Com casa destruída por conflito, ‘ex-dona da Rocinha' diz que não há heroísmo no tráfico:handicap asiático pixbet
A mais recente guerra na maior favela do Rio, precipitada por uma disputa pelo controle do tráfico, levou a cúpulahandicap asiático pixbetsegurança do Estado a pedir o apoio do Exército, com o enviohandicap asiático pixbet950 homens das Forças Armadas à Rocinha na sexta-feira passada.
Ao ver mais um surtohandicap asiático pixbetviolência, Raquel diz não sentir culpa nem arrependimento pelo envolvimento que teve na história violenta do local.
"Como eu poderia ir por outro caminho, se só tinha aquela estrada ali?", questiona,handicap asiático pixbetentrevista à BBC Brasil. "Você cria a criança no meiohandicap asiático pixbetladrões e quer que ela seja um empresário famosohandicap asiático pixbetmoda?"
Ela considera ter tido muita sorte por sairhandicap asiático pixbetum caminho que costuma ser sem volta, "um ponto final", graças a pessoas que a ajudaram a largar o tráfico e a superar o pesado víciohandicap asiático pixbetcocaína, uma luta diária que a acompanha há 12 anos.
Mas diz que a Rocinha agora está "entre a cruz e a espada", temendo que o vácuo dê margem à entradahandicap asiático pixbetuma nova facção criminosa ou mesmohandicap asiático pixbetmilicianos.
Raquel conta que começou a usar drogas aos seis anos. Com essa idade também foi vítimahandicap asiático pixbetuma tentativahandicap asiático pixbetabuso do pai, pedófilo, e a mãe passou a mantê-la trancada por dias a fiohandicap asiático pixbetseu barraco. Cheirava cola para enganar a fome, depois passou para a maconha. Aos 9 anos, foi vendida pela avó a um bicheiro do morro. Aos 11 anos, ganhouhandicap asiático pixbetprimeira arma e passou a trabalhar "intensamente" para o jogo do bicho.
Descobriu na escrita o caminho para superar a dependência. Na reabilitação, foi incentivada a escrever para conseguir extravasar suas emoções, e descobriu um prazer e um talento até então insuspeitos.
Depois disso, completou o ensino médio, se formouhandicap asiático pixbetpedagogiahandicap asiático pixbet2014, publicou poesias e contoshandicap asiático pixbetcoletâneas da Festa Literária das Periferias (Flup) - e agora está escrevendo um novo romance, a ser publicado pela Companhia das Letras, e comemora que seu A Número Umhandicap asiático pixbetbreve sairáhandicap asiático pixbetPortugal e na França e teve os direitos comprados para o cinema - o roteiro do livro estáhandicap asiático pixbetfasehandicap asiático pixbetprodução e o longa-metragem deve ser lançadohandicap asiático pixbet2019.
handicap asiático pixbet BBC Brasil - Como você passou essa última semana na Rocinha? Sua casa foi afetada pelas trocashandicap asiático pixbettiros?
handicap asiático pixbet Raquelhandicap asiático pixbetOliveira - A minha casa fica numa linha difícil, um beco que é caminho (rota do tráfico). Teve confronto aqui e a cozinha foi atingida. As paredes ficaram todas esburacadas, quebrou janela, porta, furou o pisohandicap asiático pixbetcerâmica. Isso começouhandicap asiático pixbetmadrugada, eram 5h da manhã, estávamos dormindo. Graças a Deus o quarto é nos fundos. A gente colheu as balas que ficaram na parede, tinha bem umas quinze. E tinha dois defuntos no beco. Agora tem um tanquehandicap asiático pixbetguerra no meu portão.
Essa é a casa da minha mãe, onde moro e onde nasci. Eu tenho outra casinha na Rua 2, que alugava para ter alguma renda. Deu perda total. Não sobrou nada, está tudo furadohandicap asiático pixbetbala. A família (de inquilinos) saiu e nem pagou o mês. São barracos, né, não são casas não. Sou muito pobre, minha filha. Tudo o que o tráfico me deu, a cocaína levou. Cheirei tudo.
Mas eu dei sorte, não furou a minha caixa d'água, não furou o fogão nem a geladeira, não pegouhandicap asiático pixbetninguém. Está tudo bem, graças a Deus.
handicap asiático pixbet BBC Brasil - A senhora nasceu na Rocinhahandicap asiático pixbet1961 e assumiu o tráfico na favela nos anos 1980 depois da morte do Naldo. Como se sente diantehandicap asiático pixbetum novo conflitohandicap asiático pixbettorno da disputa do poder no morro?
handicap asiático pixbet Oliveira - Essa semana foi bem difícil. A história se repete. Fico muito triste. Porque foi uma guerra anunciada, tanto do lado da polícia quanto da comunidade.
O bagulho é um barrilhandicap asiático pixbetpólvora, vinha crescendo e deu nisso. Acaba explodindo. É uma tradição da Rocinha. Nada que é do mal coopera para o bem. A tendência é as coisas entrarem nos eixos e o tráficohandicap asiático pixbetdrogas ser restabelecido, como foi na minha época.
handicap asiático pixbet BBC Brasil - Qual é a história que você diz que se repete?
handicap asiático pixbet Oliveira - Essa história da entrada da polícia e do Exército aqui. Teve isso quando implantaram esse fracasso da UPP (Unidadehandicap asiático pixbetPolícia Pacificadora), teve isso quando o Nem foi preso (Antônio Bonfim Lopes, ex-chefe do tráfico na Rocinha, presohandicap asiático pixbet2011). Na minha época, nas operações Mosaico 1 e 2, o Exército tampou a favela (as operações Mosaico foram uma sériehandicap asiático pixbetinvestidashandicap asiático pixbetfavelas cariocas no fim dos anos 1980, planejadas pela Polícia Federal para conter o crescimento do tráficohandicap asiático pixbetentorpecentes). Hoje digo graças a Deus, porque foi preciso o apoio do Exército para apaziguar a situação. Entre aspas, né?
Enquanto não houver um programa sério para a questão da dependência química e da droga, não vamos a lugar nenhum. Vi um delegado falando que são os ricoshandicap asiático pixbetSão Conrado que vêm comprar cocaína na Rocinha. P*rra nenhuma. Quem mantém o tráfico dentro da favela é o usuário regular, aquele que usa todo dia, que vende o liquidificador, a TV, o sapato, a criança, o corpo para comprar a droga. Esse é o usuário que banca o tráfico. Esse é o dinheiro que entra certinho todo dia, como um salário.
Eu conheço o Rogério 157 há muito tempo (Rogério Avelino da Silva, que estava chefiando o tráfico na Rocinha até a disputa que começou semana passada). Éramos conhecidoshandicap asiático pixbetvizinhança. Ele nem tinha vida no crime ainda, era um menino, normal. Com o tempo nessa posição (de chefe do tráfico), ele foi enlouquecendo. Fui a um churrascohandicap asiático pixbetque ele apareceu muito transtornado, drogado, as pessoas ficaram com medo dele. A droga tira a noçãohandicap asiático pixbetrealidade.
handicap asiático pixbet BBC Brasil - Como foi para você encontrá-lo assim?
handicap asiático pixbet Oliveira - Nós conversamos, ele queria o meu livro. Eu vejo com uma certa dó. Não estou vitimizando ninguém. Mas são caminhos que a pessoa trilha que não têm volta.
Quem usa droga e vai para o tráfico, isso é um ponto final na vida do sujeito. Um sujeito como Rogério. Uma pobreza miserável. Virou ladrão. Começou a fumar maconha. Foi preso. Na cadeia, aceitou ajuda do tráfico. Se você tá na cadeia e aceita esse tipohandicap asiático pixbetajuda, tá ferrado. Porque quando sairhandicap asiático pixbetlá, tá escravo. Agora, se tivesse mais oportunidade para essas pessoas lá atrás, será que elas chegavam nesse ponto final? Será que as nossas cadeias estavam tão cheias?
Eu não faço apologia ao crime. Porque isso não é vida para ninguém. É aquela parada: pague para entrar, reze para sair. Eu até me emociono. Eu amo tanto a Rocinha. É um lugar tão rico e ao mesmo tempo tão miserável.
handicap asiático pixbet BBC Brasil - Você parou para pensar que,handicap asiático pixbetoutros tempos, poderia ter sido você por tráshandicap asiático pixbetparte daqueles tiros?
handicap asiático pixbet Oliveira - Eu tive momentoshandicap asiático pixbetdéjà vu muito grande. Continuo tendo. Quando voltei para casa esses diashandicap asiático pixbetônibus, cheguei na Via Apia (na entrada da Rocinha) e pensei: "Chegamos no inferno". Vi o rosto pesadão dos outros passageiros. Eu tinha essa sensação quando estava lutando para pararhandicap asiático pixbetusar droga. Em 2009, eu passava o dia no tratamento intensivo, jantava e vinha embora. O ônibus entrava na Rua 1 e eu pensava, "cheguei no inferno".
É muito difícil ter a sorte que tivehandicap asiático pixbetsuperar o usohandicap asiático pixbetdrogas,handicap asiático pixbetencontrar a recuperação,handicap asiático pixbettrilhar o rumo da literatura,handicap asiático pixbetencontrar pessoas maravilhosas como o Júlio Ludemir e o Écio Salles, da Flup (os idealizadores da Festa Literária das Periferias). Isso me deu um objetivohandicap asiático pixbetviver, tive um despertar espiritual. Isso é raro.
handicap asiático pixbet BBC Brasil - Mas olhando para toda essa violência, você se arrependehandicap asiático pixbetter sido parte disso no passado?
handicap asiático pixbet Oliveira - Eu não tenho arrependimento. Eu sinto é uma dó desgraçadahandicap asiático pixbetuma vida desperdiçada. Eu tinha grandes possibilidades. Eu tenho QI (quocientehandicap asiático pixbetinteligência)handicap asiático pixbet180. Consegui terminar a faculdade agora, fiz Enem, gabaritei a provahandicap asiático pixbetredação, fiz poesia a partir da recuperaçãohandicap asiático pixbetdrogas (Raquel começou a escrever durante o tratamento para superar o vício). Se eu tivesse tido uma estrutura familiar saudável e uma boa educação, onde eu estaria hoje?
Agora, eu não tenho arrependimento. Eu agi conforme a lei que eu conhecia. Como eu poderia ir por outro caminho, se só tinha aquela estrada ali? À minha volta era só aquilo. Não tinha como, meu bem.
Você cria a criança no meiohandicap asiático pixbetladrões e quer que ela seja um empresário famoso da moda? Você não consegue colher coisa boa se só planta coisa ruim. Se só dá um caminho para a pessoa andar. Vai ser pedra até o fim.
Que outro caminho teria para uma pessoa que passou por tudo que passei? Fui até feliz. Consegui tirar o melhor do pior. Dei uma sorte ferrada. Eu poderia estar lá até hoje, ou ter morridohandicap asiático pixbetarma da mão. Ter dado a vidahandicap asiático pixbettrocahandicap asiático pixbetnada. Porque tudo isso é uma ilusão. É uma guerra inútil.
O arrependimento desgraçado que eu tenho é do usohandicap asiático pixbetdrogas na minha vida, que acabou com tudo que eu poderia ter.
handicap asiático pixbet BBC Brasil - Você teve uma história muito sofrida já desde criança. O que te levou a se envolver com drogas tão cedo?
handicap asiático pixbet Oliveira - Eu tive uma infância miserável. Meu pai era pedófilo. Isso eu fui descobrir com 6 anos, mas graças a Deus ele não conseguiu consumar o ato. A minha mãe era passiva e eu fiquei trancada dentro do barraco. Ficava até uma semana trancada dentro do barraco. Eu tinha 6 anos.
Comecei a sair pela janela e a andarhandicap asiático pixbetcima dos telhados da favela. A gente passava muita fome. Cheirava cola para enganar a fome. A maconha já rolava entre os mais velhos e a gente passou a fumar também.
Quando eu tinha nove anos, a minha avó me vendeu para o sistema político vigente na época, que era o jogohandicap asiático pixbetbicho. Isso era uma prática comum aqui e no Morro da Providência. E aí eu dei uma sorte danada. Pela misericórdia eu não fui transformadahandicap asiático pixbetprostituta nem usada sexualmente por esse homem que me comprou. Ele teve que me assumir como padrinho. Aí entra um sincronismo religioso. Ogum nasceu na terra e deu a ordem. O bicheiro era muito ligado a São Jorge, que na umbanda é Ogum. Eu dei essa sorte, aconteceram uns sinais.
Quando eu tinha 11 anos, ganhei a primeira arma e fui trabalhar no barracão do bicho. Limpava as armas, depois passei a fazer a contabilidade, registrar os pagamentos dos agiotas, das putas, ia recolher o dinheiro. Até os 15 anos, trabalhei intensamente para o jogohandicap asiático pixbetbicho.
handicap asiático pixbet BBC Brasil - E depois você foi para o tráfico. Como você compara os diashandicap asiático pixbethoje à épocahandicap asiático pixbetque você, e antes o Naldo, comandavam a vendahandicap asiático pixbetdrogas no morro?
handicap asiático pixbet Oliveira - Hoje tem toda uma outra tendência. Aquela coisahandicap asiático pixbetheroísmo, do bandido Robin Hood, isso aí não existe mais. Na minha época a gente era tratado como herói, pela falta absolutahandicap asiático pixbetassistência pública,handicap asiático pixbetqualquer tipohandicap asiático pixbetapoio do estado, dentro das favelas.
Mas a história se repete. É uma história perpétuahandicap asiático pixbetluta pelo poder. Não é a luta pela bocahandicap asiático pixbetfumo, pelos pontoshandicap asiático pixbetvendahandicap asiático pixbetdrogas. A droga você vendehandicap asiático pixbetqualquer esquina, vai ali no Baixo Gávea que tem gente vendendo. A disputa é pelo poder. Vai muito além. Na minha época era pelo território. Hoje é por poder econômico.
handicap asiático pixbet BBC Brasil - Como você recebeu a entrada das Forças Armadas na sexta-feira passada?
handicap asiático pixbet Oliveira - Eu tive que ir para o meio do fogo cruzado para buscar a minha neta na creche. Quando eu saí, estava lotadohandicap asiático pixbetbandido aqui na entrada. E eu gritando, eu vou passar nessa p*rra! Mais pra baixo, tinha um grupohandicap asiático pixbetpoliciais acuados.
Com o tiroteio, a gente nem se lembrou que era aniversário da minha mãe. Ela mora comigo. Fez 88 anos no dia 22 (a sexta-feirahandicap asiático pixbetque os militares chegaram à Rocinha). Quando a situação acalmou que a gente lembrou. Caramba! É aniversário da velha. Aí compramos um bolinho e um sorvetinho na padaria e cantamos um Parabéns. O pedreiro já tinha começado a tapar os buracoshandicap asiático pixbettiros na cozinha.
Eu agradeço muito essa tomada do Exército, foi primordial. Se não tivesse acontecido, não teríamos conseguido um poucohandicap asiático pixbetpaz, um períodohandicap asiático pixbetrendição.
Mas fico muito triste que os militares só vieram para acudir depois que a situação chegou lá a São Conrado. Quando um ônibus foi incendiado no asfalto o secretáriohandicap asiático pixbetSegurança Pública (Roberto Sá) e o (governador Luiz Fernando) Pezão voltaram atrás e admitiram que a Rocinha precisavahandicap asiático pixbetintervenção militar. Enquanto isso a gente estava aqui vivendo o terror.
handicap asiático pixbet BBC Brasil - Em todos esses anos na Rocinha, você viu alguma melhora? Você tem esperança que as coisas melhorem no futuro?
handicap asiático pixbet Oliveira - Eu sou completamente cética. Não tenho esperança nenhumahandicap asiático pixbetque vai acabar o tráficohandicap asiático pixbetdrogas. Sei o rumo que isso vai ter e só peço a Deus que não sejamos entregues nas mãos do Comando Vermelho (CV). Eu gostaria muito que a Rocinha continuasse nas mãos da ADA (Amigos dos Amigos), porque se for para o CV, o que vai entrar na favela é o crack, essa páhandicap asiático pixbetcal (a ADA proíbe a venda da droga nas favelas que domina). Aí vou fazer minhas malas e sair daqui. Porque não quero ver o cenáriohandicap asiático pixbetdegradação que o crack traz.
A gente fica nessa situação, entre a cruz e a espada. E não pode orar a Deus e pedir para a polícia tomar conta, que vai virar milícia. Aí vai subir o morro e ter que pagar pedágio. Eu me sinto assim num cenário nostálgico, vendo a história se repetindo, se repetindo, se repetindo.