'As Nadadoras': as irmãs que fizeram fuga épica da Síria e tiveram destinos opostos:planilha surebet

E foi na água que Yusra Mardini competiu nas Olimpíadas do Rioplanilha surebet2016, tornando-se a voz dos refugiados. Enquanto isso,planilha surebetirmã Sarah socorria outros imigrantes e agora enfrenta a justiça grega, podendo ser condenada a até 20 anosplanilha surebetprisão.

A históriaplanilha surebetYusra e Sarah inspirou o filme As Nadadoras, da Netflix. Dirigido pela egípcia Sally El Hosaini, o filme mostra as irmãs atrizes libanesas Nathalie e Manal Issa recriando as experiências vividas pelas irmãs sírias.

Realidade explosiva

Foiplanilha surebet2015 que uma bomba abalou a vida das irmãs.

"Ficamos treinando pela manhã e, quando terminamos, estávamos esperando a mamãe no ladoplanilha surebetfora quando 'bum!'", contou Sarah à jornalista Magdalena Sodomkova para um documentário apresentado pela BBC. "Uma bomba explodiu lá dentro, havia vidro por toda parte."

"Estávamos apavoradas", ela conta. "Perdemos vários amigos e até um treinadorplanilha surebetnatação morreu."

A Primavera Árabe - uma sérieplanilha surebetprotestos, levantes e rebeliões armadas antigovernamentais que se estenderam por boa parte do mundo árabe no início da décadaplanilha surebet2010 - havia chegado à Síria alguns anos antes.

O belo nome da insurreição definia uma sérieplanilha surebetenfrentamentos violentos que fizeram com que o trajeto até a piscina onde as irmãs nadavam se tornasse uma viagem perigosa.

Metade da população da Síria fugiu do país. Yusra e Sarah queriam fazer o mesmo movimento, mas seus pais não se dispunham nem mesmo a discutir essa possibilidade - até aquele dia.

Assim que souberam que uma amigaplanilha surebet15 anos havia chegado à Europa a salvo, as meninas fizeram as malas.

Multidões

Na época, Yusra e Sarah Mardini tinham 17 e 20 anosplanilha surebetidade, respectivamente. O sonho delas era chegar à Alemanha, mas não eram as únicas.

Naquele ano, a quantidadeplanilha surebetrefugiados e migrantes a caminho da Europa atingiu níveis tão grandes que deflagrou uma crise, provocando intensos debates políticos.

Para dar uma ideia, no inícioplanilha surebetdezembroplanilha surebet2015, maisplanilha surebet911 mil refugiados e migrantes haviam chegado ao litoral europeu. Maisplanilha surebet75% deles fugiam dos conflitos e perseguições no Afeganistão, no Iraque ou na Síria, o lar das irmãs Mardini.

E havia o número mais doloroso: pelo menos 3,55 mil vidas se perderam durante a viagem, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur).

A rota principal havia deixadoplanilha surebetser a perigosa travessia do mar Mediterrâneo entre a Líbia e a Itália. A travessia ainda mais letal passaria a ser da Turquia às ilhas gregas, como Lesbos. E foi este o caminho seguido por Yusra e Sarah Mardini.

Muitosplanilha surebetembarcações pequenas

A primeira tentativa das irmãsplanilha surebetcruzar o mar Egeu da cidade turcaplanilha surebetEsmirna para chegar à Grécia foi frustrada pela polícia, que as retirou da água.

Escondidas no bosque com outros refugiados, elas esperaram mais quatro dias para que as pessoas que tinham seus destinos nas mãos retornassem.

"Os traficantes são como reis", explica Yusra. "Eles aparecem e dizem: 'chegou a hora'."

A travessia não parecia tão difícil. Com a embarcação indicada, os migrantes precisavam navegar por uma hora e meia sem que fossem descobertos.

Mas os traficantes chegaram dando ordens e colocaram 17 homens, três mulheres e uma criançaplanilha surebetum bote inflável com capacidade para sete pessoas e um motor com funcionamento duvidoso. Sem ouvir os argumentos, eles lançaram o bote com os migrantes na água.

"Quinze minutos depois, o motor parouplanilha surebetfuncionar", conta Yusra. E, ainda por cima, o bote começou a encherplanilha surebetágua.

"Um amigo do meu pai, enquanto tentava retirar a água do bote, dizia para que fôssemos fortes, que nos ajudássemos uns aos outros, que não fôssemos tomados pelo pânico", relembra ela. "Todos começaram a rezar, temendo pelas suas vidas. Muitos não sabiam nadar."

Angustiados, eles jogaram na água todos os pertences que podiam. Mas o bote continuava afundando. Alguém teria que se lançar ao mar.

Foi quando,planilha surebetrepente, "minha irmã pulou". Yusra estava apavorada, assim como Sarah, "mas comecei a empurrar o bote", ela conta.

E, mesmo com a proibição daplanilha surebetirmã maior, Yusra também pulou na água.

"Sarah estava no outro lado da embarcação, gritando para que eu voltasse a subir, mas respondi que não", relembra Yusra. "'Quero ficar aqui. Quero ajudar.'"

'Morrer lentamente'

A situação no mar Egeu era desesperadora. "Duas horas depois, continuávamos na mesma posição, com os corpos e as mentes despedaçados", segundo Yusra.

O bote continuava enchendoplanilha surebetágua. O motor, às vezes, começava a funcionar, mas voltava a parar, sacudindo as meninas abruptamente. Seus braços estavam repletosplanilha surebethematomas.

"Todos nós pensávamos: 'por que fiz esta viagem, por que deixei meu país, meus pais, toda a minha família? Realmente vale a pena?'", relembra Yusra Mardini. Vários homens também se atiraram na água, até mesmo um que "nem sabia nadar. Estava agarrado à corda."

O sol estava se pondo e fazia frio. No horizonte, Yusra conseguia ver a ilhaplanilha surebetLesbos, que parecia inalcançável.

"Nós estávamos nos movendo, mas não chegávamos", segundo ela. "Era,planilha surebetfato, como morrer lentamente."

"Um amigo nosso chamou a polícia grega e turca para pedir auxílio. Ele disse que estávamos nos afogando. A polícia grega só respondeu dizendo 'voltem!',planilha surebetárabe."

Foram mais quatro horas até que eles finalmente chegassem ao litoral da Grécia.

"Eu me senti dona do mundo", relembra Yusra. "Chorei, agradecendo por minha alma ainda estar no meu corpo."

Milagrosamente, elas estavam salvas, mas ainda precisavam percorrer um longo caminho e contornar vários obstáculos.

A crise

Na ilhaplanilha surebetLesbos, as irmãs pegaram uma balsa para a capital grega, Atenas, depois um ônibus para a Macedônia do Norte, um trem através da Sérvia e, por fim, foram a pé até a fronteira com a Hungria.

Uma cercaplanilha surebetarame farpado as separava da União Europeia. Se elas cruzassem a fronteira sem serem presas pela polícia, poderiam pedir asilo. Mas elas queriam chegar à Alemanha,planilha surebetforma que precisavam passar pelas autoridades sem que fossem vistas.

As irmãs ficaramplanilha surebetuma plantaçãoplanilha surebetmilho, onde lhes disseram que ficavam os traficantesplanilha surebetpessoas. E esperaram até altas horas da noite, escondidas e com frio, até que um deles chegou oferecendo transporte até a capital da Hungria, Budapeste,planilha surebettrocaplanilha surebetvárias centenasplanilha surebeteuros.

Quando chegaram a Budapeste, Yusra e Sarah precisaram fugir do lugar aonde foram levadas, depois que ficaram sabendo que eles "vendiam órgãos dos refugiados ou, se fossem atraentes, obrigavam-nos a prostituir-se", segundo Yusra Mardini.

Como tantos outros, elas foram até a estação internacionalplanilha surebettrens da capital húngara, onde encontraram um cenário dantesco. Cercaplanilha surebetcinco mil refugiados ficavam ali, dia e noite, esperando poder embarcarplanilha surebetalgum trem. A polícia tentava impedi-los e havia distúrbios.

Em meio à confusão, Sarah e Yusra conseguiram entrarplanilha surebetum vagão, mas uma senhora as denunciou e elas foram detidas.

As irmãs foram confinadasplanilha surebetum campoplanilha surebetrefugiados, que "era horrível", segundo Yusra. Tudo parecia perdido.

Até que, mais uma vez, elas conseguiram fugir e, subitamente, a sorte sorriu para elas. A então chanceler alemã Angela Merkel decidiu acolher refugiados sírios e enviou ônibus especiais para Budapeste, que os levariam para a Áustria e, dali, para a Alemanha.

Seres humanos

"Quando chegamos a Viena [na Áustria], estava chovendo e vimos pela janela os moradores locais dando chá e café quente para os refugiados", recorda Yusra no documentário da BBC.

"Eles estavam nos esperando. E estavam nos dando boas vindas! Eles nos deram flores, ursinhosplanilha surebetpelúcia, xampu... tudo o que você pode imaginar."

"Uma mulher chamada Ann gentilmente nos deixou entrar no seu apartamento para tomar banho", ela conta. "Eu me lavei, me lavei, me lavei e vi a água saindo escura. Todos nós tomamos banho, compramos roupas e nos sentimos novas pessoas."

"Ann preparou comida quente para nós e, depoisplanilha surebettodo aquele tempo horrível, foi inacreditável voltar a nos sentir como seres humanos, com alguém dizendo: 'você é bem-vinda, lamentamos pelaplanilha surebetguerra e lamentamos pelo que você está passando."

Outro sonho

Apesar das enormes dificuldades da travessia, Yusra Mardini nunca perdeuplanilha surebetvista seu objetivo. Ela queria continuar competindo na natação.

Por meioplanilha surebetum intérprete no campoplanilha surebetrefugiados, as irmãs conheceram o treinador Sven Spannekrebs. Depoisplanilha surebetvê-las nadar, o treinador as contratou e agilizou os trâmites para que elas tivessem acesso ao alojamento e às instalaçõesplanilha surebetum clubeplanilha surebetnatação local.

E não foi só isso. Ele também ajudou Yusra a realizar seu sonho mais precioso: nadar nos Jogos Olímpicos.

Em 2016, Yusra Mardini competiu nas Olimpíadas do Rio. Ela fez parte da primeira equipeplanilha surebetrefugiados dos Jogos Olímpicos, ganhando uma das eliminatóriasplanilha surebetnado borboleta.

Em 2017, ela foi nomeada Embaixadora da Boa Vontade da Acnur - a mais jovem da história, com apenas 19 anosplanilha surebetidade.

Já Sarah conseguiu uma bolsa para estudar no Bard Collegeplanilha surebetBerlim, na Alemanha, e começou a trabalhar como voluntária na ONG Emergency Response Center International, com sedeplanilha surebetLesbos, para ajudar outros refugiados que se arriscavam a fazer a mesma travessia perigosa que ela fez complanilha surebetirmã.

Em 2018, Sarah foi presa pelas autoridades gregas, acusada, junto com dois outros membros do grupo,planilha surebetcometer vários delitos, incluindo tráfico, espionagem e fraude. Ela ficouplanilha surebetcustódia por maisplanilha surebet100 dias até ser libertada sob fiança e voltar a Berlim, onde agora vivem os outros membros daplanilha surebetfamília.

Quando começou o julgamento contra ela, Sarah não foi autorizada a ir até a Grécia para defender-se.

A organização Human Rights Watch considera a acusação "absurda", possivelmente "com motivação política". A Anistia Internacional a descreve como "injusta" e "sem valor". E um estudo do Parlamento Europeu classificou o julgamentoplanilha surebetLesbos como "o maior casoplanilha surebetcriminalização da solidariedade na Europa".

Mas as irmãs Mardini continuam sendo rostos conhecidos entre os 5,7 milhõesplanilha surebetcidadãos sírios que se tornaram refugiados desde 2011 - uma fração dos 103 milhõesplanilha surebetpessoas deslocadas à forçaplanilha surebettodo o mundo até meadosplanilha surebet2022, segundo a Acnur.

Muitas dessas pessoas, como era Yusra Mardini quando saiu da Síria, são menoresplanilha surebet18 anos.

Ouça o documentário radiofônico "Yusra: Swim for Your Life" (em inglês), que inspirou esta reportagem, no site BBC Sounds.

- Este texto foi publicado em http://vesser.net/geral-64384249