'Minha mãe não quer ouvir falar. É como se estuprofaz o bet aí demora para pagarmenino gay fosse justificado': o relatofaz o bet aí demora para pagarLondresfaz o bet aí demora para pagaruma trans brasileira:faz o bet aí demora para pagar

Legenda da foto, A diretora Bia Lessa (à esq.), Maria Alice Vieira e Gilmara Cunha na instalação Cicatriz, exibida no festival Mulheres do Mundo,faz o bet aí demora para pagarLondres | Foto: Andre Camara

"Quando se tratafaz o bet aí demora para pagaruma mulher biologicamente construída efaz o bet aí demora para pagarum gay, é justificável a violência com gay. Com a mulher é inadmissível, não pode (...) Acho que violência e exploração sexual é exploração sexual, indiferentefaz o bet aí demora para pagargênero,faz o bet aí demora para pagarvocê ser um homem gay, uma travesti ou uma mulher biologicamente construída."

Legenda do vídeo, Mulheres do Complexo da Maré contam suas histórias sobre violênciafaz o bet aí demora para pagarLondres

Há alguns dias o depoimentofaz o bet aí demora para pagarCunha pôde ser escutado e assistido por quem visitasse a instalação batizadafaz o bet aí demora para pagarCicatriz ("Scar",faz o bet aí demora para pagaringlês),faz o bet aí demora para pagarLondres. A obra,faz o bet aí demora para pagarBia Lessa, integrou o festival Mulheres do Mundo ("Women of the World"), no Southbank Centre.

Ali, foram convertidosfaz o bet aí demora para pagarobras gráficas e audiovisuais os relatosfaz o bet aí demora para pagarduas dezenasfaz o bet aí demora para pagarmoradoras da Maré, dentre as 801 ouvidas para a pesquisa Violência Contra Mulheres no Complexo da Maré, que tenta traçar um panorama da violênciafaz o bet aí demora para pagargênero naquele aglomeradofaz o bet aí demora para pagarfavelas.

O estudo integra a iniciativa batizadafaz o bet aí demora para pagar"Cidades Saudáveis, Seguras e com Equidadefaz o bet aí demora para pagarGêneros: Perspectivas transnacionais sobre Violência Urbana contra Mulheres", financiada pelo Conselhofaz o bet aí demora para pagarPesquisa Econômica e Social (ESRC/Reino Unido) e realizadafaz o bet aí demora para pagarparceria com a UFRJ (Universidade Federal do Riofaz o bet aí demora para pagarJaneiro), a Redes da Maré, a Queen Mary University, o King's College, a People's Palace Projects e o Latin American Women's Rights Service.

Para este projeto, também foi realizada uma pesquisa sobre o mesmo temafaz o bet aí demora para pagarLondres, desta vez com imigrantes brasileiras que vivenciaram algum tipofaz o bet aí demora para pagarviolência.

Legenda da foto, O público que foi ao Southbank Centre também podia ler todos os depoimentos das 20 mulheres na íntegra na instalação | Foto: Andre Camara

Moradora da Maré assim como Cunha, Maria Alice Vieira,faz o bet aí demora para pagar52 anos, também não teve coragemfaz o bet aí demora para pagardenunciar o ex-companheiro, usuáriofaz o bet aí demora para pagardrogas, que tentou matá-la.

"Ele pegou pelos cabelos e bateu com a minha cabeça no guarda-roupa. Aí me derrubou, montoufaz o bet aí demora para pagarcimafaz o bet aí demora para pagarmim, tapou a minha boca com a mão para eu não gritar, e aí foi a hora que ele enfiou a faca no meu peito... Foi quando mordi a mão dele. Ele tirou a mão da minha boca e foi a hora que eu gritei socorro e ele enfiou a faca dentro da minha boca, na minha garganta", diz.

Quando ela conseguiu fugirfaz o bet aí demora para pagarcasa e ser socorrida, o ex pulou do terceiro andar e se machucou todo. Moradores da vizinhança quiseram linchá-lo, o que Maria Alice então impediu. Logo depois, ela o acolheufaz o bet aí demora para pagarvolta.

"Fiquei um tempão me perguntando por que é que eu não fiz isso (de denunciar). Eu não sei se é porque eu não tinha coragem, ou se era pelo amor que eu tinha por ele. Eu mesma fiquei me perguntando, mas eu nunca tive essa resposta", diz a comerciante, que chegou a ficar três meses sem comer por causa dos 14 pontos levados na língua.

Na instalação feita apenas com relatos das moradoras da Maré, a diretora Bia Lessa também usou objetos pessoais das vítimas, alguns usados para feri-las, como um sabonete com o qual uma delas apanhava, ou que fossem símbolo da força para superar as agressões.

Maria Alice escolheu para a mostra uma das roupinhasfaz o bet aí demora para pagarValentina,faz o bet aí demora para pagarum ano e nove meses. A filha que teve com o homem que tentou matá-la há seis anos foi o motivo da ruptura na relação abusiva. No segundo semestre, a instalação será exibida no Rio efaz o bet aí demora para pagarSão Paulo.

Legenda da foto, A roupafaz o bet aí demora para pagarValentina, filhafaz o bet aí demora para pagarMaria Alice, é um dos objetos das mulheres da Maré exibidos na obra; foi por causa da criança que ela decidiu abandonar seu agressor | Foto: Andre Camara

Do outro lado do oceano

Do outro lado do Oceano Atlântico, brasileiras que emigraram para Londres relataram episódiosfaz o bet aí demora para pagarviolência parecidos com os que sofreram as moradas da Maré.

É o caso da baiana Camila,faz o bet aí demora para pagar31 anos, que teve o sobrenome foi omitido para preservarfaz o bet aí demora para pagaridentidade. Ela mudou-se para a capital inglesa há dez anos, depoisfaz o bet aí demora para pagarter conhecido pela internet o brasileiro que se tornaria seu marido.

"Como ele era calmo, evangélico, não bebia e não fumava, pensei que ele seria uma boa pessoa pra mim", conta. Um tempo depois, porém, ela descobriu que o casamento, na verdade, era uma prisão. "Ele me isolou do mundo porque ninguém podia saber que éramos casados. O pior abuso que sofri foi o psicológico", diz.

Não muito tempo depois, Camila passou a sofrer agressões físicas. Ela não teve coragemfaz o bet aí demora para pagardenunciar a agressão, ainda maisfaz o bet aí demora para pagarum país estrangeiro. "Tinha medo dele se vingar. Eu estava aqui sozinha e não queria voltar para o Brasil. Eu tinha vergonhafaz o bet aí demora para pagarvoltar e admitir que nada deu certo aqui."

Vergonhafaz o bet aí demora para pagardenunciar

O relato dela foi colhido durante a pesquisa Não se pode lutar no escuro: Violência Contra Mulheres e Meninas entre Brasileirasfaz o bet aí demora para pagarLondres,faz o bet aí demora para pagarautoria da professora Cathy McIlwainefaz o bet aí demora para pagarparceria com a pesquisadora Yara Evans, ambas da universidade King's College,faz o bet aí demora para pagarLondres.

Para o estudo, que tem metodologia diferente do feito na Maré e não é comparativo com aquele, foram ouvidas 175 brasileiras que vivem na capital inglesa, indicadas por organizaçõesfaz o bet aí demora para pagardireitos das mulheres.

Do totalfaz o bet aí demora para pagar175 entrevistadas, 82%, ou quatrofaz o bet aí demora para pagarcada cinco mulheres, disseram ter sofrido violênciafaz o bet aí demora para pagargênero ao longofaz o bet aí demora para pagarsuas vidas. Duasfaz o bet aí demora para pagarcada cinco delas foram vítimas tanto no Brasil quanto no Reino Unido.

Quase metade delas (48%) sofreu alguma formafaz o bet aí demora para pagarviolênciafaz o bet aí demora para pagargênero no novo país. A violência emocional/psicológica é a mais relatada (48%), seguida da física (38%) e da sexual (14%).

Camila não é a única que não reportou a agressão no Reino Unido: 56% das imigrantes brasileiras não fizeram denúncia.

Entre os motivos estão a faltafaz o bet aí demora para pagarconfiança que algo seria feito a respeito, pouca informação, vergonha e problemas com a imigração (documentos vencidos ou faltafaz o bet aí demora para pagardocumentação), além do problema com a língua estrangeira.

Na pesquisa feita na Maré, coordenada pela professora da pós-graduaçãofaz o bet aí demora para pagarServiço Social da UFRJ Miriam Krenzinger e pela Redes da Maré, foram entrevistadas 801 mulheresfaz o bet aí demora para pagarmaneira aleatória (o compromisso do projeto transnacional era ouvir cercafaz o bet aí demora para pagar200 mulheresfaz o bet aí demora para pagarcada país, mas as pesquisadoras brasileiras decidiram ampliar a amostra).

Desse total, 29% relataram ter sofrido alguma violência - apesarfaz o bet aí demora para pagaros dois estudos não serem comparativos, a diferença com a amostrafaz o bet aí demora para pagarLondres pode se dar, segundo os pesquisadores, porque as entrevistadas fora do Brasil foram indicadas por entidadesfaz o bet aí demora para pagarapoio à mulher.

Legenda da foto, A instalação montada no Southbank Centre trazia depoimentosfaz o bet aí demora para pagar20 mulheres da favela da Maré que sofreram violência | Foto: Andre Camara

Na Maré, a agressão física associada à violência psicológica foi a forma mais recorrentefaz o bet aí demora para pagaragressão, segundo 34%. O medo e a vergonha também apareceram como fatores principais para que elas não revelassem a ninguém o que sofreram.

A professora McIlwaine diz à BBC Brasil que as causasfaz o bet aí demora para pagarviolênciafaz o bet aí demora para pagargênero na Maré efaz o bet aí demora para pagarLondres são fundamentalmente as mesmas: relações desiguaisfaz o bet aí demora para pagarpoder, patriarcais e misóginas aprofundadas.

"As condições, no entanto, são muito diferentes. As mulheres na Maré vivem numa pobreza maior, com alto nívelfaz o bet aí demora para pagarexclusão efaz o bet aí demora para pagarviolência urbana. De muitas maneiras, a violência contra as mulheres lá também está associada a outras formasfaz o bet aí demora para pagarviolência."

Para Krenzinger, há uma outra conexão entre as duas pesquisas: a relação das mulheres com a questão da Justiça.

"As mulheres da Maré moram num território que estabelece redesfaz o bet aí demora para pagarproteção informais, muitas vezes fora da lógica do que a gente pensafaz o bet aí demora para pagartermosfaz o bet aí demora para pagarestado democráticofaz o bet aí demora para pagardireito. Elas acionam redes que podem ser vinculadas à família, à igreja e a grupos armados", diz. "Em Londres elas também acionam redes que não são a do Estado, como entidadesfaz o bet aí demora para pagarapoio, igreja", fala.

"Outra questão é o medofaz o bet aí demora para pagaracionar o acesso à Justiça formal via Poder Judiciário, ir à polícia. Em Londres, muitas mulheres estãofaz o bet aí demora para pagarsituação irregular e têm medo. No Rio, as mulheres não acreditam que a polícia irá até a favela investigar."