Bob Dylan, 80 anos: os bastidores das cinco turnês que o músico fez no Brasil entre 1990 e 2012:depositar sportingbet

No palco, Dylan quase não interagiu com o público. No máximo, esboçou um sorriso tímido aqui ou soltou um "Thank you, guys!" (Obrigado, pessoal!) ali. Fora do palco, foi avesso a repórteres ou fotógrafos. Não concedeu entrevista coletiva ou posou para fotos.

'Bob Dylan brasileiro'

A primeira vezdepositar sportingbetque Bob Dylan colocou os pés no Brasil foidepositar sportingbet1990, para participar do Hollywood Rock. Foram dois shows: umdepositar sportingbetSão Paulo, no dia 18depositar sportingbetjaneiro, e outro no Rio, na Praça da Apoteose, no dia 25.

O showdepositar sportingbetSão Paulo foi marcado por um encontro inusitado: odepositar sportingbetDylan com Belchior. O encontro foi promovido por Gilberto Gil e está contado no livro Belchior - Apenas Um Rapaz Latino-Americano (2017), escrito por Jotabê Medeiros.

Segundo o autor, Gil apresentou Belchior a Dylan como "o Bob Dylan brasileiro". Em tomdepositar sportingbetbrincadeira, Dylan teria respondido: "É mais provável que eu seja você na América". E,depositar sportingbetseguida, perguntou: "Quero ouvir seu álbum. Trouxe um?".

"Naquela noite, o destino colocou frente a frente duas estrelasdepositar sportingbetartesanato tão parecido, mas, ao mesmo tempo, tão diferente. Essa história é simbólica, porque a aproximação entre Belchior e Dylan sempre rolou: os cantos quase falados, as letras longas e o refinamento intelectual", explica o jornalista e escritor.

Na noite anterior ao show do Rio, Dylan participoudepositar sportingbetuma gravação no antigo estúdiodepositar sportingbetChico Batera, o percussionistadepositar sportingbetChico Buarque,depositar sportingbetBotafogo.

A pedido do cantor, cercadepositar sportingbetoito percussionistas tocaram diferentes ritmos brasileiros, como samba, baião e maracatu. Lá pelas tantas, o estúdio recebeu outra visita ilustre: o guitarrista britânico Dave Stewart, do duo Eurythmics.

Como era um dos poucos brasileiros que falavam inglês, o percussionista Léo Leobons, que morou 17 anos nos Estados Unidos, se tornou uma espéciedepositar sportingbet"intérprete" entre os músicos e o cantor.

Dylan, para frustração geral, não cantou nem tocou nada. Ficou o tempo todo no "aquário", ouvindo os tapes. Terminada a gravação, que durou algodepositar sportingbettornodepositar sportingbettrês horas, Léo recebeu seu cachê e seguiu para casa.

No dia seguinte, ainda sonolento, Léo recebeu um telefonemadepositar sportingbetum membro do entourage de Dylan convidando, ele edepositar sportingbetfamília, para assistir ao show da Apoteose. Em retribuição, comprou um tamborimdepositar sportingbetpresente e o entregou, pessoalmente, na suíte do Rio Palace,depositar sportingbetCopacabana, onde o cantor estava hospedado.

No quarto, ensinou umas levadas básicas no instrumento, Dylan gravou suas instruções e os dois se despediram. "Maisdepositar sportingbettrinta anos depois, a lembrança que ficou foi adepositar sportingbetsua aparência. Suas mãos eram grandes e suas unhas mais pareciam garras", espanta-se Léo. "No entanto, Dylan é um sujeito doce, muito simpático".

Coincidência ou não, quando lançou Under the Red Sky em setembrodepositar sportingbet1990, Dylan convidou um brasileiro para tocar percussão: Paulinho da Costa, um dos mais requisitados dos Estados Unidos. Das dez faixas do álbum, o músico carioca tocoudepositar sportingbetquatro: Born in Time, 2 x 2, God Knows e Handy Dandy.

'Recluso' e 'introspectivo'

O responsável pela vindadepositar sportingbetDylan ao paísdepositar sportingbet1990 edepositar sportingbet1991 foi o empresário Luiz Oscar Niemeyer. Responsável por trazer pesos-pesados do rock, como Paul McCartney, Rolling Stones, Eric Clapton, Sting e Elton John, Niemeyer define Dylan como "recluso" e "introspectivo".

"Durante o Hollywood Rock, ele fugiu da imprensa, saindo do hotel pela porta dos fundos", recorda Niemeyer. "Usava um engraçado disfarcedepositar sportingbetcasaco preto com capuz e óculos escuros".

Da segunda vezdepositar sportingbetque veio ao Brasil, apenas um ano depois da primeira, Dylan tocoudepositar sportingbetPorto Alegre (14depositar sportingbetagosto), São Paulo (16 e 17), Belo Horizonte (19) e Riodepositar sportingbetJaneiro (21). Quem o acompanhoudepositar sportingbetperto emdepositar sportingbetsegunda vinda ao Brasil foi o cantor e guitarrista gaúcho Duca Leindecker.

Ele e Frank Solari foram contratados para abrir o show do cantordepositar sportingbetPorto Alegre. Mas Dylan gostou tanto da apresentação da dupla que a convidou para abrir os demais shows da turnê.

"Em São Paulo, entrei no camarim, e conversamos um pouco. Um cara reservado, mas muito receptivo. Na época, eu não tinha a verdadeira noçãodepositar sportingbetquem era Bob Dylan", admite Duca.

Como uma pedra que rola

Sete anos depois, Dylan voltou a se apresentar no Brasil. Foram mais três shows:depositar sportingbetPorto Alegre (7depositar sportingbetabril), Rio (11) e São Paulo (13). Nos shows da Apoteose, no Rio, e do Ibirapuera,depositar sportingbetSão Paulo, Dylan dividiu o palco com os Rolling Stones. Juntos, ele e Mick Jagger cantaram Like a Rolling Stone, do álbum Highway 61 Revisited (1965).

Já o showdepositar sportingbetPorto Alegre foi no Bar Opinião. Um dos espectadores daquela noite foi o roqueiro Marcelo Nova, que pegou um voodepositar sportingbetSão Paulo só para assistir à apresentação na capital gaúcha. O sacrifício, garante, valeu a pena. Ficou a menosdepositar sportingbetdois metros da banda.

"Minha conexão com Bob começou quando eu tinha 14 anos e ouvi Like a Rolling Stone pela primeira vez", conta o vocalista do Camisadepositar sportingbetVênus. "É estimulante apreciar a obradepositar sportingbetum artista que não se repete nunca. Ele não se propõe a ser o maestro do baile da saudade".

No dia seguinte, Nova e a família convidaram o baixista da bandadepositar sportingbetDylan, Tony Garnier, que estava hospedado no mesmo hotel, a juntar-se a eles no café da manhã. "Conversamos sobre shows, filmes noir e a melhor maneiradepositar sportingbetaparar cavanhaques", diverte-se.

Uma década depois, Dylan voltou ao Brasil paradepositar sportingbetquarta turnê. Dessa vez, tocoudepositar sportingbetapenas duas cidades: São Paulo (5 e 6depositar sportingbetmarço) e Rio (8).

"Dylan tem o hábitodepositar sportingbetimprovisar arranjos e melodias no palco. Há quem critique que muitas músicas ficam desfiguradas. Pessoalmente, vejo isso como um ato artístico tremendo. É um músico que faz arte a todo momento", observa Pedro Couto, o editor do site Dylanesco e um dos maiores bibliófilosdepositar sportingbetDylan no Brasil, com maisdepositar sportingbetcem títulosdepositar sportingbetseu acervo.

No show do dia 6,depositar sportingbetSão Paulo, uma fã, a estudantedepositar sportingbetGeografia, Laura Artioli, então com 21 anos, conseguiu invadir o palco do Via Funchal. Detalhe: duas vezes.

Na primeira, conseguiu tocar no ídolo. Na segunda, foi "convidada" a se retirar da casadepositar sportingbetespetáculos pelos afáveis seguranças. "Paguei R$ 500 para tocar no Bob Dylan", declarou à reportagem do jornal Folhadepositar sportingbetS. Paulo,depositar sportingbetmatéria publicada no dia 7depositar sportingbetmarçodepositar sportingbet2008.

Talento versátil

Em 2010, Dylan não tocou no Brasil. Em compensação, inaugurou uma exposição, The Brazil Series, no Museu Nacionaldepositar sportingbetArtedepositar sportingbetCopenhague, na Dinamarca. A mostra reuniu 40 pinturasdepositar sportingbetacrílico e oito desenhos criados pelo músico no estúdiodepositar sportingbetsua casa, entre dezembrodepositar sportingbet2008 e marçodepositar sportingbet2010.

O convite da exposição partiu do curador da galeria, Kaspar Monrad (1952-2018). Sua coleção anterior, Drawn Blank Series,depositar sportingbetaquarelas, foi expostadepositar sportingbetpaíses, como Alemanha,depositar sportingbet2007, e no Reino Unido,depositar sportingbet2008. "Escolhi o Brasil como tema porque estive lá várias vezes e gosto da atmosfera", declarou o cantor,depositar sportingbetcomunicado oficial.

Das maisdepositar sportingbet40 telas expostas no museu dinamarquês, duas chamaram a atenção: Favela Villa Broncos (citada no catálogo como sendo carioca) e The Incident. Segundo o jornalista e escritor gaúcho Eduardo Bueno, a tela The Incident teria sido inspirada na visãodepositar sportingbetum cadáver na calçada da Avenida Ipiranga quase esquina com 7depositar sportingbetAbril.

Na madrugada do dia 18depositar sportingbetjaneirodepositar sportingbet1990, o cantor saiu para dar uma volta,depositar sportingbettorno da meia-noite, pelas ruasdepositar sportingbetSão Paulo, seguidodepositar sportingbetperto por dois guarda-costas, Rick Harder e Mitch Fennel. Entre outros points da noite paulistana, conheceu a antiga boate Kilt. Na volta ao Hilton, às 4h da manhã, viu o tal corpo estirado no chão.

Eduardo Bueno, o Peninha, pode ser considerado um dos maiores "dylanólogos" brasileiros. Não por acaso, fez parte da trupe que acompanhou o artistadepositar sportingbetalgumasdepositar sportingbetsuas turnês, entre 1990 e 1998. O convite partiudepositar sportingbetVictor Maymudes (1935-2001), tour managerdepositar sportingbetDylan, sob uma condição: "Não faça perguntas!".

Ao ser indagado sobre como descreveria Dylan na intimidade, Bueno não economiza adjetivos: "Complexo, incomum, diferente, inatingível, enigmático, exclusivo, exclusivista, inconstante, eventualmente amedrontador, às vezes gentil e, no meu caso, embora isso certamente não possa ser generalizado, muito generoso", enumera.

'O gigante da América Latina'

Em seu programadepositar sportingbetrádio, Theme Time Radio Hour, exibido entre 2006 e 2009, Dylan apresentou um episódio temático sobre o Brasil, que ele chamadepositar sportingbet"o gigante da América Latina", com direito a Aquarela do Brasil, cantada por Elis Regina.

"Existe uma parte na América do Sul onde não se fala espanhol. Fala-se português. É um país adorável, com 184 milhõesdepositar sportingbethabitantes. Esse país ocupa quase metade do continente. Acredito que seja maior do que os Estados Unidos. Seu lema é 'Ordem e Progresso'. É onde você encontra São Paulo e Riodepositar sportingbetJaneiro, dois dos lugares com as melhores festas que conheço. Estou falando do Brasil!", declarou no rádio.

Emdepositar sportingbetdiscografia, Dylan só fez menção ao Brasil uma única vez. Na canção Union Sundown, do álbum Infidels (1983), o país é citado nos versos: "All the furniture, it says 'Made in Brazil' / Where a woman, she slaved for sure / Bringin' home thirty cents a day to a family of twelve / You know, that's a lot of money to her...".

Em 2012, Dylan voltou ao Brasil paradepositar sportingbetmais longa turnê pelo país. Foram seis showsdepositar sportingbetnove dias: Riodepositar sportingbetJaneiro (15depositar sportingbetabril), Brasília (17), Belo Horizonte (19), São Paulo (21 e 22) e Porto Alegre (24). Comodepositar sportingbethábito, saiu pelas ruas da cidade onde se apresentadepositar sportingbetbuscadepositar sportingbetinspiração para novas telas ou canções.

Em suas andanças pelo Rio, no dia 15depositar sportingbetabrildepositar sportingbet2012, esbarrou com o jornalista Jotabê Medeiros, acompanhado da mulher, Nana Tucci,depositar sportingbetuma ruadepositar sportingbetCopacabana.

Quando viu a máquina fotográfica, fez uma careta: "You are f*cking paparazzi!" (Você é uma p*depositar sportingbetum paparazzi). O repórter jurou que não! "É para o Facebook!", respondeu. "Por quê?", quis saber o cantor.

"Você é um dos mais importantes artistas do século 20!", relata Jotabê no livro O Bisbilhoteiro das Galáxias - No Lado B da Cultura Pop (2013). "Trinta e quatro graus na sombra, e Dylandepositar sportingbetcasacodepositar sportingbetcouro, gorrodepositar sportingbetlã e botadepositar sportingbetcaubói", descreve Jotabê.

Jádepositar sportingbetSão Paulo, seis dias depois, deudepositar sportingbetcara com a apresentadora Sarah Oliveira cruzando a esquina da José Maria Lisboa com a 9depositar sportingbetJulho. Da janela do carro, Sarah berrou: "We love you!". E sacou seu iPhone para tirar uma foto tremida.

"Sou muito fã do Dylan. Adoro esse jeito enigmático dele. Quase não dá entrevista. E, quando dá, você pergunta uma coisa e ele responde outra. Isso sem falar que é meio excêntrico. Ganha o Nobeldepositar sportingbetLiteratura e não vai buscar", ri Sarah, que guarda até hoje a autorização dada pelo artista para o uso da canção Mr. Tambourine Man, do álbum Bringing It All Back Home (1965), na trilha sonora do filme Os Famosos e Os Duendes da Morte (2009), dirigido pelo seu irmão, Esmir Filho.

Liberar músicas para artistas brasileiros, aliás, não chega a ser uma novidade para Dylan. It's All Over Now, I,depositar sportingbetBringing It All Back Home (1965), virou Negro Amor (1977) na versãodepositar sportingbetCaetano Veloso e Péricles Cavalcanti.

Já Romance in Durango,depositar sportingbetDesire (1975), foi traduzido como Romance no Deserto (1987) pelo compositor Fausto Nilo. O cantor Zé Ramalho foi bastante literal ao traduzir Knockin' on the Heaven's Door, do filme Pat Garrett & Billy the Kid (1973),depositar sportingbetSam Peckinpah como Batendo na Porta do Céu (2008).

Dois dos 19 shows que Dylan fez no Brasil - o do Opinião,depositar sportingbet1998, e o do Pepsi On Stage,depositar sportingbet2012 - foram analisados pelo jornalista e escritor Márcio Grings no livro Quando o Som Bate no Peito (2021), que reúne resenhasdepositar sportingbet34 concertosdepositar sportingbetrock, como The Who, Roger Waters, Eric Clapton, Deep Purple e Black Sabbath.

"Foi uma epifania vê-lo tãodepositar sportingbetperto", define Grings,depositar sportingbetalusão ao show do Opinião, seu favorito.

"Nunca vou esquecerdepositar sportingbetI Want You um tom abaixo do original. Mais lenta, leve e reflexiva. Nunca mais fui o mesmo depois daquela noite", confessa.

Bueno passou por um "renascimento" semelhante. Tanto que diz que, se pudesse, mudaria a datadepositar sportingbetsua certidãodepositar sportingbetnascimento para 9depositar sportingbetmarçodepositar sportingbet1975, quando ouviu, pela primeira vez, Before the Flood (1974).

"Tão logo a agulha tocou no vinil, as muralhas da mediocridade que me cercavam tombaram por terra e toda uma nova e ampla paisagem mental se descortinou à minha volta. Foi ali que minha vida se inicioudepositar sportingbetverdade."

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