Rebaixar o currículo: a 'tática' para conseguir emprego que floresce na crise:slot duel

Por sorte, a nova chefia não se incomodou com a surpresa. "Até me pediram dicasslot duellivros e treinamentos", conta.

A opção pela tática teve suas razões. Demitidaslot dueljunhoslot duel2016, Bárbara soube, logo na primeira entrevistaslot duelemprego após a demissão, que "tinha qualificações demais para a vagaslot duelum momentoslot duelcrise".

Ou seja, a empresa não poderia pagar por seu currículo, que incluía pósslot duelMatemática e extensãoslot duelgestãoslot duelprojetos.

Em outra tentativa, o próprio gerente disse que não faria sentido contratá-la, pois até ele era menos qualificado do que ela.

"Fiquei muito brava. Passei a ter medoslot duelme apresentar com todos os conhecimentos que paguei muito pra ter. Jamais imaginei que precisaria, mas comecei a listar apenas experiências mais básicas. Funcionou", conta.

Números e riscos

O cenário econômico ajuda a entender essa tendênciaslot duel"rebaixamento voluntário" do currículo.

A demissãoslot duelempregados com curso superior completo no Brasil cresceu 10,8%slot duelmarçoslot duel2015 a marçoslot duel2016 - um corteslot duel1 milhãoslot duelpessoas.

Os dados, apurados pelo economista Fabio Bentes, da Confederação Nacional do Comércio (CNC), para a Agência Estado, mostram ainda que esse aspecto do desemprego vai na contramão das faixasslot duelmenor instrução, que têm registrado recuos no totalslot dueldemissões.

Assumir um cargo com currículo muito acima do necessário implica certos riscos, apontam especialistasslot duelmercadoslot dueltrabalho.

O primeiro é a dúvida - muitas vezes legítima - da empresa sobre o porquê da candidatura, e a suspeitaslot duelque o profissional deixará o emprego tão logo consiga algo melhor.

O segundo é o receioslot duelque o funcionário se desmotive rapidamente ou fique ansioso por uma promoção que a empresa não pode oferecer.

No casoslot duelBárbara, ela diz que isso não ocorreu - e já está investindo numa nova graduação,slot dueltecnologiaslot dueleventos.

"Sinto-me valorizada mesmo recebendo muito menos do que poderia ter (ganhava R$ 3,5 mil e passou a receber R$ 1,2 mil). Mais vale uma oportunidade na mão e a chanceslot duelme esforçar para alcançar tudoslot duelnovo do que um currículo ótimo que não rende oportunidades na crise."

Impactos da crise

Em muitos setores da economia brasileira, a dificuldadeslot duelconseguir emprego é efeito da recessão, a mais longa e intensaslot duel20 anos no país.

No trimestre encerradoslot duelmarçoslot duel2017, o desemprego medido pelo Instituto Brasileiroslot duelGeografia e Estatística (IBGE) ficouslot duel13,2% - 13,5 milhõesslot duelpessoas.

Para Bruno Ottoni, pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e especialistaslot duelmercadoslot dueltrabalho, a atual crise tem sido especialmente cruel com os trabalhadores.

"Nas crises anteriores verificávamos menos aumento no desemprego e mais queda na renda média do trabalhador. Havia mais inflação e mais informalidade, o que permitia aos patrões negociar mais facilmente reduções nos salários. Hoje, com a economia mais formalizada, o espaço para esse tiposlot duelacordo diminui", explica.

Em previsão para 2017, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que,slot duelcada três novos desempregados no mundo, um será brasileiro.

'Espantando oportunidades'

Das 40 pessoas que trabalhavamslot duel2014 no departamento da arquiteta Patrícia Rocha,slot duel30 anos, sobraram três. Ela própria perdeu o empregoslot duelagosto passado e está sem emprego fixo desde então.

Depoisslot dueloito anosslot duelestudos superiores no Mackenzie, ela acabou topando um contrato temporárioslot duelseis mesesslot dueluma construtora menor, com salário 25% mais baixo.

Com pós-graduaçãoslot duelgerenciamentoslot duelprojetos pelo Mackenzie e cursando outraslot dueldesignslot duelinteriores, Patrícia continua à procuraslot duelemprego fixo - e sem colocar no currículo o períodoslot duelque atuou como coordenadora.

"Tenho a impressãoslot duelque isso tem espantado oportunidades para cargos mais baixos ou que nunca exerci. Aí nem sequer sou chamada para uma primeira conversa", lamenta.

Seleção não é só currículo

Consultores lembram que o sucesso nas entrevistasslot dueltrabalho não depende apenas do currículo - seja ele "rebaixado" ou não.

"Muitas vezes candidatos ficam só martelando a própria qualificação, sem parar para pensar no perfil que a vaga requer", diz Ricardo Basaglia, diretor-executivo no Brasil da empresaslot duelrecrutamento Michael Page.

Para Basaglia, os três fatores mais importantes que as firmas procuram são comprometimento, flexibilidade e facilidadeslot duelrelacionamento.

Naturalmente, ninguém irá negar essas qualidades, mas entrevistadores tentam inferir esses pontosslot duelforma indireta,slot dueloutras perguntas ou testes psicológicos.

E às vezes, lembra o consultor, o currículo precisa ser resumido não para esconder experiência, mas porque o documento está inchado.

"É comum que profissionais listem até cursos antigosslot duelsegurança do trabalho desimportantes para a vaga. É preciso que só fique o principal."

Basaglia não vê a omissãoslot dueldados do currículo como faltaslot duelética, mas lamenta a "faltaslot duelconfiança na relação entre empregados e empregadores".

Esteja o obstáculo na crise econômica,slot duelum descasamento entre realidade e qualificação ouslot duelambos, vale a pena refletir sobre outras barreiras que eventualmente possam estar impedindo a conquista do emprego, afirma.

"O profissional que se conhece e se questiona com autoconsciência sempre acaba por se potencializar", conclui.

A essa doseslot duelautocrítica deve se juntar, no entanto, uma torcida para que o pior da crise econômica tenha,slot duelfato, ficado para trás.