Desmatamento avança no Cerrado e faz crescer riscobulls betapagão elétrico no Brasil:bulls bet
Do alto, a paisagem da região hoje lembra um cadernobulls betgeometria, com uma profusãobulls betcírculos e linhas retas criadas por máquinas agrícolas.
Segundo o MapBiomas, plataforma que monitora o uso do solo no Brasil,bulls bet1985 a 2019, a área coberta pelo Cerrado diminuiu 33% na microbacia hidrográfica daquela região, a Alto Paranaíba 3.
Em toda a bacia do Paraná, que também inclui trechosbulls betMata Atlântica, foram destruídos 4,2 milhõesbulls bethectaresbulls betvegetação nativa no mesmo período — uma perdabulls bet17,6%. A área desmatada é 127 vezes maior que o municípiobulls betBelo Horizonte.
Hoje, resta na bacia 22,4% da cobertura natural original.
Para pesquisadores entrevistados pela BBC News Brasil, o desmatamento agrava a escassez nos reservatórios do Paraná, responsáveis pela maior capacidadebulls betgeraçãobulls betenergia hidrelétrica do país.
"É uma resposta preguiçosa atribuir a variação nos reservatórios apenas ao El Niño ou à La Niña", diz o geógrafo Yuri Salmona, doutorandobulls betCiências Florestais pela Universidadebulls betBrasília (UnB).
Salmona se refere a explicações para mudanças nas vazõesbulls betrios brasileiros que só levambulls betconta fatores climáticos. No caso da seca atual na bacia do Paraná, há forte influência da La Niña, resfriamento periódico nas águas do Oceano Pacífico que tende a reduzir as chuvas no centro-sul do país.
Para Salmona, porém, esses grandes fenômenos "são só parte da resposta".
Nos últimos anos, vários especialistas têm associado o desmatamento na Amazônia à diminuição das chuvasbulls betoutras partes do Brasil. Segundo eles, a derrubada das árvores faz com que a floresta deixebulls betbombear para a atmosfera uma imensa quantidadebulls betágua que posteriormente se transformariabulls betchuva, os chamados "rios voadores".
Já Salmona e outros pesquisadores estudam o impacto que o desmatamento do próprio Cerrado tem na ofertabulls betágua na região.
O geógrafo está finalizando uma pesquisa na qual compara a vazãobulls betvárias bacias hidrográficas do Cerrado com os índicesbulls betchuva ebulls betocupação do solo nesses locais nas últimas décadas.
Ele afirma que, emborabulls betalgumas bacias as chuvas venham realmente diminuindo, a redução na vazão dos rios tem sido quase generalizada e ocorreu atébulls betregiões do bioma onde as chuvas mantiveram os padrões históricos.
Para Salmona, os resultados mostram que a substituição da vegetação nativa por lavouras têm impactado o fluxo dos rios da região.
A pesquisa, produzida com o apoio do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), deve ser publicadabulls betuma revista científica nos próximos meses.
Como o Cerrado regula os rios
Para entender como o desmatamento no Cerrado impacta o fluxo dos rios, é preciso conhecer a relação do bioma com as águas.
Não é por acaso que o Cerrado é conhecido como o "berço das águas", diz o engenheiro ambiental Arnaldo José Cambraia Neto, autorbulls betuma dissertaçãobulls betmestrado na Universidade Federalbulls betViçosa (UFV),bulls betMinas Gerais, sobre o papel do bioma na regulação dos rios da região.
Ocupando o Planalto Central e se estendendo por 25% do território nacional, o Cerrado é o pontobulls betorigembulls betoito das doze bacias hidrográficas brasileiras. Lá nascem muitos rios que rumam para outras regiões brasileiras, como o São Francisco, o Tocantins, o Xingu e o Araguaia.
Esses rios correm o ano todo, embora o Cerrado possa passar vários meses na estação seca sem receber uma só gotabulls betchuva.
Ao longobulls betpelo menos 40 milhõesbulls betanos, as plantas do Cerrado desenvolveram raízes longas e ultrarramificadas para buscar água nas profundezas e retirar nutrientes dos solos naturalmente pobres da região.
As raízesbulls betuma árvore do Cerrado se entrelaçam com as das plantas vizinhas, formando uma espéciebulls betesponja debaixo da terra. Na estação seca, essa esponja retém umidade no solo, garantindo a sobrevivência das plantas e dos animais que delas dependem.
Já na estação chuvosa, a esponja encharca e permite que a água infiltre até depósitos subterrâneos, os lençóis freáticos e aquíferos.
São esses depósitos que alimentam as nascentes dos rios, garantindo que eles continuem fluindo mesmo quando as chuvas cessam.
Cambraia diz que 80% da água dos rios do Cerrado tem origem subterrânea. Ou seja, ela vem principalmente da chuva que infiltra no solo e, percorrendo os sulcos criados pelas raízes, consegue chegar aos lençóis freáticos e aquíferos.
Avanço da agropecuária
Mas o funcionamento desse sistema pode ser gravemente golpeado quando a vegetação nativa do Cerrado é substituída por lavouras como asbulls betsoja, milho ou algodão, diz o geógrafo Yuri Salmona, da UnB.
Segundo o MapBiomas, 43,7% do Cerrado já foi destruído para dar lugar à agropecuária — sóbulls bet2020, o bioma perdeu 7,3 mil quilômetros quadrados, altabulls bet12,3%bulls betrelação ao ano anterior.
Como a vegetação nova tem raízes curtas, a água da chuva não infiltra tanto no solo e tende a evaporar ou escorrer até algum rio. Assim, diz Salmona,bulls betvezbulls betir para o depósito subterrâneo para ser liberada à superfície ao longo do ano, a água aumenta a vazão dos rios no período chuvoso.
Salmona diz que o desmatamento por si só já tende a reduzir a vazão dos rios no período seco, mas o impacto costuma ser ainda maior quando a vegetação nativa dá lugar a lavouras irrigadas.
É o caso, por exemplo, do que ocorreu na regiãobulls betCristalina. Segundo um relatório divulgadobulls bet2020 pela Embrapa (Empresa Brasileirabulls betPesquisa Agropecuária), Cristalina é o município com a terceira maior área irrigada por pivôs do país, e os dois primeiros do ranking também ficam na região, na bacia do Paranaíba.
Para funcionar, esses equipamentos puxam a águabulls betrios, nascentes oubulls betpoços subterrâneos, impactando a vazão dos cursos d'água ou prejudicando a recarga dos aquíferos. A irrigação tende a aumentar a produtividade e a permitir que alimentos sejam cultivados mesmobulls betperíodosbulls betseca.
Segundo um relatório da Agência Nacionalbulls betÁguas (ANA) publicadobulls bet2015, a irrigação é responsável por 89,5% do consumobulls betágua na bacia do Paranaíba, enquanto o abastecimento público responde por 2,9% do uso.
Em tese, se não fosse usada nas lavouras, essa água engrossaria a vazãobulls betrios da bacia do Paraná e poderia, por exemplo, abastecer alguma cidade no Triângulo Mineiro ou ajudar a mover as turbinas da hidrelétricabulls betItaipu, a 1.500 km dali.
Em 10bulls betjunho, a BBC pediu à ANA uma entrevista sobre a relação entre desmatamento, irrigação e falta d'água na bacia do Paraná, mas não houve resposta até a publicação desta reportagem.
Segundo um relatório publicado pela agênciabulls bet2021, a irrigação responde por 49,8% da demandabulls betáguabulls bettodo o Brasil, seguida pelo abastecimento humano urbano (24,3%), indústria (9,6%), uso animal (8,4%) e outros fins.
E a atividade tende a crescer. Um relatório da mesma ANA estima que a área irrigada no Brasil aumentará 76% entre 2019 e 2040. Boa parte desse incremento deve ocorrer justamentebulls betáreasbulls betCerrado na bacia do Paraná.
Na última terça-feira (16/6), a ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM), disse que "a ampliação das terras irrigadas precisa ser vista como uma ferramenta estratégica para o aumento da produtividade".
"Temos 3% da produção agrícola irrigada, enquanto a média mundial ébulls bet20%", afirmou a ministra.
Cristina citou um estudo da Escola Superiorbulls betAgricultura Luizbulls betQueiroz (Esalq-USP) segundo o qual o Brasil tem condiçõesbulls betaumentarbulls betárea irrigadabulls betquase oito vezes.
A ministra diz que, entre outros benefícios, o avanço da irrigação gerará empregos, ampliará a renda dos agricultores e aumentará as exportações do Brasil.
Especialistas alertam, porém, para os desafiosbulls betexpandir a atividade num cenáriobulls betque a escassezbulls betágua se torna cada vez mais frequentebulls betpartes do país — o que pode se agravar com reduções nos padrõesbulls betchuvas causadas pelas mudanças climáticas e pelo desmatamento na Amazônia.
Para o geógrafo Yuri Salmona,bulls betvezbulls betaumentar a área irrigada, é preciso ampliar o controle sobre as licenças já concedidas, já que hoje não se sabe se os agricultores respeitam os limites que lhes são impostos.
Salmona também defende que haja um mapeamento das regiõesbulls betnascentes e recargabulls betaquíferos, que devem ser consideradas prioritárias para a conservação.
Para o geógrafo, com solos e rios mais protegidosbulls betáreas sensíveis, o país estará mais preparado para lidar com alterações climáticas como as provocadas pela La Niña.
"Se esses fenômenos existem, e eles existem, eles têm uma periodicidade, como nós podemos contorná-los e mitigá-los?", questiona.
"Será que é irrigando mais, ocupando mais, desmatando nascentes? Ou será que é tendo um planobulls betgestão da baciabulls betque se determina o quantobulls betágua pode ser usado, se mede se a pessoa está usando e se protege as cabeceiras?"
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