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'Alimento para a alma, não só o corpo': a produção agrícola das 80 roças indígenas na maior cidade do Brasil:cassino aovivo
A terra indígena tem uma população estimadacassino aovivo2020cassino aovivo1,5 mil pessoas,cassino aovivo15.969 hectares - área equivalente a cercacassino aovivo159 quilômetros quadrados, quase o tamanhocassino aovivoNatal (RN), segunda menor capital do país, com 167 quilômetros quadrados.
Um estudo inédito produzido por pesquisadores guarani e técnicos do CTI (Centrocassino aovivoTrabalho Indigenista), publicado neste mêscassino aovivodezembro, mapeou a produção agrícolacassino aovivoseis dessas aldeias localizadas no Sul da cidade: Kalipety, Krukutu, Tape Mirĩ, Tekoa Porã, Tenondé Porã e Yrexakã.
A pesquisa foi contratada pela Prefeituracassino aovivoSão Paulo, por meio da Secretariacassino aovivoDesenvolvimento Urbano, responsável pela coordenação do Projeto Ligue os Pontos, com objetivocassino aovivoconhecer os agricultores desses territórios e dar visibilidade às práticas tradicionaiscassino aovivocultivo.
Segundo o levantamento, nessas aldeias, já são maiscassino aovivo80 roças indígenas, dedicadas ao cultivocassino aovivo190 variedades agrícolas, e quatrocassino aovivocada dez agricultores guarani são mulheres.
A retomada da agricultura tradicional guarani foi possível graças à recente dispersão territorial e à demarcação da TI Tenondé Porã, reconhecidacassino aovivoportaria declaratória pelo Ministério da Justiçacassino aovivo2016.
Agora, os indígenas paulistanos lutam pela conclusão do processocassino aovivodemarcação, que ainda depende da retiradacassino aovivonão indígenas, demarcação física do território e homologação pela Presidência da República. E reivindicam ao poder público municipal a aprovaçãocassino aovivoum projetocassino aovivolei (PL 181/2016), que propõe o fortalecimento do Cinturão Verde Guarani na capital paulista.
Alimento para o espírito
"Quando ficamos por muito tempo nas aldeias pequenas, perdemos a práticacassino aovivoplantio. Com a terra demarcada, passamos a contar com uma área maior e as pessoas que têm suas memórias vivas, o conhecimento da prática do plantio, retornaram com toda força, querendo ensinar", conta Jera Guarani,cassino aovivo39 anos e moradora da aldeia Kalipety.
"Para os guarani, a comida não pode alimentar só o corpo, mas sim o espírito também", diz ela. "E a comidacassino aovivobranco não faz isso, ela só nos adoece mais rápido. Hoje tem um número notávelcassino aovivoguarani com diabetes e pressão alta, o que é relacionado com a alimentação que vemcassino aovivofora."
Lucas Keese, antropólogo e coordenador do estudo, destaca que, sócassino aovivomilho e mandioca, a safracassino aovivo2019 produzida pelos agricultores guarani da TI Tenondé Porã chegou a 16 toneladas.
"Esse volume, apesarcassino aovivonão ser suficiente para garantir a autossuficiência alimentar para toda a populaçãocassino aovivo1,5 mil pessoas, já é muito significativo, pensando que, há cercacassino aovivoseis anos, a produção era muito menor", diz Keese.
"Esse fortalecimento do plantio está relacionado ao processocassino aovivodispersão deles pelo território, nessa dinâmica recentecassino aovivodemarcação", destaca o antropólogo, lembrando que, até 2012, os Guarani da Zona Sul eram cercacassino aovivo1 mil, ocupando apenas as aldeias Tenondé Porã e Krukutu, que à época tinham densidade populacional muito alta para os padrõescassino aovivovida Guarani. "A luta pela terra está intrinsecamente ligada a essa cultura agrícola."
História da TI Tenondé Porã
A fixação dos indígenas guarani na regiãocassino aovivoParelheiros começa na décadacassino aovivo1950, segundo o Relatório Circunstanciadocassino aovivoIdentificação e Delimitação da TI Tenondé Porã, publicado pela Funai (Fundação Nacional do Índio)cassino aovivo2012.
Conforme o documento, antes da implantaçãocassino aovivouma colônia alemã,cassino aovivo1827, a região era habitada pelos indígenas emcassino aovivocirculação entre o litoral e o planalto.
Parelheiros permaneceu rural e pacata até a construção da Estradacassino aovivoFerro Sorocabana, entre 1919 e 1938, quando foram construídas vilas para abrigar os trabalhadores da ferrovia, desconsiderando a presença guarani.
"A partir da décadacassino aovivo1950, sem o devido reconhecimentocassino aovivoseus direitos territoriais, algumas famílias guarani que circulavam pela região,cassino aovivoum contexto cada vez mais acirradocassino aovivodisputa fundiária, lograram assentar-secassino aovivoáreascassino aovivoum posseiro japonês, que viriam a ser as futuras aldeias Barragem (Tenondé Porã) e Krukutu, trabalhando justamente na produção agrícola do grileiro, alémcassino aovivopoderem, com essa proteção, fazer suas próprias roças para subsistência", conta o relatório da Funai.
Nas décadas seguintes, com a população crescendo, essas pequenas áreas homologadascassino aovivo1987 ficaram insuficientes para a prática da agricultura tradicional guarani. A história só mudaria a partircassino aovivo2012, com o reconhecimentocassino aovivo15.969 hectares como terras tradicionais do povo guarani pela Funai e com a portaria declaratória do Ministério da Justiçacassino aovivo2016.
As roças indígenas atuais
Entre as culturas plantadas pelos guarani paulistanos atualmente estão espéciescassino aovivocultivo anual, como milho, mandioca, feijão, batata-doce, abóbora e melancia, chamadas por elescassino aovivotembi'u ete'i (comida verdadeira). Há também espécies perenes, como bananeiras e outras árvores frutíferas e plantas madeireiras e medicinais.
Das 1.390 pessoas que vivem nas seis aldeias analisadas, 492 estão envolvidas com a manutenção das roças, ou 35% da população.
Entre os adultos,cassino aovivomédia 31% exercem trabalho remunerado regular, principalmente nos equipamentos públicos da região, como escolas e postocassino aovivosaúde, ou atravéscassino aovivobolsas para projetos. Muitos têm a vendacassino aovivoartesanato como principal fontecassino aovivorenda ou recebem auxílios governamentais, como aposentadoria ou Bolsa Família.
"Ter a possibilidadecassino aovivogarantir partecassino aovivoseu sustento por meio do que se produz no território é uma alternativa importante, sobretudocassino aovivocontextos políticos desfavoráveiscassino aovivoausteridade econômica e com ameaçacassino aovivocortescassino aovivoauxílios e direitos sociais", defendem os pesquisadores.
Ainda assim, gerar renda não é uma prioridade dos agricultores guarani. Para eles, os objetivos principais do plantio, conforme o estudo, são garantir alimento saudável, fortalecer os saberes e práticas tradicionais, circular o conhecimento entre gerações e alcançar maior autonomia.
"No conceitocassino aovivovida guarani, temos que viver com o suficiente, nunca ser ganancioso e querer mais do que o necessário. Então, para nós, plantar, colher e vender já quebra essa regra", diz Jera.
"Mais do que isso, não conseguimos conceber essa ideiacassino aovivovender. Os mais velhos, desde que nascemos na aldeia, ensinam que tudo isso foi deixado para nós pela nossa divindade maior, que chamamoscassino aovivoNhanderuete. Tudo isso para nós é muito sagrado, então não podemos ter a prepotênciacassino aovivoplantar e ganhar dinheiro com isso."
O que falta para a agricultura guarani avançar
Se muito já avançou nos últimos anos, os guarani ainda precisamcassino aovivoapoio paracassino aovivorenascida agricultura se fortalecer mais.
Segundo o estudo, entre as medidas necessárias, estão o apoio para aquisiçãocassino aovivoinsumos e a assistência técnica para incrementar o manejo agroecológico.
Outra medida necessária,cassino aovivoacordo com os pesquisadores, é fortalecer atividadescassino aovivointercâmbio e trocascassino aovivosementes.
"Já visitamos aldeias guarani no Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e até na Argentina. Em seis anoscassino aovivovida da minha aldeia, já temos maiscassino aovivo50 tiposcassino aovivobatata-doce e maiscassino aovivonove tiposcassino aovivomilho", conta Jera. "Participamoscassino aovivofeirascassino aovivotrocacassino aovivosemente com não indígenas, onde conseguimos trazercassino aovivovolta para as aldeias sementes que os guarani mais velhos já não viam há maiscassino aovivo50 anos, como amendoim preto, milho preto e milho branco grande."
Para a liderança da aldeia Kalipety, no entanto, o mais importante é garantir o fortalecimento da terra indígena. "Precisamos ter a demarcação física do nosso território e a 'desintrusão' das pessoas não-indígenas que ainda estão presentes na nossa área", afirma.
Na esfera municipal, a prioridade é o projetocassino aovivolei do Cinturão Verde Guarani. "É uma lei que garantiria muitas medidascassino aovivoapoio que já temos pelo Programa Aldeias, da Prefeitura", explica a indígena. "Por ser um programa, no iníciocassino aovivotodos os anos, sempre ficamos preocupados se isso vai continuar ou não. A aprovação dessa lei garantiria às duas terras indígenas, Tenondé Porã e Jaraguá, que não precisaríamos mais nos preocupar."
Para o antropólogo Lucas Keese, o projetocassino aovivolei é importante não apenas para os indígenas, mas para a população da cidadecassino aovivoSão Paulo como um todo.
"Há poucas áreas remanescentescassino aovivoMata Atlântica que sobraram ainda no município e grande parte delas está dentro das terras indígenas guarani. Essas terras realizam uma sériecassino aovivoserviços ecossistêmicos, como a salvaguardacassino aovivovariedades genéticas e a proteção das matas e dos mananciais", diz Keese.
"Pensar o Cinturão Verde Guarani é uma formacassino aovivofortalecer e proteger a cidade como um todo. Uma formacassino aovivovalorizar a riqueza ambientalcassino aovivoSão Paulo e pensar um outro projetocassino aovivocidade, que não seja mais esse centro que vai se expandindo indefinidamente, mas uma outra relação entre centro e periferia."
"É o município deixarcassino aovivover as terras indígenas como algo negativo, uma parte do território que a cidade perde. Pelo contrário, é um ordenamento territorial que fortalece a cidade, trazendo coisas positivas para o município ecassino aovivopopulação."
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