A 'maternidade' do açaí e outros saberesblaze aposta bonusribeirinhos que foram absorvidos pela pesquisablaze aposta bonusponta:blaze aposta bonus

Embrapa e comunidade
Legenda da foto, "A gente pensava muito na propriedade e nas divisões espaciais: aqui área produtiva, ali unidadeblaze aposta bonusconservação. Mas as comunidades não olham só para ablaze aposta bonuspropriedade, e sim para a paisagem como um todo", disse Alcidir Scariot, pesquisador da Embrapa | Foto: Izaque Pinheiro

"O desafio foi se despir da prepotênciablaze aposta bonusachar que o único conhecimento válido era o acadêmico. Comunidades indígenas e tradicionais detêm um conhecimento que às vezes é milenar: ele vai passandoblaze aposta bonusgeração a geração e foi construído no dia a dia, empiricamente, na observação e convivência com a natureza."

Essa postura, diz o pesquisador, norteia os trabalhos da Embrapa numblaze aposta bonusseus projetos mais amplos: o Bem Diverso, coordenado por Scariot, apoiado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente.

Iniciado há um ano e meio, o programa engloba seis territórios brasileiros com baixo IDH (Índiceblaze aposta bonusDesenvolvimento Humano): o Alto Rio Pardo (MG), o sertão do São Francisco (PE e BA), Sobral (CE), o Médio Mearim (MA), o Marajó (PA) e o Alto Acre (AC).

Segundo o pesquisador, maisblaze aposta bonuscem pessoas atuam no projeto, entre funcionários da Embrapa e parceiros locais. Em cada área a equipe escolheu espécies vegetais relevantes para as comunidades e tenta melhorar a qualidade dos produtos desde a coleta até o processamento. O objetivo é aumentar a renda das famílias e preservar os ecossistemas locais.

'A touceira é como uma mãe'

Coordenador do projeto no Marajó, o pesquisador da Embrapa Silas Mochiutti trabalha com produtoresblaze aposta bonusaçaí, principal fonteblaze aposta bonusrendablaze aposta bonusribeirinhos da região. Mochiutti pesquisa a atividade há décadas, comparando diferentes métodosblaze aposta bonusmanejo. "É difícil separar o que levamos a eles do que aprendemos com eles. Muitas informações vêm da vivência dos produtores,blaze aposta bonuscoisas que vimos que davam certo", afirma.

Comunidade e Embrapa
Legenda da foto, Plantioblaze aposta bonusmudablaze aposta bonusaçaí durante oficinablaze aposta bonusmanejoblaze aposta bonusaçaizais nativos. Foto: ©Andreza Andrade/Bem Diverso

Uma das técnicas incorporadas pela empresa envolve a reprodução dos açaizeiros. Mochiutti diz ter ouvidoblaze aposta bonusmuitos ribeirinhos que, ao cortar um açaizeiro para que ele rebrote, deve-se extirpá-lo rente ao solo, caso contrário a árvore não renasce.

Presidenteblaze aposta bonusuma cooperativablaze aposta bonusprodutoresblaze aposta bonusaçaíblaze aposta bonusAfuá (PA), Francisco Nazaréblaze aposta bonusAlmeida explica à BBC Brasil o porquê da prática. "A touceira [conjuntoblaze aposta bonuspalmeiras originadasblaze aposta bonusum caule principal] é como uma mãe: enquanto ela tem um filho mamando, não consegue gerar outro. Então tem que cortar bem baixinho para que esse filho vá embora, os nutrientes do tronco possam descer e a touceira brote outra vez."

Outra técnica absorvida pela Embrapa trata do transporteblaze aposta bonusmudasblaze aposta bonusaçaí. O ribeirinho diz que só podem ser deslocadas mudas que estejam com as folhas dobradas. "A gente diz que essa muda está com o olho fechado - é como se ela estivesse dormindo na hora da mudança. Se a gente transporta uma mudablaze aposta bonusolho aberto, ela não pega."

Silas Mochiutti diz que as duas técnicas jamais foram testadasblaze aposta bonuslaboratório, mas passaram a ser difundidas por causa do sucesso verificado pelos produtores. "Às vezes são fenômenos quase inexplicáveis, mas que na prática dão resultado."

O pesquisador diz que um ponto central do modelo proposto aos ribeirinhos é a combinação entre açaizeiros e outras espéciesblaze aposta bonusárvores. Ele afirma que, conforme o preço do açaí subiu nos últimos anos, muitos ribeirinhos começaram a derrubar a mata nativa para ampliar as áreasblaze aposta bonusprodução.

Mas Mochiutti diz que a estratégia não funciona. Segundo ele, é importante manter outras espécies porque essas árvores servemblaze aposta bonusabrigo a abelhas que polinizam os açaizeiros, ajudam a fixar nutrientes no solo e protegem as palmeirasblaze aposta bonusdoenças. Ele diz queblaze aposta bonusáreas que mesclam árvores nativas e açaizeiros, a produçãoblaze aposta bonusaçaí chega a cem sacas por hectare, enquanto oscila entre 20 e 30 sacasblaze aposta bonusáreas pouco diversas.

Mudanças climáticas

Presidente da Embrapa, Maurício Antônio Lopes diz à BBC Brasil que pressões para que a agropecuária brasileira reduza a emissãoblaze aposta bonusgases causadores do efeito estufa têm estimulado a pesquisablaze aposta bonustécnicas que conciliam preservação e produção. "O Brasil é hoje o país com a política pública mais bem estruturadablaze aposta bonusagriculturablaze aposta bonusbaixo carbono, que depende inteiramenteblaze aposta bonustecnologias desenvolvidas por nós", ele afirma.

Extrativistablaze aposta bonusaçaíblaze aposta bonusAfuá
Legenda da foto, Extrativistablaze aposta bonusaçaíblaze aposta bonusAfuá, Marajó. Foto: ©Andreza Andrade/Bem Diverso

Entre as técnicas já disponíveis, Lopes destaca o modelo lavoura-pecuária-floresta (que combina criaçãoblaze aposta bonusgado, cultivo agrícola e florestas plantadas), a fixação biológicablaze aposta bonusnitrogênio (que reduz a necessidadeblaze aposta bonusfertilizantes no plantio da soja) e o plantio direto na palha (que diminui a erosão e amplia a absorçãoblaze aposta bonuságua pelo solo).

O presidente da Embrapa diz que pesquisas com comunidades tradicionais e produtos nativos são outro elemento importante da estratégia da empresa frente às mudanças climáticas. Além das atividades do programa Bem Diverso, há pesquisasblaze aposta bonuscurso sobre o controleblaze aposta bonuspragasblaze aposta bonuscupuaçuzeiros, o desenvolvimentoblaze aposta bonusvariedadesblaze aposta bonusaçaí, técnicasblaze aposta bonusmanejo do umbu, o uso da permacultura e práticas agroflorestais, entre outras.

Um dos projetos mais bem sucedidos da Embrapa nesse campo, segundo Lopes, foi o resgateblaze aposta bonusum maracujá nativo do Cerrado, mais doce e menos azedo que os tipos mais comuns.

"Era uma planta daninha que, uns 20 anos atrás, crescia aí pelos matos", ele diz. Pesquisadores estudaram a planta e fizeram vários cruzamentos até chegar à versão final, batizadablaze aposta bonusPérola do Cerrado. "Hoje é uma alternativa econômica fanstástica para produtores da região", afirma. Segundo Lopes, a fruta causou frisson entre chefs estrangeiros que visitaram recentemente a Embrapa.

'Sabedoriablaze aposta bonusfaculdade'

No Alto Rio Pardo, a Embrapa distribuiu sementes do novo maracujá a comunidades geraizeiras, populações tradicionais que vivem no Cerrado do norte mineiro. Membro da comunidadeblaze aposta bonusÁgua Boa, a geraizeira Maria Neuracyblaze aposta bonusFá diz que o Pérola do Cerrado se adaptou bem às roças locais e virou fonteblaze aposta bonusrenda para o grupo.

Ela elogia a convivência com os pesquisadores. "A gente trabalha e colhe os frutos no Cerrado, e eles vêm com a sabedoria delesblaze aposta bonusfaculdade. É uma trocablaze aposta bonusexperiência."

A geraizeira diz que um dos pontos mais úteis do programa é o apoio ao intercâmbio com outras comunidades tradicionais. Na quinta-feira, ela viajou para Diamantina (MG) para aprender com moradores locais como fazer cosméticos a partirblaze aposta bonusfrutos e plantas medicinais.

Mas nem todas as comunidades geraizeiras sentiram os efeitos do trabalho. Representante do grupo na comissãoblaze aposta bonuspovos tradicionais do governoblaze aposta bonusMinas, Orlando dos Santos disse desconhecer os trabalhos da Embrapa na região do Alto Rio Pardo, que engloba 22 municípios.

Embrapa e comunidade
Legenda da foto, Segundo Scariot, um dos objetivos do programa é "empoderar as comunidades locais e contribuir para a reorganização do território, conservando as nascentes e tornando-as mais resilientes às mudanças climáticas" | Foto: ©Acervo Bem Diverso

Para ele, a atuação da empresa é bem-vinda, já que autoridades locais dão pouca atenção aos geraizeiros. "Os políticos daqui não aprovam a ideiablaze aposta bonuscomunidades tradicionais, porque nós mexemos com os interesses dos latifundiários." Santos diz que a principal bandeira dos geraizeiros é conter a monocultura do eucalipto, que avança sobre o Cerrado e destrói nascentes.

Aldicir Scariot, da Embrapa, também diz se preocupar com a atividade. Segundo ele, um dos objetivos do programa é "empoderar as comunidades locais e contribuir para a reorganização do território, conservando as nascentes e tornando-as mais resilientes às mudanças climáticas".

Para Isabel Figueiredo, coordenadora do Instituto Sociedade, População e Natureza, ONG que atua com várias comunidades tradicionais brasileiras, os trabalhos da Embrapa nesse campo "ainda são muito tímidos" se comparados ao que a empresa investeblaze aposta bonuscommodities ou outros setores.

Segundo Figueiredo, os pesquisadores da Embrapa que lidam com comunidades tradicionais, conservação e desenvolvimento sustentável são minoritários.

Mas ela diz que a Embrapa "pode fazer a diferença se entrar para valer nessa agenda"."O pouco que já existe vem gerando resultados relevantes, mas ainda é uma turma que atua ali dentro numa espécieblaze aposta bonusresistência", afirma.