Como o mar pode garantir a alimentação da humanidade no futuro:
Para muitos cientistas, a resposta pode estar nas águas, muito mais do que no solo.
Dada a crescente demanda por comida e as restrições da expansão da produçãoalimentosterra, os alimentos provenientes do oceano — ricosnutrientes e uma fonteproteína — estão prestes a se tornar nossa próxima grande resistência para produção alimentar capazsuprir as quase 10 bilhõespessoas que viverão no planeta até 2050.
Um grupoespecialistastodo o mundo reuniu-se para analisar essa questão, contando comamplitude combinadaconhecimento que abrange economia, biologia, ecologia, nutrição e pesca.
E também a maricultura, termo que começa a ganhar maior projeção, e que diz respeito às práticascultivo da vida marinha para alimentação humana (o mesmo que a agricultura, mas feita nos mares).
São 22 pesquisadoresdistintas partes do mundo que se debruçaram sobre a questão para publicar uma sérieartigos (o inaugural saiu na prestigiada revista Nature) sobre a alimentação que vem do mar.
"Examinamos os principais setores produtoresalimentos na pesca oceânica - selvagem, peixesmaricultura e mariculturabivalves - para estimar 'curvasoferta sustentável' que levamconta as restrições ecológicas, econômicas, regulatórias e tecnológicas. Sobrepomos essas curvasoferta com cenáriosdemanda para estimar a produção futuraalimentos do mar", diz a apresentação do artigo.
Hoje, estimam os cientistas, os alimentos provenientes do mar representam apenas 17% da produção atualcarne comestível no planeta. A pesquisa visa responder quantoalimentos podemos esperar que o oceano produzaforma sustentável até 2050.
"Os alimentos comestíveis do mar podem aumentar21 a 44 milhõestoneladas até 2050, um aumento36 a 74%comparação com os rendimentos atuais. Isso representaria 12 a 25% do aumento estimadotoda a carne necessária para alimentar 9,8 bilhõespessoas até 2050", concluem.
"Basicamente, a pergunta que estávamos tentando responder era: o gerenciamento sustentável do oceano nos próximos 30 anos significa que produziremos mais ou menos alimentos?", pergunta Christopher Costello, professorEconomia Ambiental eRecursos da UCSB Bren School of Environmental Science & Management, e principal autor do artigo.
Por muito tempo pensou-se que, para gerenciar o oceanoforma sustentável, teríamos que extrair menos, o que significaria menos comida do mar. O que os pesquisadores descobriram, no entanto, foi que temos que extrairforma melhor — que tenha a sustentabilidade como valor principal.
"Se feitoforma sustentável, é possível aumentar os alimentos do mar euma proporção inversarelação à expansão dos alimentos baseadosterra", detalhou o coautor Ling Cao, membro afiliado do CentroSegurança Alimentar e Meio AmbienteStanford.
"E isso pode ser feitouma maneira muito mais ecológica para o clima, a biodiversidade e outros serviços ecossistêmicos do que a produçãoalimentosterra".
Para isso, eles propõem ações que vãoreformas políticas, inovação tecnológica e a extensão das mudanças futuras na demanda, mas sempre tendoconta um planejamento prévio — algo que não tivemos na agricultura e na pecuáriasolo, que correspondem pela esmagadora maioria dos alimentos que consumimos.
"Se esses potenciaisprodução serão realizadosforma sustentável dependerámuitos fatores, mas queremos começar essa discussão", acrescenta Costello.
Autorum recém-lançado livro que tem sido considerado um dos mais importantes manifestos sobre as políticasexploração dos oceanos (A Blue Deal: Why We Need a New Politics for the Ocean, ainda sem edição no Brasil), o professor Chris Armstrong, do DepartamentoPolíticas e Relações Internacionais da University of Southampton (Inglaterra), ecoa o coroque novas políticasexploração dos mares precisam ser criadas.
"O oceano já enfrenta muitas ameaças, e é importante que não as tornemos ainda piores. Se vamos adicionar novas indústrias oceânicas, elas terão que ser do tipo que possam ajudar o oceano a se recuperar,vezprejudicar ainda maissaúde", afirma,entrevista à BBC Brasil.
Ele cita, por exemplo, a criação extensivasalmão e camarão que têm impactos ambientais muito negativos aos mares —danos à vida marinha e do usoantibióticos nas águas.
Mas indica a exploração sustentávelanimais que podem nos trazer maiores benefícios.
"A criaçãomexilhões eostras são muito positivasseus impactos, porque elas podem até ajudar a limpar os ecossistemas costeiros e mitigar problemas. O mesmo vale para o cultivoalgas marinhas, que também pode ajudar a combater as mudanças climáticas", ele afirma.
Armstrong também refuta a ideiaque o oceano é 'subexplorado', como defendem alguns pesquisadores— ainda que defenda que a ofertaalimentos provenientes do mar possam aumentarforma ordenada e sustentável.
"Nossa primeira prioridade deve ser garantir que os ecossistemas oceânicos sejam protegidos, não que sejam 'usados' ao máximo", ele ressalta.
Com a demanda global por alimentos aumentando e questões sérias se acentuando sobre se a oferta pode aumentarforma sustentável, o mar pode indicar uma solução no horizonte. Claro que expansão baseadaterra é possível, mas pode exacerbar as mudanças climáticas e a perdabiodiversidade e comprometer a prestaçãooutros serviços ecossistêmicos.
"Concordo que no futuro nos voltemos para novas fontesalimentos do mar. Sobretudo porque seus impactos ambientais são menores do que as formas convencionaispesca e piscicultura eoutras maneiras que conhecemos para produzir alimentos para bilhõespessoas", conclui.
- Texto originalmente publicado http://vesser.net/geral-63295626