O que se sabe sobre Joaquim e Ana, avósroleta de graçaJesus:roleta de graça

Autor do recém-lançado livro Jesusroleta de graçaNazaré: O Que a História Tem a Dizer Sobre Ele, o historiador André Leonardo Chevitarese, professor do Institutoroleta de graçaHistória da Universidade Federal do Rioroleta de graçaJaneiro (UFRJ), lembra que todas as "questões relativas à infânciaroleta de graçaJesus", inclusive as relacionadas a seus pais, avós e demais familiares, foram resolvidasroleta de graçaforma "muito posteriores a Jesus".

A questão da famíliaroleta de graçaJesus

Analisando sob o prisma historiográfico, faz todo sentido: para seus contemporâneos, quando o movimento Jesus Cristo acontecia, não era importante registrar tais detalhes biográficos, posto que era impossível antever a maneira comoroleta de graçavida eroleta de graçamensagem acabariam dando origem a algo maior — no caso, uma nova religião.

"É preciso ter atenção a isso", enfatiza Chevitarese, à reportagem. O historiador recorda que dados sobre a genealogiaroleta de graçaJesus estão presentes, considerando os livros canônicos, nos evangelhosroleta de graçaMateus e Lucas. "E eles escrevem isso cercaroleta de graça90 anos depois do nascimentoroleta de graçaJesus", pontua.

O pesquisador explica, contudo, que há análises comparativas que indicam que essas passagens, digamos, introdutórias ao nascimentoroleta de graçaJesus foram enxertadas a posteriori, ou seja, não teriam sido grafadas ao mesmo tempo que o relato do evangelhoroleta de graçasi. "Isso porque se excluirmos os dois primeiros capítulosroleta de graçaMateus e os três primeirosroleta de graçaLucas, observamos que ambos começariam seus evangelhos exatamente como Marcos", comenta o historiador.

"A gente suspeita que os dados relativos ao nascimentoroleta de graçaJesus e a José e Maria como paisroleta de graçaJesus teriam sido suplementos agregadosroleta de graçaforma tardia, provavelmente no século 2", acrescenta.

Segundo Chevitarese, isso ocorreu porque havia "uma demanda" no meio daqueles primeiros grupos cristãos. "Ao longo do século 1, não havia um interesse acerca do nascimento e das origens [familiares]roleta de graçaJesus. Quando veio esse interesse, já era tarde, não havia mais ninguém vivo para tirar as dúvidas, para explicar quem era o pai, quem era a mãe, o que faziam, filhosroleta de graçaquem eram, essas narrativas da infânciaroleta de graçaJesus", pondera.

É por isso, acredita o pesquisador, que as narrativas acabaram recebendo contornos muito próximosroleta de graçahistórias mitológicasroleta de graçageral,roleta de graçaque Jesus "ganha status divino". "São modelos para se falarroleta de graçanarrativasroleta de graçanascimentoroleta de graçahomens gigantes. Isso começa na oralidade. E a tradição fixou os nomes dos paisroleta de graçaJesus como José e Maria, muito tardiamente", prossegue.

Nesse momento surgiu o documento chamadoroleta de graçaProto-Evangelhoroleta de graçaTiago, a "fonte" mais completa no que tange a informações sobre Joaquim e Ana, os avósroleta de graçaJesus. "É um documento comumente datado da primeira metade do século 2. A questão que estava ali presente era a necessidaderoleta de graçaresolver um problema relativo à mãeroleta de graçaJesus, porque pesavam sobre ela acusações seriíssimas, entre as quais o fatoroleta de graçater tido um filho, Jesus, fora do casamento", contextualiza Chevitarese. "Foraroleta de graçauma união legitimamente concebida pelas leis judaicas, pelas leis religiosas judaicas. Segundo [o evangelho de] Mateus, José, quando soube que Maria estava grávida, disse 'esse filho não é meu, eu nunca tive qualquer contato com ela'."

"No momentoroleta de graçaque se precisava resolver a situaçãoroleta de graçaMaria, entram [nas narrativas] os paisroleta de graçaMaria, ou os avósroleta de graçaJesus. Chamadosroleta de graçaJoaquim e Ana", afirma o historiador. "Agora, se não temos nem sequer dados confiáveis sobre quem eram os paisroleta de graçaJesus, imagina sobre quem era os avós, Joaquim e Ana. Provavelmente estamos, portanto, no campo do mito, no camporoleta de graçaum tiporoleta de graçaliteratura que quer resolver essa acusação de, entre aspas, prostituiçãoroleta de graçaMaria, a mãeroleta de graçaum filho ilegítimo, fora do casamento."

O que diz o Proto-Evangelho

O Proto-Evangelhoroleta de graçaTiago é construídoroleta de graçaforma a dar essa auraroleta de graçasantidade para Maria. "Cria-se a inserção Joaquim e Ana para mostrar que Maria tem família, que não é uma prostituta nem uma enlouquecida. Que ela tem pedigree. E Joaquim e Ana são descritos como aqueles incumbidosroleta de graçacriar Maria sob a lei judaica, colocando-a praticamente para viver dentroroleta de graçaum templo", elucida o historiador. "Toda essa história é fantasiosa, cheiaroleta de graçamitos e equívocos por parte da lei judaicaroleta de graçapureza, etc."

Para Chevitarese, abordar esse tema significa "entrarroleta de graçanarrativas míticas, cujo valor histórico tende a zero". "Você entraroleta de graçaum terreno maisroleta de graçanascimentos divinos, modelando aí Jesus como os heróis da bacia mediterrânica", explica. "Ao mesmo tempo, há a tradição oral, com muita imaginação popular e trabalhosroleta de graçaredatores que vão mexer nesses relatos, dando contornos ou feições históricas."

Estudiosoroleta de graçahagiologias, Thiago Maerki, pesquisador da Universidade Federalroleta de graçaSão Paulo (Unifesp) e associado da Hagiography Society, dos Estados Unidos, esmiuçou à BBC News Brasil as referências aos avósroleta de graçaJesus que constam do Proto-Evangelho citado — ressalvando que "é muito difícil saber com precisão histórica informações sobre essas duas figuras santorais".

"O texto mais completo [a respeito deles] é o Proto-Evangelhoroleta de graçaTiago. Ali está narrado o nascimento miraculoso ou milagrosoroleta de graçaMaria, que segundo o texto teria nascidoroleta de graçapais estéreis", conta Maerki.

Segundo o relato, Joaquim e Ana já tinham idade avançada e nenhum filho. "Nessa época, um casal sem filhos era considerado amaldiçoado por Deus. Tanto Ana quanto Joaquim são apresentados como fervorosos na oração, pedindo a Deus que os livrasse dessa maldição", afirma o pesquisador.

Então, Joaquim teria feito um jejumroleta de graça40 dias no deserto e, assim, suas preces foram ouvidas. "Ao voltar para casa, Ana o esperava na chamada Porta Dourada,roleta de graçaJerusalém. E a concepção com o consequente nascimentoroleta de graçaMaria teria sido um grande milagreroleta de graçaDeus", acrescenta Maerki.

Ele contextualiza que, durante a Idade Média, construiu-se uma tradiçãoroleta de graçaque nesse reencontro do casal, Joaquim teria dado um beijoroleta de graçaAna. "E nesse momento teria ocorrida a fecundação do óvuloroleta de graçaAna. É uma tradição para defender que não houve ato sexual. Tanto Joaquim quanto Ana já eram idosos, não podia ter filhos e, nesse sentido, Maria foi concebida não por vias biológicas", explica.

Maerki conta que a igreja oriental acabou estudando mais as biografiasroleta de graçaJoaquim e Ana do que o ramo ocidental. "Segundo a tradição oriental, São Joaquim teria pertencido à família realroleta de graçaDavi e era parente próximoroleta de graçaJosé [que viria a ser maridoroleta de graçaMaria]", comenta. "Mais tarde, padres bolandistas [gruporoleta de graçareligiosos jesuítas] editaram uma publicação chamada 'Acta Santorum', com a vidaroleta de graçavários santos. Eles afirmaram que São Joaquim era irmãoroleta de graçaJosé. Parece que havia uma proximidade muito grande entre eles."

No Proto-Evangelhoroleta de graçaTiago, Joaquim é apresentado como um homemroleta de graçaposses e muito virtuoso. "Ele aparece como um homemroleta de graçariquezas que constantemente ofertava a Deus, pedindo queroleta de graçafato tivesse um filho", acrescenta o pesquisador.

O texto apócrifo cita que certa vez, ao fazer suas doações no templo, Joaquim foi repreendido por Ruben, um sacerdote, dizendo que, por não ter filhos, mesmo casado há maisroleta de graça20 anos, ele não seria dignoroleta de graçarealizar a oferenda.

"O fatoroleta de graçaJoaquim não ter descendente era como se fosse um estigma, e havia preconceito contra ele. Ele foi recriminado no templo por não ter filhos", explica Maerki.

Joaquim teria decidido consultar os registros das "12 tribosroleta de graçaIsrael" a fimroleta de graçaverificar se seu caso era único. "Procurou e achou: realmenteroleta de graçaIsrael todos os justos tinham tido posteridade", relata o pesquisador. Mas deparou-se com a históriaroleta de graçaAbrão, que também só havia conseguido gerar filhos comroleta de graçaesposa, Sara, na velhice.

"Essa faceta é importante, porque mostra o homem esperançoso, que tem consciênciaroleta de graçaque Deus não o abandonará", interpreta Maerki. "Joaquim, nesse sentido, é apresentado como o homem que espera o milagre divino."

Conforme comenta o pesquisador Maerki, a beleza do relato apócrifo reside justamente no fatoroleta de graçaque tanto Joaquim quanto Ana são apresentados como "duas biografiasroleta de graçatristeza,roleta de graçaangústia profunda por não gerarem descendentes" e, ao mesmo tempo, como dois que "acreditavam na oração, que Deus faria um milagre". E depois eles se tornam pais "da maior figura santoral da Igreja, que é Maria", definida como "a maior dentre os nascidosroleta de graçahomens".

Maerki também localizou menções ao casalroleta de graçaoutro texto apócrifo, o Evangelhoroleta de graçaPseudo-Mateus. "Nele, há referências mais pontuais", afirma. Ele destaca, contudo, uma passagem que ilustraria bem o caráter bondosoroleta de graçaJoaquim.

"Ele é descrito como uma figura extremamente devota e uma pessoa que se preocupava com o outro, sobretudo com os órfãos, com os peregrinos, com as viúvas e os mais pobres. E diz que ele separava tudo o que conseguia produzirroleta de graçatrês partes: uma ficava para a manutençãoroleta de graçasua casa, outra doava ao templo, o restante aos desfavorecidos. [O texto] demonstra um homemroleta de graçacaráter extraordinário", analisa.

Fora desses momentos próximos ao que seria o nascimentoroleta de graçaMaria não há outros registros sobre ambos, tampouco nada que cite se houve ou não algum relacionamento entre eles e Jesus. Há a mençãoroleta de graçaque Ana teria morrido aos 80 anos — e nada sobre a morteroleta de graçaJoaquim.

"Eles não aparecem na vida públicaroleta de graçaJesus, por isso também ficamroleta de graçafora do relato bíblico canônico", comenta o vaticanista Filipe Domingues. "Eles não existem na Bíblia."

Mil anos depois

Se as primeiras menções registradas a respeito dos que teriam sido avósroleta de graçaJesus datam do século 2, foi apenas na Idade Média que a memória deles se difundiu amplamente entre os cristãos. "A formalização dessa devoção só começou a partir dos séculos 11, 12… Demorou muito tempo. Não é uma coisa que existiu na tradição antiga, essa coisaroleta de graçaque Jesus tenha tido avós, pessoas santas e tal. A devoção foi formalizada maisroleta de graçamil anos depois", pontua Domingues.

Maerki acredita que os grandes responsáveis pela divulgação dessas histórias tenham sido as Cruzadas. "Por volta do ano 550 já havia uma basílica dedicada a Santa Anaroleta de graçaConstantinopla, na igreja oriental", afirma. "Mas no Ocidente a festa dedicada à santa começou a se difundir apenas muito mais tarde."

Em texto publicado no ano passado, o hagiólogo José Luís Lira, fundador da Academia Brasileiraroleta de graçaHagiologia e professor na Universidade Estadual Vale do Acaraú, do Ceará, reconhece que "não se sabe muito sobre ela". Ele situa, contudo, algumas histórias ligadas à santa.

"Creio que a Paróquia mais importante a ela dedicada é a Paróquia pontifícia existente dentro da cidade-estado do Vaticano. Sua construção data do século 16", exemplifica. "A bênção do templo se deuroleta de graça1583."

"Em Jerusalém existe a Basílicaroleta de graçaSant'Ana, construída sobre a casa da santa, local do nascimentoroleta de graçaNossa Senhora", cita Lira.

O hagiólogo também recorda um antigo relato,roleta de graçaque um soldado que estava na Terra Santa e sabia onde Ana estava sepultada, temia porroleta de graça"profanação" durante a expansão muçulmana.

O corpo da santa foi então confiado a cristãos que o teriam levado até a França, na catedralroleta de graçaApt, no sul do país. Esses restos mortais, conforme o relato, teriam sido redescobertos 530 anos mais tarde, quando o imperador Carlos Magno (742-814) passou pela cidade. "O caixão foi aberto e o corpo sagrado apareceu com uma placaroleta de graçaprata na cabeça, recitandoroleta de graçaletras gregas: 'o crânioroleta de graçaSanta Ana, a mãe da mãeroleta de graçaDeus'", relata Lira.

Como era praxeroleta de graçatempos medievais, aqueles restos mortais acabaram loteadosroleta de graçarelíquias,roleta de graçaformaroleta de graçafragmentos do que seria o crânio e outros ossos da santa acabaram se espalhando entre nobres e religiosos europeus.

Conforme histórico divulgado pelo siteroleta de graçanotícias sobre a Santa Sé Vatican News, "o culto aos avósroleta de graçaJesus desenvolveu-se, primeiro, no Oriente e, depois, no Ocidente". "Mas, ao longo dos séculos, foram recordados pela Igrejaroleta de graçadatas diferentes", diz o texto.

"Em 1481, o Papa Sisto 4º introduziu a festaroleta de graçaSant'Ana no Breviário romano, fixando a data daroleta de graçamemória litúrgicaroleta de graça26roleta de graçajulho, dia daroleta de graçamorte, segundo a tradição;roleta de graça1584, o Papa Gregório 13 incluiu a celebração litúrgicaroleta de graçaSant'Ana no Missal Romano, estendendo-a a toda a Igreja;roleta de graça1510, Papa Júlio 2º inseriu, no calendário litúrgico, a memóriaroleta de graçaSão Joaquimroleta de graça20roleta de graçamarço; depois, foi mudado várias vezes, nos séculos seguintes", prossegue a cronologia. "Com a reforma litúrgica,roleta de graça1969, após o Concílio Vaticano II, os paisroleta de graçaMaria foram 'reunidos'roleta de graçauma única celebração,roleta de graça26roleta de graçajulho."

O vaticanista Domingues explica que tal unificação tem um significado forte. "É para dar à data um símboloroleta de graçafamília,roleta de graçasantidade da família", analisa ele. "E também porque eles representam a passagem do mundo velho para o mundo novo, o mundo da tradição judaica, da qual eles participavam, para o mundo cristão que será fundado a partir do filhoroleta de graçaMaria."

De oficial, o Vaticano registra apenas esta frase no Martirológio Romano, o livro dos santos aprovados pelo catolicismo. Está lá,roleta de graça26roleta de graçajulho: "Memóriaroleta de graçaSão Joaquim e Santa Ana, pais da Imaculada Virgem Mãeroleta de graçaDeus, cujos nomes foram conservados pelas antigas tradições cristãs".

- Texto originalmente publicadoroleta de graçahttp://vesser.net/geral-62290716

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