Secretáriagalera.bet appTemer diz que mudança no combate ao trabalho escravo é 'retrocesso inaceitável':galera.bet app

Flavia Piovesan
Legenda da foto, Flavia Piovesan cobra revogação da nova portaria do governo Temer | Foto: Enamat

Enquanto a legislação penal prevê que qualquer uma dessas quatro situações configuram situação análoga à escravidão - trabalho forçado, servidão por dívida, condições degradantes ou jornada exaustiva -, a portaria exige a presença das duas primeiras para que os auditores possam enquadrar as empresas como exploradoresgalera.bet apptrabalho escravo.

Michel Temer

Crédito, Reuters

Legenda da foto, A portaria foi publicada pelo governo Michel Temer nesta segunda-feira

A portaria estabelece também que as fiscalizações do Ministério do Trabalho agora terão que ser obrigatoriamente acompanhadas pela polícia. Além disso, determina que uma empresa só poderá entrar para a lista suja do trabalho escravo por determinação do ministro do Trabalho, atualmente Ronaldo Nogueira, tirando essa decisão das mãos dos técnicos da pasta.

As mudanças são uma solicitação antiga da bancada ruralista - e ocorrem na semanagalera.bet appque a Comissãogalera.bet appConstituição e Justiça (CCJ) da Câmara analisa a segunda denúncia contra o presidente Michel Temer no âmbito da operação Lava Jato.

Em nota, o Ministério do Trabalho afirmou que a portaria "aprimora e dá segurança jurídica à atuação do Estado Brasileiro" no combate ao trabalho escravo. "A partirgalera.bet appagora, uma investigação criminal será abertagalera.bet appforma simultânea à emissão do autogalera.bet appinfração; a Polícia Federal estará inserida nas ações; e as multas terão aumentos que,galera.bet appalguns casos, chegarão a 500%", disse ainda o posicionamento.

Parte do governo Temer desde o impeachmentgalera.bet appDilma Rousseff, Piovesan sairágalera.bet appduas semanas para assumir uma vaga na Comissão Interamericanagalera.bet appDireitos Humanos (CIDH).

"A única coisa que posso dizer, nesse ritualgalera.bet appsaídagalera.bet appgoverno, é que eu fiz o meu melhor. Realmente, eu não contive energia. Da minha parte, me posicionei com integridade", disse.

galera.bet app BBC Brasil - Qualgalera.bet appavaliação sobre as recentes mudanças do governo no combate ao trabalho escravo?

galera.bet app Flávia Piovesan - Fiquei perplexa e surpresa com a publicação da portaria. Na condiçãogalera.bet appsecretária nacional da Cidadania e sobretudo na condiçãogalera.bet apppresidente da Conatrae (Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo), queria expressar minha profunda preocupação com essa portaria porque ela simboliza retrocessos inaceitáveis na luta pela prevenção, erradicação e fiscalização do trabalho escravo. Lamentavelmente, fomos todos aqui da Conatrae e da secretaria surpreendidos.

Sobre a minha avaliação,galera.bet appprimeiro lugar, a portaria viola frontalmente a Constituição, viola a legislação nacional, o artigo 149 do Código Penal, e os tratadosgalera.bet appdireitos humanos ratificados pelo Brasil, sobretudo os tratados da OIT (Organização Internacional do Trabalho).

Pela legislação penal brasileira, o trabalho escravo avilta a dignidade humana. E aí que é importante ter inclusive alusão à jornada exaustiva e condições degradantes. São componentes que a nossa legislação prevê, e a portaria vai na contramão e reduz drasticamente o alcance conceitualgalera.bet apptrabalho escravo. Ou seja, o trabalho forçado só vai ser caracterizado se houver cerceamento da liberdade.

Não bastando isso, uma segunda preocupação é esvaziar a autonomia dos auditores fiscais, que têm agora que atuar acompanhado da polícia.

galera.bet app BBC Brasil - A portaria inviabiliza o combate ao trabalho escravo?

galera.bet app Piovesan - Inviabiliza. E até nesse ponto queria aplaudir e dizer que corroboro a manifestação do secretáriogalera.bet appInspeção do Trabalho do ministério (João Paulo Ferreira Machado), que tal como nós expressou agalera.bet appperplexidade. Ele pleiteia a revogação e, ao final, orienta os auditores o manter as práticas, afastando a incidência da portaria.

Queria também lembrar que o Brasil foi condenado (pela Corte Interamericanagalera.bet appDireitos Humanos) no caso da fazenda Brasil Verde. Foi o primeiro casogalera.bet appque houve condenação por afronta ao direitogalera.bet appnão ser submetido à escravidão. E, na decisão, a corte expressa a proibição absoluta e universal da escravidão.

Se há direitos humanos relativos, há dois que não são: o direito a não ser submetido à escravidão e à tortura. Nada pode flexibilizar. É absoluto, é irrevogável.

Ronaldo Nogueira
Legenda da foto, A secretaria discutiu o assunto com o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira | Foto: Marcos Corrêa/PR

E outro problema é que a nova portaria também colocagalera.bet apprisco a lista suja do trabalho escravo que é um instituto aplaudido reiteradamente pela comunidade internacional nagalera.bet appefetividade no combate ao trabalho escravo contemporâneo, porque (a portaria) determina que o nome do empregador só vai para o cadastro dos empregadores do trabalho escravo se tiver determinação expressa do ministro do Trabalho. O que é extremamente grave, inaceitável.

Ou seja, por esses argumentos todos, que rogo, faço apelo para a revogação dessa portaria, por todos esses impactos danosos, lesivos ao direito à não submissão ao trabalho escravo, que é um direito absoluto, universal.

galera.bet app BBC Brasil - Essa portaria denota uma tolerância do atual governo com a escravidão?

galera.bet app Piovesan - Eu teria cautela porque já tive um debategalera.bet appduas horas com o ministro do Trabalho, justamente porque eu defendi a publicação da lista suja, que no final foi judicializada. Então, o que eu digo é que é inaceitável e que nós temos que lutar pela revogação dessa portariagalera.bet appcarátergalera.bet appurgência, porque realmente os danos são acentuados, as violaçõesgalera.bet appdireitos são gravíssimas.

Seguramente o Ministério Público do Trabalho vai entrar na Justiça. Mas seria bem melhor que houvesse essa revogação.

galera.bet app BBC Brasil - A que a senhora atribuiria a publicação dessa portaria?

galera.bet app Piovesan - É claro que numa democracia a gente respeita o outro, e é fundamental isso, mas a nossa secretaria sempre tensionou com a posição sobretudo adotada pelo Ministério do Trabalho. As nossas divergências são expressas. E alcançaram um grau elevado na (interrupção da) publicação da lista suja. Nós tivemos uma audiênciagalera.bet appduas horas com o ministro. Então, não saberia dizer.

Acho que sempre há também um lobby forte daqueles que não querem ser responsabilizados pela escravidão contemporânea, mas isso é incompatível com o Estado Democráticogalera.bet appDireito. Nós não podemos acolher esse retrocesso.

galera.bet app BBC Brasil - Mas por que o governo cede a esses lobbies? É porque ele está alinhado com essas bancadas no Congresso? Ou por que o presidente enfrenta uma denúncia por formaçãogalera.bet appquadrilha?

galera.bet app Piovesan - A minha sugestão será solicitar uma audiência com o Ministério do Trabalho com uma força tarefa integrada pela OIT, pelo Ministério Público do Trabalho. Veja que há dissidência dentro da casa. Como eu mencionei, o secretáriogalera.bet appinspeção do trabalho elaborou essa manifestação, a qual eu corroboro.

Antesgalera.bet appresponder essa pergunta, eu teria que ouvi-lo (o ministro do Trabalho). Fico devendo essa.

galera.bet app BBC Brasil - A senhora mencionou que não foi ouvida, assim como órgãos do governo que estão diretamente ligados a essa questão. De certa forma, não fica a impressãogalera.bet appque esses órgãos do governo estão fazendo papel figurativo?

galera.bet app Piovesan - Eu acho que não. Tenho muito respeito pelo Conatrae e acho que tem exercido papel fundamental.

Nós buscamos, do outro lado, intensificar e articular políticasgalera.bet appcombate ao trabalho escravo. Com a ministra Cármen Lúcia (presidente do STF), no Conselho Nacionalgalera.bet appJustiça,galera.bet appdezembro passado, nós lançamos um pacto federativogalera.bet appprevenção e erradicação do trabalho escravo. Foi assinado por maisgalera.bet app21 gestores (estaduais) que estão criando,galera.bet appcada Estado,galera.bet appprópria Conatrae.

Então, nosso compromisso é absoluto e vamos lutar até o fim. Essa luta começou ontem, quer dizer já houve vários embates, mas creio que ontem abriu-se um novo capítulo.

galera.bet app BBC Brasil - Como avalia o trabalho do André Roston, que acabagalera.bet appser afastado do cargogalera.bet appcoordenador nacionalgalera.bet appfiscalização para erradicação do trabalho escravo?

galera.bet app Piovesan - Eu presto meu testemunho público: é um profissional extremamente qualificado, com compromisso firme com a erradicação do trabalho escravo. Quando soube, liguei imediatamente para ele e abri as portas dessa secretaria para ele inclusive.

galera.bet app BBC Brasil - O presidente acabagalera.bet appsancionar lei que transfere da Justiça comum para a militar o julgamentogalera.bet apphomicídios cometidos por militares durante operações especiaisgalera.bet appsegurança públicagalera.bet appterritório nacional, medida à qual a senhora também se opunha. A senhora, quando aceitou fazer parte do governo, disse que tinha o objetivogalera.bet appevitar retrocessos. Está conseguindo?

galera.bet app Piovesan - Como eu digo, o Estado dos direitos humanos é feito por luzes e sombras. Não é uma luta linear, é complexa, difícil, e (está sendo feita) numa das conjunturas mais desafiadoras, que é essa (atual). A única coisa que posso dizer, nesse ritualgalera.bet appsaídagalera.bet appgoverno, é que eu fiz o meu melhor. Realmente, eu não contive energia. Da minha parte, me posicionei com integridade.

Fiz o meu melhor, quase um atogalera.bet appcivismo. Como você sabe, eu não tenho vínculo com qualquer partido político que não com a causagalera.bet appdireitos humanos, e entendo que direitos humanos é uma políticagalera.bet appEstado. É por isso que estou aqui até hoje. Sem direitos humanos, não há democracia nem Estadogalera.bet appDireito, e a gente tem que lutar para evitar recuos e retrocessos.

Eu estou na luta. Acho que nosso movimento ganhou algumas batalhas importantes, perdemos outras, mas os resultados são sempre provisórios. Sou uma pessoa esperançosa. Quem está nessa luta tem sobretudo esperança.

galera.bet app BBC Brasil - Qualgalera.bet appavaliação sobre o graugalera.bet appretrocessos desse governo: nenhum, pouco ou muito?

galera.bet app Piovesan - Acho difícil usar (essas classificações) porque a conjuntura é muito complexa, temos o Congresso com a composição mais conservadora que já houve, e como acadêmica sou muito cuidadosa também com tipologias.

Mas o que deixo é meu testemunhogalera.bet appque tentei lutar até o final: forças não me faltaram e desafios não faltaram também até o final.

galera.bet app BBC Brasil - A senhora falou que ganhou algumas lutas. Quais?

galera.bet app Piovesan - Acho que nós avançamosgalera.bet appalguns tópicos. Lançamos um pacto federativogalera.bet appprevenção e combate à tortura, os Estados estão sendo fomentados a criar mecanismos e comitêsgalera.bet appcombate à tortura.

Estamos finalizando o pacto federativogalera.bet appcombate à violência LGBTfóbica. Lançamos o pacto universitário pela promoçãogalera.bet appdireitos humanos e hoje têm maisgalera.bet app300 universidades. A Capes (Coordenaçãogalera.bet appAperfeiçoamentogalera.bet appPessoalgalera.bet appNível Superior) lançou um editalgalera.bet apppesquisagalera.bet appR$ 1 milhão para fomentar pesquisa nessa área.

Fizemos campanhas pela diversidade sexual. Estamos lançando agora uma publicação importante sobre trabalho escravo, falando do impacto dessa sentença (da Corte Interamericanagalera.bet appDireitos Humanos) que condenou o Brasil, pois eu sempre vejo condenações internacionais como um convite construtivo para que o Brasil aprenda e possa avançar.

Então, da nossa parte, do nosso modo, tentamos, num período tão complexo, dar uma contribuição.