Os poloneses, japoneses e alemães que ajudaram o Brasil a chegar ao topo da produçãobetboo facebooksoja:betboo facebook
Inspirada neste estudo, a BBC News Brasil buscou pesquisadores que se debruçaram também na conexão da soja com as imigrações japonesa e alemã. Confira abaixo.
Um intelectual para uma nova pátria
No mestrado, Trindade estudou especificamente a trajetória do agrônomo polonês Ceslau Biezanko (1895-1986).
O intelectual foi enviado ao Brasil pelo governo polonês na décadabetboo facebook1930 e é apontado como um dos introdutores da soja no Brasil - mais precisamente na cidadebetboo facebookGuarani das Missões (RS), hoje com cercabetboo facebook7.600 moradores e conhecida por ter sido um destino importante para imigrantes poloneses no Sul.
Neste meio tempo, Biezanko trabalhoubetboo facebookparceria com párocos, escolas, associações e agrícolasbetboo facebookorigem polonesa, buscando melhorar a vida dos colonos. Nesse projeto, a soja era vista como "importante fontebetboo facebooknovas receitas e prosperidade futura" pelo intelectual, conforme registra umbetboo facebookseus artigos, escritobetboo facebook1958.
"Ele partiabetboo facebookum pressuposto iluministabetboo facebookassociar a melhoria da sociedade à educação e à técnica", explicou Trindade à BBC News Brasil por telefone. "Biezanko tem o perfil do intelectual do século 19 que acaba versando sobre várias áreas: ele caminhava por sete ciências distintas; escreveu artigos que vão da botânica à química e à economia. Além dessa amplitudebetboo facebookformação, o ideal iluminista coloca o intelectual também como aquele que intervém na realidade da sociedade por meiobetboo facebookações políticas e sociais".
A vinda do agrônomo ao Brasil, como para muitosbetboo facebookseus conterrâneos, tem conexão direta com a história polonesa naquele período. A partir do final do século 18, o país deixoubetboo facebookexistir e teve seu território dominadobetboo facebookdiferentes momentos pela Rússia, a extinta Prússia e a Áustria. Foi um intervalo marcado por conflitos e pobreza, o que estimulou ondas migratórias.
O Brasil, porbetboo facebookvez, estimulava a colonização por estrangeiros europeus como formabetboo facebookincentivar a produçãobetboo facebookalimentos para o mercado interno. A partir dos anos 1870, famíliasbetboo facebookcamponeses poloneses passaram a ocupar os Estados da região Sul, algo intensificadobetboo facebook1890 no período denominado a "goraczka brazijliska", ou a "febre brasileira".
Enquanto isso, com o domínio russo, muitas pessoas originadas no território da atual Polônia foram enviadas para lutar na Guerra Russo-Japonesa (1904-1905). O conflito disputava áreas chinesas, o que, provavelmente, pôs europeusbetboo facebookcontato com a soja - posteriormente levada à Europa.
Segundo Trindade, com a independência da Polôniabetboo facebook1918, o país recuperado passa a tentar fortalecer seus emigrados com, por exemplo, o enviobetboo facebookintelectuais.
Potencial não cumprido
Embetboo facebookmissão, Ceslau Biezanko apostou principalmente na introdução,betboo facebookGuarani das Missões, do bicho-da-seda, que também é um produto chinês.
Mas há relatosbetboo facebookque o agrônomo introduziu ali também outras 12 variedadesbetboo facebooksoja.
"Uma entrevistada, já idosa na épocabetboo facebooknossa conversa, contou quebetboo facebookirmã recebeu na escola um punhadobetboo facebooksementesbetboo facebooksoja para levar para casa. Era uma distribuiçãobetboo facebookpequeno alcance, essa produção nunca passou dos quintais. Era algo mais ensaístico", conta Rhuan Trindade.
"Inicialmente, essa introdução da soja foi precária, não havia linhasbetboo facebookcomunicação para o comércio e nem compradores. Então, ela foi usada para ração, principalmente suína. Só que a sojabetboo facebookexcesso na ração causava uma descalcificação óssea nos suínos".
É possível que essa experiência malsucedida tenha contribuído,betboo facebook1934, com a saídabetboo facebookBiezankobetboo facebookGuarani das Missões. Outro motivo pode ter sido a escaladabetboo facebookconflitos internos na comunidade polonesa. Nos anos seguintes, o agrônomo se dedicou à vida acadêmicabetboo facebookPelotas (RS), localbetboo facebookseu falecimento.
Nas décadas seguintes, o alcance da soja permanece restrito, ainda que surjam, por exemplo, empresas familiares que começam a trabalhar com o processamentobetboo facebookgrãos - transformando-os, por exemplo,betboo facebookfarelos e óleos. Tudo muda entre as décadasbetboo facebook60 e 70 - mas antesbetboo facebookchegar lá, é preciso voltar no tempo para conhecer como os japoneses tratavam a soja no Brasil.
Um alimento fundamental
A partirbetboo facebook1908, o Brasil recebeu tamanha populaçãobetboo facebookimigrantes japoneses que tem hoje estimados 1,5 milhãobetboo facebookcidadãos com essa ascendência, segundo o Consulado Geral do Japãobetboo facebookSão Paulo. Em grande parte, eles vieram com vistas ao trabalhobetboo facebooklavourasbetboo facebookcafé no Estadobetboo facebookSão Paulo.
Mas, se do café tiravam meiosbetboo facebooksobrevivência, as primeiras levasbetboo facebookfamílias nipônicas já plantavam a sojabetboo facebookcasa para consumo próprio - afinal, o grão é componente fundamental da culinária japonesa, para alimentos como shoyu, tofu e missô. Só que, do pontobetboo facebookvista econômico,betboo facebookSão Paulo, o café tinha mais demandabetboo facebookmercado e um solo e clima mais propícios do que a soja.
Agrônomo formado na Escola Superiorbetboo facebookAgricultura Luizbetboo facebookQueiroz, da USP, Isidoro Yamanaka, filhobetboo facebookjaponeses, conta porém que essa produção caseira só daria o salto para o agronegócio na décadabetboo facebook70. E Yamanaka, hoje com 83 anos, foi testemunha ocular dessa trajetória - ele mediou diversos acordos entre governos e cooperativasbetboo facebookagricultores do Brasil e Japão e, nas décadasbetboo facebook70 e 80, coordenou programas no Ministério da Agricultura e Fazenda.
Era 1973 e o então presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, tinha imposto temporariamente um embargo à exportaçãobetboo facebookgrãos dos Estados Unidos, inclusive para o Japão. O objetivo era garantir o abastecimento interno dos EUA e controlar a inflaçãobetboo facebookpreços.
"O japonês depende da soja. Foi um desespero. Em 75, enviaram imediatamente 29 missões, com maisbetboo facebookdez pessoas cada, do Japão para Brasília para a cooperação na produçãobetboo facebooksoja. Aí, começou o Prodecer (Programabetboo facebookDesenvolvimento da Agricultura do Cerrado)", diz Yamanaka, que acompanhou algumas dessas missões como assessor do gabinete da Secretariabetboo facebookAgriculturabetboo facebookSão Paulo.
Depoisbetboo facebookpercorrer o Brasilbetboo facebookNorte a Sul, as missões decidiram pelo Cerrado como região prioritária para o plantio da soja e outros alimentos.
Paracatu,betboo facebookMinas Gerais, foi cenário para o projeto piloto do Prodecer - que, alémbetboo facebookmobilizar produtoresbetboo facebookorigem japonesa, também acabou por atrair agricultores do Rio Grande do Sul.
O boom da soja
O Cerrado é um dos palcos principais, até hoje, do plantio da soja. Mas, na décadabetboo facebook60, outros fatores contribuíram para que o Sul despontasse neste setor.
Além da demanda externa, contribuíram também para o avanço desse cultivo no país programasbetboo facebookmelhoramento genético e a mecanização na agricultura.
Como resultado, na média anual, a produção só fez crescer: saiubetboo facebook206 mil toneladasbetboo facebook1960 para 1,5 milhãobetboo facebooktoneladasbetboo facebook1970. Na safrabetboo facebook2017/2018, o Brasil produziu 117 milhõesbetboo facebooktoneladasbetboo facebooksoja.
"É no Noroeste gaúcho que se inicia o grande boom da soja: isso é inegável. A região se torna uma grande monoculturabetboo facebooksojabetboo facebookpropriedades pequenas, que produzem para o mercado externo. É a famosa 'revolução verde', com consumobetboo facebookinsumos, mecanização da lavoura e correção da calcário no solo", aponta Rhuan Trindade. "O boom da soja nos anos 60 e 70 está diretamente ligado à imigração europeia".
Esse momentobetboo facebookouro para a soja coloca, no entanto, duas origens europeiasbetboo facebookdisputa pela "paternidade" da imersão do grão no Brasil - parte fundamental da pesquisa do historiador. Ao lado dos polonesesbetboo facebookGuarani das Missões, se colocam os alemãesbetboo facebookSanta Rosa, também no Rio Grande do Sul.
Com um roteiro parecido ao das primeiras experiências com a sojabetboo facebookGuarani,betboo facebookSanta Rosa, foi o pastor luterano e americano Alberto Lehenbauer quem introduziu o grão no pequeno vilarejo.
"O pastor viajou na décadabetboo facebook20 para os Estados Unidos e a soja estava fazendo o maior sucesso por lá", explica a historiadora Teresa Neumann Christensen, que há anos estuda o cultivobetboo facebooksoja, sobretudo na regiãobetboo facebookSanta Rosa. "A situação era tão triste,betboo facebookuma pobrezabetboo facebookmarré, com crianças subnutridas. O pastor avaliou que a soja poderia resolver essa questão, então publicavabetboo facebookperiódicos receitas com o grão, ajudava na organização do plantio".
"Ele pedia que, quem colhesse soja, que levasse uma porção nos cultosbetboo facebookdomingo. É importante não só como a soja chegou a Santa Rosa, mas a socialização que ela promoveu. A região tinha um luteranismo muito forte, então a figura deste pastor teve uma importância imensa. Ele promoveu a solidariedade e a prevenção à desnutrição".
Segundo a historiadora, Lehenbauer era americano mas filhobetboo facebookalemães. Depoisbetboo facebooksua missãobetboo facebookSanta Rosa, ele foi transferido para a Argentina.
Enquanto isso,betboo facebookSanta Rosa, o crescimento da soja foi modesto mas constante com o passar dos anos - sendo acompanhado, progressivamente, da chegadabetboo facebookequipamentos como semeadeiras e empilhadeiras, além da formaçãobetboo facebooknovas cadeias, como abetboo facebookbeneficiamentobetboo facebookgrãos. Na décadabetboo facebook70, veio finalmente o boom da soja.
Santa Rosa e Guarani das Missões passam, então, a valorizar seus passados com a soja e até a reivindicar a "paternidade" da introdução deste cultivo.
Santa Rosa, por exemplo, vira berço para a criação,betboo facebook1966, da Feira Nacional da Soja (Fenasoja). Algumas décadas depois,betboo facebook2009, um projeto do legislativo estadual é sancionado e declara a cidade como "Berço Nacional da Soja".
Em paralelo, Guarani das Missões também passa a se voltar parabetboo facebookhistória com a soja - e, nisso, a figurabetboo facebookCeslau Biezanko volta a ser rememorada. Trindade lembra que a origem da introdução do grão não é fácilbetboo facebookser rastreada e, mesmo entre poloneses, há também pelo menos outros três candidatos a introdutores da soja no Paraná.
E o quanto destas primeiras experiências contribuiu para a lucrativa fase que chegaria décadas depois?
"Cientificamente falando, não há uma resposta elaborada. Mas a experiência obtida anteriormente pode ter ajudado a geração seguinte, porque é bem a regiãobetboo facebookGuarani das Missões que vai viver essa expansão nos anos 70. É uma coincidência bastante grande", opina Trindade.
Das cidades gaúchas, segundo os pesquisadores que estudaram o tema, saíram famílias que conduziram o avanço da sojabetboo facebookdireção ao Centro-Oeste brasileiro e, mais recentemente, às bordas da Amazônia.
"Onde você for neste Brasil, encontra alguémbetboo facebookorigem alemã que planta soja", resume Teresa Christensen. "Hoje,betboo facebookSanta Rosa, já tem produçãobetboo facebookleite, milho e outros, mas a soja ainda é a rainha".
Outros lados da história
O avanço da soja pelo Brasil colocabetboo facebookevidência outra faceta desta história: o da degradação do meio ambiente.
Esse cultivo é frequentemente associado por ambientalistas ao desmatamento que marca o Cerrado e rastejabetboo facebookdireção à Amazônia.
"Nós, historiadores e acadêmicos do Rio Grande do Sul, temos um embate grande contra pesquisas mais apologéticas, laudatórias dos antepassados. Temos que tentar ir além dessa visãobetboo facebookque o imigrante é o grande pioneiro: esta também é uma históriabetboo facebookdesmatamento da Mata Atlântica, uma exploração que prejudicou muito o solo da região. É uma história que continua", destaca Trindade.
Se o passado deixa marcas no presente, certas ausências também dizem coisas. O nomebetboo facebookGuarani das Missões, por exemplo, remete às missões jesuíticas que, nos séculos 17 e 18, forçavam à catequização índios guaranis. Mas onde estão estes povos nos episódios posteriores, do século 20?
"A imigração europeia no Sul, ao mesmo tempo que é uma históriabetboo facebookvalorização dos grupos europeus, é uma históriabetboo facebookapagamento das comunidades indígenas e dos grupos conhecidos como os caboclos", aponta o historiador.
"Não podemos deixarbetboo facebookver isso como um colonialismo interno brasileiro, que via o imigrante europeu como sinônimobetboo facebookprogresso, e a presença indígena e negra comobetboo facebookatraso".
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