Estudo prevê mais desigualdade e polarização nos países com acordo UE-Mercosul:roleta de 0 50 centavos

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Estudo argumenta que setores que serão mais beneficiados por acordo comercial não são os que geram empregos mais bem remunerados

No mês passado, a Secretariaroleta de 0 50 centavosComércio Exterior do governo federal estimou que o acordo traria, junto a outros já concluídos ou ainda sendo negociados pelo Brasil, montanteroleta de 0 50 centavosR$ 1,7 trilhão adicional ao PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro até 2040.

"A negociaçãoroleta de 0 50 centavosacordos comerciais é um dos pilares da estratégiaroleta de 0 50 centavosinserção do Brasil na economia internacional, promovendo competitividade e desenvolvimento econômico ao país", disse na ocasião o secretárioroleta de 0 50 centavosComércio Exterior, Lucas Ferraz.

Mas essa e outras perspectivas otimistas a respeito da liberalização do comércio são questionadas pelo estudo divulgado nesta terça-feira (8/6) pela Universidaderoleta de 0 50 centavosBoston.

Nele, os autores Ozlem Omer e Jeronim Capaldo, pesquisadoresroleta de 0 50 centavoscomércio internacional, mercadoroleta de 0 50 centavostrabalho e desigualdade, analisaram dadosroleta de 0 50 centavosemprego, crescimento e produtividaderoleta de 0 50 centavosuma amostraroleta de 0 50 centavospaíses ligados aos dois blocos: Brasil e Argentina, do Mercosul, e França, Itália, Alemanha, Polônia, República Tcheca (todos da UE) e Turquia (candidata à UE).

Eles argumentam que, nos moldes atuais, o acordoroleta de 0 50 centavoslivre comércio entre os dois blocos vai favorecer mais os setores que geram empregosroleta de 0 50 centavosmédia mais mal-remunerados e/ouroleta de 0 50 centavosmenor produtividade, potencialmente levando a um cenárioroleta de 0 50 centavos"estagnação salarial, maior desigualdade, desindustrialização prematura, maior dependência da demanda externa e outros resultados adversos".

Crédito, EPA/OLIVIER HOSLET

Legenda da foto, O chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, e a Alta Representante da UE para Política Externa e Segurança, Federica Mogherini, na ocasião do acordo entre UE e Mercosul

No caso do Brasil, esses setores seriam, por exemplo, serviço público, agronegócio ou varejo, entre outros.

Esse contexto citado pelos pesquisadores promoveria mais concentraçãoroleta de 0 50 centavosrenda e ainda mais polarização política, já bastante aguda nos países analisados.

"Em setores mais estagnados da economia (que seriam favorecidos pelo acordo), trabalhadores não costumam receber uma boa parcela dos lucros gerados. Em média, os trabalhadores recebem uma fatia cada vez menor da torta", argumenta à BBC News Brasil o coautor Jeronim Capaldo, que é pesquisador bolsista da Iniciativaroleta de 0 50 centavosGovernança Econômica Global da Universidaderoleta de 0 50 centavosBoston e da Divisãoroleta de 0 50 centavosEstratégiasroleta de 0 50 centavosDesenvolvimento da Globalização da Unctad (agênciaroleta de 0 50 centavoscomércio e desenvolvimento da ONU).

Com isso, agrega ele, "sobra menos dinheiro para consumo e para investimentos, à medida que mais dinheiro vai para lucros (de uma parcela pequena). É desestabilizante."

O estudo

Segundo Omer e Capaldo, as projeções feitas até agora sobre o acordoroleta de 0 50 centavoslivre comércioroleta de 0 50 centavosgeral projetam cenários otimistas porque desconsideram dados cruciais, como as oscilações profundas nos níveisroleta de 0 50 centavosemprego dos países envolvidos, o potencial aumentoroleta de 0 50 centavosdesigualdade social eroleta de 0 50 centavosconcentraçãoroleta de 0 50 centavosrenda e o fatoroleta de 0 50 centavosque, à medida que as empresas se tornam mais produtivas, acabam, muitas vezes, precisandoroleta de 0 50 centavosmenos funcionários para desempenhar as mesmas funções.

Esse excedenteroleta de 0 50 centavosmãoroleta de 0 50 centavosobra, argumenta Capaldo, acaba sendo deslocado para setores menos produtivos eroleta de 0 50 centavossalários menores.

Além disso, embora defenda que acordos comerciais possam ser valiosas ferramentasroleta de 0 50 centavosinserção e geraçãoroleta de 0 50 centavosrenda para paísesroleta de 0 50 centavosdesenvolvimento, Capaldo argumenta à reportagem que o tratado entre UE e Mercosul se destaca ao unir economias que estãoroleta de 0 50 centavosestágios muito diferentes entre si: as europeias, mais robustas, e as sul-americanas, aindaroleta de 0 50 centavosdesenvolvimento. "Isso já traz muitos desafios", afirma.

Um ponto-chave defendido pelo relatório é que todos os oito países estudados apresentam o que os autores chamamroleta de 0 50 centavos"um crescente desequilíbrio" entre os setores qualificados por elesroleta de 0 50 centavos"dinâmicos" - ou seja, os que têm produtividade e salários maiores - e os "estagnados",roleta de 0 50 centavosmenos produtividade e salários.

"Em todos os países, o emprego se deslocou dos setores dinâmicosroleta de 0 50 centavosdireção aos estagnados, enquanto a geraçãoroleta de 0 50 centavosvalor agregado foi na direção oposta", dizem os autores. "Isso é a principal causa da tendênciaroleta de 0 50 centavosqueda na produtividade observadaroleta de 0 50 centavostodos os países e a causa da desigualdade observada na maioria dos países."

Especificamente no Brasil, os autores preveem que o acordo UE-Mercosul vai acelerar a expansãoroleta de 0 50 centavossetoresroleta de 0 50 centavosimportância expressiva nas exportações brasileiras, como o agroalimentar e oroleta de 0 50 centavosmineração - mas que, por seus baixos salários médios e foco sobretudo na produçãoroleta de 0 50 centavosmatéria-primaroleta de 0 50 centavosvalor agregado relativamente baixo, são chamadosroleta de 0 50 centavos"estagnados" pelos autores.

"Ao mesmo tempo, (o acordo) levará à relativa retração e perdaroleta de 0 50 centavoscompetitividade dos setores mais dinâmicos, incluindo oroleta de 0 50 centavosveículos, equipamentosroleta de 0 50 centavostransporte e equipamentos eletrônicos", opina o estudo.

O risco apontado por Capaldo éroleta de 0 50 centavosque países exportadoresroleta de 0 50 centavoscommodities (por exemplo, minérios ou matérias-primas agrícolas), como o Brasil e seus pares sul-americanos, caiamroleta de 0 50 centavosuma espécieroleta de 0 50 centavosarmadilha: como o acordo favorece esse tiporoleta de 0 50 centavosexportação, pode-se acabar escanteando o salto qualitativo necessário para outros setores mais produtivos, lucrativos eroleta de 0 50 centavosmaior valor agregado.

Em contraste a esse modelo, diz Capaldo, países como a Coreia do Sul, que tinham uma economia predominantemente agrícola e conseguiram migrar para umaroleta de 0 50 centavosalta tecnologia e produtividade, "avançaram porque se especializaram não nos setoresroleta de 0 50 centavosbaixo valor agregado, mas noroleta de 0 50 centavosalto. E uma das formas pelas quais fizeram isso foi por que o ambiente comercial a que estavam expostos não era pernicioso a seu desenvolvimento", afirma o pesquisador.

Crédito, EPA

Legenda da foto, Estudo argumenta que acordoroleta de 0 50 centavoslivre comércio entre os dois blocos vai favorecer mais os setores que geram empregosroleta de 0 50 centavosmédia mais mal-remunerados e/ouroleta de 0 50 centavosmenor produtividade, potencialmente levando a um cenárioroleta de 0 50 centavos"estagnação salarial e maior desigualdade"

Indústria

Do pontoroleta de 0 50 centavosvista da indústria, Omer e Capaldo não veem grandes vantagens potenciais oferecidas pelo acordo UE-Mercosul.

"Na França, Alemanha e Itália, é improvável que o ALC (siglaroleta de 0 50 centavosacordoroleta de 0 50 centavoslivre comércio) reverta ou rompa o ciclo viciosoroleta de 0 50 centavoscrescente desigualdaderoleta de 0 50 centavosdesindustrialização", diz o estudo. "Na Argentina e no Brasil, provavelmente, o ALC intensificará a crescente desigualdade e desindustrialização, acelerando a desvantagem industrial da regiãoroleta de 0 50 centavosrelação à UE."

Capaldo diz achar improvável que a indústria brasileira consiga competir com a importação barateadaroleta de 0 50 centavosprodutos europeusroleta de 0 50 centavostecnologia superior - e cita carros elétricos como um exemplo disso.

A conclusão dos autores da Universidaderoleta de 0 50 centavosBoston não é um consenso: até o momento, o acordo Mercosul-UE tem recebido a defesaroleta de 0 50 centavosentidades industriais brasileiras e outras entidades ligadas a setores exportadores.

Em textoroleta de 0 50 centavosabrilroleta de 0 50 centavos2021 publicado emroleta de 0 50 centavosagência, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) defendeu como "imprescindível" que o governo brasileiro trabalhe pela implementação do acordo ainda neste ano.

"O acordo permitirá uma abertura gradual da economia e impulsionará o fluxoroleta de 0 50 centavoscomércio e investimento entre os dois blocos", dizia a entidade.

Segundo estimativas do governo brasileiro à época da assinatura do tratado, este poderá eliminar tarifasroleta de 0 50 centavosimportação sobre maisroleta de 0 50 centavos90% dos produtos comercializados entre Mercosul e UE. A projeção do Ministério da Economia éroleta de 0 50 centavosque isso traria produtividade e reduçãoroleta de 0 50 centavoscustos que resultariamroleta de 0 50 centavosganhosroleta de 0 50 centavosUS$ 87,5 bilhões ao PIB brasileiro.

"O tratado também permite a abertura do mercadoroleta de 0 50 centavosserviços e compras governamentais e o estabelecimentoroleta de 0 50 centavosregras importantesroleta de 0 50 centavosfacilitaçãoroleta de 0 50 centavoscomércio, barreiras técnicas, medidas sanitárias e fitossanitárias e propriedade intelectual", afirmou o texto da CNI.

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Operaçãoroleta de 0 50 centavoscombate ao desmatamentoroleta de 0 50 centavosRondônia,roleta de 0 50 centavosmarço; defensores do acordo UE-Mercosul afirmam que ele ajudará na proteção da Floresta Amazônica

Outros defensores do acordo também argumentam que, ao fazer a União Europeia pressionar o governo brasileiro a conter o desmatamento na Amazônia, o tratado pode ter um impacto ambiental relevante.

Em entrevista à BBC News Brasilroleta de 0 50 centavosjulhoroleta de 0 50 centavos2020, o eurodeputado Jordi Cañas, relator do acordo no Parlamento Europeu, defendeu que a Amazônia estará mais protegida sob o tratado, que ele definiu como "uma associação estratégica, chave, que gera um vínculo transatlântico fundamental a curto, médio, e longo prazo,roleta de 0 50 centavosnível político, comercial, social, econômico, sem dúvida, eroleta de 0 50 centavosnível humano".

'Crescimento sustentável'

No entanto, para os autores do Centroroleta de 0 50 centavosPolíticasroleta de 0 50 centavosDesenvolvimento Global, um crescimento sustentável da economia no momento atual exige "melhorar a produtividade e reduzir as desigualdades", algo que, na opinião deles, não tende a ser resolvido pelo acordoroleta de 0 50 centavoslivre comércio.

"Isso significa aumentar o tamanhoroleta de 0 50 centavossetores 'dinâmicos',roleta de 0 50 centavosalta produtividade e altos salários. Para paísesroleta de 0 50 centavosdesenvolvimento, também significa continuar a se industrializar (aumentandoroleta de 0 50 centavosparcelaroleta de 0 50 centavosmanufaturas tantoroleta de 0 50 centavosvalor agregado quantoroleta de 0 50 centavosempregos) até que possam competir com segmentosroleta de 0 50 centavosmercadoroleta de 0 50 centavosvalor agregado maior", argumentam.

Para Capaldo, esse processo depende tambémroleta de 0 50 centavosreconhecer as limitações atuais dos acordosroleta de 0 50 centavoslivre comércio e das projeções que os embasam, mesmo que sem desmerecer a importância do multilateralismo.

"Muitos anos antesroleta de 0 50 centavosTrump (governo americano tido como protecionista e nacionalista), já havia discussões na Organização Mundial do Comércio apontando que as regras (do comércio global) eram muito restritivas e queria-se a oportunidaderoleta de 0 50 centavosrediscuti-las. Trump, provavelmente pelos motivos errados, criou essa oportunidade" ao promover o nacionalismo americano às custas da integração global, afirma Capaldo.

"Mas como reação a esse tiporoleta de 0 50 centavosnacionalismo econômico muita gente correu para abraçar o status quo anterior, o que pode facilmente virar um motivo para complacência, 'nosso modelo anterior (de globalização) era tão bom', quando na verdade não era bom para a maioria dos países do mundo, motivo pela qual há tanta insatisfação", defende. "O comércio (internacional), na verdade, não tem sido tão multilateral porque mantém paísesroleta de 0 50 centavosdesenvolvimentoroleta de 0 50 centavosposições estáticas por um longo período."

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