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'Desidratado demais para chorar': a viagem mortal dos migrantes no Panamá:plataforma sortudo cc
Ouvindo suas histórias, os médicos tiveram uma ideia da luta para sobreviver no que tem sido descrito como a parte mais traiçoeira da rota migratória mais perigosa do mundo, que as pessoas atravessam na esperançaplataforma sortudo ccencontrar refúgio nos Estados Unidos.
As condições das crianças que fizeram a travessia foram o que mais comoveu Williams. Algumas estavam tão desidratadas que seus olhos pareciam afundados.
Ela lembra que não havia lágrimas quando elas choravam. Outras estavam tão desorientadas que não conseguiam lembrar seus próprios nomes.
"Elas presenciaram coisas que não deveriam ter visto", afirma a pediatra, sobre a violência e os ataques sofridos por parte dos migrantes durante a travessia.
Inferno verde
A regiãoplataforma sortudo ccDarién estende-se por 575 mil hectaresplataforma sortudo ccespessa floresta tropical, formando uma barreira natural entre a América do Sul e a América Central.
Não há estradas pavimentadas, nem caminhos sinalizados, para ajudar a atravessar essa terra sem lei, onde assaltos e estupros são comuns.
Apesar dos riscos, cada vez mais migrantes atravessam a pé a trilhaplataforma sortudo cc97 km, entre pântanos e montanhas — o que pode levar maisplataforma sortudo ccuma semana.
Estima-se que 133 mil migrantes tenham cruzado a selvaplataforma sortudo ccDariénplataforma sortudo cc2021. Desse total, 30 mil eram crianças. Muitas das pessoas que fazem a perigosa travessia são famílias do Haiti, Cuba e Venezuela, mas Williams conta que já viu crianças chegando sozinhas.
Nos nove dias que os médicos passaramplataforma sortudo ccSan Vicente, eles trataram cercaplataforma sortudo cc500 migrantes que fizeram a travessia e entrevistaram 70 delesplataforma sortudo ccdetalhes.
Entregaplataforma sortudo cccrianças a estranhos
O médico José Antonio Suárez, especialistaplataforma sortudo ccdoenças infecciosas da equipe, relembra como cuidouplataforma sortudo ccum homem venezuelanoplataforma sortudo cc60 anos que viajava com duas crianças,plataforma sortudo ccquatro e cinco anos.
O médico imaginou que fossem os netos do migrante, mas ele contou que não eram daplataforma sortudo ccfamília. Ele disse que a mãe das crianças era uma mulher haitiana que ele havia conhecido na selva e pedido que ele os levasse a San Vicente, porque ela não tinha mais forças para andar.
"O grauplataforma sortudo ccdesespero é tão grande que um pai pode entregar seu filho para um estranho", explica Suárez.
Relatos devastadoresplataforma sortudo ccmortes na travessia
O epidemiologista panamenho Roderick Chen-Camaño, experiente no trabalho com comunidades indígenas na selva, achava que estava preparado para o que encontraria na clínica improvisada.
"Não achei que fosse ver algoplataforma sortudo ccnovo", afirma ele, relembrandoplataforma sortudo ccseguida um migrante venezuelano que desabouplataforma sortudo cclágrimas quando contou o que havia presenciado durante a viagem.
O homem afirma que fazia parteplataforma sortudo ccum grupoplataforma sortudo ccmigrantes que estava escalando a cadeia montanhosa que separa a Colômbia do Panamá quando uma mulher haitiana desmaiou. E o que aconteceuplataforma sortudo ccseguida marcou o venezuelano.
Segundo o migrante, assim que o marido percebeu que ela estava morta, ele atirou um dos filhos do rochedo. E ele lembra que tentou impedir o haitiano desesperadoplataforma sortudo ccfazer o mesmo com o outro filho, sem sucesso.
Por fim, o migrante venezuelano contou ao médico que também não conseguiu impedir o homem haitianoplataforma sortudo ccpular para o vazio.
A BBC não conseguiu confirmar o relato do migranteplataforma sortudo ccforma independente, mas números da Organização Internacionalplataforma sortudo ccMigração indicam que dezenasplataforma sortudo ccmigrantes morrem todos os anos cruzando a região do Darién.
Atravessando águas infectadas
Yesenia Williams afirma que é frustrante ver queplataforma sortudo ccequipe só conseguia fazer o mínimo indispensável na clínica improvisada, aliviando parte dos sintomas sem lidar com suas causas.
"Nós vemos apenas uma pequena parte da experiência dos migrantes", reflete a médica. Mas José Antonio Suárez, que é da Venezuela, sente-se felizplataforma sortudo ccpoder oferecer ao menos alguma ajuda aos seus compatriotas.
A maior parte dos migrantes que atravessou a regiãoplataforma sortudo ccDarién no ano passado foiplataforma sortudo cchaitianos, mas os venezuelanos são a maioriaplataforma sortudo cc2022. Muitos deles deixaram a Venezuela nos últimos anosplataforma sortudo ccmeio à crise econômica do país, para tentar ganhar a vidaplataforma sortudo ccoutros países sul-americanos.
Mas os rígidos lockdowns impostos durante a pandemiaplataforma sortudo cccovid-19 dificultaram ainda mais a situação desses migrantes. Por isso, muitos deles agora estão se dirigindo para o norte,plataforma sortudo ccbuscaplataforma sortudo ccnovas oportunidades.
Um dos pacientes venezuelanos atendidos por Suárez na clínica apresentava uma irritação incomum na pele dos pés e das pernas.
Essas lesões vermelhas que causam coceira relembraram ao médicoplataforma sortudo cc67 anos algo que ele não via desde a adolescência, quando visitou a lagunaplataforma sortudo ccUnare, no seu país-natal, a Venezuela.
Suárez diagnosticou o migrante e maisplataforma sortudo cc20 outras pessoas que chegaram logo depois dele com dermatite cercarial, também chamadaplataforma sortudo cccoceira do nadador. Ela é causada por larvas parasitas que são liberadas por caramujos.
As larvas minúsculas penetram na pele dos nadadores, causando erupções. Elas morrem, mas, quanto mais o paciente coça a área afetada, pior fica a irritação, já que a pele ferida pode ser facilmente infectada por bactérias.
Mas uma das colegas do Dr. Suárez, a pediatra Rosela Obando, observou que muitos adultos sofriam a irritação, enquanto as crianças pareciam não ser infectadas. E, conversando com os migrantes, eles descobriram o porquê.
Os adultos haviam se infectado enquanto atravessavam os muitos cursos d'água que cortam a regiãoplataforma sortudo ccDarién, mas as crianças haviam sido poupadas porque seus pais as carregavam no colo para evitar que fossem arrastadas pela corrente.
A irritação raramente causa complicações, mas Suárez adverte que beber a água infestada pelos parasitas pode trazer consequências sérias.
E o médico explica que os migrantes que cruzam a regiãoplataforma sortudo ccDarién muitas vezes não têm escolha. Carregar garrafasplataforma sortudo ccágua seria um peso muito grande naplataforma sortudo ccárdua jornada, beber água dos rios infestados com larvas causa gastrite e deixarplataforma sortudo ccbeber água causa desidratação.
'Levados pelo rio'
Todos os profissionais da clínica encontraram uma história particularmente marcante.
A bióloga Yamilka Díaz conta que decidiu trabalhar na regiãoplataforma sortudo ccDarién depoisplataforma sortudo ccconhecer Delicia, uma meninaplataforma sortudo cccinco anosplataforma sortudo ccidade que foi encontrada ao lado do corpo da mãe no meio da floresta.
Delicia foi levada ao instituto onde Díaz trabalhava fazendo examesplataforma sortudo ccsangue para determinar doenças tropicais, como a malária e a dengue.
Quando Díaz perguntou a Delicia o que ela se lembravaplataforma sortudo ccter acontecido, ela disse apenas queplataforma sortudo ccfamília havia sido "levada pelo rio".
A bióloga afirma que atender os migrantes mudou aplataforma sortudo ccvida e a fez observar temas mais mundanos, como o aumento do custoplataforma sortudo ccvida, com mais lucidez.
"Você vê tudo diferente", segundo Díaz, que deixou a clínica improvisada descalça, depoisplataforma sortudo ccdar seus sapatos a uma migrante que teve os tênis infectados por fungos.
- Este texto foi publicado originalmente em http://vesser.net/internacional-62686752
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