Eleições 2018: De 111 investigações do Ministério Público, apenas uma é sobre ‘fake news’ nas eleições:777 deluxe

Celulares foram ponto central da campanha com aplicativos como o WhatsApp

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Mensagens espalhando boatos ainda não são o grande foco das investigações sobre ilícitos eleitorais

No dia seguinte, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, determinou à Polícia Federal que abrisse um inquérito para investigar o caso relatado pela jornal paulista.

Investigações eleitorais diversas também estão sendo feitas pelos Ministério Públicos777 deluxecada Estado - que têm poder para tratar777 deluxequestões menores, como propagandas irregulares, mas não podem cassar o registro777 deluxeum candidato, por exemplo. Além disso, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, disse que a Polícia Federal abriu 469 inquéritos para investigar crimes eleitorais no 1º turno - ele listou a propagação777 deluxefake news como um dos principais crimes investigados, ao lado da propaganda irregular e da compra777 deluxevotos, mas não deu números.

Parte das denúncias do MPF tramita sob sigilo: é, portanto, impossível saber o número exato777 deluxeinvestigações deste tipo abertas. Todas as apurações citadas na reportagem são públicas.

O rol777 deluxeirregularidades que estão sendo investigadas pelo MPF é amplo: envolve desde compra777 deluxevotos por parte777 deluxecabos eleitorais até a suspeita777 deluxeliberação777 deluxeverbas federais777 deluxetroca777 deluxeapoio político. Há também diversos casos777 deluxebens públicos (viaturas777 deluxepolícia e carros oficiais) usados para campanhas.

Sede do TSE777 deluxeBrasília

Crédito, TSE / Divulgação

Legenda da foto, Ilícitos eleitorais só são julgados pelo TSE (foto) quando envolvem a disputa presidencial - todos os demais ficam a cargo dos TREs dos Estados

Investigação sobre 'fake news' ainda é incipiente

Entre a quinta e a sexta-feira, PT e PDT entraram com ações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pedindo a cassação do registro do candidato presidencial Jair Bolsonaro (PSL), tendo por base a reportagem da Folha - ainda não há qualquer despacho sobre a ação.

Mas, no Ministério Público, as apurações sobre o uso777 deluxefake news nas eleições ainda estão777 deluxemarcha lenta. Das 111 apurações checadas pela BBC News Brasil, apenas uma diz respeito à difusão777 deluxeboatos. Foi instaurada no dia 11777 deluxeoutubro - na semana seguinte ao 1º turno - pelo procurador Marcelo da Mota,777 deluxeSanta Catarina.

O objetivo da apuração era combater o "surgimento e disseminação777 deluxefake news acerca da lisura do pleito eleitoral, bem como a identificação e responsabilização das pessoas ou entes ligados à divulgação777 deluxenotícias falsas", especialmente os boatos777 deluxefraude nas urnas que circularam no domingo da votação do 1º turno.

Em outro procedimento, que não passou pelo MPF, a Polícia Federal indiciou uma professora777 deluxeEducação Física do Rio Grande do Sul por espalhar boatos nas redes sociais -777 deluxevídeo, ela acusava o governo federal777 deluxeenviar "urnas fraudadas para o Nordeste do Brasil".

Na última quinta-feira, Dodge se reuniu com o ministro do STF Edson Fachin e com o ministro Jungmann para tratar do combate às fake news. Representantes das campanhas777 deluxeHaddad e Bolsonaro estavam presentes. A chefe do Ministério Público disse que a liberdade777 deluxeexpressão precisa ser garantida, mas sem abusos.

A PGR Raquel Dodge

Crédito, Agência Brasil

Legenda da foto, 'É preciso também que não haja abuso, não haja ilícito, no modo como as pessoas se expressam', disse Dodge (foto).

No dia 11, a procuradora-geral da República publicou uma instrução determinando aos procuradores eleitorais que investiguem o uso777 deluxeboatos. Os procuradores devem estar atentos, escreveu Dodge, a "notícias falsas (fake news) e discursos e práticas777 deluxecoação, ódio e intolerância com motivação político eleitoral".

Para o ex-ministro do Superior Tribunal777 deluxeJustiça (STJ) e do TSE, Gilson Dipp, a ausência777 deluxeinvestigações sobre fake news tem "tudo a ver" com a forma como a Justiça Eleitoral e o MPF estão acostumados a trabalhar. "A Justiça Eleitoral e o MPF precisam sair da era da carroça e entrar na era do avião a jato", compara ele.

"Todos estes ilícitos (spam, boatos, caixa dois) estão definidos na lei eleitoral. Não é pela falta777 deluxedefinição jurídica que estamos nesse embaraço. Certamente é porque há um despreparo total e absoluto para fiscalizar as novas formas777 deluxefazer propaganda na internet. E pode ser inclusive que este despreparo não se resuma ao Brasil", disse Dipp à BBC News Brasil.

Dipp diz ainda que a Justiça Eleitoral, às vezes, gasta tempo e energia777 deluxeexcesso com questões menores, como propaganda eleitoral antecipada ou propaganda irregular. "Às vezes, o tal 'abuso777 deluxepoder econômico' é um adesivo777 deluxeum carro que é 50 centímetros mais largo do que poderia", diz ele.

O que o MPF está realmente investigando

Revisando as apurações abertas pelo MPF, vê-se que a maioria delas diz respeito a ilícitos e crimes eleitorais clássicos, da época777 deluxeque a campanha era feita principalmente com o que os políticos chamam777 deluxe"3 S": "sola (de sapato), santinho e saliva".

Um dos casos777 deluxeapuração no Ministério Público envolve um deputado federal reeleito e ex-ministro do governo Temer. Ainda antes do começo da campanha oficial, a prefeitura777 deluxeTaquaruçu do Sul (RS) estacionou na praça central da cidadezinha máquinas compradas com emendas parlamentares do deputado, no valor777 deluxeR$ 425 mil. Os equipamentos traziam uma faixa com o nome do parlamentar e777 deluxeum aliado - para o Ministério Público, trata-se777 deluxe"evidente intento777 deluxeusar o bem público para a promoção da candidatura".

Um episódio muito parecido teria ocorrido numa cidade gaúcha próxima a Taquaruçu do Sul, Frederico Westphalen. Desta vez, porém, a faixa trazia o nome777 deluxeum deputado federal do PR gaúcho, também candidato à reeleição.

Em Goiás, um ministro do governo atual é suspeito777 deluxearticular a liberação777 deluxeverbas da pasta777 deluxeforma a obter apoio político777 deluxeprefeitos da região do entorno777 deluxeBrasília para seus candidatos. O grupo dele conseguiu eleger um senador pelo Estado e dois deputados federais. E não só: segundo denúncia anônima recebida pelo MP, ele rodou o Estado "com recursos públicos" para promover as candidaturas - o que o ministro nega.

Mesária777 deluxeseção eleitoral

Crédito, Tania Rêgo / Agência Brasil

Legenda da foto, Casos777 deluxeinvestigação ainda são relativos ao 1º turno das eleições

Os casos compilados pela BBC News Brasil e relatados acima são os que já passaram pelo primeiro crivo do Ministério Público Federal: os procuradores que atuam nas eleições decidiram abrir investigações prévias, chamadas777 deluxeProcedimentos Preparatórios Eleitorais (PPEs), para apurar os indícios777 deluxeirregularidades.

Formalmente, os responsáveis por estas apurações têm até 60 dias para decidir se abrirão ou não ações judiciais contra os investigados - mas o prazo pode ser prorrogado. Como os casos ainda estão sob investigação, a reportagem decidiu omitir os nomes dos envolvidos nos casos777 deluxeque não foi possível contatá-los.

Outros deputados federais com mandato pelo menos até 1º777 deluxejaneiro777 deluxe2019 também são investigados. Um deles, do Solidariedade do Ceará, teria sido beneficiado por propagandas eleitorais777 deluxeuma rádio na cidade777 deluxeIndependência - as vinhetas foram pagas pela prefeitura777 deluxeoutra cidade cearense, controlada por um aliado político.

No Mato Grosso do Sul, um deputado federal da legislatura atual, eleito pelo PSDB, será investigado pela suspeita777 deluxeusar dinheiro da Cota Parlamentar da Câmara em777 deluxereeleição.

Em Niquelândia (GO), um vereador foi filmado pela Polícia Civil oferecendo dinheiro a eleitores777 deluxetroca777 deluxevotos para uma deputada federal do PR, que conquistou a reeleição no último domingo.

No interior do Piauí, um prefeito estaria usando veículos oficiais para ajudar na campanha777 deluxeum senador do PP e777 deluxesua mulher, deputada federal pelo mesmo partido.

Urna777 deluxelona

Crédito, TSE

Legenda da foto, Compra777 deluxevotos e coerção777 deluxeeleitores eram ainda mais comuns na época do voto impresso - a prática ficou conhecida como coronelismo

Em Goiás, um deputado federal eleito é acusado777 deluxerodar o Estado, antes ainda do começo da campanha oficial, com líderes religiosos locais. "Em vídeo juntado (...) o candidato aparece777 deluxeuma espécie777 deluxelugar reservado num altar, e um padre, ainda não identificado, diz aos fiéis ali presentes: 'Eu só posso voltar se ele for deputado. Vocês entenderam? Vocês entenderam mais ou menos o recado do padre? (...) Eu só posso vir se ele for deputado... porque senão não tem jeito777 deluxevir, porque fica muito longe e é ele que me traz, entendeu? 'Tão' ou não?".

Ao abrir a investigação, o procurador Alexandre Moreira Tavares dos Santos diz que há decisões anteriores do TSE sobre o tema, segundo as quais é vedado o uso777 deluxecultos religiosos para pedir votos. O culto religioso, escreve o procurador, não é o "momento nem o local apropriado para se realizar propaganda eleitoral. Além do desrespeito às pessoas presentes ao culto, o desvirtuamento do ato religioso777 deluxepropaganda eleitoral é ilícito, podendo, pela gravidade resultar777 deluxeabuso777 deluxepoder".

Crime ou ilícito?

"O abuso777 deluxepoder é coibido pela Constituição do país. A legislação eleitoral reconhece que alguns candidatos têm mais poder político ou econômico que outros. O que não pode é o abuso - quando, mesmo dentro da lei, você faz algo que lhe dê domínio sobre o eleitor777 deluxefunção777 deluxedinheiro ou poder", diz à BBC News Brasil o advogado especializado777 deluxedireito eleitoral Daniel Falcão.

Ele esclarece ainda que o abuso777 deluxepoder não é crime, e sim um ilícito eleitoral. Não há pena777 deluxeprisão para este ilícito, mas ele pode tornar o candidato inelegível ou fazê-lo perder o mandato.

estátua da deusa Têmis, representante da justiça

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Legenda da foto, Alguns candidatos são mais ricos ou mais poderosos que outros, mas eles não podem abusar desta condição, diz o advogado Daniel Falcão

"O abuso acontece quando você é filho777 deluxeum prefeito e usa bens, equipamentos ou faz um evento com dinheiro público para se promover, por exemplo", diz Falcão, que trabalha no escritório Boaventura Turbay Advogados.

Tanto crimes quanto ilícitos estão descritos no Código Eleitoral brasileiro. Os primeiros, diz Falcão, podem ser punidos com prisão. "É o que acontece com a compra777 deluxevotos. Este é um crime, o crime777 deluxecorrupção eleitoral", diferencia ele. Em ambos os casos, cabe à Justiça Eleitoral julgar.

Como funciona a investigação777 deluxeum crime eleitoral?

Cabe aos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs)777 deluxecada Estado julgar se os candidatos sob777 deluxejurisdição cometeram ou não crimes ou ilícitos. A única exceção são os casos que envolvem candidatos à Presidência da República, julgados pelo TSE - e o exemplo mais recente foi a ação contra a chapa Dilma-Temer, que terminou777 deluxejunho777 deluxe2017 com a absolvição da petista e do emedebista.

Durante o período das eleições, o MPF designa alguns procuradores responsáveis por investigar e denunciar crimes eleitorais - no jargão do órgão, eles são chamados777 deluxe"procuradores regionais eleitorais". As investigações podem ser abertas a partir777 deluxenotícias enviadas por cidadãos ou por promotores (integrantes dos MPs dos Estados).

Eunice Dantas é a procuradora regional eleitoral designada para o Estado777 deluxeSergipe nestas eleições. Segundo ela, as investigações eleitorais costumam ganhar fôlego após o 1º turno da disputa. "Até a data da eleição, estamos focados777 deluxecoibir práticas777 deluxepropaganda irregular e777 deluxecuidar777 deluxeprocedimentos777 deluxeregistro777 deluxecandidatos", diz.

Quando a reportagem da BBC News Brasil conversou com Dantas, na primeira semana777 deluxeoutubro, a procuradora estava ocupada com vários casos ocorridos777 deluxemunicípios no interior777 deluxeSergipe. Lagarto, cidade777 deluxe100 mil habitantes, é um deles. "O prefeito, cujo filho é candidato a deputado, marcou para a semana da votação a inauguração777 deluxeuma praça, junto com a entrega777 deluxe550 casas populares. Mesmo que o candidato não vá, o pai estará lá representando ele", disse ela.

casas populares777 deluxeconjunto habitacional

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Legenda da foto, Entrega777 deluxecasas populares durante a campanha é mencionada como um dos indícios777 deluxeilícito eleitoral

Mas por que é tão grave que um prefeito decida entregar algumas casas construídas em777 deluxegestão às vésperas do pleito?

"Para a eleição ser justa, é preciso que exista paridade entre os candidatos. Imagine um candidato disputando sem o apoio político do chefe político local lá777 deluxeLagarto. Ele já entra na disputa prejudicado777 deluxerelação ao outro que tem o pai usando a máquina777 deluxefavor do concorrente dele", diz ela.

Os procedimentos abertos pelo Ministério Público Federal representam uma minoria das notícias777 deluxeirregularidades destas eleições: até o começo777 deluxeoutubro, o TSE já havia recebido mais777 deluxe16 mil alertas777 deluxecidadãos por meio777 deluxeum aplicativo criado para monitorar irregularidades, chamado Pardal. A maior parte (cerca777 deluxe11 mil) dizia respeito a casos777 deluxepropaganda eleitoral irregular.