Reichsbürger, o grupo com elos neonazistas que rejeita a Alemanha atual e avançablaze aposta coresatos que negam a covid-19:blaze aposta cores

"Os Reichsbürger abraçaram os protestos públicos contra as restrições do corona como uma ocasião bem-vinda para se reunir e ganhar visibilidade nas ruas. Eles estão mais presentes do que nunca", explica à BBC News Brasil Axel Salheiser, pesquisador do Instituto para a Democracia e a Sociedade Civil,blaze aposta coresJena, no Estado da Turíngia.

Na investida ao Parlamento, condenada por políticosblaze aposta coresdiversos espectros, destacava-se o grande númeroblaze aposta coresbandeiras do Império Alemão, associada aos Reichsbürger e a grupos neonazistas. O símbolo também foi usado pelo regimeblaze aposta coresAdolf Hitler.

"O Reich sempre representou um lugar mítico, um paraíso seguro para os alemães", afirma Jan Rathje, especialistablaze aposta coresextremismoblaze aposta coresdireita da Fundação Amadeu Antonio,blaze aposta coresBerlim.

Na manifestação "anti-covid-19", diz o pesquisador, o uso da bandeira imperial como "em jogosblaze aposta coresfutebol" aponta para essa ideia mítica no imaginário dos Reichsbürgerblaze aposta cores"um lugar que não é a República Federal da Alemanha".

"É um lugarblaze aposta coresesperança para o indivíduo pessoal, mas também no sentido folclóricoblaze aposta coresliberdade do povo alemão. Mas você tem que se perguntar posteriormente: liberdade contra o quê? Então a conspiração antissemita entrablaze aposta coresjogo", completa Rathje.

Neste contexto, Salheiser acredita que não há fronteiras claras entre os Reichsbürger e neonazistas. Ambos compartilham um "terreno ideológico", incluindo o revisionismo histórico. "Os neonazistas alemães empunham as mesmas bandeiras preto-branco-vermelho ou exibem insígnias do Império Alemão pré-1918 que os Reichsbürger usam para expressar seu desprezo pela democracia."

Na Alemanha, disseminar materialblaze aposta corespropaganda ou simbologia nazista (suásticas, por exemplo) é um crime passívelblaze aposta coresaté três anosblaze aposta coresprisão. Logo, grupos extremistas utilizam outras imagens, como a bandeira do antigo império.

Quem são os Reichsbürger?

Os Reichsbürger são um movimento não uniforme composto por diversos grupos espalhados pela Alemanha e online. Parte deles expressa ablaze aposta corescontrariedade ao Estado alemão moderno rejeitando documentos oficiais, declarando a áreablaze aposta coressuas casas como territórios nacionais independentes, imprimindo passaportes destas "nações", criando suas próprias moedas e até "pseudo-unidades policiais".

Os autoproclamados 'cidadãos do Reich' se recusam a pagar impostos, não aceitam representantes eleitos democraticamente e são agressivos com funcionários públicos, oficiaisblaze aposta coresjustiça e policiais que os abordam para executar ordens administrativas.

Por isso, segundo a Agência Federal para Educação Cívica (BPB), as autoridades estão "preocupadas" com o número significativoblaze aposta coresportesblaze aposta coresarmas legais entre membros do movimento e buscam suspender essas permissões quando "legalmente possível".

A polícia alemã apreendeu,blaze aposta cores2019, grandes quantidadesblaze aposta coresarmamentos, munições e explosivos com cidadãos do Reich, incluindo com indivíduos cujos portesblaze aposta coresarmas haviam sido banidos.

A BPB considera como "muito elevado" o riscoblaze aposta coresos Reichsbürger violarem "a ordem legal", uma vez que não a reconhecem, e avalia o potencial para violênciablaze aposta coresparte desses indivíduos como "muito grande". Para Salheiser, essa "tendência para violência é flagrante", ainda que partablaze aposta coresuma minoria.

"O Estado liberal democrático e seus representantes são vistos como inimigos do povo - portanto, a resistência violenta parece legítima. Alguns se preparam para o 'Dia X' [cenário apocalíptico do colapso da sociedade] para superar a democracia e suas instituições. Eles se preparam para matar", diz.

"Hoje, pesquisadores e agênciasblaze aposta coressegurança concordam sobre os perigos desta cena. Seus pensamentos rejeitam princípios fundamentaisblaze aposta coresnossa sociedade, como o Estadoblaze aposta coresDireito. Sua 'utopia social' se move entre uma monarquia autoritária (império alemão) e o Estado ilegal do 3º Reich (regime nazista)", afirma Paul Zschocke, pesquisador no Institutoblaze aposta coresPesquisa da Pazblaze aposta coresFrankfurt.

Seitas religiosas

Embora haja muitas divisões entre grupos e "governos imperiais" no movimento, o perfil dos 'cidadãos do Reich' é claro: cercablaze aposta cores75% são homens entre 40 e 60 anos, que tende a pertencer a segmentos mais desfavorecidos da sociedade.

Pesquisas nacionais do Bundesamt für Verfassungsschutz (BfV), o serviçoblaze aposta coresinteligência doméstico alemão, e da Bundeskriminalamt, a polícia federal, calculam que,blaze aposta cores2019, havia 19 mil membros dos movimentos Reichsbürger e Selbstverwalter (algo como cidadãos soberanos, que não se consideram parte da Alemanha ou sobblaze aposta coresjurisdição). Em 2017, esse número erablaze aposta cores16,5 mil.

Apesar dos dados oficiais, Rathje argumenta ser difícil determinar o tamanho real desses grupos, porque as informações atuais são do Escritório Federal para a Proteção à Constituição, uma instituição "não científica". Logo, ainda faltariam dadosblaze aposta coresestudos conduzidos por universidades e revisados por pares.

Atualmente, 950 Reichsbürger são classificados como extremistasblaze aposta coresdireita na Alemanha. Cercablaze aposta cores530 possuem armas legais e ao menos 790 perderam essas autorizações.

Enquanto a BPB vê semelhanças do movimento com "redes e seitas religiosas", o Ministério do Interior dizblaze aposta coresseu relatório anual sobre a proteção da Constituição que os Reichsbürger possuem uma "visãoblaze aposta coresmundo pouco sofisticada", moldada por, entre outros pontos, teorias da conspiração e antissemitismo. Desta forma, medidas "executivas" contra eles têm pouco sucesso e raramente resultamblaze aposta coressaídas do movimento.

"A radicalização não acontece da noite para o dia, nem a desradicalização. Às vezes, a contra-ação do Estado é uma desculpa pronta para mergulhar ainda mais feliz na toca do coelho - ou serve à autoimagemblaze aposta coresvítima da opressão estatal", afirma Salheiser.

Por causablaze aposta coressua "convicçãoblaze aposta coresuma agenda oculta", completa Zschocke, é "quase impossível" deliberar razoavelmente com um Reichsbürger. "Frequentemente, as ações do governo deixam seus seguidores mais convencidosblaze aposta coressuas causas."

Origens recentes

A BPB rastreia o início do movimento por volta dos anos 1980, com Wolfgang Gerhard Günter Ebel. O ex-funcionário da companhia ferroviária da Alemanha Oriental se autointitulou "Chanceler do Reich" e formou o seu primeiro "governo"blaze aposta coresBerlim Ocidental,blaze aposta cores1985, alegando ter sido encarregado pelos Aliados.

Ebel tinha clara postura antissemita. Para ele, a Alemanha pós-guerra era uma associação ilegal que acobertava uma conspiração "judaico-maçônica". Logo, declarou que os cidadãos do Reich não pagariam impostos, taxas ou multas àquele país.

Segundo a BPB, Ebel distorceu informações parcialmente reais para alegar a inexistência do Estado alemão moderno. Entre elas, que a Alemanha não possui uma Constituição e não é soberana porque não houve um tratadoblaze aposta corespaz com os Aliados. Contudo, a Lei Básicablaze aposta cores1949 é a Constituição do país, ainda que tenha sido criada como uma saída temporária à esperablaze aposta coresque os territórios ocupados pela União Soviética fossem reanexados.

A República Federal da Alemanha, além disso, conquistou a soberania plenablaze aposta cores1990, quando o Tratado Dois-Mais-Quatro reunificou o país e definiu que os Aliados abriam mãoblaze aposta coresseus direitosblaze aposta coresrelação à Alemanha.

O movimento iniciado por Ebel sofreu uma cisãoblaze aposta cores2004, quando foi fundadoblaze aposta coresHanover um"governo no exílio", independente dos Aliados. E a liderança deste grupo ficou com o "chanceler" Norbert Rudolf Schittke, um extremistablaze aposta coresdireita monitorado pelas autoridades que minimiza o regime nazista e acredita que os alemães são as verdadeiras vítimas da Segunda Guerra Mundial.

Diversos outros grupos surgiram nas últimas décadas. Mas Rathje destaca que parte do movimento pode ter origem por volta dos anos 1950, uma vez que a ideiablaze aposta coresreestabelecer o Império Alemão e libertá-lo da ocupação estrangeira era um dos objetivosblaze aposta coresnazistas dentro da República Federal da Alemanha.

"Eles criaram o Partido Socialista do Reich, o primeiro a ser banido como inconstitucional [na Alemanha pós-guerra]. Ele até carregavablaze aposta coresseu objetivo no nome", afirma.

Quando a organização foi proibida, neonazistas e a extrema direita prosseguiram com o plano. "É por isso que nas manifestações neonazistas eblaze aposta coresextremistasblaze aposta coresdireita na Alemanha sempre haverá bandeiras preta-branca-vermelha que representam o Império."

Violência e ataques a agente da lei

O movimento começou a se radicalizar no início dos anos 2010. E desde novembroblaze aposta cores2016, o sistemablaze aposta coresinteligência alemão monitorablaze aposta coresperto a suas atividades.

Os Reichsbürger, por outro lado, demonstravam agressividade já nos anos 1980 e 1990. Como não pagam impostos, eles entramblaze aposta coresdisputas legais contra o Estado. Ebel e seus seguidores enviavam cartas às autoridades com sentençasblaze aposta coresmorte proferidas pelo "governo do Reich" contra funcionários públicos por atuaremblaze aposta coresum "Estado ilegal".

Em 2019, segundo o BfV, cidadãos do Reich e Selbstverwalter cometeram 589 crimes extremistas politicamente motivados. Destes, 121 foram registrados como atosblaze aposta coresviolência, alémblaze aposta cores156 casosblaze aposta corescoerção e ameaças, 81blaze aposta coresextorsão e 31blaze aposta coresresistência a policiais.

Mas o episódio que mudou a percepção das autoridades sobre o perigo dos Reichsbürger ocorreublaze aposta coresoutubroblaze aposta cores2016,blaze aposta coresGeorgensgmünd, no Estado da Baviera. Policias tentavam executar mandadosblaze aposta coresbusca e apreensão quando foram recebidos a tiros por um homemblaze aposta cores50 anos, que matou um dos oficiais e feriu outros três. O réu foi condenado à prisão perpétua.

Antes daquele caso,blaze aposta coresagostoblaze aposta cores2016, outro cidadão do Reich feriu um policial com uma armablaze aposta coresfogo, também durante a execuçãoblaze aposta coresum mandato. Ele foi sentenciado a sete anosblaze aposta coresprisão por tentativablaze aposta coreshomicídio.

Há ainda diversos outros casosblaze aposta coresconflitos graves com a polícia. Em marçoblaze aposta cores2018, por exemplo, três policiais na Baixa Saxônia foram atacados e tiveramblaze aposta coresviatura seguida cidadãos do Reich ao tentarem conduzir um mandatoblaze aposta coresprisão contra um Reichsbürger.

"Mesmo que se aceite que toda sociedade tem suas 'franjas lunáticas', é preciso ver que a atitude hostil e conspiratória desses grupos os torna muito perigosos. Junto com a propagandablaze aposta coresposseblaze aposta coresarmas, tudo isso cria uma mistura explosiva", diz Zschocke.

Para os Reichsbürger e a extrema direitablaze aposta coresforma geral, argumenta o pesquisador, é "essencial" criar uma nova visãoblaze aposta coresmundoblaze aposta corestorno do 'status quo ante' (como as coisas eram antes), distante da sociedade moderna que constantemente nega o "seu mundo".

"[Ou seja] forte masculinidadeblaze aposta coresvezblaze aposta coresigualdadeblaze aposta coresgêneros, segurança nos papéis sociais ao invésblaze aposta coresincerteza da liberdade a todos, um Estado forte que apoia 'o interesse geral'. A bandeira do Império habita todos esses anseios e pela rejeição ao nosso atual Estadoblaze aposta coresDireito, a República Federal", diz Zschocke.