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De herdeiroTancredo e quase presidente a denunciado na Lava Jato: a históriaAécio:
Em depoimentosua delação premiada homologada pelo STF, Joesley Batista, dono da JBS, disse que pagou R$ 2 milhõespropina ao senador tucano no começo deste ano. O dinheiro teria sido entregue a um primoAécio, Frederico PachecoMedeiros, preso no último dia 18.
A operação também deteve Andrea Neves, irmã do senador - ela também é suspeitater participado da negociação do que a PGR afirma ser propina.
A entrega do dinheiro foi registradavídeo pela Polícia Federal, que rastreou o caminho do dinheiro e descobriu que parte do montante foi depositado na contauma empresa do senador Zezé Perrella (PMDB-MG).
Aécio nega as acusações e afirma jamais ter recebido propina. Diz que pediu um empréstimo, ser vítimacalúnia e lamenta ter visto a irmã detida "sem que nada justificasse tamanha arbitrariedade".
O nome do senador já havia sido citadodelaçõesempreiteiras, entre elas a Odebrecht, o que lhe fez virar alvoinquéritos. Mas foram as acusações da JBS que o deixam agora sob o riscovirar réu - o que ocorrerá caso o ministro Marco Aurélio Mello, relatorseu caso no STF, aceite a denúncia apresentada por Janot.
Essa decisão não tem data para ocorrer.
Herança e futebol
Desde que a denúncia da JBS veio à público, Aécio tem sido chamado nos bastidores"cadáver político".
Aliados mais próximos, entre eles tucanos mineiros, classificam sob a condiçãoanonimato como "graves demais" as suspeitas que pesam contra o amigo e companheiropartido.
Ainda assim,Brasília poucos verbalizam a necessidadeuma punição para o senador. Apenas a Rede e PSOL defendem abertamente a cassação do mandato dele.
Ninguém arrisca dizer, contudo, se esse é o fimuma carreira herdada do pai Aécio Cunha, que foi deputado federal e estadual, e dos dois avôs, Tancredo Neves, ex-governadorMinas e eleito presidente do Brasil (morreu antes da posse), e Tristão da Cunha, que passou pelo Congresso e participou do governoJuscelino Kubitschek nos anos 1950.
Com tantos homens públicos na família, ele e as duas irmãs respiram política desde cedo. Tinham o costumebrincar com santinhos dos parentes confeccionados para eleições quando criança.
Aécio da Cunha Neves nasceu10março1960,Belo Horizonte. Viveu na capital mineira até os 12 anos, quando a família se mudou para o RioJaneiro.
O jornalista Maurício Cannone foi colegasala do tucano na oitava série,meados dos anos 1970, num colégio que não existe mais no Leblon, bairro nobre da zona sul da cidades.
"Não era dos mais brilhantes, mas não era mau aluno. Se dava bem com todo mundo", recorda Cannone, que costumava trombar com Aécio no Maracanã.
Cannone conta que o senador, torcedor declarado do Cruzeiro e do Botafogo, sempre foi fãfutebol. "O pai dele era diretor do CruzeiroBelo Horizonte, e me lembro dele contando que foi ao enterro do Roberto Batata, o ponta direita", diz o jornalista.
Aécio não era bombola, mas, quando jogava futebol, usava uma camisa do zagueiro cruzeirense Darci Menezes. Naquela época, Política não era assunto recorrente.
"Era 1975, ditadura militar. Política não era estimulada. Eu nem sabia que ele era netoTancredo Neves", lembra Cannone.
Aécio, o hoje jornalista e muitos outros alunos do Magdalena Campos foram continuar os estudosoutros colégios. Os dois nunca mais estiveram na mesma sala, e acabaram perdendo o contato.
"Uma vez encontrei ele na rua, olhei e ele não me reconheceu. Deixei pra lá", conta.
De ajudante do avô a deputado federal
Aécio foi estudar economia na PUC-Rio, mas nunca foi militante estudantil. Alémfutebol, gostava mesmo erasurfar,corridasmotocross eviajar. Morava num apartamento na badalada avenida Vieira Souto, na zona sul, e a praiaIpanema era como a extensãosua casa. Desde então, ganhou a fama"bon vivant", namorador e amante da noite carioca.
O jornalista mineiro Lucas Figueiredo contaseu blog que, enquanto Aécio ainda pegava ondas e não demonstrava muito interesse pela política, a irmã dele, pouco maisum ano mais velha, vivia o oposto.
Andrea militava pela esquerda e havia, por exemplo, ajudado a fundar o PT no Rio.
Mas foi Aécio, e não Andrea, quem Tancredo Neves escolheu para acompanhá-lo a partir1981. Ele foi chamado a conhecerterra natal como secretário particular do avôBelo Horizonte. Transferiu-se para a PUC-Minas e, enquanto estudava economia, ajudava o então senador e, depois, governador.
Antes disso, quando tinha 19 anos, Aécio havia sido nomeado para trabalhar como secretário parlamentar no gabinete do pai na Câmara dos Deputados,Brasília. Mas cuidava da agenda do pai do Rio mesmo, fato que causaria polêmica mais30 anos depois, na eleição2014 - ele negou qualquer irregularidade, dizendo que à época funcionários comissionados não eram obrigados a trabalhar na capital federal.
O jovem participou das campanhas vitoriosasTancredo a governadorMinas e a presidente do Brasil. De ajudante do avô, tornou-se militante das Diretas Já (1983-1984). Assumia a política como missão.
Com a morteTancredo,21abril1985, acabou nomeado por José Sarney, que na condiçãovice assumiu o comando do país, como diretorLoterias da Caixa Econômica Federal. Ficou no cargo um ano e saiu para disputar pela primeira vez uma eleição.
Em 1986, foi eleito deputado federal pelo PMDB. Depois migrou para um novo partido: o PSDB.
'Pacote ético'
Aécio se elegeu deputado por quatro mandatos consecutivos e conquistou projeção nacional. Tornou-se líder do PSDB e,2001, conseguiu vencer a disputa pela Presidência da Câmara desafiando o PFL (atual DEM) - à época principal aliado do então presidente Fernando Henrique Cardoso.
À frente da Casa, emplacou o que chamou"pacote ético", com medidas como a criação do ConselhoÉtica da Câmara - agora, diante das acusações que pesam contra ele, pode ser alvo do órgão homólogo no Senado.
Mas depois16 anos no Legislativo, ainda faltava no currículo um cargo no Executivo.
Em 1992, já filiado ao PSDB, Aécio havia disputado sem sucesso a PrefeituraBelo Horizonte - terminouterceiro lugar. Dez anos depois, porém, liquidou a disputa ainda no primeiro turno e foi eleito para um cargo ainda maior: ogovernadorMinas Gerais. Contou com o apoio do então governador mineiro Itamar Franco, apesar das divergências do ex-presidente com FHC e o PSDB.
"Naquela eleição, ele já inventou o 'Lulécio'. Apesaro PSDB ter José Serra como candidato,Minas ele não atacou Lula", conta o deputado estadualMinas, Rogério Correia (PT), um dos maiores opositores que Aécio encontrou no Estado.
Correia conta que já fazia oposição ao PSDB desde o início dos anos 1990. Durante o governo Aécio (2003-2010), fez denúncias contra Aécio e seu grupo. "Mas essa da JBS eu não sabia", diz.
O deputado trouxe a público, por exemplo, denúnciascorrupção como o mensalão do PSDB, que teria usado agênciaspublicidade ligadas ao empresário Marcos Valério, que anos depois seria o operador do mensalão do PT, para superfaturar contratos e desviar recursos públicosmeados dos anos 1990 durante gestão do governador tucano Eduardo Azeredo.
Outro exemplo foi a chamada ListaFurnas, que teria usado verba da estatal para pagar propina a tucanos, e repassespublicidade a emissorasrádio sob o comando da família Neves - o que Aécio sempre negou.
A maioria das denúncias, lembra o próprio Correia, não foi adiante. Acabaram arquivadas pelo Ministério Público. Ele diz ter "comido o pão que o diabo amassou" - acabou sendo alvouma investigação que ainda está sob análise da Promotoria mineira.
"Dentro da Assembleia tinha o rolo compressor do Aécio. Era muito difícil fazer oposição", recorda Correia, para quem as vozesoposição eram poucas e foram sendo sufocadas,especial porque, no início, até mesmo o PT nacional tinha simpatia por Aécio.
O deputado diz ainda que, já no começo do primeiro mandato, o governador deu início a um processo"blindagem" na mídia local e,certa medida, junto ao Ministério Público estadual que, teria poupado Aécioquestionamentos mais duros, críticas e, principalmente, escândalos.
O tucano sempre negou ter tido a vida facilitada pela imprensa ou por autoridades.
'Goebbels das Alterosas'
Segundo Correia, quem cuidava da imagemAécio na mídia era a irmã Andrea Neves.
"Nessa áreacomunicação, ela mandava e desmandava. Apelidamos elaGoebbels das Alterosas, comandava com punhosaço", diz o deputado, referindo-se a Paul Joseph Goebbels, ministro da Propaganda na Alemanha nazista entre 1933 e 1945.
Um dos primeiros a abordar a relação dos Neves com a imprensa foi Marcelo Baêta, à época um estudantejornalismo da UFMG. Como trabalhoconclusãocurso,2006, ele fez um documentário chamado Liberdade, Essa Palavra para o qual gravou jornalistas narrando como teriam sido perseguidos ou demitidos por terem criticado a gestão do então governador.
"Logo depoispublicar o vídeo, no fimagosto, o governo lançou o vídeo resposta, no iníciosetembro. Um vídeo um tanto quanto chulo e agressivo", recorda o jornalista.
No material oficial, alguns dos entrevistadosBaêta mudaram a versão dada anteriormente.
"Creio que criou um certo ceticismorelação ao meu vídeo, ou pelo menos confusão nas pessoas a respeitoqual era a real posição desses entrevistados. Ao que tudo indica, eles sofreram uma pressão forte e truculenta, ao estilo Andrea Neves, que agora está presa, mas na época era muito poderosa. Ao que parece, eles ficaram com medo e cederam."
Para o jornalista, na mídia mineira "estava tudo dominado" e, na nacional, "o cenário era amplamente favorável" a Aécio, dada a pouca quantidadenotícias criticando ou questionando a gestão do tucano.
CPIs e bafômetro
Em 2010, Aécio deixou o governo mineiro com a popularidade nas alturas para concorrer a uma cadeira no Senado. Dois anos antes, havia conseguido a façanhacosturar um acordo com o PT para eleger o empresário Márcio Lacerda (PSB) prefeitoBelo Horizonte.
Levava no currículo como principal obra a construção da Cidade Administrativa, a nova sede do governoMinas, vitrine agora sob suspeita com as delações da Odebrecht - os executivos da construtora afirmaram que a licitação foi fraudada, a obra superfaturada e que houve pagamentopropina.
Na disputa2010, Aécio foi eleito senador sem dificuldades, assim como fez seu sucessorMinas, o aliado e ex-vice Antonio Augusto Anastasia (PSDB-MG), hoje também senador.
Foi Anastasia quem relatou o impeachmentDilma no Senado.
No Senado, Aécio se colocou como principal nome da oposição e tentava se cacifar para disputar a eleição presidencial. Mas nunca foi titular ou suplentenenhuma das 13 CPIs (Comissões ParlamentaresInquérito) instauradas desde 2011, segundo informações disponibilizadas no site do Senado.
Dizia-se que ele atuava mais nos bastidores. Desde 2011, apresentou 39 projetoslei e oito propostasemenda à Constituição.
Fora da vida pública, acabou sendo alvonotícias negativas. Em 2011, foi parado numa blitz da Lei Seca no Rio. Estava com a carteirahabilitação vencida e não soprou o bafômetro. Foi ainda filmado cambaleante, pedindo uma bebida num bar na mesma cidade.
Em 2014, nas vésperas da campanha, foi questionado diretamente se já havia sido usuáriococaína. "Jamais, claro que não", disse ao jornalista Fernando Barros e Silva, no programa Roda Viva, da TV Cultura, antesatribuir o boato ao "submundo" da internet.
"Sou um homem do meu tempo. Nunca vesti o figurinoum político tradicional. Nunca deixeiter minhas relações pessoais. (...) Não conseguem dizer que sou desonesto efetivamente. Não conseguem dizer que sou incompetente. De alguma forma, os ataques têm que vir. Se o ataque que tem é esse do submundo...", emendou.
Alçado a candidato tucano à Presidência da República, viu o escrutínio aumentar - inclusive sobregestãoMinas, encerrada anos antes.
Em julho2014, o jornal FolhaS.Paulo publicou reportagem afirmando que Aécio, quando governador, havia autorizado a construçãoum aeroporto numa área que eraum tioCláudio (MG). Ele sempre negou qualquer irregularidade - disse que seu tio foi prejudicado com a desapropriação. No ano passado, a Agência NacionalAviação Civil (Anac) concedeu homologação do aeródromo, que agora é público.
Nem bem, nem mal
Ao longo da vida, Aécio incorporou àimagemhomem público o gosto por festas com celebridades e empresários como Luciano Huck e Alexandre Accioly, alémpasseiosmoto e a cavalo.
O namorocinco anos com a modelo Letícia Werner virou o casamento e, às vésperas das eleições presidenciais2014, o casal anunciou que estava grávidogêmeos. O pai da jovem Gabriela,um relacionamento anterior, viu, aos 54 anos, nascer Julia e Bernardo.
Na disputa presidencial, chegou a ser desacreditado. Mas, quando amargava um terceiro lugar, conseguiu ultrapassar Marina Silva na reta final e ir para o segundo turno com Dilma Rousseff. Perdeu por pouco mais3 milhõesvotos, numa das mais acirradas disputas desde a redemocratização.
Sua influênciaMinas, porém, saiu arranhada. Embase eleitoral, foi derrotado por Dilma e não conseguiu levar ao segundo turno seu candidato a governador, o tucano Pimenta da Veiga. O PT ganhou a disputa ainda no primeiro turno com Fernando Pimentel.
Após a derrota nas ruas, partiu para o ataque. Presidido por ele, o PSDB foi ao Tribunal Superior Eleitoral tentar cassar a chapa Dilma-Temer, processo cujo julgamento está previsto para ser retomado na próxima terça-feira.
"Vamos fiscalizar, vamos acompanhar, vamos cobrar, vamos denunciar. Vamos combater sem tréguas a corrupção que se instalou no governo brasileiro", disseprimeiro discurso pós-eleitoral no Senado.
Na votação que sepultou o governo Dilma no Senado, sublinhou as denúnciascorrupção que pesam contra o PT, provavelmente sem imaginar que, meses depois, ele próprio estaria afastado do cargo, acusadoirregularidades.
Nem mesmo amigos mais próximos têm saídodefesa do senador. Mas também não o atacam. "Em respeito, não falo nem bem nem mal", diz um tucano mineiro, que conhece Aéciolonga data e pediu para não ter seu nome citado.
Contudo, não está abandonado. Parece estar ganhando tempo - tem recebido visitascasapolíticos aliados e, até agora, apenas Rede e PSOL indicaram senadores para analisar o caso do tucano no ConselhoÉtica do Senado.
Não disfarça, porém, o abatimento, principalmente por causa da irmã, cuja prisão, segundo a defesa, foi injusta e desnecessária.
Desde o diaque subiu à tribuna para defender o impeachmentDilma e atacar os que se beneficiam da sensaçãoimpunidade, Aécio parece ter se transformadoum exemplo que comprova uma frase por vezes atribuída ao seu avô Tancredo e, outras vezes, ao ex-governadorMinas Magalhães Pinto:
"Política é como nuvem. Você olha e estáum jeito; você olhanovo e ela já mudou."
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