'Tenho medo que me tirem daqui': Crise leva famílias para baixorobo estrela betviaduto:robo estrela bet

Simone Kelly e seu filho

Crédito, Luciano Teixeira/BBC Brasil

Legenda da foto, Sem trabalho, Simone Kelly não conseguiu pagar o aluguel e foi morar embaixorobo estrela betviaduto com o filhorobo estrela bet1 ano

Desempregada, a mãerobo estrela betDerik Augusto,robo estrela bet1 ano e 2 meses, viu como única solução voltar às ruas da maior cidade do país.

"Já tinha morado na rua por cinco anos, até 2014, quando fui morarrobo estrela betaluguel, mas, como não consegui mais trabalhar, tiverobo estrela betvoltar à rua."

Jesusrobo estrela betpaletó

Entra-se no localrobo estrela betque o grupo mora por meiorobo estrela betuma pequena porta. Do ladorobo estrela betfora, não dá para se ter uma noção da real dimensão da área, que abriga ao menos 15 famílias.

Na entrada, uma imagem do menino Jesus dá boas-vindas. Como está parcialmente danificada – os braços já estavam quebrados quando chegou ali – foi coberta com um paletó.

A iniciativa, alémrobo estrela betestética, tem relação com o frio, segundo os moradores: nas noitesrobo estrela betinverno, as temperaturas ficam abaixo dos 10°C no local.

O espaço tem uma cozinha comunitária –robo estrela betvolta, há mesas onde algumas pessoas tomavam o café da manhã quando areportagem visitou o local.

É nessa hora do dia, quando todo mundo já está acordado, que as tarefas começam a ser divididas: uns limpam a calçada do ladorobo estrela betfora, outros cuidam dos banheiros.

Josilene e Jean Paul

Crédito, Luciano Teixeira/BBC Brasil

Legenda da foto, Josilene e Jean Paul temem ser retiradosrobo estrela betabrigo improvisado

O casal Josilene,robo estrela bet19 anos, e Jean Paul,robo estrela bet23 anos, relata uma história parecida com arobo estrela betSimone.

A ex-vendedora, desempregada há três anos, e o ajudante geral contam que tiveramrobo estrela betdesistir do aluguelrobo estrela betR$ 700 quando perderam o controle das contas atrasadas.

"O Leandro (bebê do casal) nasceu, e aí ficou pesado. Meu trabalho com carga e descarga não dá conta das despesas ultimamente. Mas, mesmo não pagando aluguel, eu tenho medo que me tirem daqui. Tenho até pesadelos com isso", diz o rapaz.

Milhares ao relento

Por estarem ali há pouco tempo, as famíliasrobo estrela betSimone e do jovem casal não entraram no último censo da populaçãorobo estrela betsituaçãorobo estrela betrua da cidaderobo estrela betSão Paulo.

Realizadorobo estrela bet2015, o levantamento da Fundação Institutorobo estrela betPesquisas Econômicas (Fipe) revela que, na capital paulista, existem pelo menos 15.905 pessoasrobo estrela betsituaçãorobo estrela betrua – quase o dobro comparado a 2000, quando eram 8.706. A alta foirobo estrela bet82%.

Segundo a pesquisa, estão concentrados nas regiões da Sé, no Centro, da Mooca, na Zona Leste, e da Lapa, na Zona Oeste.

Padre Lancelotti

Crédito, Luciano Teixeira/BBC Brasil

Legenda da foto, Padre Lancelotti diz que censorobo estrela betmoradoresrobo estrela betrua não condiz com a realidade

Os números são bem menores do que osrobo estrela betcidades como Nova York, onde o Departamentorobo estrela betServiço para Desabrigados calcula haver 57 mil moradoresrobo estrela betrua, a maioria dormindorobo estrela betabrigos públicos. A populaçãorobo estrela betSão Paulo é 50% maior do que a da cidade americana.

Mas o padre Júlio Lancellotti, coordenador da Pastoral Povorobo estrela betRua, organizaçãorobo estrela betcaridade vinculada à Arquidioceserobo estrela betSão Paulo, disputa os números oficiais da capital paulista.

"O último censo está subestimado. Não estão contadas as pessoas que estão, por exemplo,robo estrela betinstituições religiosas não conveniadas. Acredito que temos pelo menos 22 mil moradoresrobo estrela betrua na cidade", afirma ele.

"O censo só contou quem estárobo estrela betbarracas e nãorobo estrela betbarracos. Não contaram, ainda, as pessoas que moramrobo estrela betcemitérios. Já constatei que há grupos assim nos da Vila Formosa, da Quarta Parada e da Consolação. Também não levaramrobo estrela betconta os grupos que vivem no subsolo da cidade."

Padre Lancelotti atende moradoresrobo estrela betrua

Crédito, Luciano Teixeira

Legenda da foto, Para o padre, crise levou a um aumentorobo estrela betpessoas que vivem nas ruasrobo estrela betSão Paulo

O padre afirma que a crise tem contribuído para aumentar a quantidaderobo estrela betpessoas vivendo nas ruas.

"As pessoas não estão conseguindo pagar aluguel e acabam vindo morar na rua. E os problemas econômicos afetam também os que já estavam nesses locais e sobrevivem como catadores, por exemplo. Com o consumorobo estrela betbaixa, diminuiu o númerorobo estrela betembalagens recicláveis para eles coletarem", afirma ele.

Segundo Lancelotti, reintegraçõesrobo estrela betposse e a chegadarobo estrela betpessoasrobo estrela betoutros lugares – "que vêm pra cá procurar emprego e não conseguem" – também levam pessoas às ruas.

"Temos também os que são postos para forarobo estrela betcasa pelas próprias famílias, porque não contribuem nas despesas diárias", conta.

A Prefeitura diz que a pesquisa foi realizada, inclusive,robo estrela betpontosrobo estrela betatração dessa população, como hospitais, postosrobo estrela betsaúde, escolas, mercados e sacolões, cemitérios, terminaisrobo estrela bettransporte público e que também foram contabilizados moradores que viviam nos chamados "mocós", um tiporobo estrela betburaco feito para servir como abrigo.

Vagasrobo estrela betabrigos

Quem vive nas áreas com mais moradoresrobo estrela betrua afirma ter notado o aumento nos últimos meses.

Nos finsrobo estrela betsemana, quando a movimentação diminui na região central, é possível notar uma aglomeraçãorobo estrela betsem tetosrobo estrela betlocais como o Largorobo estrela betSanta Cecília, próximo ao bairrorobo estrela betHigienópolis, uma das áreas mais nobres da cidade.

A designer Joana Gonçalves, que mora perto dali, conta que procura não circular sozinha à noite por medorobo estrela betassaltos.

"Evito descer do metrô tarde da noite e, quando tenhorobo estrela betfazer isso, vourobo estrela bettáxi ourobo estrela betUber. Sei que a grande maioria dessas pessoas só pede ajuda: dinheiro pra comida e oferecem pequenos serviços nos sinais como limpeza dos para-brisas. Sei que a maioria não está aqui porque quer. Mas, num primeiro momento, isso assusta", diz.

A Prefeiturarobo estrela betSão Paulo oferece serviços à populaçãorobo estrela betrua através da Coordenadoriarobo estrela betProteção Social Especial. Segundo a Secretaria Municipalrobo estrela betAssistência e Desenvolvimento Social, equipes especiaisrobo estrela betabordagem tentam convencer o moradorrobo estrela betsituaçãorobo estrela betrua a aceitar o encaminhamento para os centrosrobo estrela betacolhida.

Nesses locais, eles podem pernoitar, tomar banho, guardar seus pertencesrobo estrela betbagageiros, lavar roupas, alimentar-se e ainda ter assistência individualizada com o serviço social.

Haveria ainda abordagens nos pontosrobo estrela betmaior concentração, estímulo à geraçãorobo estrela betrenda e capacitação profissional, alémrobo estrela betencaminhamento para os núcleosrobo estrela betserviços e convivência e centrosrobo estrela betacolhida.

Demanda

O problema, segundo a Pastoralrobo estrela betRua, é que só pouco mais da metade dos quase 16 mil moradoresrobo estrela betrua oficiais consegue vaga nesses centros.

De acordo com a Fipe, são 8.570 acolhidos dentro desse universo. A preocupação aumenta no inverno – neste ano, foram registrados casosrobo estrela betmoradoresrobo estrela betrua que teriam morridorobo estrela betfrio.

Quarto coletivo sob viaduro

Crédito, Luciano Teixeira/BBC Brasil

Legenda da foto, Sob o viaduto, moradores também se abrigamrobo estrela betquartos coletivos

Quando os termômetros atingem 13°C ou menos, agentes oferecem encaminhamento a locais protegidos do frio. Em épocas assim,robo estrela betcaráter excepcional, segundo a prefeitura, o númerorobo estrela betvagas nos Centrosrobo estrela betAcolhida é ampliado para atender à maior procura.

Pelos dados da Secretaria hoje, são 96 centrosrobo estrela betacolhida fixos e emergenciais e, na épocarobo estrela betfrio, a capacidade é ampliada emergencialmente para 12 mil vagas diárias. Mas, destas, cercarobo estrela betmil não estariam sendo ocupadas por faltarobo estrela betdemanda.

Autonomia

Para o padre, porém, o serviço prestado pelo poder público não é suficiente, pois não garante autonomia para essas pessoas.

"O trabalho feito hoje é incompleto, insuficiente e arcaico. Temosrobo estrela betcriar espaçosrobo estrela betautonomia para estes moradores,robo estrela betque seja levadarobo estrela betconsideração arobo estrela betindividualidade e o seu modorobo estrela betvida", opina.

"É preciso, por exemplo, um lugar para que casais tenham arobo estrela betintimidade preservada. No modelo atualrobo estrela betgestão, existem regrasrobo estrela betentrada e saída, com horários rígidos nos centrosrobo estrela betacolhimento, e a separação nos dormitórios entre homens e mulheres, mesmo que sejam casados."

Segundo ele, o trabalho precisa mudar. "Os modelosrobo estrela betresposta do poder público não passamrobo estrela betdez possibilidades. Todo esse atendimento não evoluiu ao longorobo estrela bet90 anos, é o mesmo feitorobo estrela bet1920. A única coisa nova que tem é a tomada para carregar o celular."

De acordo com a Prefeitura, todos os serviços oferecidos têm regras, muitas delas discutidasrobo estrela betassembléia com quem usa esses locais, como o horáriorobo estrela betentrada e saída, das refeições erobo estrela bettelevisão por exemplo. Mas isso pode ser flexibilizado pela equipe técnicarobo estrela betcada local,robo estrela betacordo com a rotina e necessidade das pessoas que convivem ali.

Novas formasrobo estrela betacolhimento

A Secretaria explica que foram criadas novas modalidadesrobo estrela betacolhimento para atender famílias, imigrantes e transexuais.

No caso das famílias, seriam 360 vagasrobo estrela betdois serviços, o que incluirobo estrela betalguns casos vagasrobo estrela betcreche ou escola, atendimento médico e capacitação profissional, por meiorobo estrela betparcerias como o Pronatec, por exemplo – e encaminhamento para o emprego.

Também há um centrorobo estrela betacolhimentorobo estrela betimigrantes com 110 vagas e outro só para mulheres e seus filhos com capacidade para 80 pessoas.

Cartaz

Crédito, Luciano Teixeira/BBC Brasil

Legenda da foto, Há quartos familiares no local, onde tarefas diárias são divididas entre os moradores

Para os transexuais, há 30 vagas exclusivas numa casa instalada na região da Barra Funda, onde são oferecidos cursos, oficinas, palestras, alémrobo estrela betpernoite, acompanhamento psicológico e refeições.

Vagas específicas que, para os especialistas, ajudam, mas que estão aquém da demanda e não resolvem o problema. O cientista político da Fundação Getúlio Vargas, Marco Antônio Teixeira, acredita que o modelo mais comum atualmente é assistencial,robo estrela betvezrobo estrela betser multidisciplinar.

Relaçãorobo estrela betconflito

"O que temos hoje é uma relaçãorobo estrela betconflito entre o poder público municipal e as diversas instituições que fazem um trabalho independente com esses moradores, como a Pastoralrobo estrela betRua", diz.

"É preciso repensar este tiporobo estrela betpolítica pública e ter articulação com os diversos setores da sociedade. Hoje, a tendência do governo municipal érobo estrela betadministrar o problema, dar abrigo. Mas, e depois que eles saem, durante o dia?"

Para ele essa situação tende a piorar com a crise econômica. "É um efeitorobo estrela betcadeia. O crescimento está desproporcional. O limite pra quem não consegue arcar com as despesas e pagar aluguel, por exemplo, é a rua, não tem jeito", explica.

"Precisamos dar uma perspectiva para essas famílias, um outro tiporobo estrela betassistência, um lugar e um sentido para essas pessoas. Essa faltarobo estrela betperspectiva pode alimentar ainda mais a violência na nossa cidade."

Do viaduto onde mora, Simone Kelly reforça as críticas: "Nós somos só números pra eles. Em alguns lugares, não somos chamados pelo nome. As regras que nos impõem hojerobo estrela betdia são próximas das do sistema penitenciário".

Por isso, ela prefere ficar num espaço alternativo, debaixo do Viaduto Guadalajara. "Aqui, temos regras básicasrobo estrela betconvivência entre as 15 famílias. Dividimos a limpeza, a cozinha é coletiva, e fazemos a 'vaquinha' para o gás. É um espaçorobo estrela betresistência, onde privilegiamos a autonomiarobo estrela betcada um."