Cidade visitada por Bolsonaro tem 'ar insuportável' por causabets nordestequeimadas: 'A gente reza pra chover':bets nordeste
Os últimos dias foram particularmente difíceis. Sem ar condicionado, ele a mãe geralmente enfrentam o calorbets nordeste40°C que costuma fazerbets nordesteSorriso nesta época do ano com as janelas abertas.
No sábado (12/9), entretanto, a nuvem densa que baixou sobre a cidade os obrigou a fechar a casa.
"A sensação erabets nordestesufocamento", conta.
Acordou com dorbets nordestecabeça no domingo e se surpreendeu quando, pouco depois das 17h, olhou pela janela e percebeu que o sol ainda não tinha descido.
"Estava tão escuro que eu achei que já passasse das seis da tarde", conta. "O sol tava alto no céu e não tinha brilho. Dava pra olhar sem 'manchar' a vista."
Na terça-feira, com a situação ainda pior, o tempo monopolizava as conversasbets nordesteWhatsAppbets nordesteSorriso. Na trocabets nordestemensagens, Queiros e alguns amigos chegaram a conjecturar que o município estivesse no meiobets nordesteuma confluência entre a fumaça que vem das queimadas do Pantanal, ao sul, e da Amazônia, ao norte.
"A gente reza pra chover. Não resolve, mas alivia", diz ele.
A previsão meteorológica promete precipitação para esta segunda, após meses sem chuva.
O presidente Jair Bolsonaro chegou a experimentar um pouco do que os moradores da cidade têm vivido nesta sexta (18/9). Ele visitou Sorriso, considerada uma das capitais do agronegócio no país, para fazer o lançamento do plantio da próxima safrabets nordestesoja.
A fumaça das queimadas era tanta que seu avião tevebets nordestearremeter na primeira tentativabets nordestepouso na vizinha Sinop, por conta da baixa visibilidade.
A pedido da BBC News Brasil, o chefe do Laboratóriobets nordesteCiências da Biosfera da Nasa, Douglas Morton, analisou as imagens do satélite meteorológico GOES e verificou que as plumasbets nordestefumaça que chegaram à região na quarta-feira vieram principalmente do norte,bets nordesteincêndios na áreabets nordesteNovo Progresso, no Pará.
Mais para o fim do dia, ela também recebeu "grandes plumasbets nordestefumaça" lançadasbets nordesteníveis mais altos da atmosfera vindas da região do Xingu, no nordeste do Estado. A agência espacial americana tem acompanhadobets nordesteperto os dados sobre as queimadas, disponibilizadosbets nordesteuma página com versãobets nordesteportuguês.
"As maiores queimadas no sub-bosquebets nordestetoda a Amazônia neste momento estão na bacia do Xingubets nordesteMato Grosso", afirma Morton.
O professor do Institutobets nordesteFísica da USP Paulo Artaxo, membro do Painel Intergovernamentalbets nordesteMudanças Climáticas (IPCC), afirma que não é impossível que,bets nordestealgum momento, Sorriso, que está no caminho da correntebets nordestear que vem da Amazônia, também seja afetada pela fumaça das queimadas no Pantanal.
As imagens da Nasa desta quinta (17/9), ressalta o pesquisador, mostravam 60% do território brasileiro coberto por fumaça.
'Ar insuportável'
A fumaça que vem da queimadas carrega uma sériebets nordestepoluentes: monóxidobets nordestecarbono, dióxidobets nordestenitrogênio, carbono negro, entre outros. Uma das principais ameaças à saúde pública é o material particulado com menosbets nordeste2,5 micrômetrosbets nordestediâmetro, conhecido como PM 2,5.
Quando inalado, ele penetra com facilidade no pulmão e entra na corrente sanguínea, permanecendo no corpo por meses após a exposição.
Assim, o avanço das queimadas leva a um aumento dos problemas respiratórios entre as populações que estão no caminho das plumas e ao crescimento do númerobets nordesteinternações hospitalares, sobrecarregando o sistemabets nordestesaúde.
É o que mostra um estudo conduzido pelo Institutobets nordestePesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), pelo Institutobets nordesteEstudos para Políticasbets nordesteSaúde (IEPS) e pelo Human Rights Watch (HRW) com dados referentes às queimadasbets nordeste2019 no bioma Amazônia.
O levantamento estima que pelo menos 2.195 internações por problemas respiratórios podem ser diretamente associadas aos incêndios, sendo 21%bets nordestebebêsbets nordesteaté um ano e 49%bets nordestepessoas com maisbets nordeste60 anos.
"E isso é uma pequena parcela (do total provável). Quem consegue se hospitalizar na Amazônia por contabets nordestedoença respiratória é uma parcela mínima", diz Ane Alencar, diretorabets nordesteciência do IPAM.
Segundo ela, o ar nessa região nessa época do ano "fica insuportável", tão ruim ou pior do que nas cidades mais poluídas do mundo, comobets nordesteNova Déli, na Índia.
Em uma comparação para fins didáticos, é algo como passar a noitebets nordesteuma casa noturna na épocabets nordesteque era permitido fumarbets nordesteambientes fechados. "No outro dia, você acorda com dorbets nordestecabeça."
Em um momentobets nordestecomo o atual, com uma pandemia causada por um vírus que ataca o sistema respiratório, as populações dessas regiões ficam ainda mais vulneráveis.
O professor da Universidade Federalbets nordesteAlagoas (UFAL) Humberto Barbosa, coordenador do Laboratóriobets nordesteAnálise e Processamentobets nordesteImagensbets nordesteSatélites (Lapis), estimou, com basebets nordesteimagensbets nordestesatélite, a concentraçãobets nordestePM 2,5 na área do municípiobets nordesteSorriso nos últimos dias.
Na quarta feira, ela estavabets nordeste46 microgramas por metro cúbico — maisbets nordestequatro vezes maior do que o limite máximo recomendado pela Organização Mundialbets nordesteSaúde (OMS), 10 μg/m3.
Barbosa explica que o material particulado pode ter muita influência do contexto local —bets nordestegrandes centros urbanos com muito tráfegobets nordesteveículos, por exemplo, a concentração tende a ser maior. Mas os valores verificados na região, ele pondera, estão diretamente ligados às queimadas, já que se tratambets nordestepequenas e médias cidades.
O meteorologista acrescenta que os efeitos da poluição do ar causado pelas queimadas não estão restritos às áreas mais próximas aos focos. A movimentação das correntesbets nordestear espalha esse material particulado pelo território, especialmentebets nordesteperíodosbets nordesteque o tempo está mais seco, como agora.
"A mesma corrente que leva chuva da Amazônia para o Centro-Sul carrega esses poluentes", diz ele.
A imagem gerada pelo laboratório com a concentraçãobets nordestematerial particuladobets nordestediferentes regiões do país nesta quinta deixa isso claro:
"A questão da qualidade do ar está diretamente ligada à qualidade dos biomas."
'É a nossa Cubatão'
Alencar, do IPAM, ressalta que o efeito das queimadas sobre a saúde da população na Amazônia deveria ser uma questãobets nordestesaúde pública, apesarbets nordestenão vir sendo tratada como tal.
Ela traça um paralelo com a cidadebets nordesteCubatão,bets nordesteSão Paulo, que mobilizou recursos e atenção do setor público nos anos 80, quando chegou a ser uma das cidades com maior nívelbets nordestepoluição atmosférica do mundo.
"É a nossa Cubatão. O ar que a gente respira é muito aquém do que a OMS indica como 'respirável'."
O país não consegue, contudo, nem medir adequadamente os níveisbets nordestepoluição atmosférica nessas áreas.
No estudo divulgado no fimbets nordesteagosto, o IPAM e as demais entidades destacam que o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) editou, três décadas atrás, uma resolução que previa uma redebets nordestemonitoramento da qualidade do ar — e que até hoje não foi implementada adequadamente.
Apenas 12 dos 27 Estados realizam algum tipobets nordestemonitoramento da qualidade do ar, nenhum deles na região amazônica.
No ano passado, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, chegou a anunciar um plano para criar uma rede nacionalbets nordestemonitoramento da qualidade do ar, com pelo menos uma estaçãobets nordestecada Estado.
À Human Rights Watch, a pasta respondeu,bets nordestejulho, que estava conduzindo o processobets nordestelicitação para que Estados que ainda não monitoram níveisbets nordestematerial particulado fino (PM 10 e PM 2,5) possam começar a fazê-lo, mas não mencionou o monitoramentobets nordesteoutros poluentes.
Além das iniciativasbets nordestemitigação, os especialistas ouvidos pela reportagem ressaltam a importância das ações para coibir os avanços das queimadas, que são a raiz do problema.
Alencar explica que o tempo seco (e o Pantanal vivebets nordestepior secabets nordeste60 anos) contribuem para alastrar e potencializar os incêndios. O fogo precisa, entretanto,bets nordesteignição — e são raras no Pantanal e na Amazônia as queimadas geradasbets nordesteforma espontânea, pela açãobets nordesteraios durante tempestades, por exemplo.
A grande maioria dos focos é causada pelo próprio homem.
"E (a solução) não é só fiscalizar, não é só ter um decreto que coloque uma moratória do fogo, mas incentivar que não aconteça", pondera Alencar. "E o que a gente tem visto é o contrário", completa, referindo-se ao discurso do governo, que muitas vezes nega que haja um problema a ser enfrentado.
"O pior é que a gente já sabia. O INPE e a Nasa já apontavam para um ano possivelmente mais seco nessa região. A gente deveria ter trabalhadobets nordesteforma preventiva."
Barbosa, meteorologista do Lapis/UFAL, diz que a chuva esperada ansiosamente para o início da semanabets nordesteSorriso deve chegar, depois do que se desenha como um fimbets nordestesemana "bem difícil".
A precipitação estará longe, contudo,bets nordesteresolver os problemas. Os dados apontam um fimbets nordestesetembro e iníciobets nordesteoutubrobets nordestemais secura e calor.
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