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O poder genético das árvores gigantes:
Quando me mudei para Montana, no final dos anos 1970, temperaturas-34 °C ou até -40 °C eram comuns no inverno, às vezes por semanas a fio. A temperatura mais baixa já registradaMontana é-57 °C.
Mas, atualmente, as temperaturas mínimasinverno raramente caem abaixocerca-18 °C. E, quando caem, elas duram apenas um ou dois dias, o que não é suficiente, nemperto, para controlar os besouros-dos-pinheiros, que produzem seu próprio anticongelante natural.
Por isso,questãotrês anos, mais90% da minha floresta havia morrido. Nós contratamos lenhadores para derrubar as árvores e levá-lascaminhão para uma fábrica, onde elas foram transformadaspolpa e, depois,papelão.
Mas isso não foi tudo. Árvores estavam morrendotodo o oeste da América do Norte. Entre 2006 e 2007, a Colúmbia Britânica, no Canadá, perdeu 80% dos seus pinheiros-da-praia adultos, que deixaramser um sumidourocarbono (que absorve mais do que emite), para se tonarem fontecarbono, que emite mais do que absorve.
Clonando árvoresviveiros especiais
As árvores continuam a morrertodo o oeste norte-americano. Alguns anos atrás, 129 milhõesárvores morreram na Califórnia, nos Estados Unidos.
Assistir ao fim da minha floresta despertoumim um interesse renovado pelo que estava acontecendo com as árvoresMontana eoutras partes do mundo. Por isso, comecei uma pesquisa sobre a vida e a morteárvores e florestas, que já dura duas décadas.
As árvores limpam a nossa água, afetam o nosso clima, fornecem madeira para construção e oferecem fontessustento para nós e muitos dos animais que nos servemalimento. De alguma forma, elas parecem até estar conectadas às estrelas.
Mas, mesmo assim, nós sabemos muito pouco sobre o seu papel no planeta.
Nós também não conhecemos a genética das árvores, especialmente os efeitos sobre o patrimônio genético do cortevirtualmente todas as árvores maiores e mais robustas para a extraçãomadeira ao longotantos séculos. E ainda não temos basicamente nenhuma ideiacomo as árvores sobreviventes enfrentarão um mundo mais quente e seco.
Mas, nos últimos anos, os cientistas começaram a descobrir a importância da genética ancestral das árvores, com cada vez mais evidências demonstrando que elas desempenham funções fundamentais para o futuro das florestas da Terra. Essas pesquisas seguem-se aos esforçosum grupoentusiastas das árvores para tentar reproduzir as maiores dessas gigantesviveiros especiais, chamados"bibliotecas vivas", para garantir a preservação do DNA dessas árvores.
Essa ação parece ter sido premonitória.
O 'legista das árvores'
O pesquisador Craig D. Allen vem observando a morte das florestas por grande parte dacarreira profissional. Ele foi apelidado"legista das árvores", por tentar compreender como as árvores estão morrendo com as mudanças climáticas.
Allen aposentou-se recentemente do Serviço Geológico dos Estados Unidos, mas agora está mais ocupado do que nunca. Ele pesquisa a crise mundial das florestas e trabalha como professorecologia da Universidade do Novo México, nos Estados Unidos.
Há alguns anos, eu percorri com ele hectare por hectareflorestaspinheiros que estavam morrendo nas paisagens secas pertoSanta Fe, no Novo México (EUA), devido ao calor e à seca prolongada. Quando o encontreinovo recentemente, ele me disse que a morte das florestas está se acelerandotodo o mundo.
Allen faz parteum pequeno grupopesquisadores que está desvendando minuciosamente as consequências das mudanças climáticas para as florestas antigastodo o mundo - as florestas seculares, que conhecemos e amamos.
O tema é complexo, mas Allen indica resultadospesquisas publicados na última década que, para ele, resumem os graves impactos do aquecimento do planeta sobre esses ecossistemas.
O primeiro desses estudos - uma pesquisa2012, da qual Allen é um dos autores - combinou dadosanéis das árvores, registros climáticos e projeções do clima futuro no sudoeste dos Estados Unidos. Ele concluiu que as megassecas do futuro, causadas pelas mudanças climáticas, poderão ter impactos devastadores sobre as florestas da região.
O ponto fundamental da questão é que, mesmo se as temperaturas do ar subiremforma linear, a capacidaderetençãoágua da atmosfera aumenta exponencialmente. Isso significa que a atmosfera está ficando mais sedentaritmo acelerado e as secas extraem cada vez mais água do solo, das árvores eoutras plantas.
Um segundo estudo publicado2012 por uma equipepesquisa da Austrália reuniu dados sobre as colunaságua - o trajeto percorrido pela água no interior das árvores, desde as raízes até a copa -centenasespéciesárvores. A equipe concluiu que as secas mais quentes estão retirando água das florestasritmo acelerado e,muitos lugares, as árvores não conseguem mais lidar com o estresse da intensificação desse processo, causando algo parecido com uma embolia.
O terceiro estudo é2015 e examina a vulnerabilidade das árvores à secatodo o mundo. "Ele afirma que todos os principais tiposflorestas, secas e úmidas, do Arizona [Estados Unidos] e da Argélia até Alberta [Canadá] e a Argentina, estão morrendoformas historicamente incomuns, devido à ocorrênciacalor e seca", segundo Allen.
A questão aqui é que as secasclima quente, que estão ficando mais frequentes e severas, estressam as árvores até o limite do seu esgotamento.
Como a atmosfera mais quente pode reter mais precipitação, algumas florestas,lugares mais quentes e úmidos, estão se saindo extremamente bem - melhor do que nunca, segundo Allen. Mas, onde há calor e seca, elas estão morrendoquantidades crescentes.
"Eventos extremos matam as árvores", afirma Allen. "E os piores períodos estão ficando ainda piores." De fato, já estão sendo observados eventos extremos sem precedentes, como os 49°C verificados na Colúmbia Britânica no verão2021.
A importância das grandes árvores
As árvores na linhafrente deste mundotransformação são as antigas, muitas delas com mais60 ou até 90 metrosaltura.
"Uma das razões dos riscos para as árvores grandes e antigas é o custo realmente alto para mantersobrevivência: [elas têm] contas maiores para pagar", segundo William Hammond, ecofisiologista vegetal e ecologista estudioso das mudanças globais da Universidade da Flórida, nos Estados Unidos.
As árvores gigantes precisammais água emais energia para bombear toda essa água até a copa. Elas podem ser vencidas ou enfraquecidas pela seca, que as torna vulneráveis a insetos, doenças ou incêndios.
Secas e calor mais frequentes também significam que as árvores têm menos tempo para se recuperar.
"Após o términoum períodoseca, quando as árvores já têm água suficientenovo, elas têm a possibilidadecrescer novamente e recuperar parte dos seus órgãos danificados", explica Anna Trugman, professora da Universidade da CalifórniaSanta Bárbara, nos Estados Unidos, onde estuda os efeitos das mudanças climáticas sobre as florestas. "Mas, se você tiver secas mais frequentes, uma após a outra, isso pode resultardeclínio a longo prazo, pois as árvores não são capazesse recuperar."
As grandes árvores antigas são indefesas. Isso é um problema porque elas não são apenas ancestrais, gigantes e inspiradoras, mas também fundamentais para armazenar carbono e evitar que o mundo se aqueça com ainda mais rapidez. Metade do carbono retido nas florestas concentra-se1% das árvores - as maiores delas.
E esse futuro desastroso chega enquanto ainda estamos aprendendo o básico sobre as árvores.
Suzanne Simard, ecologista da Universidade da Colúmbia Britânica, no Canadá, descobriu que existem relacionamentos familiares entre as árvores. Atravéssuas raízes e fungos, elas se comunicam e redistribuem recursos.
Já a pesquisadora Diana Beresford-Kroeger defende que a grande quantidadesubstâncias emitidas pelas árvores, como os (compostos naturais) terpenos e os limonenos, são antibióticos, antivirais e preventivos químicos naturais, que ajudam a manter a saúde do mundo natural - incluindo a dos seres humanos.
Hammond e Allen preveem a morte generalizada das maiores árvores do mundo e das florestas históricas do planeta. E pesquisas indicam que as novas florestashoje são muito diferentes das florestas históricas,parte devido às novas condições mais quentes e secas.
"As florestas estão ficando menores, mais jovens e as espécies dominantes estão mudando", segundo Hammond. "As árvores irão permanecer. Elas estarão conosco por muito tempo. Mas elas vão mudar."
O que pode ser feito? Reduzir as emissõesCO2 para retardar o aquecimento está no topo da lista, mas seus benefícios podem demorar décadas. Em alguns locais, o desbaste mecânico das florestas e o fogo controlado podem ajudar. Algumas florestas têm 2 mil a 2,5 mil árvores por hectare, o que causa forte concorrência pela água. Uma floresta saudável teria um décimo dessa densidade.
Também está sendo estudada a irrigaçãoparte das sequoias. E existe a ambiciosa tentativareproduzir os maiores desses gigantes vivos.
A primeira iniciativa
Nos anos 1990, uma equipe formada por pai e filho na zona rural do norteMichigan, nos Estados Unidos, elaborou um plano para clonar as maiores árvorescada espécie do país. Era um esquema doméstico chamado Projeto das Árvores Campeãs.
David Milarch faz parte da quarta geraçãofazendeiros plantadoresárvoressombra. Ele procurou a maior árvorecada espécie no Registro NacionalGrandes Árvores - uma lista mantida pela organização sem fins lucrativos American Forests, com sede na capital norte-americana, Washington DC.
David e seu filho Jared viajavam até cada árvore campeã e pediam ao seu dono para retirar algumas mudas. Eles tinham uma escada na pick-up e Jared escalava a árvore para retirar alguns galhos pequenos.
Dali, as mudas seguiam até um viveiro para cultivar cópias. David e Jared Milarch depois plantavam os clonesdiversos ambientes - parques ou cemitérios - para formar o que eles chamavambibliotecaarquivo vivo. A ideia era preservar a genéticaárvores com 800, 2 mil ou 5 mil anosidadetodo o mundo, para o casoque as árvores originais morressem.
"A genética das grandes árvores está desaparecendo", afirmou David Milarchentrevista,2001. "Alguém precisa cloná-las e manter um registro. Ninguém sabe o que elas significam."
O projeto dos Milarch concentrou-se principalmente nas árvores mais antigas e simbólicas dos Estados Unidos: as sequoias-gigantes e sequoias-vermelhas. Agora, maisduas décadas depois, vejoequipe escalando algumas das maiores árvores do mundo para poder cortar agulhas no alto, o melhor material para clonagem.
Uma delas foi a magnífica Árvore da Cachoeira, uma sequoiaum bosque particular no centro da Califórnia - uma árvore gigantesca com casca vermelho-alaranjada que fazia os seres humanos parecerem anões. Uma foto da árvore virou capa do meu livro contando a história do esforço quixotesco do fazendeiroárvoressombra para clonar as maiores árvores do mundo e plantá-las ao redor do planeta.
Segui a vida desde então, mas, no verão2021, voltou à tona minha longa experiência com David Milarch. Incêndios varreram as famosas sequoias da Califórnia, matando um quinto delas. Uma delas era a Árvore da Cachoeira, que foi totalmente queimada.
Antes consideradas indestrutíveis, essas árvores vêm morrendoquantidades cada vez maiores nos últimos anos.
"O que estamos vendo agora é que os incêndios florestais são capazesincinerar sequoias-gigantesgrandes quantidades", afirma Christy Brigham, chefeciência e gestãorecursos dos Parques Nacionais da Sequoia eKings Canyon, nos Estados Unidos. "Após o histórico100 anossupressãoincêndios, o calor e a seca causados pelas mudanças climáticas passaram a piorar a situação."
O desaparecimento da genética da sequoia-gigante também causa preocupação. "Não sabemos o que pode ter sido perdido", afirma Brigham. "Mas estamos falandouma espécie que já passou por um gargalo genético e somente é encontrada78 bosques. Agora, temos esses incêndios florestais que queimaram 19% da populaçãograndes árvores adultas. Em um dos bosques, 80% da mata foram perdidos."
A organização criada por Milarch, agora chamada Archangel Ancient Tree Archive (o Arquivo ArcanjoÁrvores Antigas,tradução livre), ainda está clonando árvores e agora se dirige à Califórnia para procurar e, se possível, clonar um bosque "perdido"sequoias que, segundo Milarch, pode estabelecer um novo recordetamanho.
Eles também estão plantando bosquesárvores seculares. "Plantamos 75 sequoias-vermelhas clonadasárvores secularesPresdio", afirma Milarch (Presdio é uma antiga base militarSan Francisco, na Califórnia, que foi transformadaparque). "E plantamos sequoias41 cidades na região do estreitoPuget [pertoSeattle, no Estado norte-americanoWashington] como parte da migração assistida."
Esperança confirmada
A filosofia da Archangel Ancient Tree Archive é que essas árvores2 mil anosidade não podem se mover, masgenética pode. Cloná-las e plantá-las para criar uma nova floresta não salva as árvores, mas perpetuagenética secular.
A organização cultiva árvores clonadas naprópria estufa. No outono2021 no hemisfério norte, ela plantou clones da Árvore da Cachoeira e outras, alémmudas, no local onde as florestas foram destruídas pelos incêndios do verão - e também mais ao norte, onde o clima pode ser mais favorável para as sequoiasum futuro mais quente. "Uma árvore2 mil anosidade sabe uma coisa ou outra sobre sobrevivência", ressalta Milarch.
A potencial importância da genética secular inspirou o compositor e produtor musical Timothy Smit a cultivar 49 clones da coleçãosequoias da Archangel Ancient Tree Archive no seu Projeto ÉdenCornwall, no Reino Unido, que abriga milharesespécies vegetaistodo o mundo. "Eram bebês com 90 cmaltura e agora já estão com 4,6 metros", ele conta. "Todas sobreviveram."
Depoisduas décadas clonando árvores com esperançasucesso, um estudo publicado este ano confirmou que a abordagemMilarch, preservando a genética das árvores antigas, é válida. O estudo concluiu que as árvores antigas promovem radicalmente a diversidade genética e, portanto, contribuem para a resistência da floresta ao seu redorlongo prazo ecapacidadeadaptação.
"Essas árvores antigas representam indivíduos que se estabeleceram e sobreviveram por longos ciclos", segundo Chuck Cannon, um dos autores do estudo e diretor do CentroCiência das Árvores Morton ArboretumIllinois, nos Estados Unidos.
Ele afirma que "a combinação genética específica que elas contêm pode reunir os séculos passados e fornecer genes que são benéficos sob condições ambientais extremas que não estiveram presentes por centenasanos. Eles são vitais para a capacidade adaptativa das florestaslongo prazo."
Mesmo assim, muito poucas pesquisas foram realizadas sobre a genética das árvores antigas. Isso porque elas são raras e dificilmente identificadas, segundo Cannon. É por esta razão que ele acredita que a clonagemárvores seculares pela Archangel Ancient Tree Archive é tão importante.
"Aprender a propagar esses materiais vivos pode ser algo valioso para não perdermos a combinação genética única representada por essas árvores", afirma Cannon. Essencialmente, criar essa arcamaterialárvores antigas poderá ajudar outras florestas a aumentardiversidade genética ecapacidadese adaptar ao nosso mundorápida transformação.
Quando caminho pela minha propriedade atualmente, é reconfortante encontrar os descendentes dos meus pinheiros mortos se desenvolvendo. Eles não substituem as árvores antigas que um dia ficaram ali, mas as florestas das montanhas nesta parte do mundo não estão desaparecendo, pelo menos por enquanto.
Não podemos mais subestimar a importância das árvores e das florestas. Sua existência é cada vez mais frágil eperda seria incalculável.
* Jim Robbins é autor do livro "The Man Who Planted Trees" ("O homem que plantava árvores",tradução livre), publicado nos Estados Unidos pela editora Spiegel & Grau. Seu título no Reino Unido é "The Man Who Plants Trees" ("O homem que planta árvores"), publicado pela editora Profile Books.
Esta reportagem foi originalmente publicada aqui http://vesser.net/vert-fut-61992547
Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Future .
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