Após Fachin defender que veto à doaçãobwin logo pngsangue por gays é inconstitucional, STF retoma julgamento; entenda:bwin logo png
Direitobwin logo pngser solidário
Ao votar pela inconstitucionalidade na quinta-feira passada, o ministro disse que a restrição "colocabwin logo pngxeque direitos fundamentais" ao usar como critério "grupos e não condutasbwin logo pngrisco". Fachin destacou que é uma "quase vedação" à doação por homens homossexuais, afeta o exercíciobwin logo pngsua autonomia como cidadãos e gera um "impacto desproporcional".
"Não cabe valer-sebwin logo pngviolaçãobwin logo pngdireitosbwin logo pngum grupo minoritário para maximizar outros interesses, mesmo quebwin logo pnguma maioria (...), considerando erroneamente que a sexualidade tida como normal seria inalcansável pelas enfermidades transmissíveis pelo sangue, propagando assim não só o preconceito, mas as próprias doenças cuja transmissão se almeja evitar."
O ministro considerou que , ao se basearem no gênerobwin logo pngcom quem o candidato à doação se relaciona e nãobwin logo pngum comportamento específico, a regra incorrebwin logo png"discriminação injustificada".
"Viola a formabwin logo pngser e existir destas pessoas e o fundamento do respeito à diversidade e à dignidade humana." O ministro considerou o tratamento "desigual e desrespeitoso": "Não se pode negar o direitobwin logo pngser solidário a quem deseja ser como é".
"A todos serão aplicadas exigências e condicionantes que não são baseadas na formabwin logo pnguma pessoa existir. A extinção das normas atuais não gera prejuízos à coletividade. É imperioso modificar o critériobwin logo pngrestrição", disse.
A ministra Cármen Lúcia, presidente do STF, classificou o votobwin logo pngFachin como "brilhantíssimo".
Contágio
O processo corre rapidamente. Protocoladobwin logo pngjunhobwin logo png2016, pedia a suspensãobwin logo pngcaráter liminar da proibição prevista na portaria 158/2016 do ministério e na resolução 34/2014 da Agência Nacionalbwin logo pngVigilância Sanitária (Anvisa) - não há restrição para lésbicas. Fachin concordou com a urgência, mas optou por adotar o chamado rito abreviado para que o caso fosse apreciado mais agilmente.
O Ministério da Saúde e a Anvisa, apoiados pela Advocacia-Geral da União e por diretoresbwin logo pnghemocentros brasileiros, argumentam que a regra se baseiabwin logo pngestudos científicos sobre o "perfil epidemiológico dos grupos e situações, constatando aumento do riscobwin logo pnginfecçãobwin logo pngdeterminadas circunstâncias".
Não é o que acredita o PSB, autor da ação diretabwin logo pnginconstitucionalidade nº 5543, e outras organizações que também pedem o fim da medida. O PSB diz que como, na prática, a norma impede que homossexuais doem sangue, configura "absurdo tratamento discriminatório por parte do Poder Públicobwin logo pngfunção da orientação sexual".
O advogado Rafael Carneiro, que assina a petição do partido, defende que a política "ofende a dignidade humana". "O maior riscobwin logo pngcontaminação decorre da atividade sexual, não da orientação homossexual. Um heterossexual também pode ter relação anal sem camisinha e estar sujeito ao mesmo perigo que um homossexual."
Fazer sexo sem camisinha é a causa da maioria absolutabwin logo pngcasosbwin logo pngHIV no país: é o motivo apontado para 81,7% das 136.945 infecções pelo vírusbwin logo pngpessoas maioresbwin logo png13 anos reportadas entre 2007 e junhobwin logo png2016 ao Sistemabwin logo pngInformaçãobwin logo pngAgravosbwin logo pngNotificação (Sinan).
Heterossexuais representaram 36,7% dos homens brasileiros contaminados no ano passado - eram 47,3%bwin logo png2007. Homossexuais e bissexuais responderam por 59,5% dos novos casosbwin logo png2016 - eram 43,8%bwin logo png2007. Entre as mulheres, 95,9% dos casosbwin logo pngcontaminação ocorrerambwin logo pngrelações heterossexuais.
Omissão
Em processos do STF, organizações civis podem se apresentar para defenderbwin logo pngvisão. São os chamados amicus curiae. Todos os 13 inscritos na ação são contra a restrição. "Isso representa uma mobilização da sociedade civil bastante relevante", disse Gustavo Zortéa, da Defensoria Pública da União, à BBC Brasil.
"O limitebwin logo png12 meses não tem respaldo legal ou científico e viola o princípio da igualdade. Doar sangue é uma expressão da liberdade e da solidariedadebwin logo pngum cidadão."
Em parecerbwin logo pngRodrigo Janot, a PGR diz que a medida não é razoável e dá munição à homofobia e que autoridadesbwin logo pngsaúde se omitem ao não "adotar mecanismos menos gravosos" para garantir a segurança da doação: "Nem mencionam o usobwin logo pngpreservativobwin logo pngrelações sexuais como critériobwin logo pngseleçãobwin logo pngdoadores, método com maior eficácia para evitar contágio".
Autoridades brasileiras citam indicadoresbwin logo pngsaúde para negar o preconceito. "No Brasil, dados apontam que a epidemiabwin logo pngAids está concentradabwin logo pngpopulaçõesbwin logo pngmaior vulnerabilidade, tais como homens que fazem sexo com homens, usuáriosbwin logo pngdrogas e profissionais do sexo, com uma taxabwin logo pngprevalência do vírusbwin logo png10,5%, enquanto, na populaçãobwin logo pnggeral, a taxa ébwin logo png0,4%", disse o Ministério da Saúde à BBC Brasilbwin logo pngnota.
O ministério diz que o embargobwin logo png12 meses vale para quem tenha feito sexo casual com um desconhecido, vítimasbwin logo pngestupro e seus parceiros, para quem se prostitui, foi preso, tenha feito uma cirurgia ou uma tatuagem recentemente. "A inaptidão para homens que fizeram sexo com homens utiliza o mesmo critério das demais situações, ou seja, está fundamentada no que hábwin logo pngmelhor e mais moderno da literatura médica e científica nacional e internacional."
A Anvisa ressalta ainda seguir a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS), principal autoridade na área, e que manterá o "critério até que estudos provem o contrário".
Mais chances
Em seu manualbwin logo pngseleçãobwin logo pngdoadores, a OMS inclui entre os perfisbwin logo pngalto risco homens homossexuais sexualmente ativos. A organização diz que eles têm 19,3 vezes mais chancesbwin logo pngterem HIV do que a populaçãobwin logo pnggeral e apoia o veto total.
A Organização Pan-Americanabwin logo pngSaúde (Opas) reiterou à BBC Brasil a recomendaçãobwin logo pngrecusa destas doações por 12 meses, ressaltando que "a orientação sexual não deve ser usada como critério para seleçãobwin logo pngdoadores, por não constituir riscobwin logo pngsi mesma". Ainda segundo a Opas, "a expressão 'homens que fazem sexo com outros homens' descreve um fenômeno comportamental e socialbwin logo pngvezbwin logo pngum grupo específicobwin logo pngpessoas".
Os defensores do fim do veto no Brasil dizem que isso não acarretará aumento do perigo, porque candidatos já são escolhidos com basebwin logo pngcomportamentos sexuais consideradosbwin logo pngrisco, seja qual forbwin logo pngorientação sexual, e que testes aplicados às coletas são capazesbwin logo pngdetectar o HIV.
Atualmente, toda doação passa por exames que identificam se o vírus está no sangue 11 dias após a contaminação – período chamadobwin logo pngjanela imunológica – e se há anticorpos do HIV 25 dias depois. Em ambos, o intervalobwin logo pngprecisão é muito inferior ao previsto pela regrabwin logo pngexclusão do sangue.
"Mas há casos que fogem da janela imunológica, há tratamentos que afetam a detecção do vírus e a análise do laboratório pode ter erros, por isso adota-se um período maior, ainda que 12 meses pareça ser excessivamente longo e seja muito difícil que o vírus fique indetectável por tanto tempo", disse à BBC Brasil o médico Luiz Amorim, diretor do Hemorio, um dos principais hemocentros do país.
O hematologista explica que, nabwin logo pnginstituição, heterossexuais só têm doações recusadas caso tenham feito sexo com cinco ou mais parceiros nos últimos 12 meses.
Pressão por mudança
No início do mês, Amorim esteve no Congresso da Associação Americanabwin logo pngBancosbwin logo pngSangue, principal conferência do mundo da especialidade,bwin logo pngque a proibição à doação por gays foi debatida. "Há uma grande pressão aqui ebwin logo pngoutros países contra essa medida, porque a questão é complexa eparece resvalar no preconceito, ainda que não seja", disse o médico.
A realidade no exterior não permite extrair consenso. Embora países como Alemanha, Áustria, China e Dinamarca ainda proíbam gaysbwin logo pngdoarbwin logo pngforma vitalícia, há uma tendênciabwin logo pngsuavizar esse veto adotado ao redor do mundo após o surgimento da epidemiabwin logo pngAids nos anos 1980.
Na Noruega, Holanda, Austrália, Nova Zelândia, Estados Unidos e França, vigora um embargobwin logo png12 meses. Enquanto isso, na Inglaterra e na Escócia, o períodobwin logo pngveto passará a serbwin logo png3 meses, mudança justificada com o avanço da tecnologia da detecção do vírus. Itália, México, Espanha, Chile e Argentina foram além, e a orientação sexual do candidato não é levadabwin logo pngconta na triagem, apenas hábitos sexuais.
A proibição era vitalícia no Brasil quando surgiubwin logo png1993. Em 2004, foi alterada para 12 meses após a última relação sexual. "Não há evidênciasbwin logo pngque, se diminuirmos esse período, não aumentará o riscobwin logo pngcontaminação. Também não sabemos qual risco representam gays com parceiro fixo. Os estudos são caros, e um país fica esperando que outro faça."
Enquanto não houver respostas, diz Amorim, aplica-se o princípio da precaução no Brasil, mantendo a regra atual. Foi essa posição que ele e outros 26 diretoresbwin logo pnghemocentros no país manifestarambwin logo pnguma carta enviada ao STF: "É uma questão técnica e não jurídica".
Expectativa
A judicialização, no entanto, é um caminho sem volta, e, uma vez provocada, o STF se posicionará. Especialistasbwin logo pngDireito Constitucional ouvidos pela BBC Brasil avaliaram que a medida viola a Constituição.
"Para essas pessoas, se relacionar com alguém do mesmo sexo não é uma simples conduta, ébwin logo pngidentidade. Se você usa esse único aspecto para distinguí-las, você as está discriminando e as impedindobwin logo pngexercerbwin logo pngcidadania", afirmou Thiago Amparo, professor da FGV-SP.
Amparo acredita que o STF anulará a norma, opinião compartilhada por Elival da Silva Ramos, professor da USP e procurador-geral do Estadobwin logo pngSão Paulo. Ele defende que a norma seja baseada no comportamento sexual: "A visão atual está superada. Deve ser atualizada com critérios isentos, como fazer sexo sem proteção,bwin logo pngvezbwin logo pngtratar um grupo como mais promíscuo".
Renan Quinalha, professor da Unifesp, também defende a inconstitucionalidade da regra, mas não acredita que será invalidada.
"Quando temas morais se cruzam com saúde pública, como neste caso, receio que o Supremo não seja tão avançado. Ele não deve criar uma política à revelia do órgão técnico. Não é uma questão tão pacificada com precedentes judiciais quanto a união civil entre pessoas do mesmo sexo, aprovadabwin logo png2011", diz Quinalha.
* Atualizadabwin logo png25/10/2017 às 19h12