As crianças que estão morrendoinaniçãoGaza:

Uma foto do bebê Jamal al-Kaferna logo após seu nascimento,agosto2023

Crédito, Arquivo pessoal

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Ele tinha três meses quando começou a ficar doente.

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O conflito entre Israel e o Hamas se prolongava por maisum mês quando al-Kaferna e toda a família dela haviam sido deslocados diversas vezes. Eles quase morreram após um ataque aéreo israelense no campo onde estavam refugiados.

O recém-nascido foi diagnosticado com uma infecção intestinal e recebeu prescriçõesremédios. Mas ele não melhorou.

No iníciodezembro, 90% das famílias no norteGaza passavam dias inteiros sem acesso à comida,acordo com o Programa Alimentar Mundial da Organização das Nações Unidas (ONU).

Abeer lutou para conseguir amamentar seu bebê.

Desnutrida e desidratada, ela não produzia leite suficiente — e era difícil encontrar fórmula para bebês.

Em novembro, Jamal pesava 7 quilos (considerado um peso saudável), mas emagreceu rapidamente. Em poucas semanas, ele estava com apenas 3,5 kg.

Em janeiro, Esmahan, a avó do menino, disse que ele parecia "um esqueleto".

"Não conseguimos encontrar leite para ele", relata o pai, Mahmoud al-Kaferna. "Tentamos oferecer água, mas até a água estava poluída."

Jamal pesava saudáveis ​​7 kg três meses antes da guerra cobrar seu preço

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Legenda da foto, Jamal pesava saudáveis ​​7 kg três meses antes da guerra começar a cobrar um preço alto
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A família até recebeu receitasalguns remédios para o bebê, mas não conseguiu encontrá-los.

Finalmente, a criança foi internada num hospital. Mas quando Jamal começou a melhorar, eles tiveram que deixar o local.

"O hospital disse que não tinha mais nada a fazer por ele e que havia outras crianças que necessitavamcuidados", lembra o pai.

Na noite17janeiro, a temperatura corporalJamal caiu e ele começou a tossir. Uma substância branca saía do nariz do menino.

"Corremos para o hospital durante a noite, sob bombardeios", diz Mahmoud.

"Eles [os profissionais da saúde] tentaram resgatá-lo por meia hora, mas não conseguiram. A faltacomida, água e tratamento adequado matou meu filho."

A Organização Mundial da Saúde (OMS) tenta levar mais ajuda médica ao norteGaza.

No entanto, apenas três das 16 missões realizadas pela entidade tiveram acesso liberado pelas ForçasDefesaIsrael (IDF)janeiro.

Em fevereiro, nenhuma das operações conseguiu a liberação para levar ajuda.

Quando a OMS finalmente chegou ao norteGaza, no iníciomarço, a equipe descobriu que 10 crianças tinham morrido por "faltacomida" num hospital.

O Ministério da Saúde administrado pelo Hamas afirma que 27 crianças morreramdesnutrição e desidrataçãoGaza desde o início da guerra. Espera-se que esse número aumente.

Acredita-se que cerca300 mil palestinos permaneçam no norteGaza.

A ONU e outras entidadesajuda humanitária planejaram 61 missões ao norteGazaJaneiro. As IDF permitiram nove delas.

Depoisum comboioalimentos da ONU ter sido atingido por bombardeio israelense enquanto aguardava a liberação pertoum postocontrole, a entidade passou a traçar menos incursões pelo território afetado pelo conflito.

Das 24 missões planejadas para fevereiro, a IDF facilitou seis delas.

"A capacidade da ONUir ao norteGaza é algo que não deveria ser questionado se estivermos dispostos e formos capazeschegar até lá", declarou Tess Ingram, representante da áreacomunicações da Unicef.

Ele próprio passou uma semanaGaza no mêsjaneiro e tentou acessar a região norte do território palestinodiversas ocasiões.

Israel diz que não existem limites para a quantidadeajuda que pode ser entregue aos palestinos e culpa as agências da ONU por não conseguirem distribuir os suprimentos.

Gráfico com estatísticas sobre desnutrição e desidrataçãoGaza

A faltaajuda humanitária deixou as pessoas no norteGaza com poucos suprimentos.

Khalid está abrigado na cidadeJabalia com cinco filhos e outros 90 membros dafamília.

Ele disse à BBC que eles têm sobrevivido à baseervas daninhas e ração animal.

"É como comer pequenas pedrinhas", diz ele. Depoisingerir a ração, ele encontrou sangue nas fezes e sofreu episódiosdores estomacais.

A famíliaKhalid teve sorte. Eles encontraram um sacoarroz cheioterra e pedras nos escombrosum prédio.

Eles também se nutriram com Malva parviflora, uma planta comestível que cresceu no jardimum prédio bombardeado depoisalguns diaschuva.

Recentemente, porém, a ração animal, o arroz e até o mato acabaram. Durante uma semana, no iníciomarço, a famíliaKhalid não teve absolutamente nada para comer.

Os países árabes e ocidentais tentam agora lançar alimentos para Gaza pelo ar. Khalid efamília tiveram sorte novamente quando pegaram alguns pacotesarroz e carne durante uma dessas operações.

As agências humanitárias ponderam, no entanto, que esta é uma forma ineficiente e caralevar alimentos para o território.

Pacotesajuda são lançados por via aérea sobre o norte da FaixaGaza8março2024,meio ao conflitocurso entre Israel e o movimento Hamas.

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Pacotesajuda foram lançados por via aérea sobre o norte da FaixaGaza8março

Aseel, que também está no norteGaza, disse à BBC que a maior parte da ajuda caiu no mar e as pessoas tiveram que lutar para chegar até os pacotes.

O irmão dela chegou a um localentrega às 6 horas da manhã, mas voltou com apenas uma latasardinha. No dia seguinte, ele só conseguiu duas garrafas pequenaságua.

Parte da ajuda também foi lançadaáreas próximas à fronteira israelense, onde as FDI alertaram os residentes para que não se aproximassem.

"Todos correm seguindo a direção do paraquedas, até que no final desistimos e voltamos sem nada", diz Aseel.

Três pessoas que vivemGaza disseram à BBC que a ajuda humanitária beneficiou apenas algumas dezenas dos milhares que tentavam acesso aos alimentos. A maioria das pessoas voltou exausta emãos vazias.

A ONU afirma que pelo menos 576 mil palestinosGaza — ou um quarto da população total — estão a um passo da fome.

A agência alerta que o tempo está quase se esgotando para as pessoas do norte, que têm pouca comida ou água potável.

Para que uma situaçãofome seja declarada, segundo os critérios internacionais, 20% da população deve sofrer uma escassez extremaalimentos, com 30% das crianças gravemente subnutridas e pelo menos duas mortes diárias por fome, subnutrição ou doenças relacionadas, a cada 10 mil pessoas.

Essa declaração é realizada pelo Quadro IntegradoClassificação da Segurança Alimentar (IPC), um grupo composto por maisuma dúziaorganismos e gruposajuda da ONU.

Segundo um relatório divulgado pelo IPC na segunda-feira (18/3), uma situaçãofome é esperadaGaza entre o as últimas semanasmarço e o mêsmaio.

De acordo com o texto, o númeropessoas que enfrentam uma "fome catastrófica" aumentou para 1,1 milhão, o que representa cercametade da populaçãoGaza.

Em dezembro, a ONU começou a alertar sobre a fome. Desde então, a quantidadeajuda que chega a Gaza não melhorou.

Em janeiro, uma média150 comboiosajuda entraramGaza todos os dias — uma fração das 500 missões humanitárias que cruzavam a fronteira antes da guerra.

Em fevereiro, a situação foi ainda pior, com 97 comboios por dia,média.

Gráfico ajuda humanitária Gaza

Mesmo na região sulGaza, que tem acesso a mais ajuda humanitária, a maioria das famílias vive com apenas uma refeição por dia. Frutas frescas, vegetais, ovos e carne são difíceisencontrar e custam até 10 vezes o preço cobrado antes da guerra.

"Precisoum empréstimo internacional para alimentar a minha família", diz Muhammad al-Najjar, que foi deslocadoJabalia para Rafah, ao sul, com 11 membros dafamília.

Quatro latasfeijão, três latasgrãobico e 11 caixasbiscoitos costumam durar uma semana. Eles sempre complementam o estoque quando podem, apesar do grande custo envolvido.

Nagham Mazid trabalha como médico voluntário no Hospital dos MártiresAl-Aqsa, no centroGaza. Ela tem atendido um número crescentepacientes que sofremdesidratação grave e doenças gastrointestinais devido ao consumo excessivoalimentos enlatados. O especialista também precisou lidar com casosintoxicação relacionados a alimentos contaminados.

O hospital também registra um aumento acentuado nos casoshepatite e anemia. A OMS afirma que os casosdiarreia e infecções respiratórias agudas dispararamGaza, especialmente entre crianças.

A família que precisou lidar com a perda do bebê Jamal não tem comida neste momento. Os oito primos e os pais da criança estão morrendofome.

Eles só esperam ter a sorteconseguir que parte da ajuda chegue atravéslançamentos aéreos, por mar ou por terra.