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Maioridade penal: A rotinasite aviator betanouma vara da infância,site aviator betanoque juízes e promotores decidem o destinosite aviator betanoadolescentes infratores:site aviator betano
Quem é contra argumenta que um menorsite aviator betano18 anos ainda estásite aviator betanoformação e que antecedentes criminais manchariamsite aviator betanovidasite aviator betanoum país que costuma dar poucas oportunidade para ex-presidiários. Também afirma que o encarceramento não diminui a violência. Pelo contrário, a tendência seria aumentá-la, pois os jovens presos poderiam se transformarsite aviator betanomassasite aviator betanomanobra para as facções criminosas que dominam as cadeias.
As cerca 30 audiências às quais a BBC Brasil assistiu foram presididas pelo juiz Egbertosite aviator betanoAlmeida Penido, que há oito anos atua na área. Na sala ficam ainda a promotora Tatiana Callé, responsável pela acusação, e o defensor público Guilherme Feccini. Baseadossite aviator betanosuas experiências cotidianas, os três se mostraram contrários à redução da maioridade. Mas essa não é uma posição unânime nos órgãos que os três representam.
Em São Paulo, cada uma das quatro varas responsáveis por infrações fazem,site aviator betanomédia, 20 audiências no períodosite aviator betanouma tarde - cinco dias por semana. O ritmo é intenso, comosite aviator betanoum "fast-food" judicial, nas palavrassite aviator betanopessoas que atuam na área.
No começosite aviator betanooutubro, a Fundação Casasite aviator betanoSão Paulo tinha 9.333 adolescentes cumprindo medidas socioeducativas - 8.887site aviator betanorestrição totalsite aviator betanoliberdade, provisórias ou não.
'Fui no embalo'
A cabeça baixa, as mãos pra trás, a repetição do termo "senhor", que menores como Luciano adotam, são um códigosite aviator betanoconduta ensinado por funcionários da Fundação Casa e criticado por integrantes do fórum - eles chamam o ensinamentosite aviator betano"coisificação" dos adolescentes.
O paisite aviator betanoLuciano, um encanador, acompanha a audiência. Junto a amigos, o jovem roubou uma pessoa usando uma pedra como arma. Levou celular, R$ 20 e o Bilhete Único da vítima. O juiz Penido pergunta o que o motivou. "Não sei por que fiz, senhor. Fui pela cabeça dos outros, fui no embalo", responde.
Essa foi uma resposta comum: muitos se disseram influenciados por amizades ruins ou simplesmente não sabiam a motivação exata do próprio ato - foram "na onda", "sem pensar direito".
Para a promotora Tatiana Callé, a pouca idade faz com que os garotos tenham dificuldadesite aviator betanoconseguir medir as consequênciassite aviator betanoseus atos. "Com 16 anos, a pessoa ainda é imatura, por mais que a gente acredite que ela já saiba o que faz", diz ela, há dois anos na área. "Eles são mais influenciáveis, com hormônios à flor da pele, o que também dificulta o autocontrole", diz.
Oswaldo Monteiro Neto, promotor da infância há 24 anos no mesmo fórum, massite aviator betanocasos distintos, discorda da avaliação da colega - ele é a favor da redução da maioridade penal. "Com 16 anos, eles têm plena consciência do que fazem. O Código Penal foi feitosite aviator betano1940. Naquela época, uma pessoasite aviator betano16 anos era completamente diferentesite aviator betanoalguém com a mesma idade hoje", diz.
Na audiência, Luciano conta que parousite aviator betanoestudar há dois anos. Ao lado, seu pai explica: "Matriculei ele, doutor. Mas ele faltava muito. Eu trabalho à noite, não consigo acompanhar direito, a mãe não mora com a gente. Sou pai e mãe".
O juiz Penido dá uma bronca no garoto: "Isso é uma questãosite aviator betanovida ou morte. Você poderia ter morrido. E se a vítima reage? E se você leva um tiro? Você não está obedecendo o seu pai". O encanador acrescenta: "Falo para ele, doutor. Se você continuar assim, é cadeia ou morte. Mas ele não escuta".
Pais e filhos
"Sabe dizer por quesite aviator betanomãe não veio?", questiona o magistrado a um garoto alto e magro, cabeça raspada. "Acho que ela está trabalhando", responde João,site aviator betano15 anos. No mês passado, ele e um amigo roubaram um celular. Por quê? "Porque eu queria comprar um tênis e uma roupa para o fim do ano, senhor" diz ele,site aviator betanoresposta ao juiz.
"Em geral, nossa experiência mostra que quem comete uma infração é aquele adolescente que não tem o respaldo familiar. Ou que os pais, por problemas financeiros, ficam ausentes", explica Callé. "Eles residemsite aviator betanocomunidades carentessite aviator betanosaúde,site aviator betanoeducaçãosite aviator betanoqualidade, carentes do Estado. A maioria é negra ou parda, pobressite aviator betanotudo. Se são brancos, são muito pobres também. Eles acabam ficando na rua, soltos, sem imposiçãosite aviator betanolimites. Assim, a possibilidade dessa pessoa infracionar é enorme", diz.
O defensor público Guilherme Feccini compartilha da percepçãosite aviator betanoCallé. "Os adolescentes que estão mais sujeitos ao processo judicial são majoritariamente pobres. Isso acontecesite aviator betanorazão da seletividade do sistema punitivo."
Em outra audiência, um garotosite aviator betanocercasite aviator betano1,50 metrosite aviator betanoaltura entra na sala junto da mãe. Só ao completar 12 anos é que uma pessoa passa a responder por um processo. Felipe tem 12 anos e quatro meses e essa erasite aviator betanosegunda passagem por tráficosite aviator betanodrogas. No braço, ostenta três tatuagens: "Mãe", "Pai" e "Jesus Cristo" (em outra sessão naquele mesmo dia, um adolescentesite aviator betano16 anos tinha uma tatuagemsite aviator betanoreferência à facção criminosa Primeiro Comando da Capital).
A mãesite aviator betanoFelipe, que cria os filhos sozinha, é empregada doméstica "de domingo a domingo" - ela tem outro filho internado na Fundação Casa.
Ao ladosite aviator betanoambos, entra na sala Daniel,site aviator betano16, apreendido junto com o amigo Felipe - ambos estavam com cocaína e dinheiro na hora da abordagem policial. Daniel diz que é viciadosite aviator betanomaconha e "pó". O juiz Penido explica que o vício e o tráfico podem levá-los à morte, caso continuem. "Morrer? Mas morrer como?", pergunta a mãesite aviator betanoDaniel, surpresa. Auxiliarsite aviator betanolimpeza, ela soube da dependência química do filho na audiência.
Ao final, no ladosite aviator betanofora, a promotora Callé comenta com a reportagem: "Você entendeu? Às vezes, a família é tão vulnerável que nem faz ideiasite aviator betanoque o filho está correndo risco".
O caso Victor
A discussão da redução da maioridade penal renasceu depoissite aviator betano9site aviator betanoabrilsite aviator betano2013. Naquela noite, o estudante universitário Victor Hugo Deppman,site aviator betano19 anos, chegavasite aviator betanocasa na zona lestesite aviator betanoSão Paulo quando foi assassinado por um adolescente que roubou seu celular. Faltavam três dias para que o infrator completasse 18 anos, idade que permitiria julgá-lo como adulto.
O episódio ganhou repercussão e fez com que o governadorsite aviator betanoSão Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), criasse uma proposta que aumentava para oito anos o tempo máximosite aviator betanointernação para adolescentes com infrações graves, como homicídio, estupro ou latrocínio. Atualmente, o limite ésite aviator betanotrês anossite aviator betanointernação. A propostasite aviator betanoAlckmin não prosperou, mas o projetosite aviator betanoestudo hoje no Congresso ésite aviator betanooutro tucano: Aloysio Nunes (PSDB) - senador licenciado e ministro das Relações Exteriores. Nunes propõe reduzir a maioridade para crimes hediondos.
No texto, ele argumenta: "Não se pode questionar o fatosite aviator betanoque menores infratores, muitas das vezes patrocinados por maiores criminosos, praticam reiterada e acintosamente delitos que vão desde pequenos furtos, até crimes como tráficosite aviator betanodrogas e mesmo homicídios".
A propostasite aviator betanoNunes encontra acolhida popular: o Datafolha questionou,site aviator betano2015, os brasileiros sobre o assunto. Na ocasião, 87% se disseram a favor da redução da maioridade, apenas 11% foram contrários.
Penas brandas?
De acordo com a legislação atual, adolescentes apreendidos por tráfico podem passar mais tempo atrás das grades (três anos) do que adultos processados por tráfico (em média, um ano e oito mesessite aviator betanoprisãosite aviator betanocasosite aviator betanoréus primários). Para crimes violentos, no entanto, menores são detidos normalmente por menos tempo do que prevê o Código Penal para adultos. Homicídio simples, por exemplo, pode manter alguém encarcerado entre 6 e 20 anos.
De acordo com o magistrado Penido, a questão das penas gera a tentaçãosite aviator betanosolucionar a questão aplicando a adolescentes o mesmo castigo que a adultos. Isso seria, no entanto, uma ameaça ao futuro dessa geração. Na opinião do juiz, a políticasite aviator betanosegurança pública adotada pelo Brasil já não tem funcionado bem para os adultos. "A gente vai propor como solução algo que está falido, que é o encarceramentosite aviator betanomassa e o sistema prisional brasileiro?", questiona. Boa parte das cadeias do país são hoje dominadas por facções criminosas. Segundo dadossite aviator betano2014, os últimos divulgados pelo governo federal, há 622 mil pessoas nas cadeias do Brasil - a quarta maior população carcerária do mundo.
O promotor Neto afirma que o raciocínio do magistrado não procede: a necessidadesite aviator betanomelhorar o sistema prisional não exclui a viabilidadesite aviator betanoque menoressite aviator betanoidade sejam enviados pra lá. "Se o problema são as prisões, precisamos resolvê-lo, é óbvio. Mas também precisamos dar uma resposta para a sociedade que está cansadasite aviator betanosofrer com a violência (dos adolescentes)", diz.
Cadeia é solução?
Neto tem opinião parecida à do ministro Aloysio Nunes. "Os menores têm plena consciência do que fazem, e fazem porque têm certezasite aviator betanoque não serão punidos", diz. Segundo o promotor, nos últimos anos os jovens passaram a praticar mais infrações graves do que antes, quando ele entrou no Ministério Público, há 24 anos. "Na faixa dos 16 e 17 anos, eles vêm infracionando gravemente, com tráfico, roubo, homicídio. Esses atos sempre existiram, mas eramsite aviator betanomenor proporção. Demorou para reduzir a maioridade penal".
O juiz Penido pensasite aviator betanooutra forma. "Quando vejo um adolescente acusadosite aviator betanotráfico na minha frente, vejo que a mãe dele sai às 5h para trabalhar, pega duas conduções e retorna no final da tarde, cansada. A escola pública dele é mal estruturada, ou ele a abandonou. Vejo que ele está numa sociedadesite aviator betanoconsumo que o bombardeiasite aviator betanonecessidades superficiais, e que o pressionam a buscar um pertencimento a um grupo. Daí uma biqueira (localsite aviator betanovendasite aviator betanodrogas) oferece um valor altíssimo para ele trabalhar. E eu vou falar para esse jovem que o castigo, uma internação, ou a prisão vão resolver o problema dele? Não vão", diz.
Dos 9.333 jovens que estão na Fundação Casasite aviator betanoSão Paulo - internos ousite aviator betanosemiliberdade - 43%, ou 4.038 jovens, estão ali por tráficosite aviator betanodroga. Crimes violentos representam a minoria dos casos: 99 adolescentes praticaram homicídio, 1% do total, 77 estão ali por latrocínio (0,7%) e 68 por estupro (0,7%).
"Eles não têm qualificação nenhuma e recebem uma quantia inimaginável até para os pais deles. Tem molequesite aviator betano15 anos que ganha mais que gente com ensino superior. Ele sabe que se a polícia aparecer, ele pode ser preso. Mas, para ele, o benefício é muito maior que o risco. Ele vê os rapazes mais velhos da comunidade com muito dinheiro. Você acha que ele vai escolher o quê? Trabalhar num lava-rápido?", diz a promotora Callé.
O promotor Oswaldo Monteiro Neto, a favor da redução, diz que não se pode creditar a criminalidade à pobreza. "Isso é uma injustiça com a classe mais baixa, a pobreza não é indutora do crime".
Em uma das audiências presenciada pela BBC Brasil, o estudante Caique,site aviator betano16 anos, conta que ganhava R$ 300 por seis horassite aviator betanotrabalho vendendo drogassite aviator betanouma favelasite aviator betanoSão Paulo. Ésite aviator betanosegunda passagem por tráfico.
"Lá, eles (chefes do tráfico) só contratam menores. Porque para menor dá menos B.O. (gíria para problema com a Justiça). Não precisasite aviator betanoadvogado, não vai ser preso", disse. Caique mora com a avó, que é cega, desde que a mãe o abandonou.
A promotora Callé rebate: "Caique, como não fica preso? Você pode ficar na Fundação Casa por maissite aviator betanoum ano, isso não é ficar preso? Você não percebe que esses traficantes não estão nem aí para você? Eles te contrataram para ser preso no lugar deles. Você acha que não acontece nada com você?". O garoto responde: "É, acontece, senhora..."
Enviado à Fundação Casa, não se sabe quando Caique retornará às ruas.
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