O minucioso trabalho arqueológico que montou o quebra-cabeça da 'música mais antiga do mundo':iporá esporte clube

Legenda da foto, Ao longo do tempo, uma grande variedadeiporá esporte clubeinstrumentos musicais foi produzida na regiãoiporá esporte clubeque hoje é a Síria | Foto: Leila Molana-Allen

Acadêmicos passaram anos literalmente reconstruindo as tabuletas, na tentativaiporá esporte clubedesvendar não só o que estava escrito, mas a melodia que a peça musical teria se fosse tocada novamente. Os registros foram feitosiporá esporte clubeescrita cuneiforme, um dos mais antigos do mundo, que se espalhou pela região há milênios.

"O problema dessa tabuleta é que conseguíamos ler o texto porque foi escritoiporá esporte clubecuneiforme babilônico, e nós sabemos o valor dos sinais, mas não tínhamos ideia do que significava", disse Richard Dumbrill, professoriporá esporte clubeArqueomusicologia na Universidade da Babilônia, no Iraque, que estuda as tabuletasiporá esporte clubeUgarit há maisiporá esporte clubeduas décadas.

Ele contou como,iporá esporte clubediversas ocasiões, se empenhou para reconstituir os fragmentosiporá esporte clubeargila, no intuitoiporá esporte clubetraduzir o texto e a música inscritos neles:

"Eu tirei fotos e tentei montá-los como um quebra-cabeça, mas algumas peças foram danificadas sem margem para reconstrução".

Legenda da foto, Inscriçãoiporá esporte clubetabuletaiporá esporte clube3,4 mil anos, encontrada na Síria, é a peça musical mais antiga do mundo | Foto: Leila Molana-Allen

As dificuldadesiporá esporte clubetradução se deviam ao fatoiporá esporte clubeos registros terem sido feitos na língua hurrita, do nordeste do Cáucaso (provavelmente na atual Armênia), mas que acabou parando nas terras férteis da Síria.

"Esse povo migrou para o noroeste da Síria - levaram alguns mil anos nesse processo - e decidiram usar os sinais da Babilônia para escrever seu texto eiporá esporte clubemúsica", explica Dumbrill.

"Foi extremamente difíciliporá esporte clubetraduzir. Mas consegui descobrir que o texto abaixo das duas linhas eram representações musicais que tinham sido 'hurritanizadas' - ou seja, eram babilônicas, mas foram adaptadas a partir do convívio com o povo hurrita. E consegui descobrir que era uma melodia. Demorei cercaiporá esporte clube20 anos para decifrar. "

E o que a composição musical mais antiga do mundo nos diz sobre as pessoas que viviam naquela época? A partir das traduções, Dumbrill acredita que eles tinham músicas para todos os tiposiporá esporte clubeocasiões - e não apenas para eventos religiosos.

Uma das canções fala sobre uma garçonete que vendia cervejaiporá esporte clubeum bar, mas a tabuleta conhecida como H6 revela uma história bem mais sóbria.

"É sobre uma jovem que não pode ter filhos e acha que é porque se comportou maliporá esporte clubealguma forma, o que não é mencionado", conta o pesquisador.

"E pelo o que podemos entender do texto, que é bastante limitado, ela sai à noite para rezar para a deusa Nikkal, que era a deusa da lua. E leva consigo uma pequena lata com sementes ou óleoiporá esporte clubegergelim, que oferece à deusa. É tudo o que sabemos sobre o texto."

Legenda da foto, A tabuletaiporá esporte clubeargila H6 foi apenas o início do extraordinário legado musical da Síria | Foto: Leila Molana-Allen

Uma antiga oficina musical

Mas a Síria não produziu apenas a canção mais antiga. Com o tempo, uma extensa variedadeiporá esporte clubeinstrumentos musicais também foi criada na região. É o caso da lira, instrumentoiporá esporte clubecordas com um uma barra transversal; e do alaúde, que evoluiu para o moderno oud árabe, instrumentoiporá esporte clubecordas,iporá esporte clubeformaiporá esporte clubegota, que produz um dos sons mais emblemáticos da região.

No século 20, pesquisadores encontraram uma sérieiporá esporte cluberegistrosiporá esporte clubecomo funcionava o negócio da fabricaçãoiporá esporte clubeinstrumentos musicais da época. A descoberta se deuiporá esporte clubeMari, cidade-Estado do início da Idade do Bronze, às margens do rio Eufrates, ao leste da atual Síria.

"Lá, no palácio [em Mari], descobrimos uma grande quantidadeiporá esporte clubetabuletas, que eram principalmente cartas e recibosiporá esporte clubeartesãos, que encomendavam couro, madeira, ouro e prata para fazer instrumentos", conta Dumbrill.

"Assim, temos uma boa ideia a respeito dos instrumentos que foram feitos há cercaiporá esporte clube4 mil anos. Sabemos os nomes dos artesãos, os tiposiporá esporte clubeinstrumentos que eles faziam. Eles já eram influenciados por instrumentos que não eram sírios", acrescenta, citando o exemplo do parahshitum iraniano, um tipoiporá esporte clubelira que se tornou muito popular entre as mulheres do harémiporá esporte clubeMari.

A produçãoiporá esporte clubeinstrumentos musicais continuou a prosperar na Síria ao longo dos séculos - e muitos encontram-se preservados atualmenteiporá esporte clubecoleções abertas ao público.

Legenda da foto, O Palácio Debbanéiporá esporte clubeSídon, no Líbano, abriga uma vasta coleçãoiporá esporte clubeinstrumentos musicais da era otomana | Foto: Leila Molana-Allen

No Palácio Debbané, na cidade costeiraiporá esporte clubeSídon, no Líbano, por exemplo, uma mostraiporá esporte clubeinstrumentos musicais da era otomana, datados do século 19, dá aos visitantes um panorama das tradições sírias e libanesas antes da formação dos Estados modernos. Entre os objetos da Síria, estão o oud e o bouzouki (pequeno alaúde com braço longo e fino) feitosiporá esporte clubemadeira e marfim.

"As pessoas [visitantes] perguntam: por que existem tantos instrumentos musicais?", conta Ghassan Dimassy, um dos guias do Palácio Debbané.

"Dizemos a eles que essa é uma casa otomana e que as mulheres costumavam se sentar e cantar", acrescenta, enquanto imita as mulheres tocando instrumentos e os homens deitados, relaxando.

Naquele local, a música era o panoiporá esporte clubefundo essencial para qualquer momentoiporá esporte clubelazer.

Música no exílio

No ano passado, as autoridades sírias lançaram uma campanha para que Aleppo, a segunda maior cidade do país, fosse incluída na Redeiporá esporte clubeCidades Criativas da Unesco, como "Cidade da Música", para celebrar seu patrimônio. Durante o século 17, Aleppo era conhecida pelo muwashshah, tipoiporá esporte clubemúsica combinada com letrasiporá esporte clubepoesia andaluza,iporá esporte clubeárabe clássico ou, mais tarde,iporá esporte clubeárabe coloquial sírio ou egípcio.

Os muwashshah são apresentados por uma banda que toca oud e kanun (instrumentoiporá esporte clubecordas que reproduz uma espécieiporá esporte clubesomiporá esporte clubeágua pingando), assim como kamanja (espécieiporá esporte clubeviolino), darbuka (tambor) e daf (pandeiro). O formato fez sucesso na cidade, onde foi abraçado por populações muçulmanas e cristãs.

Ao mesmo tempo, também estão sendo realizados esforços significativos para preservar as tradições musicais sírias fora do país, que entrou no oitavo anoiporá esporte clubeconflito - e onde grande parte da população está sendo forçada a se concentrar na sobrevivência,iporá esporte clubeveziporá esporte clubeexplorar a herança cultural nacional. Alguns jovens sírios estão aproveitando a situação difícil para chamar a atenção para a história musical do país.

Legenda da foto, A poesia da música muwashshah é frequentemente acompanhadaiporá esporte clubeinstrumentos como o daf (à esquerda) e o oud (à direita) | Foto: Leila Molana-Allen

Por muito tempo uma incubadoraiporá esporte clubetalentos criativos, Beirute se tornou um centroiporá esporte cluberesistência para preservar o patrimônio cultural sírio.

A Me'zaf, organização fundada na capital libanesa,iporá esporte clube2015, tem como objetivo inovar, promover e preservar músicas autênticas, não apenas da Síria, mas da região do Levante como um todo, mostrando como as ricas tradições musicais do Oriente Médio precedem as fronteiras modernasiporá esporte clubeEstados-nação, introduzidas no século 20.

"Muitas expressões foram criadasiporá esporte clubeDamasco ou Aleppo e levadas para o Cairo. Na sequência, composições foram produzidas no Cairo e apresentadas no Levante", explica Ghassan Sahhab, que está à frente da Me'zaf, é professoriporá esporte clubemúsica libanesa, compositor e toca kanun.

"Temos uma cultura rica e precisamos valorizá-la para conhecer nossa história e seguiriporá esporte clubefrente. No momento, é um casoiporá esporte clubepreservação do patrimônio e da cultura."

Outro grupo musical que se formouiporá esporte clubeBeirute se chama Assa'aleek, composto por cinco sírios e um norueguês. O nome da banda significa "os maltrapilhos" ou "os vagabundos"iporá esporte clubeárabe. É uma referência a um bando que se autoproclamava uma espécieiporá esporte clubeRobin Hood, durante a era pré-islâmica, e tentava mudar os rumos da classe dominante, no Golfo Pérsico.

"Somos parecidos com os Assa'aleek: fomos expulsosiporá esporte clubenossas comunidades e pátria por muitas razões", diz Abodi Jatal, que toca percussão na banda.

"É importante preservar a música antiga síria porque é nossa identidade, é a história da civilização, no fim das contas. É isso que temos. É isso que somos", afirma Mona Al Merstany, vocalista do Assa'aleek.

"Não se trata apenasiporá esporte clubeum país qualquer - é um dos países mais antigos do mundo. É importante mostrar isso, porque todas as pessoas têm o direitoiporá esporte clubever a beleza", completa.

Eles veem a música como uma formaiporá esporte clubecombater as injustiças enfrentadas diariamente pelos moradores da região.

"Nossas letras e músicas são feitas com base nisso", diz Jatal.

"Queríamos lutar contra maus hábitos, como o assédio contra as mulheres, e vimos que isso é muito parecido com o que os Assa'aleek faziam. É por isso que escolhemos esse nome."

Alémiporá esporte clubemúsicas novas, a banda incluiiporá esporte clubeseu repertório, desde 2013, canções folclóricas da Síria, levando composiçõesiporá esporte clubediversas regiões do país para o público no Líbano.

O patrimônio musical nacional percorreu um longo caminho desde a melodia encontrada nas tabuletasiporá esporte clubeargilaiporá esporte clubeUgarit. Hoje, bandas como Assa'aleek estão reinventando o significado da música síria, influenciando novas audiências.

Eles estão criando as composições que os arqueólogos do futuro poderão um dia encontrar, armazenadasiporá esporte clubecomputadores, arquivos ou gavetasiporá esporte clubeAleppo, Damasco ou Beirute - quem sabe atéiporá esporte clubeParis, Londres ou Berlim.

Al Merstany resume bem:

"Quando alguém me pergunta o que é a Síria, é isso que tenho a dizer: a música, a arte."

iporá esporte clube Leia a versão original desta reportagem iporá esporte clube (em inglês) no site BBC Travel iporá esporte clube .