Por que a ideiaapostas gratisque o AI-5 foi uma reação à esquerda é um mito:apostas gratis
Na época, o governo militar justificou as medidas dizendo que elas eram necessárias para conter "atos subversivos"apostas gratis"setores que queriam derrubar o regime", que os militares chamavamapostas gratisrevolução, e "manter a ordem e a segurança".
"Se torna imperiosa a adoçãoapostas gratismedidas que impeçam [que] sejam frustrados os ideais superiores da Revolução (...) comprometidos por processos subversivos eapostas gratisguerra revolucionária", diz o documento original do AI-5, hoje guardado no Arquivo Nacionalapostas gratisBrasília.
A versão oficial da ditadura, portanto, foiapostas gratisque o AI-5 era uma reação à esquerda, um movimento para conter o avanço do comunismo no paísapostas gratismeio à Guerra Fria.
Membros do atual governo brasileiro e da família do presidente Jair Bolsonaro, recentemente, repetiram essa ideia.
O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) disseapostas gratisoutubro que, caso a esquerda "se radicalize", "vamos precisar ter uma resposta", que, segundo ele, "pode ser via um novo AI-5".
Eduardo depois voltou atrás quanto à afirmação, dadaapostas gratisentrevista ao canal da apresentadora Leda Nagle no YouTube. O ministro da Economia, Paulo Guedes, também falou do AI-5. "Não se assustem se alguém pedir o AI-5", ao falar sobre os protestosapostas gratisrua convocados pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Mas será que a justificativa oficial dos militares era o verdadeiro motivo por trás do endurecimento do regime?
A sociedade civil
Os principais historiadores que estudam o assunto dizem que a ideiaapostas gratisque o AI-5 foi uma resposta à esquerda é um mito, e que outros motivos estavam por trás da decisão.
Os que os documentos e os depoimentosapostas gratisenvolvidos nos mostram, dizem os estudiosos, é que o ato autoritárioapostas gratis1968 foi uma formaapostas gratisa ditadura militar controlar não só a oposiçãoapostas gratisesquerda ou os comunistas (que no Brasil não tinham números ou estrutura suficiente para ser uma ameaça real ao regime).
A principal ameaça eram os setores da sociedade civil que haviam apoiado o golpeapostas gratis1964 e que, quatro anos depois, estavam ficando descontentes com o governo - como a Igreja Católica, a imprensa, o Poder Judiciário e líderes políticos.
Ou seja, o AI-5 foi uma formaapostas gratis"enquadrar os dissidentes dentro das próprias hostes da ditadura", nas palavras do historiador Rodrigo Patto Sá Motta, professor da UFMG (Universidade Federalapostas gratisMinas Gerais) e um dos principais estudiosos do tema no Brasil.
Em um artigo científico sobre o assunto publicado no ano passado na Revista Brasileiraapostas gratisHistória, Motta explica queapostas gratis1968 a ditadura possuía os meios suficientes para reprimir a resistência colocada pela esquerda e pelos comunistas.
Em um documento diplomático americano do período há relatosapostas gratismilitares que diziam justamente isso, como o almirante Levy Reis e o general Golbery do Couto e Silva. Em conversa com os diplomatas dos EUA, Golbery davaapostas gratisopiniãoapostas gratisque o Estado já tinha instrumentos suficientes para lidar com os "subversivos", se referindo à esquerda e aos comunistas.
O que o governo militar não tinha, escreve Motta, "eram meios suficientes para enquadrar e disciplinar segmentos rebeldes da própria elite situadosapostas gratislugares estratégicos, como o Poder Legislativo, o Poder Judiciário e a imprensa".
Em entrevista à BBC News Brasil, o pesquisador explica que, quatro anos após o golpe civil-militar que instaurou a ditadura no país, os militares estavam ficando isolados no poder e perdendo boa parte do amplo apoio que tiveramapostas gratis1964.
"Muitos grupos e líderes que apoiaram o golpe foram se afastando da ditadura com o tempo (igreja, imprensa, lideranças políticas, intelectuais)", diz Motta à BBC News Brasil.
Mas por que apoiadores do golpeapostas gratis1964 estavam ficando insatisfeitos com o governo militar?
Insatisfação crescente
Historiadores chamam o golpeapostas gratis1964apostas gratis"civil-militar" porque ele aconteceu com apoio justamente desses setores. Mas,apostas gratis1967, as coisas começaram a mudar.
A ditadura enfrentava oposição desde o início. Ela vinhaapostas gratissetores como o movimento estudantil, alguns parlamentares, as greves operárias e, partirapostas gratis1967, o início da luta armada promovida pela esquerda radical - grupos que eram muito diferentes entre si.
Essa oposição esteva mais atuante a partirapostas gratis1967 eapostas gratis1968 e alguns acontecimentos marcaram a resistência. Em marçoapostas gratis1968, durante uma manifestação estudantil, a polícia militar invadiu o restaurante Calabouço, no Rioapostas gratisJaneiro, onde alguns estudantes jantavam, e o jovem estudante Edson Luís foi morto por policiais miltiares.
Seu assassinato inflamou a revolta estudantil e ele se tornou um símbolo da resistência.
Em junho, houve a famosa Passeata dos Cem Mil, organizada pelo movimento estudantil no Rioapostas gratisJaneiro; eapostas gratisoutubro aconteceu a chamada Batalha da Maria Antônia,apostas gratisque estudantes da USP (Universidadeapostas gratisSão Paulo) enfrentaram apoiadores do regime na Universidade Presbiteriana Mackenzie. A batalha levou à morte do estudante José Carlos Guimarães, atingido por um tiro vindo do lado dos apoiadores da ditadura.
O anoapostas gratis1968 foi marcado também por greves operárias, como a grande greveapostas gratisOsasco,apostas gratisjulho.
O clima tenso e a resposta autoritária do governo foi deixando alguns setores que haviam apoiado o golpeapostas gratis1964 insatisfeitos com o regime, explica o historiador Daniel Aarão Reis, professor e pesquisadorapostas gratisHistória Contemporânea na UFF (Universidade Federal Fluminense).
"Muita gente tinha apoiado o golpe, imaginando que seria uma coisaapostas gratiscurto prazo", diz Reis. "Mas aí os partidos políticos foram dissolvidos, a eleição para presidente foi indireta, a grande imprensa, que havia apoiado o golpe, começou a ser censurada... Você tinha um quadroapostas gratisinsatisfação muito ampliado."
Em 1965, o Ato Institucional número 2 estabeleceu a eleição indireta para presidente, o que foi confirmado pela Constituiçãoapostas gratis1967.
"Havia também um descontentamento com a política econômica, que atingia classes trabalhadoras, que tinha perdido direitos importantes, e o arrocho salarial, com os salários sendo reajustados abaixo da inflação."
E foi assim que a contestação ao governo, que antes vinha primariamenteapostas gratissetores mais à esquerda, como os movimentos estudantil e operário, começou a se ampliar. Juízes davam decisões desfavoráveis ao regime, a imprensa publicava notícias desabonadoras e parlamentares se tornavam insubordinados.
"Importantes líderes que tinham apoiado o golpe começaram a criticar. Carlos Lacerda foi um exemplo, mas podemos citar lideranças da Arena: Djalma Marinho, Daniel Krieger. Ulisses Guimarães, que foi líder civil do golpe, já havia ido para o MDB", conta Reis.
Entre os políticos, diz ele, havia o temorapostas gratisque os militares começassem a governar sozinhos sem o seu apoio – desde figuras da Arena como José Sarney e Luiz Vianna Filho até vereadores do interior.
Entre membros da igreja, do Judiciário, da imprensa e entre certas lideranças políticas, a insatisfação era a mesma: "O recrudescimento autoritário e a sensaçãoapostas gratisque o governo Costa e Silva era incompetente politicamente", diz Motta.
Artigos críticos ao autoritarismoapostas gratisfiguras como o ministro da Justiça Gama e Silva apareceram na imprensa, e também se ampliou o descontentamento com a excessiva violência policial.
"Quando Costa e Silva começou a governar, no inícioapostas gratis1967, prometendo diálogo e descompressão política, ele gerou expectativas positivas entre tais grupos. Mas quando os primeiros protestosapostas gratisoposição apareceram ele respondeu com muita violência. A condução política do governo foi considerada incapazapostas gratislidar com a situação", explica o pesquisador.
"E o governo foi muito criticado por não realizar a prometida reforma universitária, o que na visãoapostas gratisalguns poderia acalmar os estudantes, ou ter evitado que eles se rebelassem."
Ele explica que esse novo desafio vinhaapostas gratisfiguras que aceitaram o golpe contra João Goulart e contra as instituições democráticas, mas ao mesmo tempo não desejavam uma ditadura sem limites. "Era uma espécieapostas gratisliberalismo autoritário, a favor da repressão à esquerda, mas que desejava garantias para a opinião política moderada", diz o historiador.
Outro aliadoapostas gratis1964 que não via com simpatia o endurecimento do regime era o governo dos EUA. Motta cita um documento interno do Departamentoapostas gratisEstado americanoapostas gratisque o secretário Dean Rusk se mostra preocupado. Na opinião dele, o AI-5 era uma resposta exagerada dos militares – e a opinião da maioria dos diplomatas americanos também ia nesse sentido.
Mas e os grupos armadosapostas gratisesquerda?
O crescimento do autoritarismo levou também a uma radicalizaçãoapostas gratissetores da esquerda, e gruposapostas gratisluta armada intensificaramapostas gratisatuação entre 1967 e 1968.
Eles eram poucos, pequenos, não tinham apoio popular e não apresentavam uma ameaça real ao regime, explica Daniel Aarão Reis.
Além disso, a chanceapostas gratissetoresapostas gratiselite, da esquerda, dos grupos armados, ou seja, da oposiçãoapostas gratisgeral, se unir para derrubar o regime era quase inexistente, pois eram muito distintos. "Eram projetos políticos muito diferentes entre si", explica Reis.
Não havia nem unidade entre os gruposapostas gratisesquerda comunistas e o movimento estudantil. "O movimento estudantil era um movimento democrático. Lutava por mais verba, pela democracia, não era um movimento para derrubar o capitalismo", diz Reis.
Os documentos do período mostram que os grupos da elite, como a Igreja Católica, a imprensa e as lideranças políticas que estavam descontentes não queriam necessariamente a queda do regime, que afinal havia sido instauradoapostas gratis1964 com seu apoio.
"[Eles queriam] apenas mudançaapostas gratisrumos, não questionavam o regimeapostas gratis1964apostas gratissi", diz Motta.
"Mas o fatoapostas gratisque a oposição à ditadura tenha sido engrossada por figuras mais ao centro, deixandoapostas gratisser povoada apenas pela esquerda, significava um problema para o governo."
A atuação da esquerda armada gerava um temor real nos militares, diz Motta, "mas seu poder real foi superdimensionado para incrementar a sensaçãoapostas gratisperigo".
Tanto que parte das ações armadas foi praticada por grupos clandestinosapostas gratisdireita, que tinham o objetivoapostas gratiscolocar a culpa nos comunistas. Documentos que ficaram guardados no Superior Tribunal Militar durante 50 anos e foram revelados no ano passado mostram exemplos da atuação clandestinaapostas gratisdireita antes do AI-5.
Entre abril e agostoapostas gratis1968, um grupo formado por 14 policiais seguidoresapostas gratisAladino Félix, ligado ao general da reserva Paulo Trajano da Silva, roubou armas da própria Força Pública (percursora da Polícia Militar), fez pelo menos um assalto a banco e executou 14 atentados a bomba, incluindo o atentado a bomba na Bovespaapostas gratismaioapostas gratis1968,apostas gratisSão Paulo.
Essa táticaapostas gratisrealizar atentados e culpar os comunistas foi usada novamente anos depois, quando a ditadura já estava chegando ao fim, por setores do Exército insatisfeitos com a abertura democrática - o caso do atentado do Riocentro,apostas gratisque uma bomba explodiu no coloapostas gratisum oficial que iria realizar o ataque, é um dos episódios mais famosos da ditadura.
O caso Moreira Alves e a reunião sobre o AI-5
Alguns momentos marcaram o incômodo dos militares com a postura desses setores e, segundo os historiadores, mostram que o desejoapostas gratiscontrolar essa elite insubordinada foi um dos motivos centrais para o AI-5.
"Os momentos mais importantes nesse aspecto foram os protestos estudantis, a partirapostas gratismarçoapostas gratis1968, que os militares entenderam terem sido estimulados por professores e pela imprensa, e não terem sido devidamente punidos pelos dirigentes universitários e pelo Poder Judiciário", afirma Motta.
Documentos diplomáticos americanos mostram conversas dos diplomatas com autoridades brasileirasapostas gratisque os militares deixavam essa visões claras.
"Os militares entendiam que a imprensa publicava visões simpáticas demais à oposição e críticas excessivas ao governo, o que favoreceria a insubordinação", diz à BBC News Brasil o pesquisador Rodrigo Motta, que analisou extensamente os documentos.
"Outro ponto-chave era a oposição no Congresso, que fazia discursos agressivos e era reverberada pela imprensa."
O caso mais célebre - que acabou sendo a gota d'água para a ditadura militar - foi o discurso do deputado Moreira Alves, que chamou o Exércitoapostas gratisantroapostas gratistorturadores e convocou as mulheres a pararemapostas gratisdançar com oficiaisapostas gratisbailes.
Os militares pediram ao Congresso que o deputado fosse processado, já que a Constituiçãoapostas gratis1967 determinava que parlamentares só poderiam ser cassados pelo Legislativo.
Mesmo com as Casas dominadas pelo partido da ditadura, a Arena, e com a permissão para apenas um partidoapostas gratisoposição, o MDB, o governo teve o pedido negado - com dezenasapostas gratisvotosapostas gratisdeputados do Arena indo contra o Executivo.
"Era um atoapostas gratisdesobediência do Congresso, que na visão da ditadura servia apenas para legitimá-la, mostrando disposiçãoapostas gratisparte dos parlamentares a resistirem a atos mais autoritários", conta Motta.
"Do pontoapostas gratisvista dos militares, o gesto teria que ser punido, sob pena da oposição no Congresso crescer e vir a tornar-se focoapostas gratisinstabilidade grave para o regime."
Quando a situação chegou a esse ponto, explica o historiador, o AI-5 já estava pronto e vinha sendo ensaiado. "Não tinha sido detonado ainda pela faltaapostas gratisuma fagulha apropriada", afirma.
O caso Moreira Alves foi essa fagulha que os militares precisavam. O presidente Costa e Silva convocou a famosa reunião que instituiu o AI-5 com a cúpula do governo militar. O único a se opor ao endurecimento foi o vice-presidente Pedro Aleixo.
O então ministro da Fazenda, Antônio Delfim Netto, guru econômico dos militares, contou muitos anos depois que o caso Moreira Alves foi uma desculpa e a reunião, "um teatro".
"Naquela época do AI-5 havia muita tensão, mas no fundo era tudo teatro. Havia as passeatas, havia descontentamento militar, mas havia sobretudo teatro. Era um teatro para levar ao Ato. Aquela reunião foi pura encenação", disse Delfim, como relata o jornalista Elio Gaspari no livro A Ditadura Envergonhada.
O apoio dos empresários
O AI-5 não teve a mesma simpatiaapostas gratissetoresapostas gratiselite da sociedade que o golpeapostas gratis1964, e os militares podiam estar ficando mais isolados, mas não estavam sozinhos.
Para o Ato Institucional Número 5, eles tiveram o apoioapostas gratisum setor essencial: os empresários.
"Isso servia para compensar um pouco a faltaapostas gratisapoioapostas gratisoutros setores influentes, como a grande imprensa", explica Motta.
O AI-5 teve o apoioapostas gratisdiretoresapostas gratisinstituições como a CNI (Confederação Nacional da Indústria) e a Fiesp (Federação das Indústrias do Estadoapostas gratisSão Paulo).
Delfim Netto, ligado ao setor, disse na reunião que estava "plenamenteapostas gratisacordo" e que eram "absolutamente necessárias" certas mudanças constitucionais para que o país pudesse "realizar o seu desenvolvimento com maior rapidez".
O empresariado acreditava que mais autoritarismo poderia ser útil para facilitar decisões na área econômica e possibilitar o crescimento. "A motivação principal para o AI-5 foiapostas gratisnatureza política, o aspecto econômico foi secundário. Mas esse aspecto secundário não foi irrelevante, ou seja, a motivaçãoapostas gratisaumentar a centralizaçãoapostas gratispoder para beneficiar projetos e investimentos econômicos também teve seu peso", afirma Motta.
Quais foram as consequências do AI-5?
O AI-5 precedeu - e possibilitou - o período mais sombrio da ditadura,apostas gratisque milharesapostas gratispessoas foram perseguidas e torturadas.
"A imprensa foi calada, com censoresapostas gratisplantão nas redações ou a ameaçaapostas gratisque isso viesse a ocorrer", explica Motta. "Juízes considerados inimigos da ditadura foram expurgados, assim como diplomatas e professores universitários."
Houve um grande expurgo no Congressoapostas gratistodos os políticos que governo considerava "contestadores". O professor explica que a expulsãoapostas gratisparlamentares atingiu mais o MDB, que era o único partidoapostas gratisoposição autorizado a existir na época, mas também afetou a Arena, que era o partido do próprio governo - a legenda teve dezenasapostas gratisdeputados cassados.
"O AI-5 deu à ditadura instrumentos para imobilizar os espaços institucionais e sociais que estavam veiculando críticas ao governo", afirma Motta. Ou seja, o AI-5 foi uma maneira dos militares revigorarem o governo, explica o historiador, e unirem as Forças Armadas na defesa do regime.
Nos anos todosapostas gratisditadura, há registros sessõesapostas gratistortura praticadas pelo Estado contra cercaapostas gratis20 mil brasileiros - entre estudantes, professores, políticos, jornalistas, artistas e até militares.
Os militares, aliás, foram uma categoria muito atingida pela repressão - maisapostas gratis6,5 mil integrantes das Forças Armadas sofreram algum tipoapostas gratisperseguição.
Qualquer um que tivesse críticas ao governo poderia ser alvo.
Segundo a Comissão Nacional da Verdade também houve milharesapostas gratisperseguições na formaapostas gratisacusações, processos e inquéritos, quase 5 mil políticos e funcionários públicos cassados, centenasapostas gratisexílios e 434 mortos ou desaparecidos.
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