'Guerra territorial': os municípios e Estados brasileiros que ainda disputam 'fronteiras':impera slot

O casoimpera slotMaria Joaquina não é isolado.

Se as fronteiras terrestres do Brasil são relativamente estáveis há quase um século, o mesmo não se pode dizer dos limites internos do país. Disputas por territórios têm levado Estados e municípios aos tribunais.

As causas dos conflitos

Os motivos que levam um ente federativo a querer aumentar o seu território e, consequentemente, reduzir oimpera slotoutro, são diversos.

Para Luigi Bonizzato, professorimpera slotDireito Constitucional da Universidade Federal do Rioimpera slotJaneiro (UFRJ), os principais sãoimpera slotnatureza econômica, política e estratégica.

"Dependendo do tamanho da área reivindicada, é possível alterar o númeroimpera slotvereadoresimpera slotum município. Também pode dar ao território acesso a um recurso estratégico, como uma rodovia, ou acesso ao litoral", explica.

Não apenas municípios discutem quais são seus limites territoriais. Piauí e Ceará, por exemplo, disputam uma áreaimpera slotcercaimpera slot3 mil km² na Serra da Ibiapaba, delimitada por um acordoimpera slot1920, cujos marcos estão imprecisos, segundo o governo do Piauí.

Em marçoimpera slot2019, a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, determinou que o Exército realizasse uma perícia para definir a linha divisória entre os Estados. O processo está pendenteimpera slotjulgamento.

A região, historicamente negligenciada pelo poder público, ganhou relevância nos últimos anos com a identificaçãoimpera slotpotenciaisimpera slotmineração e energéticos, principalmente eólico e solar. Os Estados destacam-se no setorimpera slotenergias renováveis, sendo o Piauí líder no paísimpera slotcapacidade instalada para geração solar e o Ceará o terceiroimpera slotenergia eólica .

Outro fator importante é a evolução da técnica cartográfica. "Muitas dessas delimitações eram feitas com técnicas rudimentaresimpera slotcartografia, frequentemente baseadasimpera slotacidentes naturais. Hoje nós temos o georreferenciamento por satélite para definiçãoimpera slotterritório, que é muito mais preciso", explica Fernando Araújo Sobrinho, professor do departamentoimpera slotgeografia da Universidadeimpera slotBrasília (UnB).

"Quando se compara um mapa feito nos anos 40 com a imagemimpera slotsatélite, você vê que a fronteira está alguns metros à frente, por exemplo. E isso afeta a arrecadação dos entes federativos", acrescenta.

Um exemplo da importância na precisão dos marcos geográficos é a divisa entre o Pará e o Mato Grosso. Em 1900, os dois Estados assinaram um acordo para consolidar seus limites. A divisa seria uma linha reta, cujos marcos são a junção dos rios Javaés e Araguaia,impera slotum lado, e a "Cachoeira das Sete Quedas', no rio Teles Pires,impera slotoutro .

Por décadas, a situação parecia pacificada, até que,impera slot2004, o Mato Grosso alegou que um dos marcos estaria equivocado. Segundo o Estado, quando houve a realização da cartografia oficial,impera slot1922, foi definido como referência o "Salto" e não a "Cachoeira" das Sete Quedas, situada 140km rio acima. Isso teria suprimido 2,2 milhõesimpera slothectaresimpera slotárea matogrossense.

O STF julgou o casoimpera slot2019 e manteve o território reivindicado com o Pará. A perícia concluiu que o marco definido na cartografiaimpera slot1922 é o mesmo do tratado, levandoimpera slotconsideração documentos da época, não alterando a linha divisória entre os Estados.

No panoimpera slotfundo da disputa estava o grande potencial hidrelétrico dos rios da região. Lá, inclusive, foi construída a usina Teles Pires, a 10ª maior do país, que passaria a se situar totalmente no Estadoimpera slotMato Grosso, caso a ação fosse procedente.

Ironicamente, a cachoeira que deu origem a toda a polêmica hoje não existe mais, engolida pelo lago da usina.

Origens históricas

Afinal, o que define o limite territorialimpera slotuma unidade da federação? Apesar do IBGE ser o órgão responsável por criar os mapas oficiais, não éimpera slotatribuição demarcar limites territoriais. O que consolida o territórioimpera slotum Estado ou município é a lei.

A criação do federalismo brasileiro, com a Constituiçãoimpera slot1891, foi um marco na organização político-administrativa do país. O modelo foi inspirado no dos EUA, tanto que o primeiro nome oficial da república era Estados Unidos do Brasil.

Contudo, enquanto na América do Norte vários entes, anteriormente independentes, decidiram se unirimpera slotum país único e forte, no Brasil o processo foi ao contrário, pois houve uma divisão do território.

O Brasil pré-1891 era um Estado unitário, ou seja, havia um poder central que poderia criar e extinguir qualquer unidade subnacional quando bem entendesse.

A Constituição transformou automaticamente as provínciasimpera slotEstados, o que lhes garantiu uma maior autonomiaimpera slotrelação ao poder central.

Bonizzato explica que a alteração "atendeu a várias classes e poderes econômicos que estavam insatisfeitos com a centralização e que queriam participar da política".

Essa situação acabou acirrando conflitos, sendo que alguns se estendem até hoje. "Muitas das disputas atuais, guardadas suas devidas proporções, nasceramimpera slot1891. Algumas se fortificaram, outras surgiram, porém a história mostra que os problemas se prolongam no tempo", completa Bonizzato.

Desde 1996, não é possível a criaçãoimpera slotnovos municípios no país, que somavam 5.507 à época . Apesar disso, 61 novas cidades foram criadas, a maioria sob o fundamentoimpera slotque elas já existiamimpera slotfato, apenas faltava o reconhecimento legal.

Em 2019, o presidente Jair Bolsonaro apresentou uma proposta que extinguiria entes com menosimpera slot5 mil habitantes, o que acabaria com 1.217 municípios. No inícioimpera slotsetembro deste ano, o governo pediu a retirada do projeto.

Sobre um território, há um povo

Michel da Mota, 31, é comerciante e mora no bairro Maria Joaquina há 12 anos. Para ele, o principal problema que o vaivém entre municípios causa é a confusão na horaimpera slotbuscar acesso a serviços públicos.

"Quem mais sofre é a classe desfavorecida, que muitas vezes tem dificuldadeimpera slotacesso à saúde, educação, segurança. Nesta pandemia, não sabíamos a qual município recorrer para receber algum tipoimpera slotauxílio", relata.

Os royalties são uma compensação pela exploraçãoimpera slotrecursos e, portanto, devem ser obrigatoriamente investidosimpera slotobrasimpera slotenergia, pavimentação, saneamento, saúde, educação, entre outros. Porém, apesar da riqueza que gera ao município ao qual pertence, Maria Joaquina quase não possui ruas asfaltadas, sistemasimpera slotcoletaimpera slotesgoto ouimpera slotlixo adequados, sendo uma das localidades mais pobres da região.

O autor da lei que transferiu Maria Joaquina à Armação dos Búzios, Paulo Ramos, hoje deputado federal, defende que a norma atende aos anseios do bairro. "Os empregos, comércio, escolas, enfim, a vida da populaçãoimpera slotMaria Joaquina é totalmente vinculada a Búzios". O bairro fica a cercaimpera slot10 km do centroimpera slotBúzios e a 20km doimpera slotCabo Frio.

Ramos argumenta que a lei corrige uma falhaimpera slotdefinição dos limites à época da emancipaçãoimpera slotArmação dos Búzios. "Maria Joaquina nunca poderia ter permanecido com Cabo Frio".

Já a prefeituraimpera slotCabo Frio argumenta que a leiimpera slot2018 não observou requisitos formais, como a consulta à população das duas cidades, e nem realizou estudoimpera slotviabilidade antesimpera slotdeterminar que o bairro deixasseimpera slotpertencer a Cabo Frio.

A situação gera insegurança jurídica até mesmo para os administradores dos municípios. O pingue-pongue dificulta ações a longo prazo, pois uma prefeitura pode invadir a áreaimpera slotcompetência da outra.

Para Fernando Araújo Sobrinho, da UnB, o país deveria avançarimpera slottermosimpera slotintegração entre entes federativos. "Por meioimpera slotconsórcios, municípios podem comprar e dividir equipamentos, por exemplo. Mas muitas vezes caímosimpera slotquestões políticas locais, como divergências partidárias. Nessas brigas políticas, o principal afetado é a população brasileira", diz.

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