'Disseram que espancamento era reeducação': as torturas sofridas por ucranianos que tentam escapar das tropas russas:estrategia roleta europeia

Legenda da foto, Como muitos ucranianos tentando deixar as regiões ocupadas pela Rússia, Andriy foi forçado a passar por processo chamadoestrategia roleta europeia'filtragem'

Mas a internetestrategia roleta europeiaMariupol - antes, um agitado porto no sul da Ucrânia - havia sido cortada como parte do cerco imposto pela Rússia. Por isso, Andriy não conseguiu excluir algumas das suas postagens nas redes sociais.

Ele se lembrou dos primeiros dias da guerra, quando havia compartilhado mensagens antirrussas e declarações do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. "Problemas à vista", pensou ele.

Andriy conta que já havia chamado a atenção dos soldados. Naquele dia, no inícioestrategia roleta europeiamaio, quando ele entrou pela primeira vez na fila do filtroestrategia roleta europeiaBezimenne (uma pequena cidade a lesteestrategia roleta europeiaMariupol), um dos russos observouestrategia roleta europeiabarba.

O soldado deduziu que a barba era um sinalestrategia roleta europeiaque Andriy seria um combatente do regimento Azov da cidade, uma antiga milícia que tinha ligações com a extrema-direita.

"É você e o seu batalhão que estão matando o nosso pessoal?", perguntou o soldado. Andriy respondeu que nunca havia servido no exército e que começou a trabalhar logo depoisestrategia roleta europeiaformado, mas "eles não queriam ouvir".

Enquanto examinavam seu telefone, os soldados se voltaram para suas visões políticas e perguntaramestrategia roleta europeiaopinião sobre Zelensky. Cuidadosamente, Andriy disse que Zelensky era "OK" e um dos soldados quis saber o que ele queria dizer com isso.

Andriy disse que Zelensky era apenas mais um presidente, não muito diferente dos que vieram antes dele, e que, na verdade, ele não tinha muito interesseestrategia roleta europeiapolítica. O soldado respondeu "bem, você deveria só dizer que não tem interesseestrategia roleta europeiapolítica".

Eles ficaram com o telefoneestrategia roleta europeiaAndriy e disseram que ele esperasse no ladoestrategia roleta europeiafora. Lá ele encontrouestrategia roleta europeiaavó,estrategia roleta europeiamãe eestrategia roleta europeiatia, que chegaram junto com ele e já haviam recebido um documento autorizandoestrategia roleta europeiaviagem.

Andriy conta que, poucos minutos depois, recebeu instruçõesestrategia roleta europeiair até uma tenda onde membros do serviço secreto da Rússia (o FSB) estavam fazendo outras verificações.

Cinco oficiais estavam sentados atrásestrategia roleta europeiauma mesa. Três deles usavam balaclavas - gorrosestrategia roleta europeialã que cobrem todo o rosto.

Eles mostraram a Andriy um vídeo que ele havia compartilhado no Instagram sobre um discursoestrategia roleta europeiaZelenskyestrategia roleta europeia1°estrategia roleta europeiamarço. A legenda, escrita por Andriy, era: "um presidenteestrategia roleta europeiaquem podemos nos orgulhar. Voltem para casa comestrategia roleta europeiamáquinaestrategia roleta europeiaguerra!"

Um dos oficiais se adiantou: "você nos disse que era neutroestrategia roleta europeiaquestõesestrategia roleta europeiapolítica, mas você apoia o governo nazista". E Andriy relembra: "ele me atingiu na garganta. Basicamente, ele começou a me bater."

Legenda da foto, Andriy disse que os soldados descobriram que ele havia compartilhado discursos do presidente Zelensky depois que conectaram seu telefone a um computador

O professorestrategia roleta europeiahistória

Como Andriy, Dmytro teve seu telefone confiscadoestrategia roleta europeiaum postoestrategia roleta europeiacontrole quando tentava sairestrategia roleta europeiaMariupol no finalestrategia roleta europeiamarço.

Dmytro tem 34 anosestrategia roleta europeiaidade e é professorestrategia roleta europeiahistória. Ele disse que os soldados encontraram a palavra "ruscista" (misturaestrategia roleta europeia"russo" e "fascista")estrategia roleta europeiauma mensagem para um amigo. Dmytro conta que os soldados o estapearam e o chutaram, "tudo porque eu havia usado aquela palavra".

Dmytro conta que foi levado com quatro outras pessoas para uma delegacia na vilaestrategia roleta europeiaNikolsky,estrategia roleta europeiaoutro pontoestrategia roleta europeiafiltragem. "O chefe deles me socou quatro vezes no rosto", ele conta. "Parecia parte do procedimento."

Seus interrogadores disseram que professores como ele estavam espalhando propaganda pró-ucraniana. Eles também perguntaram o que ele achava dos "eventosestrategia roleta europeia2014", o anoestrategia roleta europeiaque a Rússia anexou a península da Crimeia e começou a apoiar separatistas pró-russos na regiãoestrategia roleta europeiaDonetsk e Luhansk.

Ele respondeu que o conflito era conhecido como a guerra russo-ucraniana. "Eles disseram que a Rússia não estava envolvida e me perguntaram se eu concordava que, na verdade, era uma guerra civil ucraniana."

Eles examinaram novamente o seu telefone e, desta vez, encontraram uma fotografiaestrategia roleta europeiaum livro com a letra H no título. "Nós pegamos você!", disseram os soldados a Dmytro. O presidente russo Vladimir Putin afirma queestrategia roleta europeiaguerra na Ucrânia é um esforço para "desnazificar" o país e os soldados, segundo Dmytro, acreditavam que ele estivesse lendo livros sobre Hitler.

Na manhã seguinte, Dmytro foi transferido com duas mulheres para uma prisão na vilaestrategia roleta europeiaStarobesheve, controlada por separatistasestrategia roleta europeiaDonetsk. Ele contou 24 pessoas na cela com quatro beliches.

Depoisestrategia roleta europeiaquatro dias e outro interrogatório detalhado, ele finalmente foi libertado e acabou alcançando o território defendido pela Ucrânia. Semanas já se passaram e ele ainda não sabe o que aconteceu com seus companheirosestrategia roleta europeiacela.

Legenda da foto, "Eu até tento achar alguma justificativa para o processo. Tento convencer-meestrategia roleta europeiaque existe alguma lógica", afirma Andriy sobre o filtro

'Reeducação'

De volta à tendaestrategia roleta europeiaBezimenne, Andriy observou duas outras pessoas com as mãos amarradas às costas, que haviam sido deixadasestrategia roleta europeiaum canto enquanto os oficiais se ocupavam dele.

"Eles começaram a me bater muito mais forte", ele conta, "em todo o corpo". Houve um momento, após um golpe no estômago,estrategia roleta europeiaque ele achou que fosse desmaiar, mas conseguiu sentar-seestrategia roleta europeiauma cadeira.

"Fiquei imaginando o que seria melhor", relembra ele, "perder a consciência e cair ou continuar aguentando a dor."

Pelo menos, pensava Andriy, ele não havia sido mandado para outro lugar, longe da família. Autoridades ucranianas afirmam que milharesestrategia roleta europeiapessoas podem ter sido enviadas para centros e camposestrategia roleta europeiadetenção formados nas regiões controladas pela Rússia durante a filtragem.

Em quase todos os casos, seus parentes não sabem onde eles estão, nem por quê. "Eu [tinha] muita raivaestrategia roleta europeiatudo", conta Andriy, "mas, ao mesmo tempo, eu sabia que poderia ter sido muito pior."

Legenda da foto, Andriy conta queestrategia roleta europeiamãe foi informada por um soldado russo que ele estava passando por "reeducação"

Sua mãe tentou entrar na tenda, mas foi impedida pelos oficiais. "Ela estava muito nervosa. Depois ela contou que haviam dito a ela que havia começado minha 'reeducação'", afirma Andriy, "e que ela não deveria se preocupar".

Andriy conta queestrategia roleta europeiaprovação prosseguiu por duas horas e meia. Ele chegou a ser forçado a fazer um vídeo dizendo "glória ao exército russo!" - uma paródia do slogan ucraniano, "slava Ukraini!".

A última pergunta dos oficiais, segundo Andriy, era se ele havia "entendido seus erros" e "é óbvio que respondi que sim".

Enquanto ele era liberado, os oficiais trouxeram outro homem, que havia servido anteriormente nas forças armadas da Ucrânia e tinha diversas tatuagens. "Eles imediatamente o jogaram no chão e começaram a bater. Nem chegaram a falar com ele", relembra Andriy.

A 'gaiola'

As autoridades ucranianas afirmam que as forças russas e os separatistas apoiados pela Rússia vêm conduzindo o filtro nos territórios ocupados para tentar descobrir possíveis ligações entre os moradores e as forças armadas, a polícia e até o governo local, enquanto as forças invasoras tentam restaurar os serviços e a infraestrutura.

Os homensestrategia roleta europeiaidadeestrategia roleta europeiacombate são os principais alvos. Eles são examinadosestrategia roleta europeiabuscaestrategia roleta europeiahematomas nos dedos e nos ombros que possam indicar o uso recenteestrategia roleta europeiaarmas. Revistas completas são comuns, incluindo entre as mulheres, segundo testemunhas.

Oleksandra Matviychuk, chefe do grupoestrategia roleta europeiadireitos humanos Centroestrategia roleta europeiaLiberdades Civis, com sede na capital ucraniana, Kiev, afirma que o processo, mesmo quando não é violento, é "desumano". "Não existe necessidade militar disso... Eles estão tentando ocupar o país com um instrumento que chamoestrategia roleta europeia'dor imensa para os civis'. Você se pergunta: 'por que tanta crueldade? Para quê?'"

O metalúrgico Maksym, com 48 anosestrategia roleta europeiaidade, conta que foi forçado a ficar nu enquanto oficiaisestrategia roleta europeiaBezimenne verificavam até as costuras das suas roupas.

Perguntaram se ele era do regimento Azov ou simpatizante nazista, o que ele negou, e por que ele queria sairestrategia roleta europeiaMariupol. "Eu disse: 'na verdade, são vocês que estãoestrategia roleta europeiasolo ucraniano'." Um dos oficiais - todos russos, segundo ele - reagiu atingindo Maksym com a coronha da arma no seu peito. Ele caiu.

"Apoiei minha cabeça no chão, segurando minhas costelas. Não conseguia me levantar", ele conta. "Sentia muita dor para respirar."

Ele foi levado para o que descreve como "gaiola", onde outras pessoas estavam sendo mantidas. Ele notou que um homem, halterofilista, tinha uma tatuagem do deus grego Poseidon, com um tridente. Maksym conta que os soldados achavam que fossem as armas da Ucrânia. "Ele explicou, mas eles não entenderam."

As pessoas detidas na "gaiola" não recebiam água nem comida e precisavam urinarestrategia roleta europeiaum canto na frenteestrategia roleta europeiatodos, segundo Maksym. Exausto, ele tentou por um momento dormir no chão. Um oficial veio e o chutou nas costas, forçando-o a levantar-se.

As pessoas eram levadas para o interrogatório e, quando voltavam, "você via que a pessoa havia apanhado", segundo Maksym. Ele testemunhou uma mulher na casa dos 40 anosestrategia roleta europeiaidade deitada com dores, aparentemente depoisestrategia roleta europeiater sido atingida no estômago. E um homem, que parecia ter cercaestrategia roleta europeia50 anos, tinha um sangramento no lábio e hematomas no pescoço. Maksym acredita que ele havia sido estrangulado.

Ninguém na "gaiola" fazia perguntas, nem conversava. Eles tinham medoestrategia roleta europeiaque oficiais do FSB pudessem estar disfarçadosestrategia roleta europeiaprisioneiros.

Depoisestrategia roleta europeiacercaestrategia roleta europeiaquatro ou cinco horas, Maksym foi liberado e autorizado a sairestrategia roleta europeiaMariupol. Dias depois, ele chegou com segurança ao território controlado pela Ucrânia e foi ao hospital tratar daestrategia roleta europeiainsistente dor no peito. O diagnóstico: quatro costelas quebradas.

Relatosestrategia roleta europeiatortura

Yuriy Belousov, chefe do Departamento da Guerra da procuradoria-geral da Ucrânia, afirma queestrategia roleta europeiaequipe recebeu acusaçõesestrategia roleta europeiatortura e até mortes durante a filtragem.

"[Parece ser] uma política russa elaborada antecipadamente e muito bem preparada", segundo ele. "Definitivamente, não é um caso isoladoestrategia roleta europeia[algo] feito por um militar local."

Ele reconheceu a dificuldadeestrategia roleta europeiaconfirmar os casos ou estimar a escala da violência. As autoridades ucranianas não conseguem conduzir investigaçõesestrategia roleta europeiaterritórios ocupados e a maioria das vítimas ainda relutaestrategia roleta europeiacontar suas histórias, preocupadas com seus parentesestrategia roleta europeiaMariupol, que poderão ser procurados se aestrategia roleta europeiaidentidade for exposta.

Vadym, com 43 anosestrategia roleta europeiaidade, trabalhavaestrategia roleta europeiauma empresa estatalestrategia roleta europeiaMariupol. Ele disse que foi torturadoestrategia roleta europeiaBezimenne,estrategia roleta europeiamarço.

Soldados separatistas haviam questionadoestrategia roleta europeiaesposa após descobrirem que ela havia "curtido" a página do exército ucraniano no Facebook. Eles também recuperaram no telefone dela um reciboestrategia roleta europeiauma doação que ela havia feito para eles.

"Tentei defendê-la", ele conta, "mas recebi um soco e caí". Ele se levantou, mas apanhou outra vez. Um padrão, segundo ele, que se repetiu várias vezes.

Quando os soldados russos perceberam onde ele trabalhava, eles levaram Vadym para outro edifício. Ali, Vadym conta que os soldados separatistas pediram a ele "coisas estúpidas" e começaram a bater.

"Eles usaram eletricidade. Quase morri. Caí engasgado com as minhas obturações dentárias, que haviam saído dos meus dentes", ele conta.

Vadym vomitou e desmaiou. "Eles estavam furiosos. Quando recuperei a consciência, eles me mandaram limpar tudo e continuaram a me dar choques elétricos."

Ele conta que a tortura só parou depois que oficiais russos intervieram. Eles fizeram outra rodadaestrategia roleta europeiainterrogatório e finalmente o liberaram.

Enquanto Vadym saía do edifício, ele viu ser carregada uma jovem que havia sido identificada durante o processo como funcionária da justiça. "Um saco plástico foi colocado sobre aestrategia roleta europeiacabeça e suas mãos estavam amarradas", ele conta. "Sua mãe estavaestrategia roleta europeiajoelhos, implorando para que a filha não fosse levada."

Ordensestrategia roleta europeiair para a Rússia

Vadym foi liberado com uma condição: ele teria que ir para a Rússia.

Cercaestrategia roleta europeia1,2 milhãoestrategia roleta europeiapessoas na Ucrânia, incluindo milharesestrategia roleta europeiamoradoresestrategia roleta europeiaMariupol, foram mandados para a Rússia contraestrategia roleta europeiavontade desde o início da invasãoestrategia roleta europeiafevereiro, segundo autoridades ucranianas.

A Rússia nega que esteja conduzindo deportaçõesestrategia roleta europeiamassa, o que constituiria crimeestrategia roleta europeiaguerra segundo as leis humanitárias internacionais,e afirma que está simplesmente ajudando as pessoas que querem ir para o país. A Ucrânia rejeita a afirmação.

Algumas das pessoas enviadas para a Rússia conseguiram escapar para outros países e até regressar para a Ucrânia. O número dessas pessoas permanece incerto.

Com a ajudaestrategia roleta europeiaamigos, Vadym se mudou para outro país europeu (ele preferiu não revelar o local exato). Ele conta que perdeu parte da visão e os médicos dizem que foi consequência das lesões sofridas na cabeça.

"Sinto-me melhor agora, mas a reabilitação levará um longo tempo", ele conta. Perguntei o que ele pensava da filtragem. Ele respondeu: "eles separam famílias. As pessoas estão desaparecendo. É puro terror."

O Ministério da Defesa da Rússia não respondeu aos diversos pedidosestrategia roleta europeiacomentários sobre as alegações. O governo russo havia negado anteriormente que estivesse conduzindo crimesestrategia roleta europeiaguerra na Ucrânia.

Andriy eestrategia roleta europeiafamília agora estão morando na Alemanha, depoisestrategia roleta europeiatambém terem sido forçados a ir para a Rússia.

Analisando o ocorrido, ele acredita que as forçasestrategia roleta europeiaocupação parecem estar usando o filtro para mostrar seu "poder absoluto". Ele conta que os soldados agiam como se aquilo fosse um "tipoestrategia roleta europeiaentretenimento", algo para "satisfazer seu próprio ego".

Contei a ele sobre outra ucraniana que conheci, uma engenheira aposentada com 60 anosestrategia roleta europeiaidade chamada Viktoriia. Ela me contou que um soldado descobriu que ela havia acrescentado uma bandeira da Ucrânia àestrategia roleta europeiafotoestrategia roleta europeiaperfil no Facebook, com a mensagem "Ucrânia acimaestrategia roleta europeiatudo".

Ela disse que o soldado apontou a arma para ela e a ameaçou: "vou colocar você no porão até apodrecer!" Ele então a chutou, segundo ela. Viktoriia não conseguia entender por que ele havia agido daquela forma. "O que eu fiz? Que direito ele tinha?"

Andriy conta que não consegue explicar esse comportamento. "Eu até tento achar alguma justificativa para o processo. Tento convencer-meestrategia roleta europeiaque existe alguma lógica."

Mas, segundo ele, "não existe lógica".

Alguns nomes foram alterados para proteger a identidade dos entrevistados.

* Com reportagem adicionalestrategia roleta europeiaIllia Tolstov.

- Este texto foi originalmente publicadoestrategia roleta europeiahttp://vesser.net/internacional-61830225

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