‘Vivo melhor no Capão Redondo do que nos EUA’:código afiliado pagbet

Legenda da foto, O rapper diz sentir-se mais seguro na periferiacódigo afiliado pagbetSão Paulo do quecódigo afiliado pagbetNova Jersey | foto: Ana Carolina Camargo
Legenda da foto, Jordan nasceucódigo afiliado pagbetNova Jersey, a cercacódigo afiliado pagbet40 minutoscódigo afiliado pagbetManhattan | foto: Ana Carolina Camargo

Pouco tempo antescódigo afiliado pagbetmudar para o Brasil, Jordan vivenciou a experiência que agora usa para comparar os dois lugares: ao sair da festacódigo afiliado pagbetum amigo durante uma madrugada, precisou pararcódigo afiliado pagbetuma rua vazia após uma pane do veículo que dirigia. Em vezcódigo afiliado pagbettentar consertá-lo ou sair para pedir ajuda, Jordan preferiu dormir dentro do veículo até o dia amanhecer. "Se eu saísse do carro talvez não estivesse aqui agora."

Negros americanos

Apesarcódigo afiliado pagbetter passado a infância e a adolescênciacódigo afiliado pagbetPlainfield, Jordan Fields nasceucódigo afiliado pagbetNewark, também no subúrbio do estadocódigo afiliado pagbetNova Jersey, a 20 minutoscódigo afiliado pagbetJersey City e 40 minutos da Times Square, no coraçãocódigo afiliado pagbetNova York.

A cidade é conhecida nos Estados Unidos pela rebeliãocódigo afiliado pagbetjulhocódigo afiliado pagbet1967, quando, após um taxista afro-americano ser agredido por dois policiais sem que tivesse cometido crime algum, as ruas foram tomadas por negros revoltados que desconheciam o paradeiro dele (ou do seu corpo). Naquele momento, a luta pela igualdadecódigo afiliado pagbetdireitos no país estavacódigo afiliado pagbetseu auge.

Legenda da foto, Antescódigo afiliado pagbetmudar-se para o Brasil, Jordan deu aulascódigo afiliado pagbethistóriacódigo afiliado pagbetcolégios dos EUA | foto: Ana Carolina Camargo

O episódio ficou marcado como um dos mais tensos da história da luta racial no país: 26 pessoas morreram após quatro diascódigo afiliado pagbetconfronto entre civis e o Exército - e um número não oficial indica que, desses, 16 eram moradores negros. "Todos os brancos saíram da cidade e não voltaram nunca mais", conta Jordan.

Um dos rebeladoscódigo afiliado pagbetNewark era o seu pai, que, na ocasião, chegou a ser atingido por um tirocódigo afiliado pagbetraspão na cabeça disparado por um soldado. A históriacódigo afiliado pagbet1967 foi contada exaustivamente por ele até acódigo afiliado pagbetmorte,código afiliado pagbetjunhocódigo afiliado pagbet2014. Ao jornal The New York Times, o líder do movimento negrocódigo afiliado pagbetNewark à época, Robert Curvin, mortocódigo afiliado pagbet2015, disse que o conflito foi "a coisa mais dolorosa e traumática que ele viu na vida".

Jordan, dacódigo afiliado pagbetforma, também se rebelou: formadocódigo afiliado pagbetHistória pela New Jersey City University, foi contratado como professor substitutocódigo afiliado pagbetuma escolacódigo afiliado pagbetensino médio da periferiacódigo afiliado pagbetPlainfield. Acreditou que poderia ajudar a mudar o destino dos meninos negros contando-lhes sobre o que representavam os episódioscódigo afiliado pagbet1967 e a própria história dos afro-americanos que havia culminado nos protestos. Não teve êxito.

"Os meninos precisam passar por um 'batismo' nas gangues afro-americanas para provar que são homens. É algo que remete à africanidade deles: na África, são comuns rituais que marcam uma passagem da vida", compara.

Legenda da foto, No Estadocódigo afiliado pagbetJordan, nos EUA, há conflitos entre ganguescódigo afiliado pagbetnegros e latinos | foto: Ana Carolina Camargo

"Lembro especialmentecódigo afiliado pagbetum aluno meu que foi assassinado por uma gangue rival: ele era um menino bom, estava sempre com o sorriso no rosto, não era um criminoso. Um dia, voltandocódigo afiliado pagbetuma aula a que ele tinha faltado, passeicódigo afiliado pagbetuma rua e vi a polícia isolando o corpo dele na calçada", lamenta.

Hoje, as cidadecódigo afiliado pagbetPlainfield está lidando com um grande conflito entre negros e latinos, que desde os anos 1980 migraramcódigo afiliado pagbetmassa à costa leste dos EUA. Segundo dados do governocódigo afiliado pagbetNova Jersey, 19% da população do Estado é hispânica - na maioria salvadorenhos, guatemaltecos e mexicanos. Assim comocódigo afiliado pagbetLos Angeles, na Califórnia, foi nessa época que nasceram gangues violentas como a Mara Salvatrucha (MS-13), que passaram a brigar pelos territórios com os grupos ali já estabelecidos pelos negros, como os Bloods e Crips.

"Duas minorias se matando. É um absurdo", lamenta Jordan. Em 2009, ele criou,código afiliado pagbetparceria com um amigo o grupo "Negros Americanos", que tentava unir latinos e negros na periferiacódigo afiliado pagbetNova Jersey cantando rapscódigo afiliado pagbetespanhol.

Apesar da dificuldadecódigo afiliado pagbetaprender o idioma, o simbolismocódigo afiliado pagbetver um negro cantando um estilo musical identificado com o cotidiano periférico negro dos EUAcódigo afiliado pagbetum idioma hispânico atraiu a atenção da cidade. Conseguiu a façanhacódigo afiliado pagbetter entradas entre os dois grupos e chegou a abrir shows para rappers famosos como Naughty By Nature, Redman e Styles P.

Legenda da foto, Antescódigo afiliado pagbetse mudar para o Brasil, ele passou um ano vivendo no Panamá | foto: Ana Carolina Camargo

"Em Plainfield, todo mundo quer ser rapper ou jogadorcódigo afiliado pagbetbasquete. São os clichês. Quando os caras me viam rimandocódigo afiliado pagbetespanhol, eles falavam: 'Pô, isso aí é diferente'", conta. O projeto chegou a levá-lo ao Panamá, onde passou um ano estudando o idioma e organizando showscódigo afiliado pagbetrap na periferia da Cidade do Panamá, alémcódigo afiliado pagbetproduzir um documentário sobre a guerra entre negros e latinoscódigo afiliado pagbetPlainfield.

O trem

Jordan não sabe se foi um sonho ou um fato que lhe apresentou o Brasil. Certo dia, um brasileiro perdido na página "Negros Americanos" do Facebook lhe enviou o vídeocódigo afiliado pagbet"Negro Drama", clássico do grupo paulistano Racionais MC's, pedindo para que ele gravasse uma versão própria. Disse ainda que o trabalho delecódigo afiliado pagbetPlainfield tinha muitas semelhanças com o que acontecia nas periferias das grandes cidades brasileiras.

"Eu só não tenho certeza se essa conversa existiu. Eu a procurei muito no histórico do Facebook, mas nunca a encontreicódigo afiliado pagbetnovo. Às vezes, realmente acredito que foi algo do destino para eu chegar aqui, que esse diálogo nunca aconteceu."

Como já sabia falar espanhol, Jordan passou a estudar português ouvindo rap brasileiro - os próprios Racionais MC's, Sabotage e Facção Central -, alémcódigo afiliado pagbetalgumas influências que chegavam ocasionalmente, como um disco do Trio Mocotó que caiucódigo afiliado pagbetsuas mãos. No finalcódigo afiliado pagbet2015, ele atendeu ao pedido e postou uma pequena versãocódigo afiliado pagbetportuguêscódigo afiliado pagbet"Negro Drama"código afiliado pagbetseu perfil no YouTube.

Legenda da foto, Ele conheceu a namorada pela internet, antescódigo afiliado pagbetse mudar dos EUA para São Paulo | foto: Facebook - Jordan Fields

À época, Jordan já namorava à distância a fotógrafa e também rapper Lena Silva, uma das líderescódigo afiliado pagbetum coletivo negro do Capão Redondo. Eles se conheceram quando ele procurava movimentos semelhantes ao seu no Brasil. "Ela teve muita paciência me ensinando português pelo Facebook e, para mostrar a ela que eu estava realmente empenhado, comecei a gravar os vídeos". Em janeiro do ano passado, eles se casaram, meses depoiscódigo afiliado pagbetsua chegada ao Brasil e, enfim,código afiliado pagbetconhecê-la pessoalmente.

Em abrilcódigo afiliado pagbet2016, quando ainda viviacódigo afiliado pagbetPlainfield, Jordan publicou outra músicacódigo afiliado pagbetportuguês na plataforma: "O Trem", clássico do rap brasileiro gravado pelo RZOcódigo afiliado pagbet1999. Ao contrário da primeira, porém, ele queria não apenas cantar, mas produzir um clipe alternativo.

Copiando o vídeo original,código afiliado pagbetque os membros do grupo brasileiro registraram imagens do cotidiano dentro e fora dos trens que passam por Pirituba, bairro periférico da zona oestecódigo afiliado pagbetSão Paulo, a versãocódigo afiliado pagbetJordan tem cenas filmadas por ele mesmocódigo afiliado pagbetNewark, à beira da ferrovia, cujo cotidiano é preenchido por pobreza e violência.

"Minha intenção era mostrar como, longe da ideia encantada que os brasileiros têm dos EUA, a vida lá também pode ser muito complicada. Principalmente para os negros", diz.

Para Helião, um dos membros do RZO, a gravaçãocódigo afiliado pagbetJordan reproduziu com perfeição o processocódigo afiliado pagbetprodução da própria música. "Na época que fizemos 'O Trem' estávamoscódigo afiliado pagbetuma batalha pesada para sermos rappers. Essa música tem muito sofrimento, suor, sangue mesmo, e eu acho que ele sentiu essa força", diz.

Legenda da foto, O rapper numa foto antigacódigo afiliado pagbetWashington, capital dos EUA | foto: Facebook - Jordan Fields - reprodução

"Quando eu vi pela primeira vez achei demais: um negro bonito, dreads no cabelo, mostrando a linha do trem. A música é muito forte mesmo, cara", completa.

A versãocódigo afiliado pagbet"O Trem"código afiliado pagbetJordan explodiu na cena hip-hopcódigo afiliado pagbetSão Paulo: tinha 201 mil visualizações até janeiro e lhe rendeu uma fama que, agora que vive aqui, chega a incomodar. "É meu vídeo mais assistido no YouTube, mas é complicado: vou fazer shows aqui ecódigo afiliado pagbetalgum momento os caras me pedem pra cantar a música, mas não quero ficar marcado só por ela", completa.

Inglês na quebrada

No ano passado, quando já trabalhavacódigo afiliado pagbetalgumas escolascódigo afiliado pagbetinglês da zona sulcódigo afiliado pagbetSão Paulo e dava aulas particularescódigo afiliado pagbetempresas, Jordan conheceu o coletivo Desenrola Não Me Enrola, no Jardim Ângela, formado por jornalistas que tentam produzir reportagens sobre a periferia da cidade com visões diferentes das dos grandes jornais.

Já no primeiro encontro surgiu a ideiacódigo afiliado pagbetJordan elaborar um cursocódigo afiliado pagbetinglês para os moradores da região, que se transformoucódigo afiliado pagbetrealidadecódigo afiliado pagbetagosto do ano passado. Ao custocódigo afiliado pagbetR$ 65 por mês, ele encerrou a primeira turma no finalcódigo afiliado pagbet2017 com 25 alunos que se encontram duas vezes por semana na sede do coletivo, no Centrocódigo afiliado pagbetMídia e Comunicação Popular M'boi Mirim, na zona sul da cidade.

"Quando o curso começou, eram 40 pessoas. Muitas delas saíram porque tinham que trabalhar, estudar etc.", conta Lena. "Houve até quem conseguiu emprego por causa do inglês que aprendeu nas aulas", completa Jordan.

Legenda da foto, Jordan numa fotocódigo afiliado pagbet2011, antescódigo afiliado pagbetse mudar para o Brasil | foto: Facebook - Jordan Fields - reprodução

"O curso tem uma perspectiva diferente dos comuns: não se trata apenas do estudocódigo afiliado pagbetinglês, mascódigo afiliado pagbetaprender o idioma a partircódigo afiliado pagbetrodascódigo afiliado pagbetconversa sobre questões que envolvem o cotidiano do periférico, usando a experiência dele nos EUA como negro e, claro, como periférico", comenta o jornalista Ronaldo Matos, editorcódigo afiliado pagbetconteúdo do Desenrola Não Me Enrola.

Neste ano, o projeto deve ganhar uma novidade: a presençacódigo afiliado pagbetativistas do movimento negro dos Estados Unidos para rodascódigo afiliado pagbetconversacódigo afiliado pagbetinglês com os alunos. Jordan quer mais: ao ladocódigo afiliado pagbetLena, formou o grupocódigo afiliado pagbetrap "UmSoh", que já lançou a música "A Periferia Pede Socorro" no ano passado. O vídeo no YouTube, gravado no Capão Redondo, tem 9 mil visualizações. Novas canções devem ser lançadas neste ano.

"Também quero criar codornas", conta Jordan, e antes que a surpresa da reportagem da BBC Brasil se torne uma nova pergunta, ele emenda: "Para quem nunca teve nada, ter meu lugar para viver aqui e para criar minhas codornas já é um paraíso".