Privatização dos Correios: por que ela nunca avançou nos EUA:afiliado vaidebet
Nos Estados Unidos, por outro lado, um país à primeira vista sem muito apego a empresas estatais, o United States Postal Service (USPS) segue sendo um serviço público — e com cifras superlativas.
O contingente é maisafiliado vaidebetcinco vezes o quadro da Empresaafiliado vaidebetCorreios e Telégrafos (ECT) no Brasil, que soma 95 mil colaboradores e é uma das estatais na listaafiliado vaidebetprivatizações do governo Bolsonaro. O pontapé foi dado neste inícioafiliado vaidebetano:afiliado vaidebetfevereiro, o Executivo enviou o Projetoafiliado vaidebetLei ao Congresso eafiliado vaidebetabril a Câmara votouafiliado vaidebeturgência, abrindo espaço para uma tramitação mais rápida no Legislativo.
Já o USPS não é exatamente uma estatal, mas uma agência federal ligada ao Executivo americano. Sua dataafiliado vaidebetcriação se confunde à do próprio país — o primeiro "postmaster general" (uma espécieafiliado vaidebetdiretor-geral) foi um dos patronos da independência americana, Benjamin Franklin.
Em teoria, os Correios não são financiados pelo contribuinte, mas pela receita das entregasafiliado vaidebetcartas e encomendas. Gerar lucro, entretanto, tem sido uma tarefa cada vez mais difícil — a última vez foiafiliado vaidebet2006, pelo menos no papel. Desde então, os prejuízos acumulados chegaram a quase US$ 90 bilhões (R$ 460 bilhões)afiliado vaidebet2020.
Ainda assim, a agência resiste há décadas a tentativasafiliado vaidebetprivatização. A mais recente investida nesse sentido aconteceuafiliado vaidebet2018, na gestãoafiliado vaidebetDonald Trump, e encontrou forte oposição não apenasafiliado vaidebetpolíticos democratas, masafiliado vaidebetcorreligionários republicanos do então presidente.
Por quê?
EUA profundos
"Os Estados Unidos têm uma peculiaridade", afirma a economista Monique Morrissey, do centroafiliado vaidebetestudos progressista Economic Policy Institute (EPI).
Dois tiposafiliado vaidebetconservadores convivem no Partido Republicano, diz ela. Há os conservadores liberais, pró-mercado, aqueles que defendem o Estado mínimo e outras posições que, muitas vezes, se confundem com a ideologia predominante do partido, e há os conservadores nacionalistas e religiosos.
Estes últimos vivem predominantementeafiliado vaidebetáreas rurais, que são, porafiliado vaidebetvez, bastante dependentes das entregasafiliado vaidebetcorrespondências e pacotes do serviço postal.
"Essas pessoas querem que ele continue sendo um serviço público 'patriótico', como as Forças Armadas ou as escolas públicas", avalia.
Milharesafiliado vaidebetpequenos negócios no interior do país contam com a infraestrutura da agência para distribuir seus produtos — especialmente com os preços tabeladosafiliado vaidebetalgumas categoriasafiliado vaidebetentrega.
"Um dos grandes usuários da estrutura dos Correios é um site chamado Etsy, onde milharesafiliado vaidebetpessoas vendem artesanatos e miudezas."
Como os preços praticados pela agência são determinados pelo Congresso, muita gente teme que uma eventual privatização leve a um aumento generalizado, especialmenteafiliado vaidebetáreas mais remotas, que são menos rentáveis para o setor privado. Hoje, o USPS é obrigado a prestar um serviço universalafiliado vaidebettodo o território, da Flórida ao Alasca.
"Você tem republicanos que apoiam (a manutenção do serviço público) por causa dos pequenos negócios e os democratas que apoiam por causa dos sindicatos, entre outros motivos. Então existe esse apoio bipartidário incomum nos Estados Unidos", resume Morrissey.
Pobres e idosos
Os especialistas contra e a favor da privatização dos Correios ouvidos pela reportagem concordamafiliado vaidebetpelo menos um ponto: o serviço é seguro e confiável.
Isso talvez ajude a explicar por que o USPS é uma das agências federais com melhor avaliação pelos americanos.
Uma pesquisa divulgadaafiliado vaidebetmaioafiliado vaidebet2020 pelo Pew Research Center apontou que 91% tinham uma visão favorável à agência — o primeiro lugar da lista, à frente dos Centrosafiliado vaidebetControle e Prevençãoafiliado vaidebetDoenças (CDCs), do Departamentoafiliado vaidebetSaúde dos EUA, que está na linhaafiliado vaidebetfrente contra a covid-19.
"Não deveria ser uma surpresa o fatoafiliado vaidebetque muitos americanos expressam alguma admiração pelos Correios. Talvez seja a agência com a qual as pessoas mais têm contato aqui nos EUA. Nós recebemos pacotes e correspondências seis dias por semana, o serviço postal éafiliado vaidebetforma geral bastante confiável", diz Joel Griffith, pesquisador do Heritage Foundation, centroafiliado vaidebetestudos conservador que cedeu váriosafiliado vaidebetseus quadros para o governo Trump.
O historiador Ted Widmer enxerga pelo menos duas outras razões — uma subjetiva e outra mais prática.
O nascimento do serviço postal,afiliado vaidebet1775, um ano antesafiliado vaidebetas 13 Colônias se declararem independentes do Império Britânico, se confunde com a própria história dos Estados Unidos.
"Está ligada à ideiaafiliado vaidebetdemocracia,afiliado vaidebetque pessoas comuns são capazesafiliado vaidebetgerir seu próprio governo", diz o professor da Macaulay Honors College, da City Universityafiliado vaidebetNova York.
E ainda que parte dos americanos não necessariamente enxergue o serviço como um símbolo, muitos convivem com ele como parte da rotina.
"Não é como as Forças Armadas — você pode ter admiração pelos militares, mas dificilmente um cidadão comum vai vê-losafiliado vaidebetação. O carteiro é alguém que vem diariamente àafiliado vaidebetcasa, que presta um serviço bom e barato."
A internet reduziu substancialmente a quantidadeafiliado vaidebetcorrespondências que cruzam o país,afiliado vaidebetum picoafiliado vaidebet59 bilhõesafiliado vaidebet1996 para 15,2 bilhõesafiliado vaidebet2020, considerando a chamada "first class mail", sobre a qual o USPS tem monopólio. Ainda assim, ressalta o historiador, um volume grandeafiliado vaidebetamericanos ainda depende do serviço.
"Ele é importante para os idosos e os mais pobres — pessoas que não têm um computadorafiliado vaidebetcasa e que sabem que com 50 centavosafiliado vaidebetdólar podem enviar uma carta ou um documento para qualquer lugar do país."
E o prejuízo?
A questão dos prejuízos bilionários da agência não é um consenso entre os especialistas.
Morrissey afirma que boa parte das perdas que aparecem nos registros contábeis é reflexoafiliado vaidebetuma exigência — emafiliado vaidebetavaliação, draconiana — aprovada pelo Congressoafiliado vaidebet2006 para que a agência faça provisões para benefíciosafiliado vaidebetsaúde e aposentadoria que serão pagos décadas à frente. Ao desembolsar pelas obrigaçõesafiliado vaidebetforma antecipada, registrar lucro teria ficado cada vez mais difícil.
Griffith, porafiliado vaidebetvez, afirma que a agência paga salários e benefícios acima da média do setor privado e que precisa reconhecer essas obrigações nas suas demonstrações contábeis.
A economista do EPI argumenta ainda que, seafiliado vaidebetum lado a circulaçãoafiliado vaidebetcorrespondências tem diminuído drasticamente, o volumeafiliado vaidebetendereços que a agência temafiliado vaidebetcontemplar só aumenta com o crescimento populacional. O princípio da universalidade obriga o serviço postal a atender todo o território — e,afiliado vaidebetum paísafiliado vaidebetdimensões continentais como os EUA, o custo é alto, diz Morrissey.
Ambos os lados concordam que a transformação nas comunicações e nos hábitosafiliado vaidebetconsumo dos americanos tornou imprescindível repensar o modeloafiliado vaidebetnegócio dos Correios para que ele sobreviva financeiramente — ainda que discordem sobre o que exatamente deve ser feito.
"O serviço postal está hojeafiliado vaidebetmãos atadas por causa do Congresso, que o impedeafiliado vaidebetimplementar muitas medidas que o tornariam mais rentável", diz Griffith.
O Postal Accountability and Enhancement Act (PAEA), que impôsafiliado vaidebet2006 o reconhecimento contábil das obrigações futuras com benefícios trabalhistas, também colocou uma sérieafiliado vaidebetlimitações às atividades que o serviço postal pode desempenhar.
Além das entregas, o máximo que os Correios podem fazer é tirar fotocópias, vender selos colecionáveis e processar pedidosafiliado vaidebetpassaporte.
Hoje o USPS entrega até sorvete e pintinhos vivos, diz Morrissey. Assim, realizar entregasafiliado vaidebetsupermercados, por exemplo, é algo que poderia ser feito com a atual infraestrutura para expandir os negócios — mas isso é proibido pelo PAEA.
Outra alternativa seria oferecer serviços bancários básicos, à semelhança do que aconteceu entre 1911 e 1967, quando os americanos podiam ter pequenas poupanças por meio do United States Postal Savings System.
Conforme os dados do Federal Reserve, o Banco Central americano, cercaafiliado vaidebet6% dos cidadãos do país não têm qualquer tipoafiliado vaidebetcontaafiliado vaidebetbanco e outros 16% são considerados "underbanked", ou seja, não têm acesso a serviços financeiros suficientes.
Sem bancos públicos, para descontar os cheques dos benefícios sociais pagos pelo governo as famíliasafiliado vaidebetbaixa renda muitas vezes têmafiliado vaidebetpagar tarifas abusivasafiliado vaidebetbancos privados.
"Isso aconteceu também durante a pandemia, com os pagamentos do auxílio emergencial", acrescenta Morrissey. "É um problema que as pessoas tenham dificuldade para ter acesso ao próprio dinheiro e às vezes tenham que pagar muito do próprio bolso."
Já Griffith preferiria que o Congresso desse "alguma margemafiliado vaidebetmanobra para que se pudesse ajustar salários [para baixo], para que ficassemafiliado vaidebetlinha com o setor privado, simplificar operações e talvez até diminuir os diasafiliado vaidebetentregasafiliado vaidebet6 para 5".
O pesquisador diz que ele, assim como a Heritage Foundation, acreditam que a privatização seja a melhor solução, mas admite que não há "clima político" para isso no país.
Em junhoafiliado vaidebet2018 o governo Trump chegou a propor uma reorganização da operação da agência para prepará-la para uma futura privatização. A proposta enfrentou forte oposiçãoafiliado vaidebetrepublicanos e democratas no Congresso e não foi para frente. Ainda assim, o presidente conseguiu implementar uma sérieafiliado vaidebetmudanças controversas atéafiliado vaidebetsaída da Casa Branca.
Trump e o voto pelo correio
O USPS entrou ainda no meio do imbróglio eleitoral dos Estados Unidos no ano passado.
Trump era um ferrenho opositor ao voto pelo correio, previsto na lei americana e considerado imprescindível para que os americanos conseguissem votarafiliado vaidebetmeio à pandemiaafiliado vaidebetcovid-19. O republicano repetia, sem provas, que a modalidade aumentava as probabilidadesafiliado vaidebetocorrênciaafiliado vaidebetfraude.
A oposição acusou Trumpafiliado vaidebettentar deliberadamente sabotar o serviço postal para minarafiliado vaidebetcapacidadeafiliado vaidebetfazer frente a uma operação grande como as eleições.
O inspetor-geral da agência anunciouafiliado vaidebetagostoafiliado vaidebet2020 a aberturaafiliado vaidebetuma investigação para apurar denúncias sobre aumento generalizadoafiliado vaidebetatrasos nas entregas e deterioração na qualidade do serviço. Em setembro, um grupoafiliado vaidebetsenadores democratas apresentou um relatório apontando atrasos "significativos e crescentes" nas entregasafiliado vaidebetmedicamentos controlados feitas pelos Correios.
O diretor-geral do USPS, Louis DeJoy, aliadoafiliado vaidebetTrump, afirmou na época que o objetivo das mudanças implementadas desde o inícioafiliado vaidebetsua gestão,afiliado vaidebetmaio, era aumentar a eficiência operacional da agência.
Trump e a Amazon
Um outro motivo, diz o historiador Ted Widmer, ajudou a transformar o serviço postalafiliado vaidebet"alvo"afiliado vaidebetTrump.
"Ele odeia o Jeff Bezos", diz ele, referindo-se ao fundador da Amazon, que, à semelhança dos pequenos negócios, também usa uma parte da estrutura do USPS para realizar entregas, especialmente nas regiões mais remotas dos EUA.
Bezos é ainda dono do jornal The Washington Post, que fez uma cobertura crítica à administração do ex-presidente.
"Trump pensou que poderia atingir o 'inimigo' aumentando os custosafiliado vaidebetentrega para a Amazon", diz ele.
O ex-presidente defendeu reiteradamente a necessidadeafiliado vaidebetaumento nos preços cobrados à empresa sob o argumentoafiliado vaidebetque o serviço postal estaria subsidiando a operação da Amazon — e, portanto, perdendo dinheiro.
Tanto a agência quanto congressistas repetiam, contudo, que os contratos com grandes empresas privadas como Amazon, FedEx e UPS são lucrativos. Os valores são confidenciais.
Em uma reportagem sobre o assuntoafiliado vaidebetagostoafiliado vaidebet2020, a Bloomberg ressaltou que a receita das entregasafiliado vaidebetencomendas como um todo da USPS havia registrado aumentoafiliado vaidebet50% no trimestre encerradoafiliado vaidebetjunho, a única divisão com resultado positivo.
Futuro incerto
Morrissey ressalta que o atual presidente dos EUA, o democrata Joe Biden, tem uma visão diferente sobre o serviço postal. Uma eventual substituiçãoafiliado vaidebetDeJoy, contudo, não é tão simples, já que o diretor-geral é eleito por um conselho cujos membros são apontados pelo presidente - e a maioria hoje é formada por indicações feitas por Trump.
"Resta saber o que as indicações feitas por Biden daqui pra frente vão fazer e quão rápido elas vão conseguir se mobilizar", diz a economista.
Enquanto isso, no último dia 19afiliado vaidebetmaio um grupoafiliado vaidebetsenadores republicanos e democratas apresentou uma proposta conjunta para reduzir o valor das provisões obrigatórias com benefíciosafiliado vaidebetsaúde e aposentadoriaafiliado vaidebetUS$ 5 bilhões (R$ 25,6 bilhões) por ano. O projeto é semelhante a um que já tramita na Câmara dos Representantes (o equivalente à Câmara dos Deputados).
Se os textos forem aprovados, a agência pode assistir a uma redução significativa do déficit contábil nos próximos anos.
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