'Na África, indaguei rei da minha etnia por que nos venderam como escravos':slots baratos blaze
"Sempre tive a consciênciaslots baratos blazeque um dos maiores crimes contra a população negra não foi nem a tortura, nem a violência: foi retirar a possibilidadeslots baratos blazeque conhecêssemos nossas origens. Somos o único grupo populacional no Brasil que não sabeslots baratos blazeonde vem.
Meu sobrenome, Mendesslots baratos blazeAraújo, é português. Carrego o nome da família que escravizou meus ancestrais, pois o 'de' indica posse. Também carrego o nomeslots baratos blazeum povo africano, Zulu.
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Ganhei o apelido porque meus amigos me acharam parecido com um rei zulu retratado num documentário. Virou meu nome.
Nasci no Solar do Unhão, uma colôniaslots baratos blazepescadores no centroslots baratos blazeSalvador, localslots baratos blazedesembarque e leilãoslots baratos blazeescravos até o final do século 19. Comecei a trabalhar clandestinamente aos 9 anos numa gráfica da Igreja Católica. Trabalhavaslots baratos blazeforma profana para produzir livros sagrados.
Bom aluno, consegui passar no vestibular para arquitetura. Éramos dois negros numa turmaslots baratos blaze600 estudantes – isso numa cidade onde 85% da população tem origem africana. Salvador é uma das cidades mais racistas que eu conheço no mundo.
Ao participar do projeto Brasil: DNA África e descobrir que era do grupo étnico tikar, fiquei surpreso. Na Bahia, todos nós especulamos que temos ou origem angolana ou iorubá. Eu imaginava que era iorubano. Mas os examesslots baratos blazeDNA mostram que vieram ao Brasil muito mais etnias do que sabemos.
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Quando cheguei ao centro do reino tikar, a eletricidade tinha caído, e o pessoal usava candeeiros e faróis dos carros para a iluminação. Maisslots baratos blaze2 mil pessoas me aguardavam. O que senti naquele momento não dá para descrever,slots baratos blazetão chocante e singular.
As pessoas gritavam. Eu não entendia uma palavra do que diziam, mas entendia tudo. Era como se eu estivesse no meu bairro, na Bahia, e ao mesmo tempo tivesse voltado 500 anos no tempo.
O povão me encarava como uma novidade: eu era o primeiro brasileiroslots baratos blazeorigem tikar a pisar ali. Mas também fiquei chocado com a pobreza. As pessoas me faziam inúmeros pedidos nas ruas,slots baratos blazecamisetasslots baratos blazefutebol a ajuda para gravar um disco. Não por acaso, ali perto o grupo fundamentalista Boko Haram (originário da vizinha Nigéria) tem umaslots baratos blazesuas bases e conta com grande apoio popular.
De manhã, fui me encontrar com o rei, um homem alto e forteslots baratos blaze56 anos, casado com 20 mulheres e paislots baratos blazemaisslots baratos blaze40 filhos. Ele se vestia como um muçulmano do deserto, com uma túnica com estamparias e tecidos belíssimos.
Depois do café da manhã, tive uma audiência com ele numa das salas do palácio. Ele estava emocionado e curioso, pois sabia que muitos do povo Tikar haviam ido para as Américas, mas não para o Brasil.
Fiz uma pergunta que me angustiava: perguntei por que eles tinham permitido ou participado da venda dos meus ancestrais para o Brasil. O tradutor conferiu duas vezes se eu queria mesmo fazer aquela pergunta e disse que o assunto era muito sensível. Eu insisti.
Ficou um silêncio total na sala. Então o rei cochichou no ouvidoslots baratos blazeum conselheiro, que me disse que ele pedia desculpas, mas que o assunto era muito delicado e só poderia me responder no dia seguinte. O tema da escravidão é um tabu no continente africano, porque é evidente que houve um conluio da elite africana com a europeia para que o processo durasse tanto tempo e alcançasse tanta gente.
No dia seguinte, o rei finalmente me respondeu. Ele pediu desculpas e disse que foi melhor terem nos vendido, caso contrário todos teríamos sido mortos. E disse que, por termos sobrevivido, nós, da diáspora, agora poderíamos ajudá-los. Disse ainda que me adotaria como seu primeiro filho, o que me daria o direito a regalias e o acesso a bens materiais.
Foi uma resposta política, mas acho que foi sincera. Sei que eles não imaginavam que a escravidão ganharia a dimensão que ganhou, nem que a Europa a transformaria no maior negócioslots baratos blazetodos os tempos. Houve um momentoslots baratos blazeque os africanos perderam o controle.
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Um intelectual senegalês me disse que, enquanto não superarmos a escravidão, não teremos paz – nem os escravizados, nem os escravizadores. É a pura verdade. Não dá para tratar uma questãoslots baratos blaze500 anos com um sentimentoslots baratos blazeódio ou vingança.
A viagem me completou enquanto cidadão. Se qualquer pessoa me perguntarslots baratos blazeonde sou, agora já sei responder. Só quem é negro pode entender a dimensão que isso possui.
Acho que os examesslots baratos blazeDNA deveriam ser reconhecidos pelo governo, pelas instituições acadêmicas brasileiras como um caminho para que possamos refazer e recontar a história dos 52% dos brasileiros que têm raízes africanas. Só conhecendo nossas origens poderemos entender quem somosslots baratos blazeverdade."