'O que vejohumanos confinados é parecido a papagaios enjaulados arrancando as próprias penas', diz cientista:

Ilustración isométricauna pareja mirando TV enjaulados.

Crédito, Getty Images/BBC

Precisamos do ar livre

"Passei muitos anos seguindo primatasseu habitat natural, por exemplo os bonobos no Congo. Mas também estudei muitos animaiscativeiro, como os próprios bonobos, chimpanzés e papagaios", conta ela à BBC News Mundo, serviçoespanhol da BBC.

"Então conheço a diferençasociabilidadeanimais sociais inteligentes quando estão enjaulados versus quando estãoliberdade. Esse é o grande experimento que estamos vivendo agora. Somos animais inteligentescativeiro. E várias coisas foram mostradas."

Ilustración isométricauna mujer acampando en la selva.

Crédito, Getty Images/BBC

Antestudo, explica Behncke, como mamíferos e como primatas, nos constituímosmovimento e ao ar livre. "Ter que estar fechadospoucos metros quadrados sem movimento físico e sem estar ao sol é muito, muito difícil."

"Acho que, para algunsnós, (...) a pandemia nos lembrouque somos parte, e não à parte da natureza, e que ser um animal da mesma espécie é uma força muito democrática, porque o vírus ataca a todos", opina.

Animais enjaulados têm comportamentos repetitivos

Mas existe também uma questão relacionada ao nosso comportamento social.

"Somos primatas sociais e estarmos isolados tem um efeito profundonossa saúde física e mental. Quando observamos os animais enjaulados, sejam cetáceos (baleias e golfinhos), cavalos, elefantes, papagaios, primatas ou grandes predadores, o que vemos são os chamados comportamentos repetitivos, como se coçar até provocar lesões ou dar voltas nas jaulas", explica.

"E talvez você se pergunte: como identifico o que é um comportamento repetitivo causado pelo estresse, versus movimentos que possam ter outras causas? Em geral não variam muito e não têm uma função."

"Então, quando vejo como começamos a fazer scroll nas redes sociais, sem interagir, simplesmentemaneira passiva, repetitiva, o que observo são humanoscativeiro. Não é muito diferente dos papagaios enjaulados, que começam a arrancar as (próprias) penas."

Isabel Behnckefotoarquivo

Crédito, Gentileza Isabel Behncke

Legenda da foto, Isabel Behncke estudou o comportamentobonobos, nossos parentes evolutivos

Para Behncke, "há um sofrimento muito verdadeiro, muito profundo, dos animais sociais que são privadosestímulos sociais emovimento".

Além disso, a especialista explica que nossa sociedade, assim como achimpanzés, bonobos e elefantes, tem um componente altamente complexo, chamado pelos cientistasfissão-fusão.

"Você acordamanhã e interage com seu núcleo familiar. Daí sai e interage com um grupotrabalho. Na hora do almoço, interage com outro subgrupo e à tarde se reúne com amigos. No fundo, você tem uma comunidade maior e daí você se fissiona, se separapequenos grupos, que se separam e se voltam a juntar", explica a pesquisadora.

"Agora não estamos podendo exercitar essa sociabilidadefissão-fusão, natural para os seres humanos. E as pessoas enclausuradas com seu grupo familiar e com outras pessoas também estão sofrendo, porque há mais conflito nessas relações."

Não é diferenteo que ela observavabonoboscativeiro.

"Eles são famosos por serem símios muito tolerantes, não praticam homicídios ou infanticídios, previnem e resolvem conflitos por meiobrincadeiras e do sexo. São chamadosos 'hippies da floresta'. Em cativeiro, quando chegava a comida, por exemplo, aumentava o estresse e, assim, aumentava o sexo. Mas, na natureza, havia muito menos sexo. Depois percebi que era porque se podia exercitar a fissão-fusão, diminuindo os conflitos ao se separarsubgrupos."

"Como somos humanos, achamos que tudo se soluciona conversando, mas há mecanismos ainda mais antigos, mais animais,dissipaçãoconflitos, como ir embora. É como quando você briga com seu irmão durante o almoçofamília, mas, quando volta na semana seguinte, isso já não importa tanto. O estar enjaulado não permite fazer isso, e o estresse é muito forte."

Brincar e festejar

Ilustración isométricauna fiesta con gente bailando.

Crédito, Getty Images/BBC

A chilena explica que jogos, atividades e brincadeiras são um exercício antigo e universal praticado por seres imaturos (ou seja, as crias)mamíferos e pássaros. Mas tem efeito crucial na populaçãogeral, principalmentetemposquarentena - desde montar quebra-cabeças e dar risada até cozinhar algo por prazer são atividades que trazem grandes benefícios.

"Isso é muito importante para a saúde física e mental, para a resiliência e para a criatividade", explica Behncke.

"Mas a brincadeira é uma conduta sensível ao medo. Quando aumenta o estresse, aumenta a resposta fisiológica, que porvez tende a diminuir e suprimir o jogo. Por isso, temos que prestar atenção à frequência com a qual estamos dando risada, se na pandemia podemos encontrar maneirasrir todos os dias, falar por videochamada com alguém que te divirta, ler literatura, ver comédias."

É preciso fazer o que for necessário, diz ela, "para manter a brincadeira na vida, sobretudotempos nos quais é mais difícil fazê-lo, por medo ou incerteza".

"Mas há outro ponto. Diferentementeoutros animais, nós humanos desenvolvemos rituais sociais, como ir a shows, missa, sair para dançar ou a bares. Os rituais coletivos são muito importantes porque sincronizam os grupos: eu me movo contigo, rio contigo, canto contigo e forjo um laço contigo. Pense nos gritos (das torcidas)futebol no estádio."

"Tudo isso está desaparecido com o vírus, e é um experimento impressionante. Não só não temos os rituais coletivos, como estamos vivendo um trauma coletivo. Por isso acho que vamos precisar voltar a restaurantes e pubs, ao estádio, a shows e a dançar nas festas."

Línea

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