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Biografia e documentário tentam revelar mistériosfreebet vbetClarice Lispector:freebet vbet
"Já canseifreebet vbetme deparar com frases atribuídas a Clarice que não foram escritas por ela. Hojefreebet vbetdia, nem acompanho mais. Mas, no início, o número era impressionante", recorda.
Doutorafreebet vbetLetras pela PUC-Rio, Teresa acabafreebet vbetlançar À procura da própria coisa - Uma biografiafreebet vbetClarice Lispector, versão revista e aumentadafreebet vbetEu sou uma pergunta (1999), esgotada desde 2010.
O título da nova biografia foi retirado da crônica Aproximação gradativa, publicada na ediçãofreebet vbetnovembrofreebet vbet1962 da revista Senhor e incluída na antologia Para não esquecer (1977): "Se eu tivesse que dar um título à minha vida seria: à procura da própria coisa".
Nascidafreebet vbetsua dissertaçãofreebet vbetmestrado na PUC-Rio, sob a orientaçãofreebet vbetRosiska Darcyfreebet vbetOliveira, Eu sou uma pergunta corresponde à terceira das quatro partes de À procura da própria coisa, acrescidafreebet vbetum capítulo novo: Recife, 1976, que descreve a viagem que Clarice fez à cidade onde viveu dos 5 aos 10 anos, a convitefreebet vbetum jovem escritor pernambucano chamado Augusto Ferraz, um ano antesfreebet vbetmorrer.
As outras três partes do calhamaçofreebet vbet700 e poucas páginas são "Itineráriofreebet vbetuma mulher escritora", "Vida-vida e vida literária" e "Guia mapafreebet vbetRecife e Maceió". "Divulgar a obra da Clarice virou uma missão. Uma missão que procuro cumprir há 31 anos", define a biógrafa.
Nesta missão, Teresa Montero realizou 112 entrevistas: 88 para Eu sou uma pergunta e mais 24 para À procura da própria coisa. Há desde Heloísa Azevedo, a vizinha que salvou Clarice do incêndiofreebet vbetseu apartamento no dia 14freebet vbetsetembrofreebet vbet1966, até Urbano Fabrini, o cirurgião plástico que reparou as sequelas da queimadura emfreebet vbetmão direita.
Apenas uma pessoa declinou do convite da biógrafa: o escritor mineiro Fernando Sabino (1923-2004). "Procurado por telefone, alegou que não se sentia à vontade para falarfreebet vbetClarice", explica Teresa. "É uma pena porque ele teve um papel importantíssimo na vida dela."
'Escrever é mais forte do que eu'
Entre outros achados, Teresa incluiu um raro registro audiovisualfreebet vbetClarice: seis minutosfreebet vbetuma entrevista que ela concedeufreebet vbetdezembrofreebet vbet1976 para o jornalista Araken Távora (1931-1991) no programa Os Mágicos, da antiga TVE (atual TV Brasil).
A gravação, feita no apartamentofreebet vbetGustavo Sampaio, no Leme, mostra a escritora sentada no sofá da sala, descalça, com uma máquinafreebet vbetescrever no colo e, aos seus pés, Ulisses, seu cãofreebet vbetestimação, descansando sobre o tapete vermelho.
À pergunta "Você consegue viver exclusivamentefreebet vbetliteratura?", Clarice responde: "De jeito nenhum". Mais adiante, Távora indaga: "Escreve por vocação ou por necessidade?". "Olha, eu só escrevo porque não consigo deixarfreebet vbetescrever", explica a escritora ucraniana nascidafreebet vbetChechelnyk que, assim que completou 21 anos, se naturalizou brasileira. "É mais forte do que eu."
O trecho resgatado do Arquivo Nacional é um dos destaques do documentário A Descoberta do Mundo, dirigido por Taciana Oliveira, que estreiafreebet vbetdezembro na 16ª edição do Festivalfreebet vbetCinema Latino-Americanofreebet vbetSão Paulo e, a partirfreebet vbetjaneiro, chega às salasfreebet vbetcinema e aos canaisfreebet vbetstreaming.
Alémfreebet vbetcolaborar no roteiro, Teresa atua como consultora da obra. "Gostofreebet vbetcomparar meu trabalho aofreebet vbetuma arqueóloga", diz. "É um mistofreebet vbetpesquisa arqueológica com investigação detetivesca. Não basta ler o livro físico. Tem que 'escavar' nos arquivos".
Foi pesquisando arquivos públicos, tal e qual uma arqueólogafreebet vbetbuscafreebet vbetum fóssil raro, que Teresa Montero descobriu, entre outras preciosidades, a carta que Clarice Lispector - seu nome original era Haia ("Vida",freebet vbethebraico) - escreveu ao presidente Getúlio Vargas (1882-1954) solicitandofreebet vbetnaturalização.
A Descoberta do Mundo resgata trechos do depoimento dado por Clarice ao Museu da Imagem e do Som (MIS) no dia 20freebet vbetoutubrofreebet vbet1976 e reúne depoimentosfreebet vbetamigos, como as escritoras Nélida Piñon e Marina Colasanti, e familiares, como Paulo Gurgel Valente, seu filho, e Nicole Algranti,freebet vbetsobrinha-neta. Dos que já partiram, há entrevistas com os poetas alagoano Ledo Ivo (1924-2012) e maranhense Ferreira Gullar (1930-2016) e o jornalista carioca Alberto Dines (1938-2018).
"Minha história com Clarice começou a ser escrita aos 19 anos quando li Água Viva pela primeira vez. Lerfreebet vbetobra me tornou uma pessoa melhor", afirma Taciana. "O documentário diz muito sobre o atual momento político do Brasil. Se estivesse viva, Clarice estaria indignada com tudo o que está acontecendo. Donafreebet vbetuma posição ideológica firme, estaria ao lado dos que lutam por seus direitos."
Militante ou 'isentona'?
Outra descoberta importantefreebet vbetÀ procura da Própria Coisa atende pelo títulofreebet vbet"Clarice Lispector fichada pela polícia política: 1950 e 1973". Garimpadosfreebet vbetdois arquivos públicos, o Nacional e o do Estado do Riofreebet vbetJaneiro (APERJ), as fichas policiais revelam a atuação políticafreebet vbetClarice na luta pelo fim da ditadura e a patrulha que ela sofria por parte dos governos antidemocráticos.
A escritora foi fichada pela primeira vezfreebet vbet27freebet vbetjaneirofreebet vbet1950, durante o governo do general Eurico Gaspar Dutra (1946-1951), na Delegacia Especialfreebet vbetSegurança Política e Social (DESPS). Qual a razão do seu fichamento? No livro, Teresa especula algumas hipóteses: era casada com um funcionário do Itamaraty, o diplomata carioca Maury Gurgel Valente (1921-1994)? O casal era amigo do jornalista russo Samuel Wainer (1910-1980) efreebet vbetesposa, Bluma (1914-1951)? Ela tinha "nacionalidade russa"? Difícil saber.
O segundo fichamento ocorreufreebet vbet6freebet vbetjunhofreebet vbet1973, no Serviço Nacionalfreebet vbetInformações (SNI), durante o governo do general Emílio Garrastazu Médici (1969-1974). À época, Clarice trabalhava no Jornal do Brasil, com Alberto Dines, considerado "subversivo" pelo regime militar. E mais: gostavafreebet vbetentrevistar intelectuais da esquerda, como o jornalista Antônio Callado (1917-1997), o antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997) e o psicanalista Hélio Pellegrino (1924-1988), entre outros, para a revista Fatos & Fotos.
Vista como "alienada" por Henriquefreebet vbetSouza Filho (1944-1988), o Henfil, Clarice chegou a ser "enterrada"freebet vbet"O Cemitério dos Mortos-Vivos", tirinhafreebet vbethumor publicada nas páginas do jornal O Pasquim. Era lá que o cartunista sepultava simbolicamente personalidades que, emfreebet vbetopinião, simpatizavam com o regime militar ou, como se diz nos diasfreebet vbethoje, ficavamfreebet vbetcima do muro.
Na ediçãofreebet vbetnº 138, publicada na semanafreebet vbet22 a 28freebet vbetfevereirofreebet vbet1972, o "enterro" foifreebet vbetClarice Lispector. "Me reservo o direitofreebet vbetcriticar uma pessoa que, com o recurso que tem, a sensibilidade enorme que tem, se coloca dentrofreebet vbetuma redoma", explicou Henfil. Fizeram companhia a ela, entre outros, o dramaturgo Nelson Rodrigues (1912-1980), a escritora Rachelfreebet vbetQueiroz (1910-2003) e a apresentadora Hebe Camargo (1929-2012).
Sobre o episódio, Clarice comentou,freebet vbetabrilfreebet vbet1972: "Ele não me conhece o bastante para saber o que eu penso ou não". E completou: "Se eu me encontrasse com ele, a única coisa que eu diria é: 'Olha, quando você escrever sobre mim, Clarice não é com dois 'esses', é com 'c', viu?'". Anos depois,freebet vbetdepoimento para a jornalista Regina Echeverria, autora da biografia Furacão Elis (1985), Henfil fez um mea culpa: "Eu só me arrependofreebet vbetter enterrado duas pessoas: Clarice Lispector e Elis Regina".
À Procura da Própria Coisa traz, ainda, uma foto inéditafreebet vbetClarice Lispector na Passeata dos Cem Mil. O protesto, realizado no dia 26freebet vbetjunhofreebet vbet1968, reuniu artistas e intelectuais, como o ator Paulo Autran (1922-2007), a atriz Tônia Carrero (1922-2018) e o dramaturgo Dias Gomes (1922-1999).
A fagulha incendiária da passeata foi a morte do estudante Edson Luísfreebet vbetLima Souto (1950-1968) durante uma invasão policial ao restaurante Calabouço, no Centro do Rio. Na imagem, Clarice está sentada no chão, ouvindo o discurso dos líderes estudantis.
Homenagemfreebet vbetbronze
Com o passar dos anos, Teresa Montero tornou-se mais do que biógrafafreebet vbetClarice Lispector. A convite do filho da escritora, Paulo Gurgel Valente, passou, também, a organizar antologias. São dela: Correspondências (2002), Aprendendo a viver (com Luiz Ferreira, 2005), Outros escritos (com Lícia Manzo, 2005), Minhas queridas (2007), Clarice na cabeceira (contos, 2009) e Clarice na cabeceira (crônicas, 2010). Nestes dois últimos, admiradores famosos da obra clariceana elegem seus contos e crônicas favoritos.
Não satisfeita, Teresa ainda colaborou, assinando o prefácio ou redigindo as notas,freebet vbetduas publicações: Clarice Lispector - Entrevistas (2007), organizado por Claire Williams, e Todas as cartas (2020). Ajudou, ainda, na criação do Espaço Clarice Lispector no Jardim Botânico e na instalaçãofreebet vbetuma estátuafreebet vbetbronze, no Leme.
A obra,freebet vbettamanho natural, é assinada pelo escultor Edgar Duvivier e, não por acaso, fica no bairro onde Clarice viveu seus últimos anosfreebet vbetvida. Em 2016, Duvivier foi convidado pela prefeitura do Rio para esculpir uma estátuafreebet vbethomenagem à moradora mais ilustre do bairro.
No dia, conheceu Teresa e a atriz Beth Goulart, que interpretou a escritora no monólogo Simplesmente Eu, Clarice Lispector. A certa altura da conversa, Duvivier perguntou: "E quem vai financiar a estátua?" Ninguém soube responder.
Na faltafreebet vbetpatrocínio, Duvivier esculpiu 40 maquetes e conseguiu vendê-las, cada uma por R$ 2,5 mil,freebet vbet15 dias. Alémfreebet vbetesculpir a escritora, esculpiu também o cãofreebet vbetestimação dela, Ulisses. "Quando os cachorros passam pela estátua, começam a latir. Tem uns que ameaçam até morder o Ulisses. Minha obra é apreciada até por cachorros!", diverte-se.
Roteiro clariceano
Entre uma biografia e outra, Teresa lançou O Riofreebet vbetClarice — Passeio afetivo pela cidade (2018). O livro nasceufreebet vbetuma sériefreebet vbetpasseios culturais, realizados entre 2008 e 2019, pelos bairros onde Clarice viveu na cidade: Tijuca, Centro, Catete, Botafogo, Cosme Velho, Jardim Botânico e Leme. Os participantes leem trechosfreebet vbetsua obra, trocam experiênciasfreebet vbetleitura e visitam os lugares que ela frequentou.
Um dos pontos altos do roteiro é o número 88 da rua Gustavo Sampaio, no Leme. Lá mesmo, onde a TVE gravou a entrevista para Os mágicos,freebet vbet1976. Clarice morou no Edifício Macedofreebet vbet1966 a 1977. Hoje, quem mora no apartamento 701 é a atriz Zezé Motta. "Acredita que, certa vez, uma fã foi lá por conta própria, bateu na porta da Zezé e pediu para conhecer o apartamento?", indaga Teresa, espantada. Sim, Clarice tem dessas coisas.
A ideiafreebet vbetfazer um tour pelas ruas clariceanas do Rio surgiu durante viagem a Itabira (MG), a 111 quilômetrosfreebet vbetBelo Horizonte. Na terra natal do escritor Carlos Drummondfreebet vbetAndrade (1902-1987), placas sinalizam endereços importantes na vida e obrafreebet vbetseu filho mais ilustre. De volta ao Rio, pensoufreebet vbetfazer o mesmo com Clarice.
Às voltas com o lançamentofreebet vbetÀ procura da própria coisa, Teresa ainda não teve tempofreebet vbetler o novo livrofreebet vbetChico Buarque, Anosfreebet vbetchumbo. Um dos contos, Para Clarice Lispector, com candura, fala da admiração, quase idolatria,freebet vbetum jovem poeta por uma escritora famosa.
"Chico é lindo e é tímido e é triste. Ah, como eu gostariafreebet vbetdizer alguma coisa - o quê? - que diminuísse afreebet vbettristeza", escreveu Clarice emfreebet vbetcoluna do Jornal do Brasilfreebet vbet3freebet vbetfevereirofreebet vbet1968.
"É bacana saber que, depoisfreebet vbettodos esses anos, o Chico presta essa homenagem a Clarice", afirma Teresa.
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