Surfe une moradores do Rioaviator estrela betárea marcada pela desigualdade:aviator estrela bet

Legenda do vídeo, Surfe une moradores do Rioaviator estrela betárea marcada pela desigualdade

Nascido e criado na Rocinha, Marcello Farias frequenta a praiaaviator estrela betSão Conrado, localizada na Zona Sul do Rioaviator estrela betJaneiro a uma curta distância da favela, quase que diariamente. Apaixonado por bodyboard, ele publica fotos e vídeos das condições do mar nas redes sociais, para orientar demais surfistas da região. Ainda que imprópria para banhoaviator estrela betboa parte do ano, a praia atrai atletas profissionais e amadores da favela e do bairroaviator estrela betmesmo nome pelas boas ondas.

Os dois quilômetrosaviator estrela betextensão da praiaaviator estrela betSão Conrado são compartilhados por moradoresaviator estrela betrealidades contrastantes. Segundo dados fornecidos pelo Instituto Pereira Passos com base no Censo Demográficoaviator estrela bet2010, do IBGE, a renda domiciliar per capita médiaaviator estrela betSão Conrado (R$ 5.606) é 11,8 vezes maior que na Rocinha (R$ 474). Mas essa disparidade se torna fluida no mar.

Patrick Azevedo, que viveaviator estrela betum condomínioaviator estrela betSão Conrado, é um dos que costumam checar os postsaviator estrela betFarias antesaviator estrela bettirar a pranchaaviator estrela betcasa.

"O surfe te dá humildade porque você está numa situaçãoaviator estrela betvida e morte e só tem as pessoas ao seu redor e Deus," diz Azevedo. "Não tem profissão, conta bancária, status social. Não existe isso ali dentro."

O produtoraviator estrela beteventosaviator estrela bet29 anos começou a surfar aos 14. Ele passava férias com a família da mãeaviator estrela betCabo Frio, na Região dos Lagos do Rio, e começou a se aventurar nas águas encorajado por uma das irmãs mais velhas, que pegava onda com um namorado. Foi ela quem o levou à tradicional galeria River, especializadaaviator estrela betmateriaisaviator estrela betsurfe no Rio, e o presenteou comaviator estrela betprimeira prancha.

Farias,aviator estrela bet44 anos, também se encantou cedo com o mar. Aos 10 anos, ele trabalhava como boleiroaviator estrela betquadraaviator estrela bettênis no antigo Hotel Intercontinental,aviator estrela betfrente para a praia, e gostavaaviator estrela betir ver os surfistas no mar antesaviator estrela betvoltar para casa. Aos poucos, começou a pegar onda com amigos da Rocinha, usando pranchasaviator estrela betisopor e pedaçosaviator estrela betpranchas quebradas.

"A minha infância foi muito difícil. Na Rocinha sempre faltou água, saneamento, dinheiro", conta. "Às vezes, não tinha nada para comer. Eu comia macumba na praia, um coco do lixo."

Com a ajuda do pai e o dinheiro que recebia no hotel, Farias comprouaviator estrela betprimeira pranchaaviator estrela betbodyboard. Ele agora trabalha como barmanaviator estrela betum restaurante no Jardim Botânico, bairro nobre do Rio, eaviator estrela beteventos particulares.

"Eu vejo muita desigualdade, pessoas com muito dinheiro comendo muito bem, e outras sem nada para comer," comenta. "É confuso para mim trabalharaviator estrela betcasas tão lindas, com elevador que levam até dentroaviator estrela betcasa, e chegar no becoaviator estrela betque moro, por onde não passa nem uma geladeira."

Apesar do custo relativamente alto dos equipamentos, o surfe se tornou mais acessível graças à popularização do esporte e à maior disponibilidadeaviator estrela betpranchas e demais itensaviator estrela betsegunda mão. Iniciativasaviator estrela betprojetos sociais, empresas e atletas profissionais beneficiaram jovensaviator estrela betbaixa renda e fortaleceram os vínculos entre os frequentadores da praia.

"Quem ama surfar tem noção do quão doloroso seria você acordar com um baita sol, sabendo que o mar está lindo, tomar o seu café da manhã e estar indo para a portaaviator estrela betcasa quando começa um tiroteio e você não pode sair," diz Azevedo sobre as experiências vividas por seus amigos da Rocinha. "É duro, e o surfe te traz essa noçãoaviator estrela betque isso acontece com o garoto que está ali surfando com você todo dia."

Pela proximidadeaviator estrela betonde vive e pelos preços maisaviator estrela betconta do comércio na comunidade, Azevedo sempre teve costumeaviator estrela betir à Rocinha para comer, principalmente tarde da noite - períodoaviator estrela betque a ofertaaviator estrela betserviçosaviator estrela betSão Conrado se torna menor. Ele também passou a ir encontrar os amigos do surfe e levar pranchas para conserto na comunidade. Até que um dia,aviator estrela bet2017, Azevedo se viu no meioaviator estrela betum tiroteio ao subir a favelaaviator estrela betcarro para buscar equipamentosaviator estrela betsom para um campeonato que estava organizando. Depois disso, as idas à Rocinha ficaram mais escassas.

"Eu tenho a opçãoaviator estrela betnão ir lá, se eu acho violento ou perigoso, se acho que é só estar no lugar errado na hora errada. Mas e se eu moro lá? E se a minha realidade é aquilo?", comenta. "Quando você começa a ter noção do tamanho problema, não tem como se manter como você era antes disso."

Os surfistas da praia costumam se reunir, especialmente nos finaisaviator estrela betsemana, para churrascosaviator estrela betconfraternização. Juntos, Azevedo e Farias já organizaram campeonatos locaisaviator estrela betsurfe e bodyboard.

"Se pudéssemos eleger um presidente para o 'cantão'aviator estrela betSão Conrado, seria o Marcello Farias", diz Azevedo, se referindo à ponta esquerda da praia onde pegam onda. "Ele é um cara que abraçou a causa ambiental aquiaviator estrela betuma forma que me mobilizou há muitos anos."

Incomodado com a poluição da praia, Farias se juntou a amigos e,aviator estrela bet2012, fundou o grupo Salvemos São Conrado, que conta com maisaviator estrela bet40 mil seguidores nas redes sociais.

"A gente vê o problemaaviator estrela betSão Conrado ainda mais quando chove," explica. "É muito lixo dentro d'água. A gente vê rato, seringa, todo tipoaviator estrela betsujeira. Num lugar tão bonito,aviator estrela betondas perfeitas, é frustrante ver a situação do bairro."

Popular e engajado, Farias é cumprimentado por onde passa. Seu sonho é um dia ver um campeonato mundialaviator estrela betsurfe ser realizado na praia, que não recebe competições internacionais por causa da poluição - problema que afeta a todos, sem discriminação. Para chamar atenção para a causa ambiental, Farias e seu grupo organizam mutirõesaviator estrela betlimpeza da praia que reúnem moradores tantoaviator estrela betSão Conrado, incluindo Azevedo, como da Rocinha. Crianças e adolescentes que estão aprendendo a surfar, e que recebem atenção especialaviator estrela betFarias, também participam das ações.

"O surfe tirou muitos jovensaviator estrela betcaminhos errados," comenta. "Tem garoto da Rocinha que hoje é advogado por causaaviator estrela betcontatos feitos pelo surfe."

"O surfe transformaaviator estrela betvisãoaviator estrela betmundo,aviator estrela betpessoa interior," complementa Azevedo. "Às vezes vem uma onda boa, mas ela não é para você. Tem um cara do seu lado que tem a preferência e você tem que respeitar, porque é um respeito mútuo. Quando a onda for para você, você vai querer ser respeitado. Há uma sérieaviator estrela betcódigosaviator estrela betética ali dentro que vão formando um ser humano."

Atualmente, na maior parte do tempo que passa dentro d'água, Farias está tirando fotosaviator estrela betsurfistas eaviator estrela betjovens da Rocinha que participamaviator estrela betescolinhasaviator estrela betsurfe e bodyboard, para quem ele doa os registros. Ele se diz inspirado pelo renomado fotógrafoaviator estrela betsurfe Rick Werneck,aviator estrela betquem ganhouaviator estrela betpresente uma fotoaviator estrela betsurfando na décadaaviator estrela bet90.

Com a câmera na mão, Farias aproveita para permaneceraviator estrela betcontato com o mar, já que ele reduziu o tempoaviator estrela betcima da pranchaaviator estrela betbodyboard após sofrer um grave acidenteaviator estrela bet2015 na praiaaviator estrela betSão Conrado.

"Peguei uma onda grande e, no final, caíaviator estrela betcabeça no fundo. Desmaiei. O que me salvou foi Deus e a corda da minha prancha, que estava presa no meu braço, e sinalizou o pontoaviator estrela betque eu estava. Eu estava morrendo no fundo, não conseguia abrir o olho, nem me mexer," relembra. "Depoisaviator estrela betquase 4 minutos, alguns amigos meus viram a prancha e que eu estava ali. Fui acordar e me mexer no (hospital) Miguel Couto."

Em outubroaviator estrela bet2018, Farias tinha acabadoaviator estrela betsair da praia quando Azevedo sofreu um acidente. Ele caiu da pranchaaviator estrela betsurfe ao pegar uma onda e foi atingido pelo equipamento no rosto, o que provocou um corte profundo e o deixou dois mesesaviator estrela betrecuperação.

"Minha vida mudou depois desse episódio, pela relação das pessoas com isso e a correnteaviator estrela betsolidariedade que recebi, principalmente das pessoas daqui que me acompanham no surfe diariamente," diz Azevedo, que aos poucos voltou para o mar e não pensaaviator estrela betpararaviator estrela betsurfar.

Vídeo e reportagem: Ana Terra Athayde

Este vídeo faz parte da Crossing Divides, série da BBC que busca unir as pessoasaviator estrela betum mundo fragmentado.