O que é ser evangélico?:greenbets usuario bloqueado

Ilustraçãogreenbets usuario bloqueadoevangélico

Crédito, Daniel Arce Lopez/BBC

Um exemplo representativo desse avanço no campo político é que o governo Bolsonaro chegou a ter seis ministros protestantes ao mesmo tempo: Onyx Lorenzoni (luterano), André Mendonça (presbiteriano), Milton Ribeiro (presbiteriano), Damares Alves (do Evangelho Quadrangular), Luiz Eduardo Ramos (batista) e Marcelo Antonio (da igreja Cristã Maranata).

Só que esse avanço da população evangélica (que deve superar numericamente agreenbets usuario bloqueadocatólicos na décadagreenbets usuario bloqueado2030) vem sendo acompanhadogreenbets usuario bloqueadodesconhecimento, preconceito e desinformação sobre quem são, o que pensam e por que votamgreenbets usuario bloqueadodeterminados candidatos.

Para entender melhor sobre essa população cada vez mais importante na política e na sociedade brasileiras, a BBC News Brasil vai responder a algumas perguntas fundamentais sobre os evangélicos.

Primeiramente, é importante entender as diferenças e as semelhanças entre evangélicos, protestantes e outras vertentes do cristianismo.

Em seguida, vamos explorar as origens do protestantismo no século 16 e a inserção dos evangélicos no Brasil até se tornarem uma força política que teve um enorme impacto na eleiçãogreenbets usuario bloqueadoBolsonaro,greenbets usuario bloqueado2018.

Evangélicos, protestantes, crentes…

Para começar, qual é a diferença entre evangélicos, protestantes, pentecostais e neopentecostais?

Em geral, o termo protestante é usado para descrever pessoas que seguem todas as denominações derivadas da Reforma Protestante, movimento ocorrido há maisgreenbets usuario bloqueado500 anos que deu origem ao principal desdobramento da Igreja Católica desde o cisma entre as igrejas do Ocidente e do Orientegreenbets usuario bloqueado1054.

Isso incluiria então todas as igrejas cristãs criadas a partir das ideiasgreenbets usuario bloqueadoMartinho Lutero, dos luteranos à Igreja Universal do Reinogreenbets usuario bloqueadoDeus.

O antropólogo Juliano Spyer resume o protestantismo no livro Povogreenbets usuario bloqueadoDeus da seguinte forma: "O foco da experiência religiosa deve ser o próprio cristão, seu contato particular com Deus mediado pela leitura e interpretação da Bíblia, e pelo trabalhogreenbets usuario bloqueadocumprir a vontadegreenbets usuario bloqueadoDeus sendo parte das ações evangelizadoras".

Teoricamente, não há diferenças entre protestantes e evangélicos, mas segundo Spyer, muitas vezes "evangélico" é usado para se referir ao protestante pobre, enquanto "protestante" é geralmente adotado para se referir a pessoas das camadas médias e alta — alguns deles rejeitam a classificaçãogreenbets usuario bloqueado"crente" ou mesmogreenbets usuario bloqueado"evangélico", preferindo se identificar como cristãos.

Além disso, os protestantes costumam ser divididosgreenbets usuario bloqueadotrês grupos: os protestantes históricos, os pentecostais e os neopentecostais.

O primeiro trata das principais correntes protestantes que surgiram na Europa no século 16, como os calvinistas, os luteranos e os anglicanos. O segundo e o terceiro são ligados a desdobramentos protestantes no século 20 que defendem uma experiência mais pura e simples do cristianismo, num contato com Deus menos formal e mais emocional.

As origens dos protestantes

A corrente religiosa conhecida no Brasil como evangélica derivagreenbets usuario bloqueadoum movimento que começou oficialmentegreenbets usuario bloqueado1517.

Naquele ano do século 16, o monge católico e teólogo alemão Martinho Lutero pregou na portagreenbets usuario bloqueadouma igrejagreenbets usuario bloqueadoWittenberg (Alemanha) suas "95 Teses".

Seus escritos atacavam, entre outros pontos, abusos e fraudesgreenbets usuario bloqueadolideranças católicas e a vendagreenbets usuario bloqueado"indulgências" (uma espéciegreenbets usuario bloqueado"lugar no paraíso" ou "perdão" dos pecadosgreenbets usuario bloqueadoquem estava vivo, morto ou na fase intermediária na crença católica, o purgatório).

Para Lutero, as pessoas deveriam ser salvas por meiogreenbets usuario bloqueadosua fégreenbets usuario bloqueadoum contato direto e individual com Deus. E não por meiogreenbets usuario bloqueadoperdões concedidos por líderes católicos,greenbets usuario bloqueadoindulgências vendidas ougreenbets usuario bloqueadointermediários para entender a mensagemgreenbets usuario bloqueadoDeus (como a tradição escolástica elaborada pelos teólogos católicos).

Uma das principais medidas práticasgreenbets usuario bloqueadoLutero foi a tradução da Bíblia do latim para o alemão. Isso não apenas permitiu que as pessoas tivessem acesso direto ao texto bíblico emgreenbets usuario bloqueadoprópria língua como também quebrou o monopólio das lideranças católicas sobre a interpretação desses escritos sagrados.

evangélico lê a bíbliagreenbets usuario bloqueadoigreja

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Protestantismo levou pessoas comuns a se aproximarem da Bíblia sem intermediários

As ideias e açõesgreenbets usuario bloqueadoLutero se espalharam como pólvora pela Europa. De um lado, ele acabou condenado por heresia e excomungado pela Igreja Católica. De outro, começou a ganhar seguidores que viriam a ser conhecidos como luteranos ou protestantes (nome dado por causa do protesto que fizeram contra a política religiosa do catolicismo).

"Ele [Lutero] não foi a primeira pessoa que se levantou contra o poder papal e contra os poderes imperiais [do Sacro Império Romano Germânico]. Mas, sem dúvida nenhuma, as consequências [de seu movimento] ocorreramgreenbets usuario bloqueadoforma nunca antes vistas para a cristandade ocidental, porque daígreenbets usuario bloqueadofato começa um desenrolar político, econômico e religioso", explica a historiadora Jaquelinigreenbets usuario bloqueadoSouza, professora na Universidade Regional do Cariri e pesquisadora nas Faculdades EST (antiga Escola Superiorgreenbets usuario bloqueadoTeologia), instituição da Igreja Evangélicagreenbets usuario bloqueadoConfissão Luterana no Brasil.

"Nasceu uma nova divisão para a cristandade ocidental, com a necessidadegreenbets usuario bloqueadose trabalharem questões sobre liberdade religiosa, já que Lutero defendia que não era bom — nem são — ir contra a consciência. Questões sobre a ideiagreenbets usuario bloqueadoliberdadegreenbets usuario bloqueadoexpressão,greenbets usuario bloqueadoresistência ao Estado, tudo isso será desdobramento daquilo", diz Souza.

Esse movimentogreenbets usuario bloqueadoseparação da Igreja Católica (que começou com o objetivogreenbets usuario bloqueadoquestionamento e nãogreenbets usuario bloqueadocisão) ficaria conhecido como Reforma Protestante, com três grandes vertentes: luteranismo, anglicanismo e calvinismo.

Esse protestantismo histórico,greenbets usuario bloqueadoforma geral, é centrado numa volta à Bíblia como elemento essencial da fé e da prática religiosa.

O calvinismo tem esse nome por causa do teólogo francês João Calvino, que tinha um foco especial no trabalho.

"Calvino e também o calvinismo [ou seja, as interpretações posteriores da teologia dele] entendem que o trabalho deve ser visto como uma bênção, pois deve ser realizado para glorificar a Deus", explicou à BBC News Brasil o historiador, filósofo e teólogo Gerson Leitegreenbets usuario bloqueadoMoraes, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Outro ponto que se destaca no calvinismo é a ideia da escolha, da predestinação. "A partir do século 17, o calvinismo passa a ser visto como uma religiosidade que enaltece a predestinação: só os eleitos são salvos. Mas essa é uma marca do calvinismo [ou seja, dos seguidores] e não do próprio Calvino", explica Moraes.

E isso acabou se tornando muito fortegreenbets usuario bloqueadopaíses como a Inglaterra — com os chamados puritanos — e,greenbets usuario bloqueadoseguida, com os colonos que chegaram aos Estados Unidos imbuídos da ideiagreenbets usuario bloqueadoque eram os predestinados ao Novo Mundo. No Brasil, a principal denominação ligada ao calvinismo é a Igreja Presbiteriana do Brasil.

"No meio protestante, os calvinistas são reconhecidos como um grupo religioso muito apegado à Bíblia, à tentativagreenbets usuario bloqueadofidelidade, ao viver segundo a tradição", explica Sonia Mota, pastora da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil e diretora executiva da Coordenadoria Ecumênicagreenbets usuario bloqueadoServiço

Mas Mota ressalta que há diferenças ainda mais profundas dentro dessas próprias correntes. "A distância que separa os calvinistas liberais, fundamentalistas e carismáticos é maior do que a distância entre os tradicionais princípios teológicos calvinistas e osgreenbets usuario bloqueadooutras denominações protestantes históricas".

Chegada e expansão do protestantismo no Brasil

Essas e outras correntes protestantes começariam a chegar ao Brasil ainda no século 16, mas só se consolidariam mesmo no século 19.

Muitos fatores favoreceram a chegada delas, como a abertura dos portos brasileiros às nações amigas,greenbets usuario bloqueado1808, e a crescente liberdade religiosa para além da Igreja Católica.

O luteranismo e o anglicanismo foram trazidos principalmente por imigrantes alemães e ingleses, respectivamente. O calvinismo,greenbets usuario bloqueadoseguida, se espalhou graças ao trabalhogreenbets usuario bloqueadomissionáriosgreenbets usuario bloqueadocorrentes como a presbiteriana e a metodista.

O marco fundador do calvinismo no país, por exemplo, é considerado a chegada do pastor americano Ashbel Green Simonton,greenbets usuario bloqueado12greenbets usuario bloqueadoagostogreenbets usuario bloqueado1859. Três anos depois, ele fundaria a Igreja Presbiteriana do Brasil, hoje com cercagreenbets usuario bloqueado650 mil adeptos. Estima-se que, no total, sejam 1,2 milhão os praticantes do calvinismo no Brasil.

Como dito acima, o protestantismo é divididogreenbets usuario bloqueadotrês vertentes: os protestantes históricos (calvinistas, luteranos, anglicanos etc.), os pentecostais e os neopentecostais.

Igreja da Assembleiagreenbets usuario bloqueadoDeus

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Legenda da foto, Assembleiagreenbets usuario bloqueadoDeus é a instituição pentecostal mais popular do país

No Brasil, os protestantes históricos incluem as igrejas Luterana, Batista, Presbiteriana, Metodista, Episcopal, entre outras.

O segundo grupo (pentecostal) tem entre seus integrantes Assembleiagreenbets usuario bloqueadoDeus, Deus é Amor, Evangelho Quadrangular e Congregação Cristã do Brasil.

O terceiro grupo (neopentecostal), uma subdivisão dos pentecostais, inclui denominações como Renascergreenbets usuario bloqueadoCristo, Igreja Universal do Reinogreenbets usuario bloqueadoDeus, Sara Nossa Terra, Igreja Internacional da Graçagreenbets usuario bloqueadoDeus e Igreja Mundial do Podergreenbets usuario bloqueadoDeus.

Segundo estimativa do Datafolhagreenbets usuario bloqueado2016, a cada 100 evangélicos no Brasil, 34 são da Assembleiagreenbets usuario bloqueadoDeus, 17 sãogreenbets usuario bloqueadoigrejas que não pertencem a nenhuma grande denominação, 11 da Igreja Batista, oito da Universal, seis da Congregação Cristã do Brasil, cinco da Quadrangular, três da Deus é Amor, dois da Adventista e dois da Presbiteriana, entre outros. E a cada 100 evangélicos, 44 são ex-católicos.

Vale lembrar que, no Brasil, a face típica do evangélico é feminina, negra e jovem: 58% são mulheres, 59% são pretos ou pardos e maisgreenbets usuario bloqueado60% têm entre 14 e 44 anos. Os dados sãogreenbets usuario bloqueadouma pesquisa Datafolhagreenbets usuario bloqueado2020, a mais ampla feita até agora sobre o perfil dos evangélicos brasileiros.

Surgido entre pessoas mais pobres e menos favorecidas no início do século 20 nos EUA, o pentecostalismo é uma formagreenbets usuario bloqueadocristianismo que também enfatiza a experiência direta da presençagreenbets usuario bloqueadoDeus por aquele que crê.

Em linhas gerais, os pentecostais acreditam que a fé precisa ser uma experiência poderosa, e não apenas algo ligado a rituais ou reflexões, e que os crentes são movidos pelo podergreenbets usuario bloqueadoDeus.

Um aspecto pentecostal importante na conversão é o batismo no Espírito Santo, que acredita-se preencher a vida do crente com o Espírito Santo e conceder a ele a força para viver uma vida verdadeiramente cristã.

A maioria dos pentecostais acredita que esse movimento representa um retorno do cristianismo à forma pura e simplificada, como o que era praticado nos primeiros anos da própria Igreja Católica. A formagreenbets usuario bloqueadoorar pentecostal, por exemplo, é menos formal e mais emocional do que a tradição católica.

Esse movimento pentecostal (que não é uma igrejagreenbets usuario bloqueadosi, mas várias denominações que discordamgreenbets usuario bloqueadodiversos aspectos) chega ao Brasil ainda no início do século 20. Especialistas falamgreenbets usuario bloqueadotrês ondasgreenbets usuario bloqueadoexpansão no país.

A primeira onda tem umgreenbets usuario bloqueadoseus marcosgreenbets usuario bloqueado1911, anogreenbets usuario bloqueadoque missionários suecos fundam a Assembleiagreenbets usuario bloqueadoDeus no país.

O trabalho deles começagreenbets usuario bloqueadoBelém direcionado aos indígenas, mas décadas depois se volta para o restante da população. Hoje, a Assembleiagreenbets usuario bloqueadoDeus é a mais popular denominação pentecostal, reunindo cercagreenbets usuario bloqueadoum terço dos evangélicos.

A segunda onda pentecostal ganha força nos anos 1950 e 1960 por meiogreenbets usuario bloqueadodenominações como Brasil para Cristo e Deus é Amor.

A terceira onda, a partir dos anos 1970 estaria mais ligada a um desdobramento do pentecostalismo chamadagreenbets usuario bloqueadoneopentecostalismo. Um dos marcos é a fundação da Igreja Universal do Reinogreenbets usuario bloqueadoDeus,greenbets usuario bloqueado1977.

Mulher evangélica ora durante Marcha para Jesus

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Legenda da foto, Mulheres negras são a maior parcela entre os evangélicos brasileiros

Não há consenso sobre o que diferencia o neopentecostalismogreenbets usuario bloqueadorelação ao pentecostalismo e nem segreenbets usuario bloqueadofato há uma unidade entre essas denominações que não seja apenas temporal (ou seja, neopentescostais, por essa classificação, seriam todas as que tenham surgido a partir dos anos 1970).

"O neopentecostalismo transformou as tradicionais concepções pentecostais acerca da conduta e do modogreenbets usuario bloqueadoser do cristão no mundo. Propagou a ideiagreenbets usuario bloqueadoque ser cristão constitui o meio primordial para permanecer liberto do Diabo e obter prosperidade financeira, saúde e triunfo nos empreendimentos terrenos. 'Ter um encontro com Cristo' passou a significar gozargreenbets usuario bloqueadouma vida próspera e feliz, ou a certezagreenbets usuario bloqueadopoder contar com a efetiva intervenção divinagreenbets usuario bloqueadotoda circunstância, até para satisfazer ambições materiais", escreve o sociólogo e professor Ricardo Mariano (USP)greenbets usuario bloqueadoartigo sobre o tema.

Potência política e social

Mas, se a história dos protestantes no Brasil começagreenbets usuario bloqueadomeados do século 19 e avança no século 20, por que só no século 21 os evangélicos se tornaram uma potência política e social?

O sociólogo peruano José Luis Pérez Guadalupe aponta no livro Novo ativismo político no Brasil: os evangélicos do século 21 alguns fatores importantes para essa transformação evangélica:

O primeiro foi a percepção, com o amadurecimento das igrejas evangélicas,greenbets usuario bloqueadoque era válido reivindicar um lugar legítimo na sociedade, defender a liberdade religiosa e atuar como cidadãos imbuídos da mensagem cristã.

O segundo foi uma mudança teológica significativa, segundo Guadalupe. Antes, a mentalidade dominante (pré-milenarismo) rejeitava participargreenbets usuario bloqueadocoisas "mundanas", como a política, porque a vida era vista como uma "salagreenbets usuario bloqueadoespera" da segunda vindagreenbets usuario bloqueadoJesus Cristo.

"Houve (na época) grande pressão nas comunidades evangélicas para abandonar as coisas mundanas e se dedicar inteiramente à evangelização, uma vez que a segunda vinda do Salvador poderia ocorrer a qualquer momento", escreve. Era quase como uma "greve social" contra o que chamavamgreenbets usuario bloqueado"mundo".

Mas, a partir dos anos 1990, o pós-milenarismo começa a ganhar força na América Latina. Essa doutrina afirma que o milênio atual é "tempogreenbets usuario bloqueadocolheita", ou seja, que os cristãos protestantes deveriam não apenas esperar a segunda vindagreenbets usuario bloqueadoCristo, mas trabalhar ativamente pelo usufruto da vida e pela restauração do Reinogreenbets usuario bloqueadoDeus na Terra.

Um exemplo dessa mudançagreenbets usuario bloqueadouma fuga do mundo para uma conquista do mundo é a Teologia do Reino Presente, pregada por algumas denominações neopentecostais.

"É uma escatologia (doutrina que trata do destino final do homem e do mundo) da vitória, que torna os devotos verdadeiros herdeiros do poder, da autoridade e do direito divinogreenbets usuario bloqueadoconquistar as naçõesgreenbets usuario bloqueadonomegreenbets usuario bloqueadoDeus. O Reinogreenbets usuario bloqueadoJesus Cristo não se refere mais a uma promessagreenbets usuario bloqueadobênçãos futuras, mas ao tempo presente do fiel egreenbets usuario bloqueadosua igreja", explica o sociólogo argentino Joaquín Algranti na obra Política e Religião nas Margens: Novas formasgreenbets usuario bloqueadoparticipação social das megaigrejas evangélicas na Argentina.

Especialistas apontam outros três teologias influentes na transformação da atuação políticagreenbets usuario bloqueadoevangélicos no Brasil: a Teologia da Prosperidade (desfrutar o mundo criado por Deus), a Teologia da Guerra Espiritual (purificar o mundo dos demônios do mal) e a Teologia do Domínio (conquistar o poder e comandar o mundo segundo a palavragreenbets usuario bloqueadoDeus).

evangélicos oram
Legenda da foto, Mudanças sociais, teológicas e políticas impulsionaram participaçãogreenbets usuario bloqueadoevangélicos na política e na vida pública do Brasil

Segundo Juliano Spyer, na teologia da prosperidade pregada no neopentecostalismo, por exemplo, "a conversão e adoção da prática religiosa são recompensadas por Deus via ascensão financeira".

Nessa vertente, o fiel é "estimulado a atuargreenbets usuario bloqueadomaneira empreendedora para enfrentar as adversidades da vida", e prosperidade não se trata apenasgreenbets usuario bloqueadouma questão financeira, masgreenbets usuario bloqueadoviver melhor.

"A disciplina e o esforço para abraçar valores e ideais cristãos se fortalecem quando a pessoa está menos vulnerável socialmente, tem casa, está empregada, pode estar e tem comidagreenbets usuario bloqueadocasa."

Spyer ressalta que parte do crescimento das igrejas evangélicas se dá justamente porque entrar para uma dessas denominações geralmente melhora as condiçõesgreenbets usuario bloqueadovida dos brasileiros mais pobres e conduz à ascensão socioeconômica. Por quê?

Segundo ele, o conjuntogreenbets usuario bloqueadocausas inclui tanto questões religiosas quanto práticas, como o "fim do alcoolismo e consequentemente da violência doméstica (associada ao vício), fortalecimento da autoestima, da disciplina para o trabalho e aumento do investimento familiargreenbets usuario bloqueadoeducação e nos cuidados com a saúde", alémgreenbets usuario bloqueado"conforto emocional, dinheirogreenbets usuario bloqueadomomentosgreenbets usuario bloqueadodificuldade, acesso a empregos, consultas com profissionais da saúde, encontros com advogados ou com representantes do poder público e até vagasgreenbets usuario bloqueadoclínicasgreenbets usuario bloqueadodesintoxicação".

Spyer menciona também o papel como nova redegreenbets usuario bloqueadorelacionamentos que igrejas pentecostais tiveram para milharesgreenbets usuario bloqueadotrabalhadores rurais que migraram do interior do Nordeste para a periferiagreenbets usuario bloqueadograndes centros urbanos e se afastaramgreenbets usuario bloqueado"redesgreenbets usuario bloqueadoajuda mútua dentro dos espaços familiares"greenbets usuario bloqueadosuas terras natais.

Já no caso do protestantismo histórico, o progresso econômico "resultagreenbets usuario bloqueadoum estilogreenbets usuario bloqueadovida austero" que se relaciona com o mundo por meio do trabalho e da produçãogreenbets usuario bloqueadoriqueza.

Segundo Spyer, "pentecostais e especialmente protestantes históricos frequentemente rejeitam a ideiagreenbets usuario bloqueadoque a conversão possa ser justificada por uma ambiçãogreenbets usuario bloqueadoprosperidade material. Muitos entendem que a melhoragreenbets usuario bloqueadocondições pode acontecer como consequênciagreenbets usuario bloqueadouma vida mais regrada e pela influência da igreja, por exemplo, na promoção da educação formal".

Segundo Spyer, o incômodogreenbets usuario bloqueadorelação à teologia da prosperidade, mais ligado a setores médios e altos da sociedade (incluindo os protestantes históricos), "seria uma desaprovação a que o pobre ambicione para si aquilo que faz parte da vida dos brasileiros mais ricos, como viajargreenbets usuario bloqueadoavião, fazer turismo para o exterior e consumir produtos caros".

O terceiro fator apontado por Guadalupe para a transformação evangélica no Brasil seria ligado à política.

O panogreenbets usuario bloqueadofundo era uma crisegreenbets usuario bloqueadoideologias e dos partidos políticos tradicionais, cujo auge foi o declínio do comunismo, gerando "vácuos e bolsõesgreenbets usuario bloqueadopoder que foram deixados sem uma representação política viável na região".

Assim, a política se mostraria um meiogreenbets usuario bloqueadoevangelização das massas egreenbets usuario bloqueadogruposgreenbets usuario bloqueadoinfluência na sociedade, como políticos, empresários e comunicadores.

Um dos marcos na participação políticagreenbets usuario bloqueadoevangélicos no Brasil se deu nos anos 1980, simbolizada na mudança do lema dominante "crente não mexe com política" pelo avanço do slogan "irmão votagreenbets usuario bloqueadoirmão".

Preconceito e atuação no debate público

Por causa desse conjuntogreenbets usuario bloqueadocaracterísticas, o evangélicos costumam ser alvogreenbets usuario bloqueadopreconceitogreenbets usuario bloqueadodiversos lados. Em algumas situações, são pejorativamente chamadosgreenbets usuario bloqueadofanáticos, hipócritas (por supostamente praticarem o oposto do que pregam), alienados e preconceituosos.

Parte disso acontece porque evangélicos não aceitam a posição passivagreenbets usuario bloqueadovulneráveis, submissos ou humildes, na visão do antropólogo Juliano Spyer,greenbets usuario bloqueadoseu livro Povogreenbets usuario bloqueadoDeus. "(O evangélico) é acusadogreenbets usuario bloqueadoser manipulado ougreenbets usuario bloqueadoser avarento por querer ter as mesmas coisas que seus críticos desfrutam: viajar, se vestir bem e ir a restaurante."

Para alémgreenbets usuario bloqueadoataques com ou sem fundamento, o antropólogo e professor Ronaldo Almeida, da Unicamp, identifica quatro eixos na atuação da camada evangélica mais conservadora no debate público.

São eles: a defesa da moral (antiaborto, antieducação sexualgreenbets usuario bloqueadoescolas, etc.), o discurso da ordem (redução da maioridade penal, endurecimento das lei penais etc.), a defesagreenbets usuario bloqueadoum Estado menos intervencionista nas relações sociais e econômicas e a demonizaçãogreenbets usuario bloqueadoadversários políticos e religiosos (esquerda e religiões fora da tradição judaico-cristã).

Mas a brasilianista e cientista política americana Amy Erica Smith (Iowa State University) lembra,greenbets usuario bloqueadoartigo sobre o tema, que a atuação políticagreenbets usuario bloqueadoreligiososgreenbets usuario bloqueadodireção aos eleitores mais conservadores nos últimos anos não se resumiu aos evangélicos.

Juliano Spyer

Crédito, Juliano Spyer/Acervo pessoal

Legenda da foto, Antropólogo Juliano Spyer afirma que evangélicos são alvosgreenbets usuario bloqueadopreconceito por questões religiosas, sociais e econômicas

Em 2010, por exemplo, o papa Bento 16 instruiu bispos a orientarem os brasileiros católicos que não votassemgreenbets usuario bloqueadocandidatos pró-legalização do aborto.

"Católicos e evangélicos se encontram com frequência no mesmo ladogreenbets usuario bloqueadodebates ideológicos sobre questões ligadas à sexualidade, ao aborto e aos direitos das mulheres."

Mas ao longo dos anos, conta Smith, lideranças católicas se tornaram mais cautelosasgreenbets usuario bloqueadose posicionar politicamente, enquanto as evangélicas seguem caminho inverso.

Segundo Smith,greenbets usuario bloqueado2014 quase metade dos evangélicos brasileiros ouviram seus pastores falarem sobre campanha eleitoral nas semanas que antecederam o pleito.

Isso não significa, ressalta a pesquisadora, que seja direta e automática a influênciagreenbets usuario bloqueadobispos e pastores nos votos dos fiéis. Em geral, o principal efeito é a maior participação política dos eleitores evangélicos, e não o direcionamento deles para votosgreenbets usuario bloqueadorebanho no candidato A ou B.

Há, no entanto, grande influência na pauta legislativa.

"A presença evangélica na crescente direita ideológica só tende a crescer nos próximos anos. Entre os evangélicos brasileiros, a defesagreenbets usuario bloqueadopolíticas que promovem posições conservadorasgreenbets usuario bloqueadoquestõesgreenbets usuario bloqueadosexualidade e família parece estar crescendo com fortes ligações à missão teológica", afirma Smith.

Em quem os evangélicos votam e por quê?

No segundo turno da eleição presidencialgreenbets usuario bloqueado2018, por exemplo, quase 105 milhõesgreenbets usuario bloqueadopessoas foram às urnas.

Dentre eles, estima-se que 31,4 milhões eram evangélicos — 21,7 milhões votaramgreenbets usuario bloqueadoJair Bolsonaro (então PSL) e 9,7 milhões,greenbets usuario bloqueadoFernando Haddad (PT). Ou seja, quase 70% dos evangélicos votaramgreenbets usuario bloqueadoBolsonaro. Em comparação, entre os católicos Bolsonaro obteve 51% dos votos válidos.

Grande parte das lideranças evangélicas aderiram à campanhagreenbets usuario bloqueadoBolsonarogreenbets usuario bloqueado2018, como Edir Macedo, Silas Malafaia (Assembleiagreenbets usuario bloqueadoDeus Vitóriagreenbets usuario bloqueadoCristo), Valdemiro Santiago e R.R. Soares (Igreja Internacional da Graçagreenbets usuario bloqueadoDeus).

"Eu vou votar no Bolsonaro, analisei todos os projetos e o dele é o melhor, principalmentegreenbets usuario bloqueadorelação à ideologiagreenbets usuario bloqueadogênero. Estão convencendo que meninos podem ser meninas, e meninas podem ser meninos", disse à época o missionário R.R. Soares, líder da Igreja Internacional da Graçagreenbets usuario bloqueadoDeus.

Mas qual é o peso dos pastores nas escolhas dos fiéis nas urnas? Pesquisas com eleitores apontam que esses líderes influenciam o votogreenbets usuario bloqueadosomente trêsgreenbets usuario bloqueadocada 10 fiéis evangélicos — a taxa é um pouco maior entre neopentecostais (como as denominações Universal e Renascer),greenbets usuario bloqueado31%, do que entre os evangélicos como um todo,greenbets usuario bloqueado26%.

"Não é um votogreenbets usuario bloqueadocabresto. Mesmo quando o pastor é candidato e toda a igreja é mobilizada para votar nele, há casosgreenbets usuario bloqueadoderrota fragorosa. Os membros parecem estar obedientes, mas não estão", disse o sociólogo Paul Freston, que estuda o papel dos evangélicos na política desde os anos 1980,greenbets usuario bloqueadoentrevista à BBC News Brasil sobre o tema.

Manifestantes da Marcha para Jesus

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Bolsonaro somou quase 70% do voto evangélico no segundo turnogreenbets usuario bloqueado2018

"Estamos falandogreenbets usuario bloqueadopessoas que são cidadãos comuns, têmgreenbets usuario bloqueadoinserção na sociedade. Elas levamgreenbets usuario bloqueadoconsideração fatores pessoais, profissionais,greenbets usuario bloqueadofamília,greenbets usuario bloqueadoclasse."

Muitos pesquisadores brasileiros investigam o que motiva os votos dos evangélicos, e quão diferentes são esses motivos do restante da população. Como dito antes, é importante ressaltar que os evangélicos não são um grupo uniforme, formado apenas por pessoas com as mesmas posições políticas.

Um exemplo disso é o fatogreenbets usuario bloqueadoque o apoiogreenbets usuario bloqueadolideranças neopentecostais populares a Bolsonaro continua forte, mas, segundo pesquisasgreenbets usuario bloqueadointençãogreenbets usuario bloqueadovoto, o apoio e a vantagem eleitoral dele entre eleitores deste segmento têm caídogreenbets usuario bloqueadorelação a 2018.

O que, então, está por trás do comportamento eleitoral dos eleitores evangélicos? Eles são mais conservadoresgreenbets usuario bloqueadomédia do que outros grupos da sociedade brasileira?

Especialistas apontam que pautas conservadoras têm atraído tanto católicos quanto evangélicos há décadas no país.

Mas, para os pesquisadores Paulo Gracino Junior e Carlos Henrique Souza, parte dos evangélicos brasileiros aproveita esse novo espaço no debate público para expor suas posições, o que fez com que o grupo se tornasse central na onda conservadora recente no país — que culminou na eleiçãogreenbets usuario bloqueadoJair Bolsonaro,

Segundo Gracino Junior e Souza, a candidaturagreenbets usuario bloqueadoBolsonaro impulsionou e sintetizou discursivamente o conservadorismo a partirgreenbets usuario bloqueadouma articulaçãogreenbets usuario bloqueadotorno da família, educação, moralidade e segurança.

Os pesquisadores lembram que algo equivalente ocorreu durante a ditadura militar (1964-85) com o catolicismo conservador.

O elo e o combustível da nova onda conservadora, segundo os pesquisadores, foi o antipetismo, que conseguiu sintetizar todos esses diversos afetos difusos na sociedade, como a fobia ante as novas identidadesgreenbets usuario bloqueadogênero e outras pautas minoritárias, a nostalgia da ordem militar e o ódio contra a corrupção na política.

Martinho Lutero

Crédito, Domínio Público

Legenda da foto, Martinho Lutero deu início à Reforma Protestante há maisgreenbets usuario bloqueado500 anos

Em outro trabalho sobre o tema, Gracino Junior (Iuperj), desta vezgreenbets usuario bloqueadoconjunto com as cientistas políticas Mayra Goulart (UFRJ) e Paula Frias (Uerj), afirma que o "ressentimento é o afeto que catalisa os vínculosgreenbets usuario bloqueadoidentificação entre a candidaturagreenbets usuario bloqueadoBolsonaro e seu eleitorado, sobremaneira, o evangélico".

Há uma perspectivagreenbets usuario bloqueadoabandono por trás desse ressentimento, explicam os pesquisadores, ligada a uma demandagreenbets usuario bloqueadoeleitores órfãos que acabaria casando com a oferta do populismogreenbets usuario bloqueadodireitagreenbets usuario bloqueadoBolsonaro.

Segundo o triogreenbets usuario bloqueadoestudiosos, isso ocorre principalmente com os evangélicos porque nas últimas três décadas eles passaramgreenbets usuario bloqueadogrupo ressentido, que se sentia humilhado cultural e socialmente, para uma camada social organizada, heterogênea, mas com forte representação cultural e política.

E agora esse grupo se vê quase que profeticamente uma variaçãogreenbets usuario bloqueadoum dos versículos bíblicos mais populares no meio evangélico pentecostal: "os humilhados serão exaltados".

Segundo os pesquisadores Ricardo Mariano e Dirceu André Gerardi,greenbets usuario bloqueadoestudo sobre o tema, o antipetismo evangélico começougreenbets usuario bloqueado1989 na política brasileira, perdeu força nos governos Lula e Dilma, mas ganhou novo impulso a partirgreenbets usuario bloqueado2006, a partir das propostasgreenbets usuario bloqueadocombate à homofobia egreenbets usuario bloqueadodescriminalização do aborto.

Em 2015, o afastamento desse grupo político chegou ao auge, com 89% da bancada evangélica votando a favor do impeachmentgreenbets usuario bloqueadoDilma.

Por outro lado, a cientista política Ana Carolina Evangelista, diretora-executiva do Iser (Institutogreenbets usuario bloqueadoEstudos da Religião), ressalta que a identidade religiosa pesa menos na escolha eleitoral dos evangélicos do que diversas demandas sociais, políticas, econômicas e também religiosas.

Para Evangelista, a chamada "agenda moral" tem servido menos a demandas e propostasgreenbets usuario bloqueadomudanças e mais ao papel antiesquerdagreenbets usuario bloqueadoacionar medos e pânicos no eleitoradogreenbets usuario bloqueadoeixos como defesa da moral e da família e força e ordem na segurança pública.

José Luis Pérez Guadalupe, por outro lado, afirma que não há um "voto evangélico" único, mas sim "o voto dos evangélicos" plural e pulverizado.

Em 2018, segundo ele, houve uma maior união (e não unanimidade) desses votos por causa da agenda moral (contra o direito ao aborto e pró-família), que se tornou central na atuação político-eleitoralgreenbets usuario bloqueadolideranças e denominações evangélicas.

Uma das evidênciasgreenbets usuario bloqueadoque o voto dos eleitores evangélicos não é baseado apenasgreenbets usuario bloqueadofatores religiosos, segundo Guadalupe, é a sub-representação eleitoral desse segmento religioso na Câmara dos Deputados.

Em 2019, havia 82 representantes evangélicos na Casa, equivalente a 16% dos 513 deputados — aquém da proporçãogreenbets usuario bloqueadoevangélicos na população brasileira (cercagreenbets usuario bloqueado30%).

Mesmo assim, isso não significa que a Frente Parlamentar Evangélica, conhecida como "bancada evangélica", tenha pouca influência no Congresso. Pelo contrário. Ao se associar a outros gruposgreenbets usuario bloqueadointeresse, como a bancada ruralista, por exemplo, ela consegue avançar ou barrar projetos sem precisar ser majoritária na Câmara.

*Com informações adicionais da BBC,greenbets usuario bloqueadoRafael Barifouse (BBC News Brasil) egreenbets usuario bloqueadoEdison Veiga (colaboração para a BBC News Brasil)

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