'Aos 11 anos convenci a políciagoldenspin777que meu pai era o assassinogoldenspin777minha mãe':goldenspin777

- Qual é seu nome?

- Sou Collier Landry Boyle.

- Diga-nos quantos anos você tem agora.

- Tenho 12 anos.

- Você disse que foi dormir por volta das 21h do dia 30goldenspin777dezembro. Aconteceu alguma coisa durante aquela noite que te acordou?

- Ouvi um grito. A primeira coisa que pensei foi que algo estava errado com minha mãe. Um pouco depois, talvez cercagoldenspin777três minutos, ouvi uma forte baque.

Esse diálogo,goldenspin777um tribunal nos Estados Unidosgoldenspin7771990, foi acompanhado com grande interesse pelo país inteiro.

Meses antes, quando Collier Boyle tinha apenas 11 anos, ele acordara um belo dia e viu quegoldenspin777mãe tinha desaparecido. Mas, ao contrário da família egoldenspin777boa parte da comunidadegoldenspin777que vivia, ele imediatamente suspeitou quegoldenspin777mãe tinha sido assassinada.

Ele passou a monitorar seu principal suspeito pelo crime até conseguir levá-lo à Justiça: seu próprio pai.

Esse caso é contadogoldenspin777um episódio da terceira temporada do podcast Que História!, da BBC News Brasil. Ele pode pode ser ouvido nas principais plataformasgoldenspin777podcast, como Spotify e Apple Podcasts, e no canal da BBC News Brasil no YouTube.

O médico e o monstro

No final dos anos 1980, Collier morava com seus pais, John e Noreen Boyle,goldenspin777Mansfield, no interior do Estado americanogoldenspin777Ohio. Era uma família cristã, vivendogoldenspin777uma região pacata que tradicionalmente vota no Partido Republicano.

Ele passava a maior parte do tempo com a mãe,goldenspin777quem era muito próximo.

"Minha mãe sempre me tratava como um pequeno adulto, falava comigo como se eu fosse adulto. Era generosa, atenciosa e afetuosa. Era gentil com todos que conhecia. Mas eu era a pessoa mais importante da vida dela", disse elegoldenspin777uma entrevista recente ao programa Outlook, da BBC.

Seu pai, um médico bastante conhecido e respeitado pela comunidade, estava quase sempre trabalhando. Ou pelo menos era isso que ele fazia a família acreditar.

"Quando ele estava por perto, você sempre tinha que estargoldenspin777guarda. Ele tinha mudançasgoldenspin777humor muito violentas. Ele era um pouco como Dr. Jekyll e Mr. Hyde, o personagemgoldenspin777O Médico e o Monstro. Eu via que, quando ele lidava com pacientes, mostrava compaixão e era muito atencioso. Mas aígoldenspin777casa ele não era assim. A gente achava que ele vivia pro trabalho. Às vezes eu acordavagoldenspin777manhã para ir à escola e encontrava ele dormindo no sofá porque chegava no meio da noite depoisgoldenspin777fazer suas rondas. Mas, como descobri mais tarde, isso acontecia porque ele estava tendo vários casos com outras mulheres", contou Collier.

Noreen sabia dos casos. Ela sofria com a constante infidelidade do marido. O casamento era infeliz, mas, na época, Collier não sabia disso, achava que brigas e discussões eram comunsgoldenspin777todas as famílias. Ele diz ter tido uma infância feliz, até começar a ter que lidar com os súbitas ataquesgoldenspin777cólera do pai.

"Me lembrogoldenspin777uma vez ter deixado cair um ovo no chão quando estávamos fazendo um café da manhãgoldenspin777sábado. E meu pai começou a gritar comigo, enquanto eu pedia desculpas. ‘Eu vou matar você. Eu vou matá-lo. Noreen, implore pela vida do seu filho.’ E minha mãe se jogava na minha frente, com as lágrimas escorrendo, eu ficando apavorado e ela implorando por mim. E então ele saiu furiosogoldenspin777casa, batendo a porta, quebrando as vidraças da porta. Mais tarde ele voltava, todo gentil, pedindo desculpas."

Mesmo assim, ou talvez até como uma formagoldenspin777trazer harmonia para a família, os paisgoldenspin777Collier resolveram adotar um segundo filho. Noreen viajou para Taiwan para buscar a irmã mais nova Collier. Ele ia junto, mas, no último minuto, um forte ataquegoldenspin777asma o impediugoldenspin777viajar com a mãe. E essa foi a primeira vezgoldenspin777que ele ficou sozinho com seu pai por um tempo.

"Fiqueigoldenspin777casa sem a proteção da minha mãe por quase duas semanas. Apanhei muito. Ele me batia com um cinto, me perseguia, gritava comigo: ‘Seu garotinho gordo e estúpido’."

E assim, Collier e Noreen continuaram convivendo com os rompantesgoldenspin777gritos e violência do pai. Collier não sabia dos casos extraconjugais do pai, até que,goldenspin7771989, este começou a levar o garotogoldenspin777visitas a Sherri Campbell, uma suposta "paciente do papai", que viviagoldenspin777outra cidade comgoldenspin777filhas.

Nessas visitas, Collier via o pai abraçando e beijando a mulher. Collier acabou contando à mãe sobre essa "namorada" do papai.

Para Noreen, foi a gota d'água. Ela tinha feito um acordo:goldenspin777que John poderia fazer o que bem entendesse, desde que não envolvesse o filho. Por isso, dessa vez, ela resolveu por um fim ao casamento.

A lista no Garfield

Enquanto a mãe articulava os trâmites do divórcio, o paigoldenspin777Collier ficava mais agressivo. Um dia,goldenspin777novembrogoldenspin7771989, Noreen pegou o filho na escola o levou a um restaurante.

"Minha mãe estava dirigindo e disse: ‘Collier, quero que você saiba uma coisa. Eu nunca te abandonaria. E se algum dia teu pai te disser que eu te deixei, não é porque eu fui embora. É porque teu pai me matou’. Ela estava com medo. E eu disse, ‘mãe, isso não pode acontecer. Isso não vai acontecer’."

"Uma das coisas que comecei a fazer nessa época foi uma listagoldenspin777amigosgoldenspin777minha mãe para onde pudéssemos eventualmente irgoldenspin777buscagoldenspin777refúgio. Fiz uma lista com todos os telefones desses amigos e a escondi num Garfieldgoldenspin777pelúcia que eu tinha. Garfield era aquele gato do desenho animado. E esse Garfieldgoldenspin777pelúcia acabaria tendo um papel crucial no que aconteceu a seguir."

E o que aconteceu a seguir foi que a mãegoldenspin777Collier desapareceu repentinamente. Na noite anterior ao último diagoldenspin7771990, eles estavamgoldenspin777casa juntos com a irmã dele, esperando a chegada da avó paterna.

"Ela chegou bem tarde. Meu pai basicamente a deixou e foi embora. A gente ficou conversando na sala, eu dei um abraço na minha avó, disse ‘boa noite, vovó’. Dei um beijo e um abraço na minha mãe, disse ‘eu te amo, mamãe’. E fui para a cama. E essa foi a última vez que vi minha mãe."

Na madrugadagoldenspin77731goldenspin777dezembrogoldenspin7771989, Collier Landry acordou no meio da noite com o que parecia ser um grito.

"Então ouvi dois baques muito altos com cercagoldenspin777um minutogoldenspin777intervalo. E entre essas pancadas, ouvi meu pai resmungandogoldenspin777voz muito baixa, mas pude reconhecer que era a voz do meu pai, que não estavagoldenspin777casa quando fui dormir."

"Fiquei na cama, ouvindo isso e pensando: ‘será que eu vou ver o que está acontecendo?’ Olhei para o meu relógio do Batman na parede, eram 3h18 da manhã. De alguma forma, voltei a dormir."

"Acordei algumas horas depois, o sol apareceu e corri direto para o quarto da minha mãe. E notei que os lençóis da cama estão todos desarrumados. Minha mãe, quando ela acordava, a primeira coisa que ela fazia era arrumar a cama. Fiquei procurando manchasgoldenspin777sangue nos lençóis."

"Desci imediatamente e meu pai estava sentado no sofá com uma toalha enrolada na cintura. Ele tinha acabadogoldenspin777sair do banho. E eu disse a ele, eu disse, ‘onde está minha mãe?’ Ele não respondeu imediatamente. Ele estava assistindo à CNN na televisão, como sempre fazia. E eu repeti: onde está minha mãe?"

"Meu pai, muito calmo, olha para mim e diz, ‘Collier, mamãe tirou umas férias’.

E naquele momento eu soube que ele tinha feito algo com ela.

'Tua mãe vai voltar'

Collier começou a confrontar o pai, que disse que ele e Noreen tinham brigado por causagoldenspin777dinheiro,goldenspin777Sherri e do divórcio.

"A essa altura, minha avó tinha entrado na sala , ela estava hospedada com a gente, e ele começou a explicar para ela o que tinha acontecido, que a minha mãe tinha ido embora, que eles tinham brigado. Aí ele disse que não era para chamar a polícia. Não havia razão para entrargoldenspin777pânico. ‘Tua mãe vai voltar. Ela já fez isso antes’, ele dizia.

Collier então subiu para o seu quarto, pegou a lista que tinha guardado dentro do Garfieldgoldenspin777pelúcia, se trancou no banheiro e ligou para os amigos da mãe dele, pedindo para eles acionarem a polícia.

"Então a polícia chegougoldenspin777casa, minha avó atendeu a porta e começou a gritar comigo. ‘Seu pai lhe disse para não chamar a polícia. Não queremos envolver a polícia. Você está desobedecendo ao seu pai.’ E eu disse: ‘Não chamei a polícia’, porque isso era verdade."

"Durante todo o tempogoldenspin777que os policiais estiveramgoldenspin777casa, minha avó ficougoldenspin777cimagoldenspin777mim, me controlando. Consegui afastar um dos policiais do ladogoldenspin777fora do quartogoldenspin777minha mãe e disse a ele: algo aconteceu com minha mãe, não confiogoldenspin777meu pai."

Graças à insistênciagoldenspin777Collier, Noreen foi dada como desaparecida. As circunstâncias do caso chamaram a atençãogoldenspin777um investigador da polícia chamado David Messmore.

"David Messmore apareceugoldenspin777casa. Meu pai tinha ido embora naquela manhã. Minha avó atendeu, ficou irritada e disse ‘Vou ligar pro meu filho. Ele é médico e vai processar vocês.’ E aí ela foi pra cozinha ligar para meu pai. Eu aproveitei, olhei bem nos olhos dele e disse: ‘Minha mãe nunca me abandonaria. Algo aconteceu com ela. Dê-me seu cartão. Vou para a escola amanhã e vou ligar para você porque não posso falar aqui’."

Collier chegou à escola no dia seguinte, foi direto para a sala do diretor e pediu para ligassem para o número do cartãogoldenspin777David Messmore. O investigador foi até a escola se encontrar com Collier.

"Eu contei tudo o que podia para ele. Ele olhava pra mim, tipo ‘quem diabos é esse garoto?’ Ele me contou isso anos depois, que nunca tinha se deparado com uma criança tão articulada e determinada nesse tipogoldenspin777situação. Que a maioria das crianças, quando perdem a mãe, perdem a cabeça. Não sabem o que fazer, ficam chorando. Mas o mais importante, é que ele acreditougoldenspin777mim."

As fotos no porta-luvas

Segundo Collier, havia grande resistência por parte do chefe da polícia local e da promotoriagoldenspin777fazer acusações contra John Boyle, por medogoldenspin777serem processados pelo rico e influente médico. E o paigoldenspin777Collier tinha assumido o papelgoldenspin777marido abandonado,goldenspin777pessoa que sentia grande falta da mulher e que rezava pela volta dela.

E durante todo esse tempo, Collier monitorava as ações do pai e passava informações a David Messmore.

"Um dia, meu pai me chamou para ir com ele ao consultório, dizendo que precisava pegar uma papelada. E eu, tipo, disse que sim, não queria deixar ele fora da minha vista. Na volta, paramosgoldenspin777um postogoldenspin777gasolina. E quando meu pai entrou no postogoldenspin777gasolina, comecei a vasculhar o carro, abri o porta-luvas e encontrei duas fotografias.

Uma eragoldenspin777uma casa que nunca tinha visto antes. E a segunda é da namorada, a Sherri, e os dois filhos dela sentadosgoldenspin777frente a uma lareira embrulhadagoldenspin777plástico. Imediatamente pensei ‘esta é uma casa nova e pode estar ligada a tudo isso’."

Collier contou a David Messmore sobre as fotos. Elas ajudaram o investigador a descobrir que, alémgoldenspin777abrir um novo consultório médico na cidadegoldenspin777Erie, na Pensilvânia, John Boyle também tinha comprado uma casa nova ali, a qual teve acesso pouco antes do desaparecimentogoldenspin777Noreen.

Messmore conversou com a corretoragoldenspin777imóveis que cuidara da venda dessa casa e perguntou se havia algo suspeito. Ela disse a ele que o paigoldenspin777Collier estava com muita pressa para ter acesso à propriedade e que perguntou o que havia sob o novo piso do porão, caso quisesse baixá-lo. Além disso, descobriu-se que o médico tinha alugado uma britadeira dias antes do desaparecimentogoldenspin777Noreen.

Na manhãgoldenspin77724goldenspin777janeirogoldenspin7771990, menosgoldenspin777quatro semanas após o desaparecimentogoldenspin777sua mãe, Collier egoldenspin777irmã foram retiradosgoldenspin777casa por assistentes sociais, enquanto uma equipegoldenspin777peritos criminais cumpria um mandatogoldenspin777busca e examinava o local, atrás o corpogoldenspin777Noreen.

A casagoldenspin777Erie, Pensilvânia, também foi revistada. No dia seguinte, os investigadores encontraram um corpo. A mãegoldenspin777Collier fora enterrada no porão da nova casa. John Boyle foi preso e indiciado por assassinato premeditado.

Prisão e fama

O julgamento teve grande impacto na pequena comunidadegoldenspin777Mansfield. Afinal, quase todos os habitantes da cidade conheciam o réu. A polícia estimou que umgoldenspin777cada 13 residentesgoldenspin777Mansfield esteve sob seus cuidados. E um dos momentos mais aguardados do julgamento foi justamente o depoimentogoldenspin777Collier, então com 12 anos.

John Boyle, foi condenado por homicídio qualificado a uma pena mínimagoldenspin77720 anos. O júri concluiu que o assassinato da mulher foi premeditado, planejado e executado intencionalmente.

Boyle está preso até hoje. Ele tem uma audiência para avaliargoldenspin777possível libertação marcada para 2025.

Mesmo não tendo dúvidasgoldenspin777que fizera a coisa certa, Collier se viu, após a prisão do pai,goldenspin777um momento bastante difícil, porque ninguém do lado paterno, nem do materno, queria ficar com ele.

"O lado paterno da família me rejeitou porque me culpou pela condenação. E o lado materno da família me disse literalmente: não vamos acolhê-lo porque você se parece com seu pai. Fui deixado por conta própria e entrei no sistemagoldenspin777adoção, eu e minha irmã. Foi horrível isso. Sim, foi uma droga."

Um juiz decidiu que os dois deveriam ser separados para tentarem recomeçar suas vidas com famílias diferentes.

Segundo Collier, seus novos pais "eram afetuosos e totalmente dedicados a ele".

Mas não foi fácil para eles lidar com a famagoldenspin777Collier.

"Não podíamos ir a lugar nenhum sem que as pessoas soubessem quem eu era, e meus novos pais eram pessoas reservadas. Eles certamente não estavam acostumados a ter pessoas olhando para elesgoldenspin777restaurantes. Todos me conheciam e tinham me visto na televisão, sabiam do julgamento. Isso colocou muita pressãogoldenspin777nosso relacionamento enquanto crescia, mas superamos isso. Eles são maravilhosos e as coisas acabaram do jeito que deveria ser."

Collier concluiu os estudos e, mais tarde, se mudou para Los Angeles, onde vive até hoje.