As estratégias das marcas para infiltrar propaganda nas escolas brasileiras:jogos360 com

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Marcas encontram diferentes formasjogos360 comlevar suas marcas às crianças

A publicidade direcionada para o público infantil é considerada abusiva pelo Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) desde 2014. E o Ministério da Educação tem uma portaria proibindo qualquer tipojogos360 compropagandajogos360 comescolas públicas.

No entanto, episódios como o relatado por Luiza Diener são extremamente comuns. As marcas usam das mais diferentes estratégias para garantirjogos360 compresença no ambiente escolar sem fazer propaganda direta, driblando a regulação.

Embora não veiculem anúncios, por exemplo, as empresas fazem oficinas com professores e alunos, atividadesjogos360 comsalajogos360 comaula e até distribuem seus produtos para as crianças. Outras patrocinam eventos, promovem peçasjogos360 comteatro nas escolas, visitas à fábrica ou - como no caso da óticajogos360 comBrasília - supostos programasjogos360 comsaúde.

"Normalmente as campanhas vêm como açõesjogos360 comresponsabilidade social, são vendidas como atividades educativas ou culturais", diz Ekaterine Karageorgiadis, coordenadora do programa Criança e Consumo, do Instituto Alana, ONG que defende os direitos das crianças.

Diener conta que conversou com outra mãe cujo filho chegoujogos360 comcasa preocupado, achando que tinha problemajogos360 comvisão por causa do "pré-exame" - uma consulta no oftalmologista mostrou não haver problema algum.

"Ficamos bem chateados. Escola não é lugarjogos360 compropaganda, e publicidade não tem que ser direcionada para crianças", diz ela. "A criança estájogos360 comuma idadejogos360 comque você está absorvendo tudo, que está construindo os gostos, a visãojogos360 commundo, o que considera essencial. Esse tipojogos360 cominfluência é negativa."

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Propagandajogos360 comescola é mais agressiva do que a convencional, afirma especialistajogos360 comdireitos do consumidor

Atividade cultural ou campanhajogos360 commarketing?

Em janeirojogos360 com2018, o Alana denunciou a marca Bic ao Ministério Públicojogos360 comMinas Gerais por considerar umajogos360 comsuas ações publicitárias como "direcionamento abusivojogos360 compublicidade para o público infantil".

A Bic havia lançado um projeto chamado "Escolajogos360 comColorir", cuja ideia era fazer atividades nas escolas das ensino fundamentaljogos360 comcapitais como São Paulo, Belo Horizonte e Riojogos360 comJaneiro.

Nas atividades, as crianças utilizavam diversos produtos da empresa: canetas, lápisjogos360 comcor, papéis. "A ação expõe massivamente os alunos a imagens, cores, logos e valores corporativos da empresa durante as atividades, que são propostas para serem feitas não apenas nas salasjogos360 comaula, mas tambémjogos360 comoutros momentos como recreio ou no tempojogos360 comlazerjogos360 comcasa", diz o Alana na denúncia.

Em resposta, a Bic afirma que umjogos360 comseus pilares é o "compromisso com a educação" e que faz "ações voltadas ao acesso à educação junto a comunidades locais".

"No Brasil, a empresa pauta todas suas atividadesjogos360 comacordo com a legislação (...) alémjogos360 compossuir um rígido códigojogos360 comconduta interno. O Projeto Escolajogos360 comColorir foi concebido respeitando tais preceitos", defende a empresajogos360 comnota. "Assim, não há violação às normas do conselho."

Legenda da foto, O projeto Escolajogos360 comColorir foi terminado pela Bic | Foto: Divulgação/Bic

Para a nutricionista Ana Paula Bortoletto, do Idec (Institutojogos360 comDefesa do Consumidor), a discussão não pode ficarjogos360 comcimajogos360 comtecnicismos, já que as estratégias são usadas pelas marcas justamente para ter campanhas publicitárias que atinjam crianças sem desrespeitar formalmente as normas.

Ela defende que a legislação seja endurecida.

"De certa forma, essas campanhas com apresentaçãojogos360 comprodutos e grande presença das marcas são piores do que um comercial na TV voltado para crianças", diz Bortoletto. "Você está expondo as crianças aos produtos, elas já vão memorizando, identificando, reconhecendo. As campanhas diretas costumam ser até mais agressivas, por estarem muito mais próximas às crianças e durarem mais tempo."

Para o Alana, a publicidade para a criança é sempre disfarçada, uma vez que ela não tem o senso crítico para reconhecer que aquilo é uma mensagem comercial. Mas se veiculada no ambiente escolar, o problema é ainda maior.

"A mensagem vemjogos360 comum espaçojogos360 comautoridade. A autoridade do professor, da escola, fortalece a campanha publicitária", diz Ekaterine Karageorgiadis.

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Marcas disfarçam campanhas publicitáriasjogos360 comprojetos educativos para entrarjogos360 comescolas

Estratégia comum

A Bic não é a única marca a produzir campanhas do tipo.

A Danone teve duas grandes campanhasjogos360 comescolasjogos360 com2016. Eles ofereciam cursojogos360 comformaçãojogos360 comprofessores, desenvolvimentojogos360 comatividadesjogos360 comsalajogos360 comaula para falar da importânciajogos360 comconsumir produtos lácteos - setorjogos360 comatuação da empresa -, distribuiçãojogos360 comprodutos didáticos e apresentação da peça O Fabuloso Mundo das Descobertas.

Em um único diálogo da apresentação, a palavra "lácteos" chegava a ser repetida maisjogos360 com15 vezes.

Em outro caso, no mesmo ano, a Sadia divulgou, com o chef britânico Jamie Oliver, uma ação chamada Saber Alimenta. O projeto piloto foi feito com 20 escolas e 56 professores, que receberam um treinamento da empresa sobre alimentação.

A BRF, empresa controladora da Sadia, diz que "os professores foram capacitados para replicar conhecimento para crianças do Ensino Fundamental" e que os materiais são voltados para os adultos e "não fazem referência a nenhum produto da marca."

Segundo Ekaterine Karageorgiadis, é grave que as marcas impactem o currículo das escolas - mesmo se o produto da marca não for apresentado diretamente. "A escolha do currículo tem que se basearjogos360 comum projeto pedagógico planejado para ensinar as crianças a pensarem criticamente. Mas (com as campanhas) o conteúdo é apresentado com um viés e uma orientação mercadológica, nãojogos360 commaneira crítica", diz ela.

"Será que realmente interessa ficar seis meses falando sobre leite, semjogos360 comnenhum momento questionar se ele realmente é bom e necessário para todo mundo?", afirma.

Legenda da foto, Jamie Oliver se tornou garoto propaganda da Sadia no Brasil | Foto: Divulgação/Sadia

Para Bortoletto, do Idec, o risco é supervalorizar um produto alimentício. "No caso do leite, por exemplo, ele pode fazer partejogos360 comuma dieta saudável, mas não é obrigatório. Depende muitojogos360 comqual é o leite. Se for uma bebida láctea cheiajogos360 comaçucar, pode fazer mais mal do que bem", diz ela.

"A criança precisa aprender a diferenciar um produto naturaljogos360 comum processado. A escola é um ambiente para elas aprenderem hábitos realmente saudáveis e pensamento crítico."

No ano passado, o Ministério Público do Distrito Federal instaurou um inquérito civil para apurar o caso da Danone, que ainda não foi encerrado.

Procurada pela BBC Brasil, a Danone, que cancelou os projetosjogos360 com2016, diz que "suas açõesjogos360 comcomunicação atendem à legislação brasileira vigente e refletem a missão da companhiajogos360 comlevar saúde ao maior númerojogos360 compessoas", e quejogos360 comcampanha "levou informação e conhecimento sobre a importânciajogos360 comuma boa alimentaçãojogos360 comforma lúdica e gratuita às escolasjogos360 comtodo país."

Porjogos360 comvez, a Sadia afirmou que o conteúdo do seu programa "estájogos360 comconformidade com todas as legislações, regulamentações bem como regras aplicáveis ao setor alimentício e a publicidadejogos360 commaneira geral" e que "assinou um Compromisso Público sobre Publicidade Responsável no qual se comprometeu a não realizar açõesjogos360 commerchandisingjogos360 comseus produtos nas escolas, sejam elas particulares ou públicas, direcionadas ao público infantil".

Ajuda ou exploração?

Outra estratégia muito usada pelas empresas é oferecer patrocínio - que vai desde promover campeonatos esportivos a se oferecer para comprar o material ou uniforme para crianças carentesjogos360 comtrocajogos360 comdivulgação da marca.

A Nestlé, por exemplo, tem há anos parcerias para promover campeonatos esportivosjogos360 comescolas das redes pública e privada. Os eventos tinham exposiçãojogos360 comlogos e imagensjogos360 comNescaujogos360 combanners e painéis, distribuiçãojogos360 commedalhas, troféus e uniformes com o nome e o símbolo da marca, e distribuiçãojogos360 comprodutos da Nestlé aos presentes no evento.

Legenda da foto, Faltajogos360 comestrutura e recursos faz escolas públicas aceitarem 'qualquer ajuda', diz diretora | Foto: Rovena Rosa/Ag. Brasil

A empresa afirma que reformulou algumas ações da competição, procurando outros espaços para ajogos360 comrealização – costumavam ocorrer nos CEUs (Centrosjogos360 comArtes e Esportes Unificados). Segundo a multinacional, os eventos agora não acontecem maisjogos360 comnenhum ambiente relacionado à educação.

"Reforçamos, ainda, que a participação dos jovens na Copa Nescau® é condicionada à autorização dos responsáveis. Além disso, diversas melhorias vêm sendo desenvolvidas no formato da competição para reforçar o caráterjogos360 comsocialização do evento", diz a companhiajogos360 comnota.

"A Nestlé Brasil informa que segue rigorosamente a legislação vigente no país e está entre as empresas pioneiras no mundo na adoçãojogos360 comparâmetros mais rigorosos para divulgar seus produtos ao público infantil", conclui.

O lado da escola

A questão das campanhas se torna mais complicada no caso do patrocínio, uma vez escolas públicas muitas vezes têm carênciajogos360 cominvestimento e problemas na infraestrutura - ou seja, acabam tendendo a aceitar qualquer "ajuda" que possam receber.

A BBC Brasil conversou, sob a condiçãojogos360 comanonimato, com a diretorajogos360 comuma escola municipaljogos360 comSão Paulo que recebeu ações publicitáriasjogos360 com2013 e 2015. Ela falou sobre um dos casos.

"A exposição (das crianças às marcas) não é o melhor dos mundos. Mas estávamos sem aulasjogos360 comeducação física porque a quadra estavajogos360 compéssimo estado. Resolvemos participar da ação porque tinha um prêmiojogos360 comdinheiro que seria muito útil para a escola", diz a diretora. "Nossa falta é tanta que a gente acaba aceitando certos negócios para dar um mínimojogos360 comcondição para os alunos", afirma. Tratava-sejogos360 comum concurso - e o colégio acabou não ganhando.

A empresa alimentícia Tirol promoveu uma competição parecidajogos360 com2016. Alunos deveriam criar brinquedos utilizando materiais recicláveis –jogos360 compreferência, segundo o regulamento, embalagensjogos360 com"leite longa vida Tirol, caixinhas do suco Frutein, bebida láctea Fibrallis e achocolatado Tirolzinho". As crianças vencedoras ganharam um bicicleta e uma mochila cheiajogos360 comachocolatados. Ejogos360 comescola, um prêmiojogos360 comR$ 18 mil.

Procurada pela reportagem, a Tirol "diz que está no mercado desde 1974, sempre prezando pela qualidade dos produtos e bem-estar dos consumidores", e que já prestou esclarecimentos sobre o projeto para o Ministério Público do Estado.

Mas para especialistas, ativistas e alguns pais, aceitar investimentojogos360 commarcas é a forma erradajogos360 comatacar o problema – principalmente no casojogos360 comcrianças pequenas.

"Não podemos deixar que a necessidadejogos360 comsuprir essa falta seja uma justificativa para cercear outros direitos das crianças", diz Ekaterine Karageorgiadis, do Alana.

Para Bortolotto, do Idec, é preciso que haja investimento e políticas públicas para resolver os problemas nas escolas com dificuldades.

"E mesmo na privada, as decisões sobre currículo e os alimentos a que as crianças têm acesso precisam ser partejogos360 comum projeto que coloca o interesse e bem-estar das criançasjogos360 comprimeiro lugar", diz a nutricionista. "Não é algo que pode ficar à mercê das estratégiasjogos360 commarketing das indústrias."