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Lima Barreto é bom remédio para nossa enxaqueca republicana e democrática, diz Lilia Schwarcz:betsul roupas
Veja a seguir os principais trechos da conversa com a historiadora.
betsul roupas BBC Brasil - A biografiabetsul roupasLima Barreto sucede seu livro betsul roupas Brasil: Uma Biografia betsul roupas . As duas obras têm algobetsul roupascomum?
betsul roupas Lilia Schwarcz - Sim. Lima Barreto teve uma biografia fundamental,betsul roupasFranciscobetsul roupasAssis Barbosa,betsul roupas1951. Mas eu queria outro Lima - que era vítima sim, mas que tinha protagonismo. E eu queria inquirir o tema racial e a questãobetsul roupasgênero - essas são questões da nossa geração, e não podia cobrar isso do Franciscobetsul roupasAssis. Minha geração é que tem convivido com as questões dos direitos civis, das diferenças.
Eu lia Lima Barreto havia muito tempo, já identificava isso e é uma história do Brasil, é uma certa história do Brasil. Quando eu fiz o Brasil: Uma Biografia, muito influenciada pela pesquisa, a gente dizia que um dos pilares da história do Brasil é a questão racial, que ainda é uma grande invisibilidade hoje no Brasil.
Para você ter uma ideia, quando eu lancei Brasil: Uma Biografia, não poucos jornalistas me falavam "poxa vida, nunca tinha pensado na história do Brasil sobre esse ângulo". E foi o último país a abolir a escravidão, recebemos 45% dos africanos que foram forçados a sair do seu território, então é um espanto. Eu quero contar a história do Brasil a partir da janelabetsul roupasLima Barreto.
betsul roupas BBC Brasil - Alémbetsul roupasser atual pela questão do gênero,betsul roupasraça, há na obra dele uma decepção com os políticos, presente atualmente também. Como aborda isso?
betsul roupas Schwarcz - Eu começo o livro com uma citação que diz que "O Brasil é uma grande comilança - comem os políticos, os jornalistas, comem os juristas". Você lê aquilo e a sensação que te dá é um dèjá vu. Ela cobre a corrupção da República, cobre o mau uso da res pública a partirbetsul roupasinteresses privados. E faz uma crítica feroz aos políticos, chega a dizer "à República do Brasil falta dignidade".
Então ele cobra um Brasil mais inclusivo, mais justo, mais igualitário - problemas que estamos vivendo até hoje. São temas que ele viveu no pós-abolição e que vivemos ainda nessa mesma República falhada que padece com os problemasbetsul roupascorrupção, mas não só disso:betsul roupasracismo, homofobia. São questões que estão na pautabetsul roupasLima Barreto, e que estão na nossa agenda.
betsul roupas BBC Brasil - E ele faz isso com um humor ácido...
betsul roupas Schwarcz - A gente tem esse jeito tão brasileirobetsul roupasrir da desgraça. Me lembro do 7 a 1 da Alemanha contra o Brasil. Assim que o jogo terminou comecei a receber mensagens tirando sarro disso, e o Lima tem um pouco disso - muito crítico, muito mordaz, mas ao mesmo tempo muito bem humorado.
As histórias dele sobre o funcionalismo público sãobetsul roupasmatarbetsul roupasdar risada - ele diz que "você mede a qualidadebetsul roupasum bom funcionário público pela quantidadebetsul roupasvezes que ele abre as gavetas, ou que ele aponta o lápis". E ele tá lá, é funcionário público.
É uma blague que tem a ver com esse modernismo carioca, que durante muito tempo ficou fora da agenda, fora do compasso dos modernismos, e que era um modernismo boêmio e bem humorado.
Era críticobetsul roupasidealizações do país, era uma literatura crítica,betsul roupascontestação. E ele faz uma crítica aos estrangeirismos. E teve uma recepção desastrosa na época, como você pode imaginar.
betsul roupas BBC Brasil - Desastrosa porque era crítica às elites ou porque já era racialmente engajada?
betsul roupas Schwarcz - Quando eu digo que Lima Barreto merece mais do que (ser) a vítima, é porque ele tinha um projeto literário,betsul roupasinserção. E fazer uma literatura negra, afrodescendente, era grave nessa época. Porque era um tema entre muitas aspas, as pessoas achavam desagradável, era melhor não falar disso.
E a gente sabe que naquela época, quem fazia sucesso, virava branco. Tanto nas fotos como na cor. Temos cor social.
No próprio manicômio, ele foi internado como branco e, depois, como pardo. Essa é a régua da cor no Brasil. Eu tentei provar no livro que ele trazia esse tema, ele descreve a cor dos personagensbetsul roupasuma forma minuciosa, ele próprio se chamavabetsul roupasazeitona escura.
Para você ter um autor que diz que negro é a cor mais cortante no Brasil - não tem ingenuidade nisso. Ninguém queria falar desse tema.
betsul roupas BBC Brasil - Lima ajudou a impulsionar uma literatura afrodescendente?
betsul roupas Schwarcz - Ele morreubetsul roupas1922, aos 41 anos e com a obra muito silenciada. Depois da Nigéria, o Brasil é o maior paísbetsul roupaspopulação negra e africana e somente agora começam a aparecer expoentes da literatura negra, afrodescendente.
E eu não chamobetsul roupasliteratura negra quem nasceu negro, não é uma questãobetsul roupasorigem, é uma opção - no Lima Barreto é um projeto literário.
E agora sim, para esse tipobetsul roupasliteratura, Lima Barreto é sempre lembrado e vai continuar a ser lembrado. E ele nunca esteve tão atual.
betsul roupas BBC Brasil - E pode ser inspirador para esse momentobetsul roupasapatia?
betsul roupas Schwarcz - Lima Barreto é um bom autor para a gente pensar as nossas falácias da democracia e da República. Ele vivia acusando as nossas instituições - a gente anda dizendo que as nossas instituições estão fortes, eu não vejo como. É só um ritual vazio que anda forte, e não as instituições.
E ele falava mal do presidente, do deputado, ele é crítico dos discursos vazios. Ele é um bom remédio para nos curar da nossa enxaqueca republicana e democrática. É um autor que provoca, que não estabiliza.
Exatamente depois das manifestações, dos panelaços, a gente entroubetsul roupasum períodobetsul roupasapatia. E o período pedebetsul roupasnós - como diria o poeta - vigilância. E não apatia. E Lima Barreto era muito vigilante, e incômodo nabetsul roupasvigilância. Ele é bom para nós neste momento.
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