Da escravidão à autonomiasite para aposta de futebol50 anos: a históriasite para aposta de futebolrenascimento dos índios yawanawá:site para aposta de futebol

"Quando cheguei para liderar o meu povo,site para aposta de futebol2001, os Yawanawá estavam com a autoestima muito baixa", diz à BBC News Brasil Tashka Yawanawá, cacique da aldeia Mutum e um dos responsáveis pelo que chamasite para aposta de futebol"renascimento cultural e espiritual" do povo.

Com 46 anos, Tashka nasceu quando os seringueiros ainda ocupavam o território yawanawá, uma trechosite para aposta de futebolFloresta Amazônica cortado pelo rio Gregório, próximo à fronteira com o Peru.

Os forasteiros chegaram à região há cercasite para aposta de futebolum século, durante o Ciclo da Borracha. Até então sem contato regular com o mundo exterior, os Yawanawá foram recrutados para extrair látex das seringueiras.

"Muitas pessoas começaram a cortar seringa para trocar por sal, açúcar, gênerossite para aposta de futebolprimeira necessidade. Depois os Yawanawá começaram a perceber que os patrões queriam sempre mais produção", conta Tashka.

Com o tempo, os indígenas foram abandonando as roças e passaram a depender cada vez mais dos donos dos seringais, que cobravam preços exorbitantes por roupas e alimentos. Capangas armados fiscalizavam os locaissite para aposta de futeboltrabalho.

Eles acabaram se tornando escravos por dívidas, sujeitos ao alcoolismo, à prostituição e às doenças trazidas pelos seringueiros.

Enquanto os patrões seringalistas os apertavamsite para aposta de futebolum lado, missionários evangélicos americanos da News Tribes Mission (Novas Tribos do Brasil) os cercavam do outro.

Líder da aldeia Nova Esperança, Biraci Júnior Yawanawá diz à BBC News Brasil que os patrões e os missionários trabalhavam numa espéciesite para aposta de futebolparceria e estimulavam um "sistema individualista" entre os indígenas.

"Um nos explorava fisicamente, e o outro nos explorava espiritualmente, impondosite para aposta de futebolreligião, nos impedindosite para aposta de futebolusar nossas medicinas esite para aposta de futebolfazer cerimônias, porque era 'coisa do demônio'", ele diz.

Demarcação do território

O cenário começou a mudar quando, nos anos 1980, jovens yawanawá enviados à cidade para estudar — entre os quais o paisite para aposta de futebolBiraci Júnior, o cacique Biraci Brasil — entraramsite para aposta de futebolcontato com o incipiente movimento indígena acreano e com ONGs que o assessoravam, como a Comissão Pró-Índio do Acre. Informaram-se sobre seus direitos e voltaram às aldeias para por fim à exploração.

A mobilização levou à demarcação da Terra Indígena Rio Gregório,site para aposta de futebol1983. Na época com 983 mil hectares, o equivalente a um terço do Estadosite para aposta de futebolAlagoas, ela foi a primeira terra indígena demarcada do Acre. Em 2007, o território dobrousite para aposta de futeboltamanho.

Com a terra assegurada, os indígenas invadiram os barracões dos seringueiros para expulsá-los. Depois, foram atrás dos missionários.

Naquela altura, conta Biraci Júnior, os Yawanawá estavam tão habituados à presença dos religiosos que alguns protestaram, argumentando que os missionários haviam construído escolas e distribuíam remédios às comunidades. Coube a Biraci Brasil convencê-lossite para aposta de futebolque tudo ficaria bem.

"Ele explicou que nós vivíamos antes dos missionários, tínhamos nossas medicinas, nossas plantas. Dizia que tínhamos que acreditar no poder delas, e a partir daí começou o trabalhosite para aposta de futebolperguntar aos mais velhos, aos pajés, que estavam há tanto tempo adormecidos, para fazê-los puxar da lembrança o conhecimento, as rezassite para aposta de futebolcura, os cantos cerimoniais, e reavivar toda a espiritualidade", diz o indígena.

Depois que os Yawanawá expulsaram os missionários, outras comunidades nativas acreanas fizeram o mesmo.

Retomada da ayahuasca

Desse movimentosite para aposta de futebolresgate também participaram sertanistas — servidores da Funai (Fundação Nacional do Índio) que trabalhavam junto às comunidades indígenas.

No artigo "Os outros da festa: um sobrevoo por festivais yawanawá e huni kuin", publicadosite para aposta de futebol2018 pela revista Horizontes Antropológicos, a doutorandasite para aposta de futebolAntropologia na USP Aline Ferreira Oliveira descreve como indígenas acreanos retomaram o consumo da ayahuasca.

A bebida, feita com duas plantas amazônicas, tem propriedades psicodélicas e havia sido proibida por misionários que viviam entre entre os nativos grupos. Nos anos 1990, indígenas que viviam nas cidades próximas às aldeias, como Rio Branco, Tarauacá e Cruzeiro do Sul, foram reapresentados a elasite para aposta de futebolencontros com sertanistas e adeptossite para aposta de futeboldoutrinas associadas à ayahuasca, das quais a mais conhecida é o Santo Daime.

O Santo Daime foi fundado por um seringueiro negro, o migrante maranhense Raimundo Irineu Serra (1890-1971). Após conhecer a bebida por intermédiosite para aposta de futebolindígenas acreanos no início do século 20, Irineu formulou uma corrente religiosa que mescla elementos cristãos, africanos, nordestinos e ameríndios.

Oliveira diz que os encontrossite para aposta de futebolque os indígenas retomaram o contato com o chá tinham clima festivo e instrumentos musicais, duas características das religiões daimistas que acabaram absorvidas pelos indígenas emsite para aposta de futebolreapropriação da substância. Hoje muitos grupos indígenas romperam os laços com essas religiões e passaram a seguir ritos própriossite para aposta de futebolrelação à bebida, à qual atribuem propriedadessite para aposta de futebolcura e o podersite para aposta de futebolconectar os mundos físico e espiritual.

Trabalhos mais animados

Os líderes Yawanawá dizem que a absorçãosite para aposta de futebolelementos externos teve papel central na consolidaçãosite para aposta de futebolseus rituais ligados à ayahuasca, bebida que eles chamamsite para aposta de futebol"uni".

Biraci Júnior afirma que, no passado, os trabalhos xamânicos do povo eram restritos aos homens mais velhos. "Era uma coisa muito focada na medicina (tradicional), com cantos fortessite para aposta de futebolcura, e aquilo se tornou monótono para a juventude, era muito sem graça", ele diz.

Conforme os rituais incorporaram instrumentos antes inexistentes entre o povo, como o violão, o tambor e o maracá, "os trabalhos foram ficando mais animados, e com isso a juventude se despertousite para aposta de futebolquerer aprender a língua,site para aposta de futebolquerer cantar."

Hoje Biraci Júnior diz que vários adolescentes Yawanawá falam fluentemente a língua nativa e estão se preparando para se tornar pajés (líderes espirituais) — cenário impensável há algumas décadas.

Turismo xamânico

A animação dos rituais também tem ajudado a atrair turistas para as aldeias, atividade que se tornou a principal fontesite para aposta de futebolreceitas da comunidade.

Desde o início dos anos 2000, os Yawanawá passaram a abrir seus festivais xamânicos para o público externo, no que foram seguidos por outros grupos indígenas acreanos. Hoje o povo realiza dois grandes eventos anuais, o Mariri e o Yawá.

Os visitantes vão às aldeias para uma semanasite para aposta de futebol"canto, dança, cura, arte, expressão artística, manifestação cultural e espiritual, num atosite para aposta de futebolagradecimentos aos espíritos da floresta pelos bens que ela oferece", segundo a descrição no site da agência Grupossite para aposta de futebolViagem, que organiza expedições a comunidades indígenassite para aposta de futebolvários países das Américas.

Nas cerimônias, eles têm acesso à ayahuasca e a outros remédios tradicionais, como o rapé (tabaco moído com cinzasite para aposta de futebolárvores, assoprado pelas narinas), a sepa (resina usadasite para aposta de futeboldefumações para purificar o corpo) e a sananga (colírio para limpar a visão feito com raízes). O consumosite para aposta de futebolálcool e drogas ilícitas é proibido.

Biraci Júnior diz que, emsite para aposta de futebolmaior edição, o festival Yawá reuniu 600 visitantessite para aposta de futebol19 países na aldeia Nova Esperança. Cada um temsite para aposta de futeboldesembolar R$ 2 mil pela experiência — dos quais, segundo o líder, R$ 1.400 cobrem custos com comida, transporte e serviços para os visitantes.

O fluxosite para aposta de futebolgente foi grande demais para a aldeia, que hoje tem 380 habitantes. Desde então, os organizadores têm limitado o númerosite para aposta de futebolparticipantes.

Nem todos os visitantes se adaptam às condições na aldeia. Tashka Yawanawá cita o casosite para aposta de futeboluma senhora que não conseguia defecar nas fossas usadas pela comunidade. "Tive que mandar buscar um assentosite para aposta de futebolprivadasite para aposta de futebolTarauacá", ele diz.

Outro caso envolveu um casal francês que viajou à aldeiasite para aposta de futebolluasite para aposta de futebolmel. "Eles não conseguiam transar na rede e caíam no chão o tempo todo", conta, aos risos.

Melhorias das aldeias

Tashka diz que hoje a atividade economicamente mais vantajosa para a comunidade são vivências que agregam entre 20 e 40 visitantes nas aldeias por até três semanas. Há várias edições por ano, e cada uma gera até R$ 150 milsite para aposta de futebolreceitas, segundo ele. O grupo também realiza rituais e vivênciassite para aposta de futebolcidades.

Os líderes dizem que o dinheiro do turismo é investidosite para aposta de futebolmelhorias físicas para a comunidade, como novas construções e poços d'água, esite para aposta de futebolsistemassite para aposta de futebolcriaçãosite para aposta de futebolporcos, galinhas e peixes. Os gastos são decididossite para aposta de futebolassembleia.

Segundo Biraci Júnior, antes dos festivais, os Yawanawá se deslocavam à cidadesite para aposta de futebolpequenas canoassite para aposta de futebolviagens que levavam até cinco dias. "Hoje temos a possibilidadesite para aposta de futebolcomprar barcos com motor e levamos oito horas", diz.

Contato com indígenas nos EUA

Além dos instrumentos musicais, os festivais Yawanawá incorporaram outros elementos que o grupo conheceusite para aposta de futebolandanças fora das aldeias.

Tashka Yawanawá diz que os eventos foram inspiradossite para aposta de futebolcelebrações realizadas por outros povos nativos das Américas, como o "pow-wow", cerimôniasite para aposta de futebolque indígenas norte-americanos recebem visitantes para cantar, dançar e celebrar a cultura local.

Ele participou da festa durante um intercâmbiosite para aposta de futebolestudos na Califórnia, seguido por uma longa expedição do Canadá ao Chile, quando conheceu dezenassite para aposta de futebolcomunidades nativas. Emsite para aposta de futebolúltima viagem ao exterior,site para aposta de futebolsetembro, acompanhou a Marcha pelo Climasite para aposta de futebolNova York junto da ativista sueca Greta Thunberg.

Parcerias com empresas

A primeira experiência internacional do líder foi financiada pela Aveda, empresa americanasite para aposta de futebolcosméticos que há 27 anos compra sementessite para aposta de futebolurucum dos Yawanawá, usando-assite para aposta de futebolprodutos para cabelo.

O grupo também já teve uma parceria com o designer Marcelo Rosenbaum, com quem desenvolveram uma linhasite para aposta de futebolluminárias apresentada no Salão Internacional do Móvel do Milão,site para aposta de futebol2013.

Em 2015, a grife Cavalera levou os indígenas à São Paulo Fashion Week, exibindo roupas com estampas inspiradas na arte do grupo. E,site para aposta de futebol2018, foi a vezsite para aposta de futebola grife Farm lançar uma coleçãosite para aposta de futebolcolares, brincos e bolsas com miçangas trabalhadas por mulheres Yawanawá.

As parcerias com empresas possibilitaram que vários membros do grupo fossem enviados a universidades brasileiras e estrangeiras. Segundo Biraci Júnior, hoje o povo tem 18 membros com ensino superior. Há duas médicas, uma cirurgiã dentista, alémsite para aposta de futebolgraduadossite para aposta de futebolMatemática, Biologia e Letras, entre outras carreiras. O próprio Biraci Júnior estudou Administração Agrícola no Havaí (EUA).

O líder diz que, quando enviam um jovem à cidade para estudar, os Yawanawá esperam que ele retorne e use os ensinamentos para o bem da comunidade, sem sobrepujar o conhecimento tradicional.

Segundo ele, quase todos os que se formaram voltaram e hoje dão aulas nas escolas indígenas, o que motiva os jovens a permanecer nas aldeias. As médicas atendem os pacientessite para aposta de futebolparceria com os pajés, aproveitando o conhecimento sobre remédios naturais.

Conquistasite para aposta de futebolautonomia

Quase 40 anos após se livrarem dos missionários e dos seringalistas, os Yawanawá celebram as transformaçõessite para aposta de futebolsuas vidas. Antes sob o riscosite para aposta de futeboldesaparecer, eles agora somam cercasite para aposta de futebol1.300 integrantes, dos quais 324 vivem no Peru e 132, na Bolívia.

"Hoje os Yawanawá estão nessa tão sonhada jornada da nossa autonomia", diz Tashka. Ele reconhece que, para chegar onde chegaram, contaram com o apoiosite para aposta de futebolONGs, sertanistas e parcerias que lhes permitiram capacitar seus integrantes.

Hoje, porém, diz que o grupo não dependesite para aposta de futebolninguém — nemsite para aposta de futebolinstituições privadas, nemsite para aposta de futebolórgãos públicos. "Se a Funai acabar, seria o fim do mundo para muitos povos. Para nós, não faria a mínima diferença."

Isso, porém, não o impedesite para aposta de futebolse preocupar com a situação dos outros grupos esite para aposta de futebolcriticar o presidente Jair Bolsonaro. "Nenhum outro governo desrespeitou tanto os povos indígenas com o atual", afirma.

Tashka condena a promessasite para aposta de futebolBolsonarosite para aposta de futebolque não demarcaria novas terras indígenas e a posiçãosite para aposta de futebolque os índios devem ser inseridos na sociedade para que deixemsite para aposta de futebolser "miseráveis".

"Uma pessoa dessas não consegue ver a beleza, a arte, a ciência, a medicina que os povos indígenas carregam com eles. Só consegue ver pobreza", diz o líder.

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