A incrível história do amputado por choque que construiu braço com sucata:betesporte cadastro
Seria mais um obstáculo na vida desse cearensebetesporte cadastro48 anos, que nasceu surdo e não aprendeu a falar. Mas rendeu uma bela históriabetesporte cadastrodedicação.
Ari, como é conhecido, passa boa parte do dia enfurnado numa oficinabetesporte cadastroquintal. Em meio a peças recolhidasbetesporte cadastrodepósitos e na cozinha da mãe, colocou na cabeça: irá construir a prótese mais barata existente, para devolver movimentos a si e a qualquer amputado como ele.
Em pouco tempo, ele produziu duas próteses do braço direito, uma mecânica e outra elétrica, e já trabalha na terceira, que deseja ser computadorizada. "Meu sonho é ajudar as pessoas", diz Ari à BBC Brasil, sempre com ajuda da mãe na tradução.
O inventor autodidata, que se comunica por meiobetesporte cadastrosinais com a mão remanescente, construiu as próteses com peças descartáveis e partesbetesporte cadastroutensílios domésticos.
Sua primeira criação tem o antebraçobetesporte cadastrocanobetesporte cadastroPVC e tampabetesporte cadastropanela; o punho é um bicobetesporte cadastrosecadorbetesporte cadastrocabelo; os dedos são canosbetesporte cadastroalumínio, acionados por elásticosbetesporte cadastroprender dinheiro; e a palma da mão exibe uma borracha, para garantir aderência ao segurar objetos.
Bastou um mêsbetesporte cadastrotrabalho, ainda no ano do acidente. Ao todo, Ari investiu R$ 400, até 20 vezes menos do que uma prótese similar no mercado.
A inspiração veiobetesporte cadastrovídeos na internet. O braço, porém, não é fixo, como a maioria das próteses mecânicas. O punho é flexível e ele aciona os dedos com movimentos no ombro esquerdo. Era a independência que o inventor buscava.
Cotidiano
Com o mesmo braço que sempre usou, Ari agora corta pão, pega copos e até dirige seu carro. E não se tratabetesporte cadastroum veículo automático, mas um Fusca com câmbio daqueles que pedem força para passar a marcha - com a mão direita, diga-sebetesporte cadastropassagem.
"Meu filho é muito independente. Se a gente resolve se meter a ajudar, toma bronca. As cuecas, por exemplo, ele aprendeu a lavar com uma mão só", relata Maria do Socorro Ribeiro, aposentadabetesporte cadastro66 anos.
A prótese, claro, não pode ser molhada, então foi preciso improvisar outros jeitinhos no dia a dia. "No banho, lavo a axila esquerda com o polegar da mão esquerda", conta Ari.
Mas o inventor não se dá por satisfeito. "No mesmo diabetesporte cadastroque terminei a primeira prótese, já queria fazer uma mais moderna", diz.
Na escala evolutiva das prótesesbetesporte cadastrobraços, o degrau seguintebetesporte cadastrouma mecânica é a elétrica. Nela, o movimento dos dedos é acionado por uma bateria, com comandos feitos com a outra mão ou por meiobetesporte cadastroeletrodos que captam os impulsos dos nervos na região da amputação.
O inventor leu sobre issobetesporte cadastrotutoriais na internet e decidiu fazerbetesporte cadastroprótese elétrica. Em oito meses, o dispositivo estava pronto. Bem mais moderno que o primeiro.
Novo invento
Ari construiu um braço que, com acionamento mecânico a partir do ombro, movimenta os dedos por corrente elétrica. A energia é enviada a partirbetesporte cadastrouma bateriabetesporte cadastronobreak, atravésbetesporte cadastroum motorzinhobetesporte cadastrojanelabetesporte cadastrocarro.
O material da segunda criação é ainda mais rudimentar do que o da primeira. No antebraço há um copobetesporte cadastrocoquetel, tubobetesporte cadastroextintorbetesporte cadastroincêndio e pedaçosbetesporte cadastropanelas. Os dedos são correntesbetesporte cadastrobicicleta, ligados à mão por meiobetesporte cadastrocolheres.
"Passei a chamar meu irmãobetesporte cadastro'Exterminador do Futuro', porque a prótese parece abetesporte cadastroum ciborgue", brinca José Rusivelton Ribeiro, o Russo,betesporte cadastro46 anos, donobetesporte cadastroacademiabetesporte cadastroginástica e braço direito - literalmente -betesporte cadastroAri.
O irmão o ensinou a usar serra e solda para moldar peças. Isso possibilitou uma flexibilidade ainda maior no punho e nos dedos da prótese. O inventor, contudo, não gostou do resultado final: os materiais não eram ideais e o braço ficou com 4 kg, o dobrobetesporte cadastroum modelo com funções similares.
Agora, Ari está trabalhandobetesporte cadastrouma prótese semelhante à segunda, porém mais leve. Tanto a segunda quanto a terceira deverão custar menosbetesporte cadastroR$ 2 mil, até 15 vezes mais baratas do que uma convencional nesse patamar.
Para produzir suas invenções, Ari investe partebetesporte cadastrosua aposentadoria por invalidez (R$ 880) e dos bicos que faz consertando TVs e computadoresbetesporte cadastrocasa. "Acho linda a forçabetesporte cadastrovontade dele", afirma a mãe.
A lojinhabetesporte cadastroeletrônicos, antigo sustento da família, foi vendida no dia do acidente. O trauma foi grande para todos, e emociona os parentes até hoje.
Uma quase tragédia
O paibetesporte cadastroAri, José Auri Ribeiro, comandou durante maisbetesporte cadastrotrês décadas a Eletrônica O Louro, a 100 metrosbetesporte cadastrocasa. O mais velho dos cinco filhos começou a trabalhar aos sete anos, e logo herdou a habilidade no consertobetesporte cadastrotelevisores. Até que o pupilo superou o mestre. "Ele ficou muito melhor do que eu", afirma Auri, eletrônicobetesporte cadastro72 anos.
Aquele final da tardebetesporte cadastrosetembrobetesporte cadastro2012, data que a família não esquece, sumiu da memóriabetesporte cadastroAri. "Eu apaguei. Não me lembrobetesporte cadastronada."
Sorte que ele estava acompanhado da mãe, técnicabetesporte cadastroenfermagem. "Fiz massagem cardíaca e respiração, então o coração voltou a bater", relembra Socorro.
Ari foi socorridobetesporte cadastrocarro a uma UPA (Unidadebetesporte cadastroPronto Atendimento), onde esperou por cinco horas. A alternativa, conta a mãe, foi atendê-lo numa ambulância, e depois transferi-lo a um hospital no centro da cidade, a 10 kmbetesporte cadastrodistância.
"Com poucos dias, a mão começou a necrosar, então meu irmão chamou os médicos e pediu a amputação no antebraço, onde ficou um machucadobetesporte cadastroformabetesporte cadastroanel, para não correr o riscobetesporte cadastroperder o braço inteiro", relata o irmão Rusivelton.
Quinze dias depoisbetesporte cadastroquase perder a vida, Ari recebia alta. "Quando o vi pela primeira vez, segurei o choro para não deixá-lo triste. Só que ele estava tão bem - parecia que tinha arrancado um dente, e não um braço - que aquilo me deu força", diz o irmão.
Ímpeto criativo
Ari mora com a mãe e a filha Sara, numa casa simples no bairro boêmio da Varjota. Conheceu a mulher, Zenaide, também surda, na escola para pessoas com deficiência auditiva. Mas ela partiu cedo, aos 34 anos,betesporte cadastro1998, vítimabetesporte cadastrocâncerbetesporte cadastromama.
O cearense nasceu com perda total da audição, limitação constatada quando ainda era bebê. Ao longo da infância e da juventude, aulasbetesporte cadastroLibras (Língua Brasileirabetesporte cadastroSinais), no Instituto Cearensebetesporte cadastroEducaçãobetesporte cadastroSurdos, minimizaram dificuldadesbetesporte cadastrocomunicação com os pais e os irmãos.
Porém, a condição financeira prejudicou o desenvolvimento da fala, o que talvez fosse possível atravésbetesporte cadastrofonoaudiologia. "Como nunca ouviu, ele não consegue fazer nenhum som", explica a filha, Sara Ribeiro, universitáriabetesporte cadastro24 anos.
Os paisbetesporte cadastroAri se separaram pouco antes do acidente - hoje Auri morabetesporte cadastroFortim, a 135 kmbetesporte cadastroFortaleza. Socorro se divide com a neta, e também com o filho Rusivelton, no suporte ao filho mais velho. Essa atenção é importante, sobretudo para "controlar" o ímpeto criativobetesporte cadastroAri.
"Dia desses, ele viubetesporte cadastroum vídeo um cientista tentando fazer um motorbetesporte cadastrocarro funcionar com água. Ele quis fazer o mesmo, só que deu uma explosão danadabetesporte cadastrocasa. Minha mãe me ligou desesperada, para convencê-lo a parar com essas coisas", diz o irmão.
Ari volta e meia se acidenta - já cortou a mão esquerda com seus equipamentos. "Quando bota uma coisa na cabeça, meu pai às vezes fica obcecado. Então a gente tembetesporte cadastroestar semprebetesporte cadastroolho, para colocar um freio", confidencia Sara.
Sua históriabetesporte cadastrovida sensibilizou o donobetesporte cadastrouma empresabetesporte cadastroprótesesbetesporte cadastroSorocaba (SP). Dele, Ari ganhou duas próteses elétricas,betesporte cadastroR$ 15 mil e R$ 30 mil, alémbetesporte cadastroR$ 10 mil para investirbetesporte cadastroseu trabalho.
Com os presentes, Ari conseguiu renovar a carteirabetesporte cadastromotorista, já que a legislaçãobetesporte cadastrotrânsito não permite a um amputado dirigir com prótese sem avaliaçãobetesporte cadastrosegurança. Agora, não há mais o riscobetesporte cadastroser paradobetesporte cadastroalguma blitz.
Hoje ele se divide entre uma das próteses que recebeu e a primeira que produziu, dependendo da necessidade. Isso porque uma das próteses que recebeu, apesarbetesporte cadastromais moderna, não tem mobilidade no punho.
Quando uma das peças doadas deu problema, o inventor não teve dificuldade para abri-la e consertá-la. Em casa, Ari é considerado o "gênio" da família - avaliação compartilhada até por especialistas.
Futuro
A reportagem da BBC Brasil apresentou Ari aos donosbetesporte cadastrouma empresabetesporte cadastroprótesesbetesporte cadastroFortaleza. Os irmãos Roberto e Carlos Henrique Enéas ficaram impressionados ao conhecer os inventos.
"Esperava ver algo muito mais simples. É incrível que algo assim seja feito numa oficina", diz Roberto, fisioterapeuta e protético,betesporte cadastro34 anos.
Não existe um curso superior no Brasil que ensine a produzir prótesesbetesporte cadastromembros superiores ou inferiores. Há cursos técnicos, que capacitam profissionaisbetesporte cadastrosaúde para atuar no ramo.
Segundo o Instituto Brasileirobetesporte cadastroGeografia e Estatística (IBGE), existem cercabetesporte cadastro500 mil amputados no país. Apesar disso, reforça Roberto, também não há uma produção nacionalbetesporte cadastropróteses, mas somente pesquisas isoladasbetesporte cadastrocentros acadêmicos.
Por isso, as próteses usadas no Brasil são todas importadas,betesporte cadastrocompanhias como a alemã Ottobock, e adaptadas por empresas sob a necessidade do paciente. Dessa forma, Roberto assegura: o que Ari cria num quartinhobetesporte cadastroFortaleza está à frentebetesporte cadastrotudo que é feito no país.
"Esse cara é um gênio. Guardadas as devidas proporções, é um Miguel Nicolelis sem aparato tecnológico à disposição", afirma Roberto, referindo-se ao cientista paulista que é referência mundialbetesporte cadastroneuroreabilitação.
Para o fisioterapeuta, duas coisas sinalizam o avanço das invenções do cearense: a flexibilidade do punho e um sensor instalado na ponta do dedo médio da segunda prótese, que evita que o apertobetesporte cadastromão passe do ponto.
"Usei uma lata para calcular a força necessária. Se a lata amassa, é porque machucaria a mão da pessoa", explica Ari.
"Só recentemente as próteses passaram a ter esses dois recursos, e somente um único modelo no mundo, que custa R$ 200 mil", indica Carlos Henrique, administradorbetesporte cadastro38 anos. "Ele aplicou ideias complexas a componentes simples."