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A fortuna secretaoligarca do 'círculo íntimo'Putin revelada por investigação da BBC:
Como parte do projeto Pandora Papers Russia, uma investigação liderada pelo Consórcio InternacionalJornalistas Investigativos (ICIJ), a BBC descobriu evidênciasque:
- Transações no valorUS$ 700 milhões (R$ 3,2 bi) ligadas a Suleiman Kerimov e seus parceirosnegócio mais próximos foram relatadas como suspeitas por bancos entre 2010 e 2015;
- O contador suíço Alexander Studhalter figurou como proprietárioimóveis que na verdade pertenciam a Kerimov;
- Kerimov era o proprietário secretoimóveis na Riviera Francesa eLondres, incluindo a propriedade com terraço mais cara já vendida no Reino Unido.
Tom Keatinge, diretor do CentroCrimes Financeiros e EstudosSegurança do think tankdefesa RUSI, disse que os oligarcas sob alvosançõespotências ocidentais têm muitas dessas empresasfachada.
"Isso mostra o grande desafio que teremosefetivamente fazer valer as sanções contra os oligarcas - não apenas confiscar seus iates e casasBelgravia [um bairroalto padrãoLondres]."
Suleiman Kerimov apareceufevereiro ao lado do presidente Putin com outros bilionários no momentoque tanques russos invadiam a Ucrânia.
Ele tem sido alvosanções dos EUA desde 2018 "por ser um funcionário do governo da Federação Russa" e também como membro do parlamento russo.
Kerimov também recebeu punições do governo britânico15março deste ano e da União Europeia que o classificou como "um membro do círculo internooligarcas" próximo a Putin.
De origem humilde como economista da era soviética, Kerimov se tornou um dos magnatas mais bem relacionados da Rússia.
Ele fezfortuna comprando ativosenergia e grandes participaçõesbancos russos após a queda da União Soviética. Há relatosque ganhou US$ 21 bilhões com os investimentos na gigante do setorgás Gazprom e no Sberbank, o maior banco estatal.
Em novembro2006, ele quase morreuum acidente no sul da França, do qual saiu ferido. Ele derrapou na Promenade des Anglais, um dos principais pontos turísticos da cidadeNice, na França, com uma Ferrari modelo Enzo, avaliadaUS$ 650 mil. O carro pegou fogo, e Kerimov e uma passageira foram retirados dos destroços.
Nossa investigação sobre Kerimov expõe a falha do sistema bancário internacionalidentificar quem estava por tráscentenasmilhõesdólarestransações que bancos identificaram como suspeitas.
Kerimov está entre os mais4.000 russos cujos nomes aparecemdados obtidos pelo Consórcio InternacionalJornalistas Investigativos e examinados como parte do Pandora Papers Russia - uma nova investigação do ICIJ e parceiros globais para esclarecer transações financeiras secretas ligadas aos oligarcas e outros próximos ao Kremlin no contexto da invasão da Ucrânia pela Rússia.
Registros corporativos mostram como falsos proprietários foram usados para esconder os verdadeiros envolvidos e que os bancos não sabiam exatamente quem estava por trás das grandes transaçõesdólares.
Isso colocadúvida a capacidade dos governosidentificar e apreender os ativos para efetivar as sanções impostas.
"Nós vamos atrás dos seus ganhos ilícitos", prometeu o presidente dos EUA, Joe Biden,seu discurso anual do Estado da União. Os EUA anunciaram um importante programa intergovernamental para identificar ativosoligarcas. Mas isso não será fácil, como mostra o caso Kerimov.
Especialistas dizem que potências ocidentais têm muito trabalho a fazer porque, durante anos, foram negligentes com a circulaçãodinheiro sujo e não tomaram providências para responsabilizar os bancos.
"Eles terão que se esforçar para recuperar o tempo perdido para solucionar isso", disse Julia Friedlander, ex-consultorasanções do Departamento do Tesouro dos EUA, agora no think tank Atlantic Council.
Veja abaixo as principais descobertas relacionadas a Suleiman Kerimov.
A investigação francesa
Um documento da justiça francesa que não foi tornado público, ao qual a BBC teve acesso, revela como o oligarca teria escondidoriqueza usando seus associados mais próximos.
Kerimov foi presonovembro2017 na França por suspeitalavar recursos provenientesevasão fiscal. O processo contra ele estava relacionado à comprauma sériepropriedadesluxo na Riviera Francesa entre 2006 e 2010.
O foco do processo foi a Villa Hier,Cap d'Antibes, uma propriedade luxuosa que já foi usada como localfilmagem para o filme Os Safados, com Steve Martin e Michael Caine,1988.
A vila havia sido vendida para uma empresa suíça chamada Swiru Holding AG2008 por € 35 milhões (quase R$ 180 milhões) - mas os investigadores descobriram pagamentos ocultos mostrando sonegaçãoimpostos sobre o preço realcompra€ 127 milhões (cercaR$ 650 milhões).
Alexander Studhalter, um contador e empresário suíço também foi preso. Ele alegou ser o proprietário da Swiru Holding equatro vilas, mas, segundo investigadores franceses, os imóveis eram do oligarca russo.
Studhalter funcionaria como um "laranja"Kerimov - mas os processos criminais contra os dois homens foram suspensos. As acusações foram arquivadas por um tribunalapelação francês.
Em 2020, a Swiru Holding admitiu seu envolvimento na evasão fiscal e foi multada€ 1,4 milhão (R$ 7,1 milhões) e obrigada a pagar outros € 10,3 milhões (R$ 52 milhões) para resolver o caso.
O advogadoKerimov divulgou um comunicado dizendo que os tribunais franceses "rejeitaram oficialmente as alegações feitas pelo ex-procuradorNice contra Suleiman Kerimovter realizado operaçõeslavagemdinheiro".
Studhalter afirma que "nunca foi o laranja do meu amigo russo".
Masacordo com o documento do tribunal francês acessado pela BBC isso não é verdade.
Em uma audiência secretajunho2018, os juízes apresentaram provas coletadas pelo juizinstrução, que concluiu: "o beneficiário efetivo e exclusivo das vilas é o Sr. Kerimov efamília".
As evidências incluíam registrostrês bancos - incluindo documentos aparentemente assinados por Studhalter, Kerimov e seu sobrinho Nariman Gadzhiev - afirmando que Kerimov e seu sobrinho eram os verdadeiros proprietários da Swiru Holding.
Studhalter justificou, segundo o tribunal, dizendo que os "documentos mantidos pelo banco e assinados por Suleyman Kerimov ou Nariman Gadzhiev ... eram falsificações".
Questionado por parceiros da BBC e do ICIJ, Studhalter afirmou que um mesmo funcionário do banco falsificou documentosduas instituições bancárias, mas disse que não sabia por quê.
Studhalter também disse: "Eu era o único beneficiário efetivo da Swiru Holding AG desdefundação até vender a empresa2019, o que é confirmado pela Administração Tributária Federal Suíça e um tribunal na França".
Os advogados francesesKerimov disseram: "Após vários anosinvestigação, nenhuma acusação foi feita contra nosso cliente".
Studhalter diz que as quatro vilas na França já foram vendidas. Registros oficiais na França mostram que a beneficiária final das empresas proprietária dos imóveis é a filhaKerimov.
PropriedadesLondres
A França não foi o único país onde Kerimov usou a Swiru Holding para realizar transações financeiras secretas.
Nossa investigação descobriu que - ao mesmo tempo que o bilionário russo comprava propriedades no sul da França - ele construía outro império imobiliário secretoLondres.
One Cornwall Terrace é uma luxuosa mansãoquatro andares próxima ao Regent's Park,Londres. A casa tem 2.000 metros quadradosjardins paisagísticos e uma grande escadaria dupla que leva a um pátio imponente.
O imóvel foi destaque nas manchetesjornais2013, quandovenda por £ 80 milhões (R$ 490 milhões) foi listada como uma das maiores transações do setor no Reino Unido.
Em outubro do ano passado, documentos vazados nos Pandora Papers revelaram que era uma das duas propriedades adjacentes compradas pela família que governa o Catar.
Mas os documentos mostram que2005 o imóvel foi comprado por £ 21 milhões (R$ 128 milhões) por uma empresa offshorepropriedade da Swiru Holding, a mesma empresa que documentos financeiros na França mostraram serpropriedadeKerimov.
Após o lançamento bem-sucedido da empresa Polyus GoldKerimov - o maior produtorouro da Rússia - na bolsavaloresLondres2007, o One Cornwall Terrace se beneficiouuma restauração luxuosa. O trabalho realizado entre 2008 e 2013 foi bastante interessante para os bolsosarquitetos, designersinteriores e paisagistasLondres.
A reforma custou £ 30 milhões (R$ 183 milhões),acordo com os arquitetos que trabalham no projeto e incluiu a construçãouma "piscina e spaúltima geração no subsolo", enquanto a renovação do jardim foi "inspirada na Piazza dell'AnfiteatroLucca, Itália".
Embora as referências citassem um "cliente russo privado", o verdadeiro dono - Kerimov - estava escondido atráscamadassigilo offshore.
Transferências
As atividades financeiras da empresa secretamente propriedadeKerimov não se limitavam ao mercado imobiliário.
Documentos dos Pandora Papers mostram a Swiru Holding no centrouma redeempresas envolvidas nas transferênciascentenasmilhõesdólares - dinheiro ligado ao oligarca.
Em um caso, registros corporativos vazados revelam que um acionista por procuração - alguém que possui açõesbenefíciooutra pessoa - foi falsamente indicado como o verdadeiro proprietáriouma empresa envolvidamaisUS$ 300 milhões (R$ 1,4 bilhão)transferências.
Renato Coppo é um tatuador na turística cidade suíçaLucerna, apaixonado pela "arte asiática" e com "muitos anosexperiência profissional no campo da tatuagem". Seu estúdio fica na mesma cidade do escritório do contador e empresário Alexander Studhalter.
De acordo com documentos datados2016 - um deles assinado por Studhalter - Coppo também era o beneficiário efetivo da Fletcher Ventures, uma empresa registrada nas Ilhas Virgens Britânicas, mas administrada na Suíça pela Swiru Holding.
A empresa do tatuador, chamada Fletcher Ventures, estava envolvidagrandes transações. Em 2013, a empresa transferiu US$ 100 milhões para uma companhia chamada LT Trading Ltd.
Foi uma das várias transações da Fletcher Ventures que fizeram soar alarmes no banco americano BNY Mellon. A instituição apresentou um relatórioatividade suspeita ao Tesouro dos EUA, que localizou a Fletcher Ventures na Suíça. Renato Coppo não foi identificado e o banco não conseguiu identificar exatamente para onde estava indo o dinheiro.
O rastreamento levou a LT Trading até um endereço online do Reino Unido. Funcionários do banco observaram que a empresa britânica se especializou "na vendafrutas e legumes". Era "suspeito" porque "parece ser inconsistente com a suposta linhanegócios da LT Trading Limited".
Na verdade, o banco havia identificado uma empresa com o mesmo nome no país errado. Documentos vazados dos Pandora Papers mostram que a LT Trading não tinha conexão com a empresaprodução britânicamesmo nome.
O beneficiário efetivo da LT Trading mencionado nos registros corporativos era o sobrinhoKerimov, Nariman Gadzhiev. Assim como a Fletcher Ventures, a empresa era administrada na Suíça pela Swiru Holding.
A transação foi apenas uma da sérietransferências eletrônicas realizadas2010 a 2015, totalizando US$ 700 milhões relatados às autoridades dos EUA como suspeitas e das quais funcionários do banco não conseguiram identificar ligações com o oligarca russo. Os arquivos foram encontradosuma cópiarelatórios secretos obtida pelo ICIJ para a investigação do FinCEN Files2020.
Registros vazados também mostram que,2013, a Fletcher Ventures enviou US$ 202 milhões (R$ 950 milhões) para a LLC GiliaMoscou, uma firma ligada a uma empresainvestimentosKerimov. Os funcionários do banco não conseguiram identificar quem estava por trás da empresa russa.
O BNY Mellon diz que está proibidocomentar sobre arquivos secretos, mas declarou que cumpre integralmente as leis e normas.
Quando abordado no ano passado sobre a Fletcher Ventures e as transações multimilionáriassua empresa, Coppo se recusou a responder a perguntas e encaminhou os jornalistas que trabalhavam com a BBC e o ICIJ para Studhalter.
Apesarassinar um documento dizendo que Coppo era o beneficiário efetivo, Studhalter disse que o assinou por engano e apresentou outros registros afirmando que ele, e não Coppo, era o verdadeiro proprietário da Fletcher Ventures.
Coppo continua não respondendo às nossas perguntas.
A Fletcher Ventures não é a única empresa que Studhalter contesta a documentação.
Outro vazamento mostra que a Fren Global Corp fez empréstimos no valorcercaUS$ 3 bilhões a uma empresa ligada a Kerimov e família que tinha ações da Polyus Gold.
De acordo com documentos assinados por Studhalter, ele era o beneficiário efetivo da Fren Global Corp. Mas Studhalter diz que vendeu a Fren Global Corp2014 "como uma empresafachada sem ativos" para Nariman Gadzhiev, sobrinhoKerimov.
Quando questionado sobre o assunto, Studhalter afirmou não reconhecer o que descreveu como uma "assinatura eletrônica distorcida" no documento que lhe foi mostrado.
Outros ativos atribuídos à Swiru Holding e que se acredita terem pertencido a Kerimov incluem um Boeing 737 customizado e um superiate, avaliado pela última vezUS$ 150 milhões (R$ 705 milhões). Studhalter afirma que ele, e não Kerimov, era o verdadeiro proprietário.
Kerimov não respondeu aos pedidoscomentários sobre a reportagem, excetorelação à investigação francesa. Gadzhiev, o sobrinho, não respondeu à carta enviada pela BBC.
Desenvolvimentos recentes
Em 8abril, a UE impôs sanções ao filhoKerimov, Said Kerimov, que deixou o conselho da Polyus Gold. A revelaçãoquefilha agora é dona das vilas francesas pode tornar as propriedades alvosanções na França.
Euma declaração na semana passada, o promotor francêsNice responsável pelos casosque Kerimov e Studhalter foram formalmente indiciados chamou a atenção "para o fatoque o processo continuaandamento". Em outras palavras, ainda é um casoaberto.
Reportagem adicionalWill Dahlgreen e Anthony Reuben
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