Elites e políticos chilenos exageraram no arrocho da população, diz pesquisadora:d23 roleta
Há três anos, a socióloga começou a estudar a experiência dos usuários no metrô chileno, que vê como "uma metáfora do que ocorre na sociedade".
No estudod23 roletacampo, seus entrevistados repetiam uma mesma frase: "o metrô é o lugar onde nos tratam como animais".
Confira a entrevista da socióloga à BBC News Mundo, o serviçod23 roletaespanhol da BBC.
d23 roleta BBC - Que condições se deram para que os protestos explodissem no Chile após a alta na passagem do metrô?
d23 roleta Kathya Araujo - É bem difícil saber por que agora, por que hoje e não ontem, mas creio que há alguns fatores que podem ser reconstituídos: um tem a ver com o transporte público.
Este não é o único caso no mundo, nem na história do Chile,d23 roletaque o transporte público causa revoltas, porque tem a ver com uma coisa cotidiana.
No caso chileno, ele representa uma parte muito alta do orçamento familiar: o efeitod23 roletauma alta na passagem é direto, visível e afeta muitas pessoas.
Outro fatord23 roletajogo nesta crise é que, há um bom tempo, como diziam os estudos e era visível, o metrô se converteu numa espécied23 roletametáfora do que ocorria na sociedade.
Em nossos estudos, as pessoas usavam o metrô como metáfora extremamente forte da sociedade, com suas contradições, seus abusos, suas tensões, onde as pessoas dizem ser "tratadas como animais" na hora do rush.
É um lugar onde elas são obrigadas a funcionar "comod23 roletauma guerra contra os outros", onde para subir há que se lutar contra todos, onde queremos que não nos empurrem mas somos obrigados a empurrar.
O metrô funciona como uma encarnação da desigualdade quando se comparam as estaçõesd23 roletaalgumas linhas com outras.
d23 roleta BBC - Ainda assim, o metrôd23 roletaSantiago representa uma grande melhora na formad23 roletatransported23 roletaalgumas décadas atrás...
d23 roleta Araujo - Exato. E a experiência do metrô tem momentos muito gratos, claro, mas também tem outros momentos, como nas horas do rush, que são precisamente as horas nas quais se transportam as classes trabalhadoras e os estudantes,d23 roletaque o metrô é verdadeiramente a selva.
O metrô é as duas coisas: um lugar querido, celebrado, que ao mesmo tempo resolveu e não resolveu nossos problemas, assim como é o país.
d23 roleta BBC - De que forma?
d23 roleta Araujo - O metrô é como nossa sociedade: melhoramos as condiçõesd23 roletavida, mas não a qualidaded23 roletavida.
E são melhoras que, no Chile,d23 roletageral, estão nas costas das pessoas.
Então, claro, o Chile está muito melhor, mas você não tem tempo para seus filhos, tem que trabalhar todo o tempo, está endividado, estuda e não tem onde exercerd23 roletaprofissão. É uma permanente contradição.
São condições melhores,d23 roletageral, mas não uma qualidaded23 roletavida melhor.
As coisas materiais melhoraram para todo mundo, mas não a qualidade.
Por isso insisto na metáfora do metrô: as pessoas gostamd23 roletasuas condições, mas não gostamd23 roletatudo o que isso implica parad23 roletaqualidaded23 roletavida e se perguntam "temosd23 roletapagar um preço tão alto pelo que temos?"
Os salários não aumentaram, o endividamento é muito alto, e não é um endividamento do consumod23 roletaluxo, mas para sobreviver.
É essencial entender que essa é a tensão que temos no Chile.
E o problema não é só o diagnóstico. O problema é o que vamos fazer adiante, que é o essencial.
O que está acontecendo com a sociedade, o que está acontecendo com os políticos.
d23 roleta BBC - Alguns ministros do presidente Piñera disseram às pessoas que se levantassem mais cedo se quisessem comprar um bilhete mais barato, ou que fossem comprar flores porque estavam mais baratas.
d23 roleta Araujo - Esses comentários representam a grande distância entre a elite e os cidadãos chilenos, mas essa distância não explicaria a crise, porque é comum a outros países latino-americanos.
A separação, a distância da elite política chilena, é uma parte da explicação para essa crise, claro, mas a arrogância da elite no Chile não é só da elite política, é da elited23 roletageral: é como se não tivessem se dado contad23 roletaque estãod23 roletaoutro país, com outros indivíduos que têm ideias muito mais fortes do que antes, que têm outras expectativasd23 roletarelação, mais expectativasd23 roletahorizontalidade.
É como se não soubessem como o povo mudou.
Não se deram conta da magnitude da mudança, e, como não se dão conta, seguem com esses tiquesd23 roletaresponder como se estivessem conversando com o caseiro da fazenda.
d23 roleta BBC - Em que momento acha que começou essa demanda por mais horizontalidade por parted23 roletachilenos e chilenas?
d23 roleta Araujo - Eu fiz trabalhod23 roletacampod23 roleta2004 a 2007 para o livro Usos e Abusos no Chile Atual, e as pessoas ali já estavam saturadas do abuso e esperavam situações mais horizontais.
E a elite teve reações pragmáticas, mas sem se dar contad23 roletaque os fundamentosd23 roletasua autoridade estavam se transformando.
Há algo que se produziu ali, que eles não notaram, que o país estava mudando, que pedia mais horizontalidade, que tinha mais consciência e que as basesd23 roletasua própria autoridade tinhamd23 roletaser distintas.
d23 roleta BBC - Como avalia a decisãod23 roletaenviar os militares para controlar a ordem?
d23 roleta Araujo - O peso simbólicod23 roletauma medida como essa no Chile é altíssimo.
Isso só poderia alimentar o fogo, como ocorreu real e metaforicamente: só poderia alimentar o fogo da sociedade.
Havia que se recorrer às forças da ordem, claro, há que se proteger as pessoas, porque aqui se começaram a mesclar muitas coisas, algumas delituosas.
Mas acho que foi apressado enviar os militares, foi um erro.
No momentod23 roletaque o governo o fez, como fez, avivou o conflito.
Isso foi construir um cenáriod23 roletaguerra.
d23 roleta BBC - Os saques têm chamado muito a atenção...
d23 roleta Araujo - Acredito que há um setord23 roletapessoas qued23 roletaforma alguma faria saques, incêndios ou vandalismo.
Mas acho que há um setor que cruza as fronteiras.
Acho que não temos informação para saber quem são, ou como são, oud23 roletaque idade, oud23 roletaque setor.
No entanto, esses não são os primeiros casosd23 roletavandalismo, e isso quer dizer que há um grupod23 roletapessoas que não compartilhad23 roletacertas normas comuns.
Aí há um sintoma que devemos seguir investigando, porque há uma coisa muito forte com a questão dos saques, mostram que alguns princípios da vidad23 roletacomum parecem não funcionar para um setor da população.
d23 roleta BBC - Havia irritação no Chile...
d23 roleta Araujo - Eu creio que as pessoas no Chile estão sendo demasiadamente exigidas e o níveld23 roletaexigênciad23 roletaalgum momento terád23 roletaparar.
Isso não é um estalido que vem do nada, a sociedade chilena está muito irritada, e isso era vislumbrado há vários anos.
Jád23 roleta2009 e 2012 se mostrava que a sociedade estava crescentemente enojada e com uma tendência cada vez maior a sobrerreagir aos eventos que tinhad23 roletaenfrentar.
E isso emergiu com todad23 roletapotência desta vez.
Porque essa irritação, essa violência foi se instalandod23 roletalugares distintos da sociedade: nos bairros com "balas perdidas",d23 roletaescolas,d23 roletauniversidades, na fragilidade das classes menos favorecidas do país.
Há uma violência que está instalada há muito tempo, com muitos focos, e acredito que temosd23 roletanos recuperar disso.
Isso não explica a ocorrência disso agora, mas sim que isso esteja ocorrendo.
d23 roleta BBC - Assim como o metrô se via como um dos mais modernos da América Latina, o Chile também se vê como um país moderno...
d23 roleta Araujo - Sim. Essa é a contradição: o país é um dos mais ricos e estáveis da América Latina.
Mas hoje temosd23 roletaexplicar por que as pessoas estão nas ruas e por que há "panelaços"d23 roletatoda a cidade.
E acho que tudo isso tem a ver também com as elites empresariais e políticas arrochando mais do que podiam arrochar, aplicando uma certa lógica capitalista no país.
Porque, claro, te colocamd23 roletaum escritório lindo, mas te fazem trabalhar por um salário miserável.
d23 roleta BBC - Acredita que é o fim do "modelo chileno"?
d23 roleta Araujo - Não acho que seja o fim do modelo chileno se com isso você queira dizer "fim do capitalismo".
Mas espero que seja uma inflexão maior, ou ao menos um bom estímulo para repensá-lo à luz dos efeitos do neoliberalismo chileno maisd23 roleta40 anos depois.
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