Os alemães que venceram quedabraço com regime comunista pelo direitoficar nus:

Crédito, Sean Gallup/Getty Images

Legenda da foto, "É usar a natureza completamente,forma plena", disse alemão acerca do nudismo

Não éhoje que muitos alemães se despem com naturalidadepúblico — sejapraias, parques ou saunas espalhadas pelo país.

Alguns deles são membrosum movimento naturista chamado FKK, ou "cultura do corpo livre", que foi proibido durante o nazismo e,seguida, enfrentou desaprovação oficial nos primeiros anos do regime comunista na Alemanha Oriental.

O jornalista Mike Lanchin, do programarádio Witness, da BBC, foi atrás das origens desse costume e mostra como os alemães desafiaram as autoridades comunistas pelo direitopegar sol como vieram ao mundo, na costa do Mar Báltico:

Há maisseis décadas, o alemão Wolfgang Heider vai à praia nu, um costume do qual se orgulha.

"Nunca foi uma coisa erótica", afirmou eleentrevista ao programa Witness2017.

De fato, a nudez pública é vista com algo natural na Alemanha — onde não é incomum se despirdiversas situações cotidianas.

"É usar a natureza completamente,forma plena", acrescentou ele.

Wolfgang foi sem roupa pela primeira vez às praias naturistas do Mar Báltico, na Alemanha, ainda no início do regime comunista, que sucedeu o fim da Segunda Guerra Mundial.

"Havia meninas, meninos, a gente brincava junto, sempre tinha algum tipoesporte, como vôlei, natação, claro", relembrou.

E, segundo ele, nunca houve qualquer tipoconstrangimento.

"Era normal para nós."

O nudismo e o naturismo têm uma longa tradição na Alemanha. O movimento FKK, abreviaçãoFreikörperkultur, datamaiscem anos.

Conforme mostrou reportagem publicada pela BBC Future, na virada do século 20, pairava no ar a Lebensreform ("reforma da vida"), uma filosofia que defendia a alimentação orgânica, a liberação sexual, a medicina alternativa e uma vida mais simples e mais próxima da natureza.

"(O FKK) surgiuuma preocupação com a saúde, e uma sensaçãoque era saudável para o corpo ficar exposto ao sol e ao ar puro", explicou à BBC Josie McLellan, professorahistória moderna na UniversidadeBristol, no Reino Unido.

"Muitas vezes, era considerado um bom antídoto para alguns aspectos negativos da/ industrialização."

Na década1920, o nudismoprol da saúde e do bem-estar estava crescendopopularidade na Alemanha. E havia centenasspas nudistas por todo o país.

Crédito, WALTRAUD GRUBITZSCH/AFP/GettyImages

Legenda da foto, Nudismo é visto com naturalidade por muitos alemães

"Depois da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), uma sériepessoas tentaram popularizar (a prática), sobretudo trazendo para dentro da tradição social-democrata", acrescentou McLellan.

"Viam como algo muito importante para as massas, fazer exercícios ao ar livre, pegar ar fresco e se expor à luz do sol."

Ainda na época da ascensão do nazismo (1933-1945) na Alemanha, o nudismo havia sido oficialmente banido — embora alguns vissem a prática como uma formacriar o corpo ariano perfeito.

E a cineasta favoritaAdolf Hitler, Leni Riefenstahl, usou corpos nus atléticos e fortes à vontadeseus documentáriospreto e branco dos anos 1930.

"Há muita glorificação do corpo nu na propaganda nazista, principalmentetorno dos Jogos Olímpicos. O famoso filme Olympia, de Leni Riefenstahl, tem muitos homens e mulheres nus", explicou McLellan.

"Acho que o corpo nu se torna um símbolouma Alemanha forte, uma Alemanha jovem e uma Alemanha racialmente pura."

Após o fim da Segunda Guerra Mundial, que resultou na divisão do país, poucos alemães tinham condiçõessairférias.

Mas no início da década1950, o Mar Báltico estava novamente lotadoturistas da agora comunista República Democrática Alemã (RDA), a chamada Alemanha Oriental.

"Na década1950, ainda era possível viajar para o oeste (Alemanha Ocidental,regime capitalista), mas havia restrição financeira. O Mar Báltico era realmente o balneário que a população frequentava", disse Wolfgang.

Ele e os amigos, como muitos alemães orientais, aderiram ao hábitonadar ou simplesmente curtir o dia na praia nus.

Ele explicou que havia uma espéciecódigoconduta. As pessoas não gostavam, por exemplo,ser fotografadas nuas.

E excessos também não eram vistos com bons olhos.

"Lembro, por exemplo,pessoas que iam nuas fazer compras no supermercado. Isso, é claro, não era legal."

Para Wolfgang, o nudismo colocava todospéigualdade.

"É claro que parecia estranho quando você estava na praia e via seu diretor ou professor da universidade sentado atrásvocê. (Mas) as pessoas são muito iguais lá. E isso tornava a coisa toda, como posso dizer, muito democrática."

Mas o Partido Comunista da Alemanha Oriental não via dessa forma. E um ministro chegou a pedir que o nudismo fosse banido novamente para proteger os olhos da nação.

"Eles tentaram proibir na costa báltica, e havia realmente policiais patrulhando as praias e tentando fazer as pessoas colocarem suas roupasvolta", explicou McLellan.

"Mas, na verdade, não deu certo porque,um modo geral, os banhistas e os turistas se recusam a aceitar. Eles apenas riam dos policiais, ou zombavam deles."

Alguns desafiavam as autoridadesforma bem criativa.

"Há relatosgentegravata na praia, e aí quando a polícia tentava efetuar a prisão, eles falavam: 'Não estou nu, estougravata'."

"Havia também algumas pessoas que eles tentavam prender e diziam: 'Eu sou socialista, sou do partido, não acho que haja algoerrado nisso, isso na verdade faz parte da tradição socialista'", completou a historiadora.

Wolfgang contou que, inicialmente, as autoridades locais ficaram um pouco surpresas com a resistência — mas com o fortalecimento do movimento, tiveram que se render, "abrindo oficialmente praias para FKK".

Não há estatísticas confiáveis ​​sobre quantas pessoas frequentavam acampamentosFKK ou se despiam nas praias durante o regime comunista. Mas,1980, cerca80% dos alemães orientais afirmaram que nadavam nus.

Com o colapso do comunismo no Leste Europeu e a queda do muroBerlim,1989, Wolfgang relembrou ter se deparado com um certo puritanismo por partealguns alemães ocidentaisrelação ao fascínioseus vizinhos pelo nudismo.

"Nós (alemães orientais) achamos isso um pouco ridículo, aquele povo vindo do oeste estava um pouco indignado com esta vida livre."

Desde a reunificação da Alemanha1990, houve um declínio da cultura FKK.

"Então quando hojedia, você vai a essas praias, você encontra mais idosos, que estão acostumados com aquela antiga tradição", declarou Wolfgang. "Não é tão livre e convencional como era antes."

Mas a cultura FKK continua sendo vista como um atoresistência.

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