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4 momentos que contam a história da destruição das ferrovias no Brasil:cbet ict units
A BBC News Brasil perguntou a especialistascbet ict unitshistória e engenharia ferroviária o porquê - sintetizado, a seguir,cbet ict unitsquatro momentos.
A crise do café
O café é elemento central nos primeiros capítulos da história das ferrovias no Brasil - tanto na ascensão quanto na decadência, como explica Eduardo Romerocbet ict unitsOliveira, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp).
É a razão para a construção das primeiras estradascbet ict unitsferro no século 19: a primeira delas, a Estradacbet ict unitsFerro Mauá, que começou a operarcbet ict units1854, levavacbet ict unitssuas locomotivas a vapor a commodity do Vale do Paraíba ao portocbet ict unitsMagé, na baixada fluminense, que,cbet ict unitslá, seguiacbet ict unitsbarco até a cidade do Rio. Nessa época, o café representava quase 50% das exportações brasileiras.
A malha ferroviária foi aumentando com a expansão da atividade cafeeira e passou a deslocar também passageiros, que até então só conseguiam viajar longas distâncias com transportes movidos por tração animal, como as charretes puxadas por cavalos.
"Durante muito tempo, as ferrovias foram praticamente a única viacbet ict unitstransportecbet ict unitscargas e pessoas no país", destaca Oliveira, um dos pesquisadores do projeto Memória Ferroviária.
E foi nesse contexto que a malha chegou a quase 30 mil kmcbet ict unitsextensão na décadacbet ict units1920, quando veio o baque da crisecbet ict units29. O crash da bolsa nos Estados Unidos, na época o maior compradorcbet ict unitscafé brasileiro, e a grande depressão que se seguiu tiveram impacto direto sobre o Brasil.
Em um curto espaçocbet ict unitstempo, as exportações da mercadoria despencaram, assim como os preços. As ferrovias, que eram administradas pelo setor privado sob regimecbet ict unitsconcessão, passaram a transportar cada vez menos carga e viramcbet ict unitsrentabilidade despencar.
Tem início, nesse momento, um período lentocbet ict unitsdecadência que culminaria na estatização das estradascbet ict unitsferro maiscbet ict unitsduas décadas depois.
JK e o nascimento da indústria automobilística
Antes, contudo, outros dois fatores importantes entramcbet ict unitscena: o crescimento das cidades e a popularização do automóvel.
O país vive uma grande transformação depoiscbet ict units1940. Até então baseada quase exclusivamente na agricultura, a economia brasileira se volta cada vez mais para a indústria. A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e a Vale do Rio Doce, então empresas estatais, são fundadas nessa época,cbet ict units1940 e 1942, respectivamente, no último período do governocbet ict unitsGetúlio Vargas, a ditadura do Estado Novo.
Essa mudança na matrizcbet ict unitscrescimento, porcbet ict unitsvez, catalisa um processocbet ict unitsmigração das populaçõescbet ict unitsáreas rurais para as cidades. As capitais ganham uma nova escala, vão inchando, um processo que tem como efeito colateral a diminuição da demanda por trenscbet ict unitspassageiroscbet ict unitsalguns trechos menores, entre cidades próximas.
"As fábricas estão nas cidades", pontua Oliveira.
A políticacbet ict unitsindustrialização continua com o presidente Juscelino Kubitschek, que assumecbet ict units1956 e elege a indústria automobilística como catalisadorcbet ict unitsseu planocbet ict unitsdesenvolvimento.
O Planocbet ict unitsMetascbet ict unitsJK, que ganhou o slogan "50 anoscbet ict units5", é frequentemente apontado como o início do chamado "rodoviarismo" no Brasil. Um movimento cheiocbet ict unitsnuanças e explicado por uma combinaçãocbet ict unitsfatores, diz o professorcbet ict unitsEngenhariacbet ict unitsTransportes da Coppe/UFRJ Hostílio Xavier Ratton Neto.
Um deles é a própria natureza da indústria automotiva, que tem uma cadeiacbet ict unitsprodução longa, com efeito multiplicador na economia, e emprega uma mãocbet ict unitsobra qualificada que até então não existia no país.
"É nessa época que se cria a classe do operário especializado, com maior poder aquisitivo", afirma.
Em paralelo, a construção das rodovias era menos custosa que as estradascbet ict unitsferro e o petróleo usado para produzir combustível ainda era muito barato.
No panocbet ict unitsfundo, a Guerra Fria estreitava as relações entre Brasil e Estados Unidos. Na tentativacbet ict unitsbarrar a expansão da influência da União Soviética no continente, os americanos firmaram acordoscbet ict unitscooperação técnica ecbet ict unitsfinanciamento para investimentos com diversos países da América Latina.
Assim, aindacbet ict units1956 foi criado o Grupo Executivo da Indústria Automobilística (GEIA), sob o comando do Capitãocbet ict unitsMar e Guerra Lúcio Meira.
O Brasil, que até então só montava veículos, passaria a fabricar carros, caminhões e jipes, tendo como principal polo a região do ABC paulista. São desse período dois modelos que fizeram história no país: o Fusca e a Kombi, ambos da linhacbet ict unitsmontagem da Volkswagencbet ict unitsSão Bernardo do Campo.
Com a produçãocbet ict unitsveículos nacionais, multiplicaram-se os quilômetroscbet ict unitsrodovias. Só nos cinco anoscbet ict unitsgestão JK, a malha rodoviária federal pavimentada foi multiplicada por três,cbet ict units2,9 mil km para 9,5 mil km.
As ferrovias, porcbet ict unitsvez, entravam os anos 1950 sucateadas.
Além da redução da demandacbet ict unitscarga e passageiros, um outro fator contribuiu para o "estado bastante acentuadocbet ict unitsdegradação física das estradascbet ict unitsferro": "Muitas concessões já estavam no final, próximo da devolução, e não havia cláusula nos contratos que obrigassem as concessionárias a fazer investimentos ou devolver as ferrovias no estadocbet ict unitsque as pegaram", diz Ratton Neto, que tem larga experiência no planejamento, construção, operação e gestãocbet ict unitssistemascbet ict unitstransporte metroviário e ferroviário.
É nesse contexto que,cbet ict units1957, surge a Rede Ferroviária Federal (RFFSA), estatal que passou a administrar as ferrovias que até então estavam nas mãoscbet ict unitsdiferentes empresas privadas.
Inicialmente, diz o historiador Welber Luiz dos Santos, do Núcleocbet ict unitsEstudos Oestecbet ict unitsMinas da Associação Brasileiracbet ict unitsPreservação Ferroviária, a intenção não era "destruir" as ferrovias.
"Os primeiros relatórios da empresa demonstram que o projeto eracbet ict unitsmodernização e unificação administrativa para facilitar a integração entre os diferentes meioscbet ict unitstransporte", afirma o pesquisador.
"Os investimentos rodoviários do Planocbet ict unitsMetascbet ict unitsJK não eram uma ameaça ao sistema ferroviário", avalia.
A extinção das linhascbet ict unitspassageiros
Os projetoscbet ict unitsrecuperação e melhoria, contudo, incluíam a desativaçãocbet ict unitsuma sériecbet ict unitslinhas e "ramais" (jargão do setor para os trechos secundários) considerados deficitários.
A lógica, diz o historiador Eduardo Romerocbet ict unitsOliveira, é que o mundocbet ict unitsmeados do século 20 era completamente diferente daquele que, muitas décadas antes, havia norteado a construçãocbet ict unitsparte das ferrovias.
"Houve uma mudança no negócio", diz o professor da Unesp. "As estradascbet ict unitsferro da música do Milton Nascimento eramcbet ict unitsoutra época, para pensar o transportecbet ict unitscafé,cbet ict unitsaçúcar,cbet ict unitsum períodocbet ict unitsque nem a legislação trabalhista existia."
O químico Ralph Mennucci Giesbrecht, um "fanático por ferrovias" que há maiscbet ict unitsduas décadas pesquisa sobre elas, especialmente sobre as estações, coleciona diversas histórias desse período turbulento.
"Nos anos 60 e 70 sumiram praticamente todas as ferrovias menores, aquelas consideradas deficitárias", diz ele, autor do livro O Desmanche das Ferrovias Paulistas.
Os conflitos aparecemcbet ict unitshistórias como a da desativação do trecho entre as cidades paulistascbet ict unitsSão Pedro e Piracicaba, concluídacbet ict units1966. O prefeitocbet ict unitsSão Pedro na época chegou a enviar um telegrama incisivo ao governador, Laudo Natel, questionando o critério da baixa rentabilidade usado para justificar a extinção do ramal.
"Déficit, se não levarmoscbet ict unitsconta o bem coletivo, também dá a polícia, dão as escolas e todas as repartições mantidas pelo Estado. O déficit do ramal é muito relativo, pois, não levandocbet ict unitsconta o movimento das estaçõescbet ict unitsBarãocbet ict unitsRezende, Costa Pinto, Recreio e Paraisolândia, a estaçãocbet ict unitsSão Pedro despachou este ano maiscbet ict units40.000 toneladascbet ict unitscana. Finalizando, aqui deixo minha desilusão por tudo e por todos", dizia a mensagem, conforme reportagem do jornal O Estadocbet ict unitsS.Paulocbet ict units30cbet ict unitsoutubrocbet ict units1966 encontrada por Giesbrecht.
Aos poucos, as linhascbet ict unitspassageiros foram desaparecendo, permanecendo,cbet ict unitsalguns casos, aquelas que cruzavam as regiões metropolitanas das grandes cidades, usadas até hoje.
Com o avanço da indústria automobilística e a entrada do aviãocbet ict unitscena, as ferrovias entraramcbet ict unitscrise,cbet ict unitsmaior ou menor medida,cbet ict unitstodo o ocidente. Nos paísescbet ict unitsque foram mantidas para transportecbet ict unitspassageiros, o serviço, na maioria dos casos, passou às mãos do Estado.
É o caso, por exemplo, dos Estados Unidos. A estatal Amtrak foi fundadacbet ict units1971 e faz até hoje a gestão das linhascbet ict unitspassageiros no país. Também são estatais a alemã Deutsche Bahn, a espanhola Renfe e a francesa Société Nationale des Cheminscbet ict unitsfer Français (SNCF).
A estagnação e o corredorcbet ict unitscommodities
Do lado do transporte ferroviáriocbet ict unitscarga, parte dos investimentos vislumbrados no período JK não saíram do papel, diz o historiador Welber Santos.
Emcbet ict unitsvisão, a ditadura militar mudou o foco da políticacbet ict unitstransportes, que passou a ser mais voltada para as rodovias, com a apostacbet ict unitsgrandes obrascbet ict unitsengenharia, como a ponte Rio-Niterói, e alguns investimentos questionáveis, como a Transamazônica, que nunca foi concluída.
A Ferrovia do Aço, ele diz, um dos projetos ferroviários que chegou a sair do papel nesse período, começou a ser construídacbet ict units1973 com a promessacbet ict unitsser entreguecbet ict unitsmil dias, mas só foi inauguradacbet ict units1992, e com um porte muito mais modesto do que o projeto inicial.
Para Ratton Neto, da Coppe/UFRJ, um dos principais obstáculos à realização dos investimentos necessários à malha ferroviária do país naquela época foi a crise do petróleocbet ict units1973 e o período turbulento que se seguiu.
"Depois daquele choque na economia mundial, o Brasil, que até então tinha acesso fácil a crédito, passou a ser visto como paíscbet ict unitsalto risco. A partir daí, teve início uma crise que impediu que os planos nacionaiscbet ict unitsdesenvolvimento pudessem ter sequência. Deixamoscbet ict unitsplanejar para apagar incêndio praticamente até os anos 90", diz ele.
Nos anos 1990,cbet ict unitsum contextocbet ict unitsbaixo crescimento econômico, inflação elevada e alto nívelcbet ict unitsendividamento público, a RFFSA é liquidada e as ferrovias são novamente concedidas à iniciativa privada, por meio do Plano Nacionalcbet ict unitsDesestatização (PND).
A partir daí, elas passam a funcionar majoritariamente como corredorescbet ict unitstransportecbet ict unitscommodities para exportação, diz o professor da Coppe/UFRJ.
Hoje, quase metade da malha, 14 mil km, está nas mãos da Rumo Logística, empresa do grupo Cosan. Outros 2 mil km são administrados pela Vale. Cercacbet ict units75% da produçãocbet ict unitstransporte ferroviário é minériocbet ict unitsferro. "Outros 10% ou 12% são soja", estima Ratton Neto.
Como os contratoscbet ict unitsconcessão não preveem a realizaçãocbet ict unitsinvestimentos e melhorias, boa parte da malha segue como foi construída no segundo império, com a chamada bitola métrica, ultrapassada, bem mais estreita que a bitola internacional, hoje usada como padrão.
O modelo atualcbet ict unitsexploração das ferrovias, na avaliação do especialista, subaproveita o potencial do país e deixa o Brasil refém das rodovias - consequentemente, mais suscetível a grevescbet ict unitscaminhoneiros como acbet ict units2018, que gerou caos e desabastecimento.
As estradascbet ict unitsferro poderiam ser mais utilizadas para transportecbet ict unitsbens industriais, ele exemplifica,cbet ict unitsbobinascbet ict unitsferro e cimento a automóveis, inclusivecbet ict unitstrechos curtos, nos moldes das "short lines" dos Estados Unidos.
"Também poderiam ser usadas para transportar contêineres, uma tendência nova e muito rentável", acrescenta.
Um entrave para o planejamentocbet ict unitsnovas linhas, contudo, é o apagãocbet ict unitsdados sobre a movimentação internacbet ict unitscargas. O Brasil não sabe, no detalhe, o que é transportado ecbet ict unitsonde para onde. Iniciativas como o Plano Nacionalcbet ict unitsContagemcbet ict unitsTráfego ainda não geram dados robustos nesse sentido, diz o professor.
A outra é o próprio modelocbet ict unitsconcessão,cbet ict unitsque as concessionárias têm controle tanto sobre as vias quanto sobre os trens. Assim, essas empresas acabam tendo o monopólio do transporte ferroviário e,cbet ict unitsúltima instância, decidem o que trafega ou não pelos trilhos.
"As ligações hoje atendem aos interesses dos próprios concessionários."
Os novos projetos anunciados recentemente pelo governo, na avaliação do professor, não chegam a quebrar a lógica das ferrovias como corredorcbet ict unitscommodities. Em setembro, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, anunciou a autorização para construção, pela iniciativa privada,cbet ict units10 novas ferrovias, com investimentos da ordemcbet ict unitsR$ 50 bilhões.
Em paralelo, ele chama atenção também para o projeto da Ferrogrão, que deve ligar o Mato Grosso ao Parácbet ict unitscercacbet ict units933 km com a propostacbet ict unitsfacilitar o escoamentocbet ict unitsgrãos pela região Norte do país.
Na tentativacbet ict unitstirar a ferrovia do papel, o governo sinalizou que disponibilizará para a futura concessionária até R$ 2,2 bilhõescbet ict unitsrecursos da União. O dinheiro, contudo, viria da outorga que será paga pela Vale para renovar a concessãocbet ict unitsduas das ferrovias que administra hoje, a Estradacbet ict unitsFerro Carajás e a Estradacbet ict unitsFerro Vitória-Minas.
"Os recursos da outorga que poderiam ser usados para geraçãocbet ict unitsbenefícios econômicos e sociais nesse caso acabariam captados pelo próprio setor privado."
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