'Sinto saudadebet 013 apostasser criança':bet 013 apostasuma década, gravidezbet 013 apostasmeninasbet 013 apostas10 a 14 anos não diminui no Brasil:bet 013 apostas

Crédito, BBC Brasil

Legenda da foto, Maria, que engravidou aos 13 anos: 'Quando entendi que estava grávida, senti muito nervosismo. Pensei: não vou ser mais criança, agora eu vou cuidarbet 013 apostasoutra criança'

Sente saudadebet 013 apostasser criança? "Sinto. Eu jogava bola na rua, bolabet 013 apostasgude". E agora? "Não…. Ficobet 013 apostascasa e vou à igreja", diz, enquanto revê na televisão o filme Esquecerambet 013 apostasMim 3.

Aos 15 anos, dois anos após o ter o primeiro filho, ela sofreu um aborto, e agora, aos 16, acababet 013 apostasdar à luz uma menina, que mamabet 013 apostasseus braços. Depois do último parto, quis fazer uma laqueadura, mas o procedimento não é permitido para mulheres tão jovens.

Hoje, cria os filhos sozinha. O pai da primeira criança morreu assassinado. O da recém-nascida,bet 013 apostas23 anos, morabet 013 apostasuma comunidade afastada do centrobet 013 apostasAutazes e só soube que seria pai quando a gravidez estava no sexto mês. Os dois já não estão juntos - Maria diz que ele ajuda a comprar fraldas ou talco, mas não costuma cuidar da filha. "O que pedir, ele dá, mas tem medobet 013 apostaspegar porque ela é muito pequenininha".

Maria - cujo nome verdadeiro foi preservado para não expô-la, assim como o das demais entrevistadas - é uma das quase 305 mil brasileirasbet 013 apostas10 a 14 anos que tiveram filhos entre 2005 e 2015, segundo o Datasus (bancobet 013 apostasdados do Ministério da Saúde), que reúne os registrosbet 013 apostasmaternidades e cartórios.

Os números mostram que a gravidez entre meninas dessa idade ocorrebet 013 apostastodo o país, principalmente nas áreas mais pobres, alcançando os piores índices na região Norte. O mais grave é que a taxabet 013 apostasfecundidade entre garotas nessa faixa etária não tem caído, ao contrário da tendência geral do país,bet 013 apostasque se observa queda nos nascimentos tanto entre adolescentes (mulheresbet 013 apostas15 a 19 anos), quanto entre adultas (a partirbet 013 apostas20 anos).

Com a ajuda da demógrafa Suzana Cavenaghi, a BBC Brasil calculou que o númerobet 013 apostasnascidos vivos a cada mil mulheres entre 15 e 49 anos caiubet 013 apostas58,9 bebêsbet 013 apostas2005 para 53,6bet 013 apostas2015. Enquanto isso, a taxa para meninas entre 10 e 14 anos ficoubet 013 apostas3,2 bebês nos mesmos anos.

Não há um bancobet 013 apostasdados que permita ampla comparação internacional para gravidez entre meninas dessa idade. No caso dos Estados Unidos, por exemplo, a gestação nesse grupo etário é bem mais baixa e estábet 013 apostascontínua queda: segundo o relatório mais recente do Departamentobet 013 apostasSaúde americano, a taxabet 013 apostasnascimentos por mil garotasbet 013 apostas10 a 14 anos caiubet 013 apostas0,6bet 013 apostas2007 para 0,2bet 013 apostas2015. Em 1991, erabet 013 apostas1,4.

Retrocesso na educação sexual

Ouvidos pela BBC Brasil, especialistas das áreasbet 013 apostassaúde, educação e direito que acompanham o tema apontam para diversos fatores que podem explicar a persistência desse quadro, com destaque para a faltabet 013 apostasorientação sexualbet 013 apostascasa e nas escolas.

Crédito, BBC Brasil

Legenda da foto, Grávida aos 14 anosbet 013 apostasuma comunidade pobre amazonense, Lúcia sofreu represálias na escola e na igreja

Segundo a Unesco, o ensino sobre os temas sexualidade e prevenção à gravidez sofreu enorme retrocesso no Brasil desde 2011, quando a polêmica envolvendo o material educativo Escola sem Homofobia (que ficou tachadobet 013 apostas"kit gay") acabou levando ao recolhimentobet 013 apostastodo o suporte didático para educação sexual, que era distribuído desde 2003 para crianças a partir dos 12 anos, no âmbito do Programa Saúde na Escola.

"Hoje, nessa faixa etáriabet 013 apostas10 a 14, nada tem sido feito no campo das políticas públicasbet 013 apostaseducação e sexualidade. Não existe uma diretriz nacional. Isso acaba virando um tabu e, como consequência, temos as crianças engravidando", critica Rebeca Otero, coordenadorabet 013 apostasEducação da Unesco no Brasil.

Para o órgão da ONU, a educação sobre sexualidade e gênero deve começar desde os cinco anos, para meninas e meninos. Isso nunca foi implementado no Brasil, diz Otero.

"A orientação da Unesco é que os assuntos sejam adaptados a cada faixa etária: o conhecimento do corpo, por que sente o desejo, o que é abuso sexual. Tendo essa informação, a criança vai saber como se protegerbet 013 apostasuma gravidez, como postergarbet 013 apostasvida sexual, caso queira".

Sem orientação, as meninasbet 013 apostasmenor renda são as mais vulneráveis, nota Maria Helena Vilela, diretora do Instituto Kaplan, especializadobet 013 apostassexualidade.

"Muitas vezes, nas casas mais pobres, a família inteira é obrigada a viver num mesmo ambiente. Então, pais fazem sexo e elas não só assistem, como passa a ser algo muito natural ainda cedo", observa.

"E hoje há também muito mais mães e pais separados,bet 013 apostasbuscabet 013 apostasnovos parceiros. Essas meninas convivembet 013 apostasambiente muito mais sensualizado do que antigamente, também pela mídia, músicas, televisão, internet. Mas, ao mesmo tempobet 013 apostasque vivem num mundo social com muita liberdade, há um despreparo da escola, da família, para encarar que elas já podem ser sexualmente ativas. Elas ficam vulneráveis pela ignorância", afirma.

Crédito, BBC Brasil

Legenda da foto, Especialistas acreditam que violência sexual e tolerância com relações supostamente consentidas entre adultos e menoresbet 013 apostasidade estão por trás da maioria dos casosbet 013 apostasgravidez na pré-adolescência

'Já vai abrindo as pernas'

E se a escola e a sociedade não educam para evitar a gravidez,bet 013 apostasgeral também não estão preparadas para acolher as meninas gestantes, ressalta Otero.

Grávida aos 14 anosbet 013 apostasum namoradobet 013 apostas19bet 013 apostasuma comunidade pobrebet 013 apostasAutazes, Lúcia sofreu represálias na escola e na igreja evangélica. "Já vai abrindo as pernas, depois fica sem condição", disse ter ouvidobet 013 apostasum professor.

Ela não queria um filho, mas, religiosa, nem cogitou o aborto. "Sabia que era uma vida, não podia matar."

A filha nasceu há um mês e agora ela só pode ir à igreja se ficar isolada. Foi excluída do grupobet 013 apostasjovens,bet 013 apostasque participava do coral,bet 013 apostasprincipal distração. O pastor quer que ela case com o pai da criança "para voltar à comunhão e participar do grupobet 013 apostassenhoras".

"Eu não sou senhora. Tenho que ter responsabilidade por causa dela, mas não tenho que ser senhora. Me senti abandonada, senti revolta", contou.

Lúcia sente saudade do seu corpo. Os seios ficaram bem maiores, a barriga ganhou estrias. Está traumatizada com a gravidez e diz que não quer mais ter filhos. O processobet 013 apostasparto foi difícil, com duas hemorragias, e acaboubet 013 apostascesárea. "Achei que tinha morrido. Minha vista escureceu, perdi o movimento do corpo. Dorbet 013 apostasparto vai quebrando tudo dentro da gente", relembra.

Lúcia decidiu ter uma segunda chance na vida: vai se mudar no próximo ano para Presidente Figueiredo, outra cidade do Amazonas, onde terá o suportebet 013 apostasuma tia. A filha vai ficar com a mãebet 013 apostasLúciabet 013 apostasAutazes - ela, que também teve o primeiro filho aos 14 e foi obrigada ao matrimônio, apoia a decisão da menina.

"Casamento cedo tira a liberdade. Eu vou sentir saudades da minha filha, mas lá a escola é melhor. Quero ser arquiteta, pegar ela quando eu tiver faculdade e condiçãobet 013 apostascriar", planeja Lúcia.

Abusos por trás da gravidez

Especialistas no tema acreditam também que a violência sexual e a tolerância com relações supostamente consentidas entre adultos e menoresbet 013 apostasidade estão por trás da maioria dos casosbet 013 apostasgravidez na pré-adolescência.

"Nem todos os casos nessa faixa são resultadobet 013 apostasestupro, mas o que vemos muitas vezes são meninas que sofrem abusos sexuais durante a infância e isso acaba estimulandobet 013 apostassexualidade, levando essas meninas a namorarem mais cedo, o que acaba desembocando nessa gravidez", afirma Ana Carolina Araújo, conselheira tutelarbet 013 apostasCeilândia, cidade satélitebet 013 apostasBrasília.

A polícia do Distrito Federal registrou 832 estuprosbet 013 apostasvulneráveis (menoresbet 013 apostas14 anos)bet 013 apostas2016, mas Araújo acredita que a maioria dos casos não chega a ser denunciada. Essa é a mesma impressão da delegada Juliana Tuma, titular da única Delegacia Especializadabet 013 apostasProteção a Criança e ao Adolescentebet 013 apostasManaus. Ela diz que chegam para ser investigados por dia,bet 013 apostasmédia,bet 013 apostasseis a sete suspeitasbet 013 apostasestuprosbet 013 apostasvulneráveis.

No Amazonas, a quantidadebet 013 apostasnascidos vivosbet 013 apostasmãesbet 013 apostas10 a 14 anos cresceu 40% desde 2005 (maior alta entre os Estados), chegando a 1.432bet 013 apostas2015.

Para o promotorbet 013 apostasAutazes, Cláudio Sampaio, que já atuou tambémbet 013 apostasoutras cidades do Estado, a redução do problema virá "somente com projetos sociais, um debate maior da própria sociedade, que seja incentivado por órgãos públicos ou por igrejas, pra poder fortalecer o respeito à sexualidade da mulher e o respeito à criança".

"Aqui no Norte, vejo uma cultura, digo no sentidobet 013 apostashábitos que estão enraizados na sociedade,bet 013 apostasaceitação das relações sexuais entre crianças e adultos. Isso é considerado normal, infelizmente, e acontece até no próprio núcleo familiar, com padrastos, com irmãos, com tios", afirma.

Mas essa solução proposta pelo promotor esbarrabet 013 apostasoutro problema que ele próprio identifica: a "ausência do poder público"bet 013 apostasuma região distante do restante do país,bet 013 apostasgrande extensão e com enormes desafios logísticos devido à floresta.

Ele ressalta a necessidadebet 013 apostasmaior presença do governo federal, já que é comum autoridades locais estarem envolvidasbet 013 apostasabusos. O caso mais famoso é obet 013 apostasCoari, cujo ex-prefeito Adail Pinheiro chegou a ser condenado a 11 anos e 10 mesesbet 013 apostasprisão por exploração sexual infantil, mas esse ano recebeu indulto (perdão) da pena e foi solto.

"O governo federal precisa cuidar das pessoas daqui, e isso não é propriamente dar dinheiro, dar um Bolsa Floresta. É preciso que o poder público venha e capacite as pessoas, para que possam desempenhar profissões, para que entendam a necessidadebet 013 apostasrespeito às mulheres", cobra.

As três garotas com quem a BBC Brasil conversou no Amazonas relataram ter sofrido algum tipobet 013 apostasabuso sexual durante suas vidas, casos que seguem sem punição. Maria foi estuprada por um comerciante aos 13, quando já estava grávida. Lúcia teve a coxa acariciada por um funcionário do postobet 013 apostassaúde aos 12 - ele depois estuprou a irmã dela, que tinha 14.

Em Manaus, Joana, hoje com 17 anos e mãebet 013 apostasdois filhos, contou que sofreu seu primeiro abuso aos 5. O estuprador foi um vizinho, que pagou R$ 50 abet 013 apostasmãe, viciadabet 013 apostasdrogas. Com muito sangramento, foi parar num hospital. "Meu útero saiu do lugar, até hoje sinto dores por isso". Nada aconteceu com ele, que a abusou novamente cinco anos depois, dessa vez por R$ 100.

Joana saiubet 013 apostascasa para um abrigo depoisbet 013 apostasse cortar "todinha com uma gilete". Passou por vários. "Depois do meu segundo estupro, com 11 anos, comecei a ser putinha", conta. Sua primeira gravidez, aos 13 anos, foi interrompida com quatro comprimidosbet 013 apostasum remédio abortivo. Na segunda, aos 14, decidiu ter o filho. O pai era seu namorado, então com 21 anos, homem que a explorava sexualmente e a induzia a se drogar junto combet 013 apostasmãe.

Crédito, BBC Brasil

Legenda da foto, Nascimento do primeiro filho deu a Joana chancebet 013 apostasser atendida por serviçobet 013 apostasapoio a vítimasbet 013 apostasviolência sexual

"Passei duas semanas pensando com Deus se abortava. Pensei: vai atrapalhar minha vida, vai acabar minha vidabet 013 apostasputa."

A gravidez na pré-adolescênciabet 013 apostasgeral traz efeitos negativos para as meninas e seus bebês: estudos mostram maior incidênciabet 013 apostasevasão escolar,bet 013 apostasdepressão pós-parto ebet 013 apostasnascimentosbet 013 apostasbebês prematuros e com baixo peso.

Entre elas, o acompanhamento pré-natal e a amamentação costumam durar menos tempo do que entre as mães adultas. São consequências da pouca maturidade e das condições sociais precárias.

No casobet 013 apostasJoana, a gravidez acabou tendo impacto positivo. O acompanhamento pré-natal a levou ao Serviçobet 013 apostasAtendimento às Vítimasbet 013 apostasViolência Sexualbet 013 apostasManaus, onde recebeu apoio psicológico e conseguiu interromper a venda do seu corpo e, gradualmente, o usobet 013 apostasdrogas.

Hoje ela está casada e tem uma boa relação com o paibet 013 apostassua segunda filha,bet 013 apostassete meses. Ele tem 21 anos e trabalha com manutençãobet 013 apostasar-condicionado - item onipresente na fervente Manaus.

"Depois que meus filhos nasceram, veio um amor muito grande. Eu quis deixar a vida velha pra lá. Mas às vezes eu choro, quando meus filhos estão dormindo. Fica um reflexo (lembrança) na minha cabeça. Eu fico lendo a Bíblia, fico lendo, fico lendo, e só assim eu acalmo. Se eu for começar a pensar, eu fico doida", diz ela, que é evangélica.

"Eu tenho muito sonhobet 013 apostasque mato ele (o abusador, que segue morando no bairro da infânciabet 013 apostasJoana). Eu quero matar ele, mas se eu for pra cadeia, o que vai ser dos meus filhos? Eu penso muito nisso."

A BBC Brasil questionou os ministérios da Educação e Saúde sobre as críticas quanto à faltabet 013 apostaspolíticas públicas para enfrentar a gravidezbet 013 apostasgarotas e saber o que o governo pretende fazer para enfrentar o problema. A pasta da Educação não se manifestou. Já a pasta da Saúde se limitou a comentar as causas do problema e minimizarbet 013 apostasgravidade, destacando que os nascimentos nesse grupo representam 0,9% do totalbet 013 apostasnascidos vivos no país.

"A leve tendênciabet 013 apostasaumento, (da gravidez) na faixabet 013 apostas10 a 14 anos, pode estar associada a vários fatores tais como violência sexual, aspectos culturais, iniquidades, faltabet 013 apostasoportunidades, dentre outros; além disso, esse é um percentual muito pequeno, quando considerada todas as faixas etárias", respondeu o ministério.