A menina que trabalhavacassino brasileiropedreiras, virou desembargadora e hoje luta contra o trabalho infantil:cassino brasileiro
Foi telefonista, professoracassino brasileiromatemática, funcionária do Banco do Brasil, cursou Direito, virou juíza do Trabalhocassino brasileiro1995 ecassino brasileiromaio deste ano tomou posse como desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (Pará e Amapá).
'Filhascassino brasileirocriação'
Sua dissertaçãocassino brasileiromestrado, defendidacassino brasileiro2006 na Universidade Federal do Pará e publicadacassino brasileirolivro no ano seguinte, analisa as trajetóriascassino brasileiromeninas saídas do interior paraense para trabalhar na casacassino brasileiroterceiroscassino brasileiroBelém.
São as chamadas "filhascassino brasileirocriação" - um eufemismo para disfarçar o que a desembargadora, na vida, na academia e na prática profissional, constatou ser a exploração sem limitescassino brasileirouma mãocassino brasileiroobra jovem e barata.
Em entrevista à BBC Brasil por e-mail e telefone, Zuíla Dutra relembroucassino brasileirotrajetória e analisou a persistência do trabalho infantil doméstico no Brasil (apesar da queda verificada nos últimos anos).
"Muitas vezes, nas audiências, os empregadores negavam veementemente a relaçãocassino brasileirotrabalho, alegando tratar-secassino brasileiro'filhacassino brasileirocriação'. Mas as provas demonstravam claramente a existênciacassino brasileiroautêntico vínculo laboral (relaçãocassino brasileirotrabalho) e, mais ainda,cassino brasileirosuperexploraçãocassino brasileirotrabalho. Esse tipocassino brasileiroexploradorcassino brasileiromãocassino brasileiroobra doméstica utiliza a expressão 'filhacassino brasileirocriação' como substitutivo para 'trabalho escravo', 'trabalho servil' e outros assemelhados", afirma ela.
Rotinacassino brasileiroexploração
A históriacassino brasileiroZuíla passa por um barraco sem luz nem águacassino brasileiroSantarém.
"Éramos muito pobres. Minha mãe, Oscarina, criou os cinco filhos sozinha. Analfabeta, não tinha profissão definida, lavava roupa, fazia todo tipocassino brasileiroserviço. Morávamoscassino brasileirofavor no fundo do quintalcassino brasileirouma fábricacassino brasileirobeneficiamentocassino brasileirolátex, num canto sem água nem luz. Então consentiram que ela fizesse merenda para vender nas fábricas, e eu e meus irmãos vendíamos. Eu me lembro perfeitamente: um levava o tabuleiro com suco, outro os sanduíches", conta a desembargadora.
"Minha mãe, mesmo analfabeta, teve a sabedoriacassino brasileironão deixar que nenhum dos filhos saíssecassino brasileiroperto dela. Um dia, na fábrica, um casalcassino brasileiroSão Paulo quis me levar para morar com eles. Eles diziam que eu ia estudar, ter tudo. Minha mãe não deixou, dizia que filho tinha que ficar com ela. Era a mesma históriacassino brasileirohoje, prometem tudo, mas na verdade vira uma rotinacassino brasileiroexploração, com jornadascassino brasileiro16, 18 horas", afirma.
Aos 16 anos, Zuíla passou no concurso público para telefonista. Foi professoracassino brasileiromatemática e, posteriormente, funcionária do Banco do Brasil.
Embora sonhasse ser juíza do Trabalho, só pôde fazer Direito alguns anos depois, a partircassino brasileiro1990, quando o curso foi criadocassino brasileiroSantarém. Logo depois mudou-se com a família para Belém, onde se formou e se tornou juíza, fazendo do combate ao trabalho infantil uma das missõescassino brasileirosua vida.
A desembargadora integra a Comissão Nacionalcassino brasileiroCombate ao Trabalho Infantil ecassino brasileiroEstímulo à Aprendizagem do Tribunal Superior do Trabalho e coordena idêntico grupo no TRT da 8ª Região. Entre as ações desenvolvidas estão palestrascassino brasileiroescolas e uma marcha que reuniu maiscassino brasileiro20 mil pessoascassino brasileiroBelém no ano passado.
Neste ano, o foco é esclarecer jovens e empresários sobre a Lei da Aprendizagem, que estimula a formação profissional e supervisionada,cassino brasileiroalgumas carreiras,cassino brasileiroadolescentes a partircassino brasileiro14 anos.
Situação aceita
Para Zuíla Dutra, uma das dificuldades do combate ao trabalho infantil doméstico é que ele, diferentemente do que ocorre quando se vê uma criança numa pedreira ou carvoaria, não causa indignação no grosso da sociedade. Pelo contrário: acontece dentro das casascassino brasileirofamília e é culturalmente aceito como um atocassino brasileirosolidariedade ou uma chancecassino brasileiroascensão social.
A rotina da trabalhadora doméstica infantil é outra, alerta: o mais comum é que a garota se afaste da família, abandone a escola ou pouco possa estudar, e ainda seja cotidianamente submetida a jornadas longas, sem folga semanal e com salário abaixo do mínimo legal - alémcassino brasileiroenfrentar riscos que vão desde acidentes domésticos, como ser quimada por uma panelacassino brasileiroágua quente, até o assédio sexual dos patrões.
"A cantilena dos empregadores para atrair a presa é sempre a mesma, no sentidocassino brasileiroque vão tratar a menina como 'filha', oferecendo-lhe estudo e a oportunidade para mudarcassino brasileirovida. O que se observa,cassino brasileiroregra geral, é que os filhos das pessoas que exploram o trabalho infantil doméstico frequentam escola particularcassino brasileiroexcelente qualidade e dispõemcassino brasileirotempo para brincadeiras com outras crianças, tratamento que as meninas empregadas jamais recebem. Até mesmo a frequência à escola pública é dificultada ou negada, diante da extensa e penosa jornadacassino brasileirotrabalho", afirma.
A desembargadora destaca outros problemas, como a faltacassino brasileiromaturidadecassino brasileirouma menina ou adolescente para cuidarcassino brasileirooutras crianças, e a retirada da garota do convívio familiar. Apesar disso, ainda é comum que famílias pobres, por necessidade, mandem suas filhas para morar e trabalhar como agregadascassino brasileirooutras casas.
"De irmã ou filha, ela passa à condiçãocassino brasileiroserviçal, empregada, babá ou agregada. Para esses pais ou mães, tal doação representa libertarcassino brasileirofilha da necessidade, pois imaginam que ela terá escola, comida, teto, roupa, calçados e lazer garantidos. Pensam estar oferecendo a chancecassino brasileiroum futuro diferente do seu. As meninas que são entregues por seus pais para serem criadas como 'filhas' na verdade não passamcassino brasileiromãocassino brasileiroobra exploradacassino brasileiroforma desumana, salvo raríssimas exceções."
Zuíla Dutra sabe que ela própria é uma exceção. Emcassino brasileirotrajetória, destaca seguidamente o papel da mãe, Oscarina, que nunca cedeu a quem quisesse levarcassino brasileiroprole como "filhoscassino brasileirocriação". Os cinco filhos estudaram e só duas, por decisão pessoal, não concluíram o curso superior.
"Já adulta, eu ensinei minha mãe a escrever o nome. Minha mãe está viva, tem 85 anos, e foi à minha posse como desembargadora. É minha heroína", orgulha-se.