pública nas Américas (1918-1968) (Fiocruz, 2016).

Na época, ainda se acreditava que a doença se originara no continente americano e depois chegara à África. Só depois se chegou ao consensozebet service clientque o trajeto fora o contrário, e que o tráficozebet service clientescravos havia levado o Aedes aegypti e a febre amarela para o continente americano.

Magalhães conta que,zebet service client1923, quando um primeiro acordozebet service clientcooperação foi assinado entre a Rockefeller e o governo brasileiro, os médicos brasileiros viram a chegada dos técnicos americanos com desconfiança. "Há uma resistência. Eles reagem se perguntando, 'quem são esses caras que querem chegar para nos ensinar, se a gente teve Oswaldo Cruz?' Mas quando veem a chancezebet service clientimplementar um programa nacional, começam a cooperar", relata Magalhães.

A partir dos anos 1930, a Fundação Rockefeller cresceuzebet service clientpoder e importância no Brasil, desfrutandozebet service clientrelações mutuamente benéficas com o governozebet service clientGetúlio Vargas.

"Vargas usa a fundação para consolidar seu poderzebet service clientterritório nacional, e a fundação vê nas suas boas relações com o governo a chancezebet service clientconsolidar uma campanha sanitária a nível nacional", explica Magalhães.

O governo Vargas aproveitou as frentes abertas pela campanha sanitarista - com timeszebet service clientinspetores atuando nas cidades para combater o Aedes e buscando alianças com lideranças locais - para fortalecer a presença do Estado país afora.

"A saúde pavimentou o caminho para o Estado varguista exercerzebet service clientautoridade nos mais longínquos rincões do Brasil", ressalta Magalhães.

Cobaias humanas e erroszebet service clientpercurso

A primeira metade do século 20 vê uma sériezebet service clientavanços no conhecimento sobre a febre amarela. Em 1900, finalmente se comprovou o que o epidemiologista cubano Carlos Finlay já defendia havia 20 anos: a febre amarela é transmitida por mosquitos. Em Havana, iniciou-se a primeira campanhazebet service clientcombate à doença pelo ataque ao vetor, que seria reproduzida no Rio por Oswaldo Cruz.

No início dos anos 1930, descobriu-se que homens e mosquitos não são os únicos que carregam o vírus; estes também vivem, na forma silvestre da doença,zebet service clientdiversas espécieszebet service clientmacacos, seu hospedeiro natural nas florestas. Assim, mesmo quando eliminada das cidades, a doença tem "reservatórios naturais"zebet service clientvírus na selva, e nunca poderia ser erradicada totalmente.

Em 1937, depoiszebet service clientanoszebet service clientpesquisas e incontáveis testes com diferentes cepas do vírus da febre amarela, finalmente é descoberta uma vacina.

Pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz e da Fundação Rockefeller chegaram a uma versão considerada adequada à imunizaçãozebet service clientgrandes contingentes populacionais, e a vacina começou a ser produzidazebet service clientlarga escala no campus do Instituto Oswaldo Cruz.

Logo se procedeu à vacinaçãozebet service clientmassazebet service clientáreas ruraiszebet service clientMinas Gerais e na cidade do Riozebet service clientJaneiro - embora a vacina ainda estivesse "em fasezebet service clientobservação e experiência", como afirmou à época o influente chefe do escritório da Fundação Rockefeller para a América do Sul, Fred Soper.

No livro Febre amarela, a doença e a vacina - uma história inacabada, o historiador Jaime Benchimol lembra que a pressa gerou protestos.

Na época, o renomado entomologista Ângelo Moreira da Costa Lima, do Instituto Oswaldo Cruz, acusou a Fundação Rockefellerzebet service clientestar usando o povo brasileiro como "cobaiazebet service clientgrave comprovação experimental", enquanto nos EUA a decisão forazebet service clientprotelar o início da vacinação.

"Tais acusações tiveram pouco eco, mas pelos padrõeszebet service clienthoje a vacinação jamais teria acontecido (com essa velocidade). Eles chegaram à vacinazebet service client1937 e começaram a aplicarzebet service clientcontingentes consideráveiszebet service clientgente. Foram afoitos", considera o historiador.

Hepatite Bzebet service clientmassa

Mosquito transmite a febre amarela

Crédito, AFP

Legenda da foto, 'Aedes aegypti' chegou a ser erradicado no Brasil na décadazebet service client1950

Nos anos seguintes, começaram a aparecer complicações. Parte da população vacinada apresentou um surtozebet service clienticterícia, que na verdade sinalizava infecção por hepatite B. Em 1940, foram identificados mil casos entre Rio e Espírito Santo, e 22 mortes. No ano seguinte, também foram registrados casoszebet service clientencefalite como efeito colateral da vacina.

Pesquisadores chegaram à conclusãozebet service clientque a icterícia era ocasionada pelo usozebet service clientsoro humano para fabricar as vacinas, o que foi interrompido. O soro estaria transmitindo um agente patogênico ainda desconhecido - e que mais tarde seria identificado como hepatite B.

O problema foi superado na fabricação brasileira, mas foi nos EUA que teve consequências mais graves. O laboratório central da Fundação Rockefellerzebet service clientNova York seguiu com o usozebet service clientsoro humano, para não retardar,zebet service clientplena Segunda Guerra Mundial, a produçãozebet service clientmilhõeszebet service clientvacinas.

Em 1942, recém-entrados na guerra e temendo um ataque biológico do Japão, os EUA decidiram vacinar todos os seus soldados. Meses depois, 28 mil casoszebet service clienticterícia foram identificados entre eles, resultandozebet service client62 mortes.

De acordo com Benchimol, estudos realizados anos mais tarde com veteranos estimaram que a vacinação contra febre amarela tenha levado a 330 mil casoszebet service clienthepatite B no Exército americano.

"Assim se produziu a maior epidemiazebet service clienthepatite B na história", diz o historiador.

'Testemunho do fracasso'

Jaime Benchimol lembra a experiência bem sucedida no combate ao Aedes aegypti no passado e critica a faltazebet service clientuma política sériazebet service clientcombate ao vetor. Para ele, o foco na vacina não basta como estratégiazebet service clientcontrole.

"Essa tentativa atabalhoadazebet service clientvacinar todo mundo é o que se pode fazer agora, mas é o testemunho do fracasso, da incompetência deste governo e dos anterioreszebet service clientlidar com essa questão", considera.

O historiador Rodrigo Cesarzebet service clientSilva Magalhães diz que a estratégiazebet service clientassociar a vacinação nas áreas rurais ao combate "sem trégua" ao Aedes aegypti nas cidades havia sido responsável pelos maiores sucessos nas últimas décadas.

"Esse binômio foi irresponsavelmente abandonado pelos últimos governos, e é por isso que estamos vivendo esse cenário epidêmico", critica.

Para o historiador Marcos Cueto, houve uma "complacência" das autoridades políticas e sanitárias no controle ao Aedes aegypti.

"Na segunda metade do século 20, as cidades da América Latina tiveram crescimento muito mais rápido quezebet service clientinfraestrutura sanitária", diz Cueto. "O resultados são cidades sem água encanada e esgoto, com as condições ideais para criar o mosquito."

Os jornais, afirma, gostamzebet service clientestamparzebet service clientsuas páginas fotos do mosquito ampliado como um "Godzilla", como se fosse o único algoz.

"Isso reduz o problema e não levazebet service clientconta aspectos sociais e humanitários. O grande problema é ignorar a necessidadezebet service clientinvestir nas deficiênciaszebet service clientesgoto e água nas áreas urbanas", ressalta.

O problema pode ser vistozebet service clienttoda parte, a olho nu - mesmo às portas da Fundação Oswaldo Cruz, o principal centrozebet service clientpesquisas epidemiológicas do Brasil. A pesquisadora visitante Ilana Löwy chama atenção para os canaiszebet service clientágua parada, sem saneamento, logo ao lado da entrada, na favelazebet service clientManguinhos.

"Enquanto não se resolver a questão do saneamento, os mosquitos não vão para lugar nenhum", lembra Löwy.

"Vi que o governo espalhou muitos slogans por aí dizendo que um mosquito não é mais forte que um país. Ficou bonito", considera a historiadora. "Mas não acho que os mosquitos vão se impressionar muito."