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'Por que perdoei o homem que me roubou R$ 30 mil':qg pix bet
José, um senhorqg pix betquase 60 anos, sem nenhum antecedente criminal, havia trabalhado com o maridoqg pix betFernandaqg pix betuma grande empresa multinacional no passado. Quando precisou preencher a vaga na própria empresa, o maridoqg pix betFernanda resolveu dar uma chance para o ex-colega, que estava desempregado.
"Ele é um senhor, conhecemos a família dele, meu marido já havia trabalhado com ele, que não tinha nenhuma mancha no currículo", conta Fernanda. "Nunca imaginamos que pudesse fazer uma coisa dessas", diz Fernanda.
Como responsável pela área financeira, José tinha acesso aos cartões e contas da empresa. Logo apósqg pix betcontratação, os donos perceberam enormes rombos nas contas, que totalizavam maisqg pix betR$ 30 mil. "Não havia possibilidadeqg pix betser outra pessoa, estava bem claro que era ele", diz a empresária.
A empresária conta que estava tomada por um turbilhãoqg pix betsentimentos — raiva, desejoqg pix betJustiça, mas também um 'peso'qg pix betlevar à questão à polícia.
"Imagina, é uma coisa muito grave. Ele poderia ser preso. E tinha a família dele, que ia sofrer também", diz. Ela conta que chegou até a se culpar. "Você fica pensando, por que eu confiei?", diz.
Questionado sobre o destino do dinheiro, José disse que iria checar. No dia seguinte não foi trabalhar. Confrontado novamente sobre a questão por telefone, perguntou ao maridoqg pix betFernanda se os dois poderiam se encontrar para resolver a questão.
"Ele disse que queria resolver, que ia pagar. Meu marido foi se encontrar com ele, que deu várias desculpas e no fim não pagou", diz Fernanda.
Sem opções, Fernanda e o marido foram à delegacia fazer um boletimqg pix betocorrência.
Pensando na vítima
Após o inquérito da polícia, o caso foi parar nas mãos da promotoraqg pix betJustiça Celeste Leite dos Santos, que coordena o Avarc.
"Eu percebi que havia um vácuo na Justiça, que é o acolhimento à vítima", conta Celeste. "Existe uma preocupação com o crime, o réu é processado, mas a vítima não é levadaqg pix betconta. No processo penal tradicionalmente a vítima é relegada ao segundo plano", diz ela.
"Então o Avarc é um projeto para que a promotoria não seja apenas um órgãoqg pix betacusação, masqg pix betacolhimento e resoluçãoqg pix betconflitos."
A ideia é levar ao campo criminal os princípios da justiça restaurativa — técnicaqg pix betsoluçãoqg pix betconflito a partir da escuta das partes diretamente envolvidas,qg pix betque elas discutem qual a melhor formaqg pix betreparar o dano causado pelo conflito.
A promotoria acolhe a vítimaqg pix betum crime (ou a procura) e questiona como ela gostariaqg pix betser reparada. Então o acusado é procurado e é proposto um acordo: ele admite o crime, se responsabiliza por ele e concorda com as condiçõesqg pix betreparação. Em troca, não é processado criminalmente. As condições podem envolvem reparação financeira, doações para a caridade, trabalho voluntários, entre outros.
Algumas semanas depoisqg pix betfazer o B.O., Fernanda recebeu uma carta do Ministério Públicoqg pix betSP perguntando se ela gostariaqg pix betparticipar do projeto, que começouqg pix betdezembroqg pix bet2018.
"De certa forma, foi um alívio, foi como tirar um peso das minhas costas", diz a empresária. "Porque eu fui, procurei a polícia... Você quer Justiça, claro, mas fica pensando, será que a pessoa ir para a prisão não é demais?"
O caso então seguiu o protocolo estabelecido no Avarc, onde o criminoso é chamado para um encontro com a promotoria e vítima.
"Muitas vezes quando é condenado e vai para a prisão, o réu continua achando que não é culpado, que foi uma 'vítima do sistema', que foi injustiçado. Ele não é obrigado a confrontar as consequências do que fez (para a vítima)", diz Celeste, que coordena o projeto do MP. "Ao encarar a vítima, ele vê diretamente o dano que causou."
Claro que há casosqg pix betque esse encontro não é possível. A promotoria então apresenta ao acusado dos crimes os pedidosqg pix betreparação da vítima e tenta-se chegar a um acordo. Às vezes também são usadas videoconferências.
O acusado precisa sempre estar acompanhadoqg pix betum advogado. Quando não tem dinheiro para pagar por um, pode contar com um dos advogados voluntários do Avarc. Isso porque o encontro acontece antes do inícioqg pix betum processo formal, e a Defensoria Pública (órgão público que defende quem não tem como pagar por um advogado), não atua nessa fase.
"Sempre levamosqg pix betconsideração as condições do acusado para estabelecer os termos do acordo. É um contrato que ele faz", explica Celeste. Se a pessoa não o cumprir, o MP segue o processo que normalmente aconteceria, iniciando um processo criminal contra o acusado e o denunciando à Justiça.
Lágrimas e perdão
No casoqg pix betFernanda, o encontro com José gerou lágrimas dos dois lados.
Celeste conta que, no início, José não queria admitir o crime. Ela então explicou que, para participar e ter o benefícioqg pix betnão ser processado criminalmente pelas acusações, ele precisaria confessar. Caso quisesse se defender com uma negativa, o processo correria normalmente — José seria processado pelo Ministério Público e teria direito a defesa e a um julgamento.
José, no entanto, resolveu confessar o crime. "Ele não explicou por que fez isso, mas chorou, pediu desculpas, e eu também me emocionei", conta Fernanda.
Ele concordou com o acordo proposto pelo Ministério Público, proposto com base na conversa com Fernanda, que, como reparação, pediu apenas o dinheiroqg pix betvolta. José teve que devolver os R$ 30 milqg pix betvárias parcelas — que ele terminouqg pix betpagar no meio do ano passado. Também teve que fazer uma doação a uma instituiçãoqg pix betcaridade que faz atendimento a vítimasqg pix betcrimes — condição imposta pelo MP.
"Foi uma solução boa para todo mundo. Eu recebi o dinheiroqg pix betvolta, ele não foi preso... Se fosse pelo procedimento normal, ele teria sido preso, teria a vida arruinada, sem contar a família, e eu continuaria sem o dinheiro", diz a empresária.
"E o perdoei, sim. Não guardo nenhum tipoqg pix betrancor", diz Fernanda, que também explica que isso não significa que confiaria novamenteqg pix betJosé.
Celeste explica que, tendo cumprido todos os termos do acordo, José está livre para seguir comqg pix betvida.
Fernanda gostou tanto do projeto que se ofereceu para ser voluntária — o formatoqg pix betsua participação ainda não foi definido, mas provavelmente estará relacionado ao atendimentoqg pix betvítimasqg pix betcrimes como o que ela sofreu.
Regras do acordo
O acordo com o acusado só é possívelqg pix betcrimes para os quais a pena mínima éqg pix betaté 4 anos e que não envolvam abuso sexual ou violência doméstica.
O novo "pacote anticrime" aprovadoqg pix betdezembro no Congresso, trata do tema dos acordos feitos antes do início do processo judicial, os chamados acordosqg pix betnão persecução penal (ANPP), negociados pelos MPs diretamente com os investigados.
Inicialmente, o projeto do ministro da Justiça, Sergio Moro, estabeleceria que somente crimes com pena máxima (e não mínima)qg pix betquatro anosqg pix betprisão poderiam passar por acordos — algo que teria excluído o crime cometido por José contra Fernanda, por exemplo.
No entanto, na passagem do projeto pela Câmera, o projeto original foi modificado e esse trecho retirado.
O texto final formaliza a possibilidadeqg pix betacordos para crimes com pena mínimaqg pix betaté 4 anos e outras regras.
O acordoqg pix betnão persecução penal com o MP não pode ser feito se o investigado for reincidente ou se houver provasqg pix betqueqg pix betconduta criminosa é frequente. Também não podem participar pessoas que já fizeram um acordo do tipo nos cinco anos antes do cometimento do crime.
Para a coordenadora do Avarc, o problemaqg pix betmuitos dos acordos feitos com os investigados é que a vítima não é ouvida no processo. "Se faz um acordo com a pessoa e vítima não é questionadaqg pix betnenhum momento sobre como gostariaqg pix betser reparada", afirma Celeste. Ela diz ainda que o novo pacote não resolve o problema.
A ideia do Avarc é justamente incluir a vítima no processo. "Queremos evitar a vitimização secundária, que é quando a vítima sofre uma nova violência ao não ser acolhida no ambiente jurídico", explica.
Para ela, isso é muito diferenteqg pix bettrazer sentimentosqg pix betvingança ou justiçamento para o direito criminal — pelo contrário. "Com o acordo, quem comete um crime se responsabiliza muito mais por seus próprios atos, o que é muito importante para evitar recaídas (no crime) e para a ressocialização".
Atualmente o Avarc é um projeto do Ministério Públicoqg pix betSão Paulo, iniciado no Fórum Criminal da Barra Funda, então só funciona na capital,qg pix betPindamonhagaba,qg pix betGuarulhos e na Baixada Santista. Mas a ideia é expandir para o Estado todo — e até para o resto do Brasil.
"A ideia é criar um modelo que possa ser usado por todos os promotores", afirma Celeste.
*o nome foi alterado para preservar a identidade do envolvido
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