A luta contra os fraudadores7games jogo no telefonecotas raciais nas universidades públicas:7games jogo no telefone

Só na UFRJ já foram 280 denúncias7games jogo no telefonepossíveis fraudes nas cotas raciais desde a implantação do sistema. Segundo a universidade, dos 186 já analisados, 96 foram considerados aptos a ocuparem as vagas reservadas para pretos, pardos e indígenas (PPI).

Na Universidade Estadual da Bahia, um aluno branco7games jogo no telefonecabelo ruivo entrou no curso7games jogo no telefoneMedicina neste ano através das cotas — o que está sendo investigado.

A USP investiga 41 denúncias. A Unicamp desligou nove alunos e a Unesp expulsou 30 que tiveram as autodeclarações consideradas inválidas.

As denúncias são resultado7games jogo no telefoneuma grande mobilização do movimento negro para identificar e combater fraudes nas cotas e evitar que haja abusos no direito, conquistado após anos7games jogo no telefoneluta.

"A gente não queria estar discutindo isso, queria que existisse um bom senso e um respeito à lei. Mas, como não existe, temos que recorrer a métodos mais eficazes", diz o advogado Lucas Módolo, que criou com colegas um grupo7games jogo no telefonecombate à fraudes quando ainda era aluno7games jogo no telefoneDireito da USP.

"Quantos alunos negros tiveram o direito7games jogo no telefoneestudar tolhido por culpa desses fraudadores?", questiona frei Davi, da ONG Educafro, que fez denúncias7games jogo no telefonefraudes7games jogo no telefonecotas para mais7games jogo no telefone20 universidades.

As reclamações chegaram até a entidade7games jogo no telefonediversas formas. "A gente garante total tranquilidade e anonimato para quem faz", diz Davi.

"Aconteceu muito7games jogo no telefonealunos da Educafro e outros alunos solidários, dentro7games jogo no telefonesala7games jogo no telefoneaula, ouvirem comentários e deboches sobre pessoas fraudando as cotas", conta.

Módolo explica que o Comitê Antifraude da USP, criado por alunos e com caráter extraoficial, não tem o objetivo7games jogo no telefoneavaliar se alguém pode ou não ser considerado pardo.

"Somos um canal7games jogo no telefonerecepção7games jogo no telefonedenúncias que depois repassamos para as faculdades", afirma. "Não temos como finalidade fazer essa avaliação, nem temos competência. O objetivo é pressionar para que essa avaliação aconteça."

"Na USP nenhum fraudador foi expulso", diz Módolo. "Por causa da inércia da universidade, as fraudes têm sido usadas como argumento por grupos revisionistas para defender que não existam cotas."

"Ainda existe a necessidade7games jogo no telefonereconhecer que a desigualdade racial é um problema7games jogo no telefoneracismo, não só um problema socioeconômico."

Nas redes sociais, a hashtag #afroconveniência tem7games jogo no telefonesido usada para denúnciar a prática7games jogo no telefonebrancos se dizerem afrodescendentes quando convém — para abusar7games jogo no telefonecotas, por exemplo —, mas usarem os privilégios7games jogo no telefoneser branco durante todo o resto do tempo. Diversos ativistas negros postaram fotos dizendo "Meu avô é branco, logo sou branco. Estranhou?" para reforçar essa ideia.

"O argumento do 'tenho um avô pardo' não faz sentido no Brasil, onde você é julgado e sofre preconceito pelo fenótipo", diz à BBC News Gislaine Silva, que também faz parte do Comitê Antifraude da USP.

"Nós negros não vamos deixar que se use a universidade para beneficiar pessoas brancas desonestas", diz Frei Davi.

Combate e prevenção

A USP foi uma das últimas universidades públicas a implementar o sistema7games jogo no telefonecotas,7games jogo no telefone2018. Para participar, é preciso se declarar preto, pardo ou indígena e optar pela opção7games jogo no telefoneconcorrer pelas cotas.

A universidade não faz análise das autodeclarações feitas no vestibular, e não existe um grupo específico só para analisar denúncias7games jogo no telefonefraude à cotas raciais. Elas são avaliadas pela Comissão7games jogo no telefoneAcompanhamento da Política7games jogo no telefoneInclusão da USP, a mesma que avalia questões socioeconômicas.

O movimento negro defende que deveria existir um grupo para analisar as denúncias e que haja não apenas combate, mas prevenção às fraudes.

"A universidade já tinha que, desde o início, ter reconhecido a necessidade da prevenção na entrada,7games jogo no telefoneavaliar as declarações após o vestibular", diz Módolo.

Isso normalmente é feito através da chamada heteroidentificação, quando uma comissão avalia se a autodeclaração racial feita pela pessoa é autêntica.

Frei Davi defende que o processo seja sempre no ingresso, o que é muito menos traumático para a pessoa e muito mais simples7games jogo no telefoneser resolvido do que desligar um aluno que já faz o curso há anos. "Todas as universidades justas, éticas e responsáveis têm comitê preventivo", afirma.

Além do desligamento7games jogo no telefone30 pessoas, a Unesp implantou um comitê7games jogo no telefoneheteroidentificação7games jogo no telefone2017. A Unicamp também implantou um comitê7games jogo no telefoneverificação no ingresso.

O pró-reitor7games jogo no telefonegraduação da USP, Edmund Chada Baracat, diz que a questão é7games jogo no telefoneextrema importância para a universidade, mas que o processo7games jogo no telefoneavaliação das denúncias leva tempo e que é preciso "uma averiguação que seja respeitosa".

"Esse processo é um processo muito delicado, porque lida com pessoas, portanto temos que ser muito sensatos na avaliação", diz Baracat.

Ele afirma que, devido ao tamanho da universidade e ao grande número7games jogo no telefoneingressos, fazer uma avaliação das declarações no vestibular seria inviável.

"Esse ano foram pouco mais7games jogo no telefone2 mil alunos pretos, pardos e indígenas. Se a gente chamar 2 mil estudantes, demorando 15 ou 20 minutos cada um, quanto tempo vai levar? Isso seria inviável", afirma.

O Comitê Antifraude recebeu mais7games jogo no telefone4507games jogo no telefonevários cursos da USP e elaborou três dossiês: um para a faculdade7games jogo no telefoneDireito, um para a7games jogo no telefoneMedicina e um terceiro para os outros cursos.

Baracat diz que 41 denúncias "com indícios mínimos7games jogo no telefonematerialidade" estão sendo avaliadas pela universidade. Também há dois processos administrativos7games jogo no telefoneandamento contra estudantes que, segundo a sindicância feita pela USP, podem ter fraudado suas declarações.

O movimento negro criticou uma recomendação da USP7games jogo no telefoneque fossem feitos boletins7games jogo no telefoneocorrência7games jogo no telefonecasos7games jogo no telefonesuspeitas7games jogo no telefonefraudes. "Apesar7games jogo no telefonemuitas pessoas falarem que isso é um crime e pode ser resolvido no Ministério Público, a USP tem a competência para fazer isso por si própria e evitar uma judicialização difícil e custosa", afirma Lucas Módolo.

Mas Baracat diz que os BOs não são uma exigência, mas uma das modalidades7games jogo no telefoneque a universidade aceita denúncias. "Pode fazer uma denúncia sem ter um boletim, mas precisa ter indícios7games jogo no telefoneque a denúncia é verdadeira. Ou seja, fotos, perfis da pessoa nas redes sociais, algum tipo7games jogo no telefoneprova. Isso elimina o denuncismo irresponsável", afirma.

A questão da miscigenação

Além7games jogo no telefoneanalisar as denúncias7games jogo no telefonefraudes, a UFRJ implantou neste ano um comitê7games jogo no telefone54 pessoas para fazer a heteroidentificação para todos os ingressantes pelo sistema7games jogo no telefonecotas no vestibular.

Foram cerca7games jogo no telefone1,5 mil alunos ingressantes avaliados nas duas primeiras chamadas,7games jogo no telefoneum processo que durou uma semana. Diversos não foram considerados aptos para ingressar pelas cotas — o número exato ainda não foi consolidado porque o processo acabou7games jogo no telefoneterminar.

Mas afinal, como é feita essa avaliação e como lidar com as sutilezas7games jogo no telefoneidentificar a identidade racial7games jogo no telefonealguém7games jogo no telefoneum país miscigenado como o Brasil?

"A miscigenação sempre foi usada no Brasil para alimentar o mito da democracia racial, ou seja,7games jogo no telefoneque no Brasil haveria uma categoria homogênea7games jogo no telefonemestiços que seriam tratados7games jogo no telefoneforma igual", diz a especialista7games jogo no telefoneHistória dos negros no Brasil Denise Goés, que coordena o comitê7games jogo no telefoneavaliação7games jogo no telefonedenúncias da UFRJ.

"Isso só serve para perpetuar a desigualdade7games jogo no telefoneum país que não trata todos como iguais", diz ela.

"Historicamente o racismo no Brasil é baseado no fenótipo, ou seja, nas características aparentes das pessoas, como cor7games jogo no telefonepele, traços e cabelo", afirma Marcelo Pádula, que coordena o comitê7games jogo no telefoneheteroidentificação da UFRJ.

"Quanto mais características que identificam uma pessoa como negra, mais chances7games jogo no telefonesofrer com o racismo. Quanto mais características brancas, maiores as chances7games jogo no telefoneinclusão social."

Como é feita a identificação racial

Denise Goes afirma que autodeclaração foi uma vitória no fortalecimento do movimento, porque muitas pessoas não conseguiam nem se ver como negras devido ao mito da democracia racial. "Por um lado, foi vitória da afirmação da identidade negra. Mas, do ponto7games jogo no telefonevista7games jogo no telefonepolítica pública, ela não é suficiente."

Por causa da forma como o racismo funciona no país, diz, a identificação para avaliar se alguém está apto para ocupar as vagas destinadas aos negros é feita com base no fenótipo, não com base7games jogo no telefonequestões culturais ou ancestralidade.

Isso significa que ser filho ou neto7games jogo no telefonenegros não é suficiente para garantir o acesso às cotas raciais se a pessoa é lida pela sociedade como branca, ou seja, se não sofre preconceito racial.

"As cotas são uma política7games jogo no telefonereparação para quem sofre racismo", diz Pádula.

Na prática, a heteroidentificação na UFRJ é feita por uma comissão avaliadora, formada por alunos, docentes e funcionários que passaram por uma capacitação7games jogo no telefone60 a 90 horas.

A capacitação inclui a história da constituição do racismo no Brasil, tem um contraponto com o racismo norte-americano (mais baseado7games jogo no telefoneorigem e questões culturais) e7games jogo no telefoneoutros países, e há exercícios práticos7games jogo no telefoneheteroidentificação.

No total são 54 pessoas, mas cada ingressante é avaliado por uma subcomissão7games jogo no telefone5 pessoas.

Cada ingressante comparece pessoalmente a uma entrevista, no qual os avaliadores observam se a pessoa tem fenótipos negros, ou seja, características físicas — cor7games jogo no telefonepele, cabelo, traços do rosto — que as identificam como negros.

"Não é só uma única característica, é o conjunto da percepção e integração7games jogo no telefonetodos esses sinais", explica Pádula.

Ter a pele mais escura nem sempre é suficiente. "Há uma série7games jogo no telefonepessoas que tem tons7games jogo no telefonepele não-brancos, como descendentes7games jogo no telefoneárabes ou japoneses7games jogo no telefoneokinawa, mas que não são vítimas do racismo", diz Lucas Módolo.

Pádula afirma que a comissão não é um 'tribunal racial' para definir a identidade das pessoas, mas apenas uma avaliação sobre se ela está apta ou não para ter acesso às vagas7games jogo no telefonecotas.

Além disso, quem discorda do resultado tem a possibilidade7games jogo no telefonerecorrer.

"A gente pega casos muito óbvios, que comprovam que não é uma questão7games jogo no telefonedúvida sobre a identidade7games jogo no telefoneuma pessoa parda, mas7games jogo no telefoneabuso mesmo. Não é à toa que,7games jogo no telefonelonge, o curso com mais fraudes foi medicina, o mais difícil7games jogo no telefoneentrar", afirma Goés.

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