O que mudou desde o assassinato027 betMarielma, torturada e violentada pelos patrões aos 11 anos:027 bet
Marielma foi seguidamente torturada e espancada pelo casal, até ser encontrada morta027 bet12027 betnovembro027 bet2005. Laudo médico apontou costelas quebradas, rins e pulmões perfurados, além027 betcortes e queimaduras. O exame também indicou sêmen no corpo da menina, indício027 betviolência sexual.
A defesa dos patrões alegou à época que Marielma havia molestado a filha deles,027 betum ano. Exames no bebê descartaram essa tese.
Uma das testemunhas da acusação disse ter visto Marielma, na casa dos patrões, com manchas hemorrágicas na pele. Disse também ter presenciado uma agressão contra a menina, mas que nada fez por ter sido ameaçado por Ronivaldo.
Em dezembro027 bet2006, Ronivaldo foi condenado a 52 anos027 betprisão pelo crime, pena depois reduzida para 48 anos. Cumpriu 10 anos e ganhou benefício do regime semiaberto. Agora está foragido. A advogada Ivelise Neves, que cuidou do caso na fase027 betexecução penal, disse que perdeu o contato com o cliente.
Roberta foi condenada a 33 anos027 betprisão. Cumpriu 11 anos e passou para o regime semiaberto, saindo para trabalhar durante o dia e voltando à noite para uma instituição penal. Mas ficou três meses foragida e foi recapturada027 bet24027 betmaio.
A morte027 betMarielma provocou indignação e fez com que organismos nacionais e internacionais se posicionassem sobre o trabalho infantil doméstico no Brasil.
A menina se tornou um símbolo da luta contra o problema e, dois anos após027 betmorte,027 bet12027 betnovembro027 bet2007, foi assinada a lei que institui 12027 betjunho como Dia Nacional027 betCombate ao Trabalho Infantil (também estabelecido pela ONU como dia mundial sobre o tema).
Em Belém, uma lei municipal promulgada027 bet2009 transformou o 12027 betnovembro, data027 betsua morte,027 betDia Municipal do Combate à Exploração da Mão027 betObra Infantil.
Outros casos
Depois027 betMarielma, histórias027 betmeninas que trabalham como babás e empregadas passaram a chamar mais atenção. Em 2008, a empresária Sílvia Calabresi foi presa por torturar a menina Lucélia Rodrigues da Silva, então com 12 anos, que ela dizia ser027 betfilha adotiva, mas que na verdade trabalhava como empregada da casa.
Em 2015, um anúncio num jornal paraense provocou revolta: um casal propunha-se a adotar jovem027 bet12 a 18 anos para que ela cuidasse027 betum bebê027 betum ano. Na verdade, era um caso027 betbusca027 betuma trabalhadora infantil disfarçado027 betadoção. Foram três anúncios quase simultâneos, todos com o mesmo tipo027 betconteúdo, e as denúncias chegaram ao Ministério Público do Trabalho.
Na tarde da última terça-feira, 31027 betmaio, quando fazia uma palestra sobre trabalho infantil027 betuma escola municipal027 betBelém, a desembargadora Maria Zuíla Dutra perguntou quem já trabalhava.
Numa turma027 betsétimo ano, 20% dos alunos levantaram o braço. Entre eles, J.M.P.,027 bet13 anos. Ela mora com os pais027 betBelém, mas cuida027 betgêmeas027 bettrês anos, filhas027 betuma aparentada da família. Uma das irmãs é especial e tem problemas027 betlocomoção. J. disse que precisa ajudar os pais e que ganha R$ 70 mensais pelo serviço.
"Em casos assim, fazemos um trabalho solidário e educativo027 betconversa com a família. Mas é absolutamente ilegal, é trabalho remunerado, proibido por lei. Uma jovem027 bet13 anos não tem condições027 betcuidar027 betduas crianças027 bettrês anos. Ela me contou que tem dores nas costas, fica cansada. Alguém pode pensar que está fazendo um bem a essa menina, mas na verdade faz um mal", afirmou Dutra, gestora do Programa027 betErradicação do Trabalho Infantil e027 betEstímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho.
No caso027 betJ.M.P., ela será encaminhada para cursos profissionalizantes e, quando completar 14 anos, para o programa027 betaprendizagem.
Trabalho infantil027 betcasa
Números do IBGE (Instituto Brasileiro027 betGeografia e Estatística) mostram que, nos últimos 12 anos, o Brasil reduziu027 betquase 60% o trabalho027 betcrianças e adolescentes027 bet5 a 17 anos, esforço reconhecido mundialmente e associado a programas como o Peti (Programa027 betErradicação do Trabalho Infantil) e o Bolsa Família.
O ritmo027 betqueda, porém, caiu recentemente. Pior ainda, a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra027 betDomicílios) revelou que,027 bet2013 para 2014, o trabalho027 betpessoas027 bet5 a 17 anos cresceu 4,5%, o que significa mais 143,5 mil crianças e adolescentes ocupados.
Segundo a Pnad, 3,3 milhões027 betcrianças e adolescentes027 bet5 a 17 anos trabalhavam027 bet2014, 8,1% do total da população dessa faixa etária. Em 2013 eram 3,2 milhões, ou 7,5%. Na faixa etária027 bet5 a 13 anos, o trabalho infantil propriamente dito, o aumento foi027 bet9,3%, 506 mil027 bet2013 para 554 mil027 bet2014.
O trabalho infantil doméstico também caiu nos últimos anos. Segundo a Pnad, havia 174,8 mil trabalhadores domésticos027 bet10 a 14 anos no Brasil027 bet2014; eram 213,6 mil027 bet2013, 326 mil027 bet2008 e 406 mil027 bet2004.
De novo,027 bet2013 a 2014 houve crescimento do trabalho doméstico na faixa027 bet10 a 14 anos, que subiu027 bet50 mil para 52 mil. Esse dado não inclui, porém, os trabalhadores infantis027 bet5 a 9 anos. Segundo o IBGE,027 bet2014 ainda havia 69 mil crianças dessa faixa027 betidade trabalhando, a maioria na área rural.
A partir dos dados do IBGE, o FNPeti (Fórum Nacional027 betPrevenção e Erradicação do Trabalho Infantil), que reúne cerca027 bet70 entidades governamentais e não governamentais envolvidas no combate ao problema, fez análises específicas sobre o trabalho infantil doméstico. O Nordeste concentra 38% dos casos; depois vêm o Sudeste, com 29%, o Norte, com 12,6%, o Sul e o Centro-Oeste, com 10,2% cada.
Com números assim, o Brasil não cumpriu a meta com a qual se comprometeu027 betreunião da Organização Internacional do Trabalho (OIT)027 bet2006: eliminar até 2015 as 89 piores formas027 bettrabalho infantil, entre elas o trabalho infantil doméstico. A outra meta é erradicar a totalidade do trabalho infantil até 2020.
"O trabalho infantil doméstico ainda é um problema que a sociedade tolera. Muitas vezes nem é notificado. Apesar da queda significativa dos últimos anos, o ritmo027 betqueda foi reduzido, e houve até um aumento027 bet2013 para 2014", afirma a socióloga Isa Oliveira, secretária-executiva do FNPeti.
Cria da casa, afilhada ou filha027 betcriação
Especialistas consultados pela BBC Brasil são unânimes027 betafirmar que o trabalho infantil doméstico está longe027 betacabar no Brasil.
Na avaliação deles, casos extremos, como o027 betMarielma, atraem atenção e causam revolta, mas há um número alto027 betrelatos cotidianos027 betcrianças e adolescentes que continuam trabalhando como domésticas, e a sociedade os aceita tranquilamente - como o da jovem027 bet13 anos que cuida dos gêmeos027 betBelém.
Nas regiões Norte e Nordeste, é comum que patrões se refiram a trabalhadoras domésticas infantis ou adolescentes como "filhas027 betcriação", "afilhadas" ou "crias da casa". Mas, na verdade, as garotas são submetidas a uma rotina027 betservidão: deixam027 betver suas famílias, cumprem jornada exaustiva, abandonam a escola e são submetidas a riscos diversos, desde acidentes027 betcasa até abusos sexuais.
O procurador Rafael Marques, vice-chefe do Ministério Público do Trabalho (MPT) no Pará e no Amapá, comandou,027 bet2007 a 2015, a Coordenadoria Nacional contra a Exploração do Trabalho Infantil do MPT.
Marques diz receber muitas denúncias027 bettrabalho infantil doméstico a partir027 betsituações027 betque famílias pobres mandam suas filhas para trabalhar027 betoutras casas. São histórias e condições similares à027 betMarielma, ainda que sem os extremos027 bettortura e morte. Só ao MPT do Pará chegaram este ano 123 denúncias; 34 continuam sob investigação.
"As pessoas aceitam e até acham que estão fazendo um bem à criança, para que ela saia da miséria. Por isso o trabalho doméstico ainda é muitas vezes invisível, entendido como mal menor, e conta com a complacência social", afirma o procurador.