Como rosas vermelhas viraram símbolo da globalização:bvb poker
Nas estufas, os responsáveis pelo cultivo trabalham a todo vapor com seis mesesbvb pokerantecedência, para que suas roseiras (seis por metro quadrado, ou cercabvb poker60 mil por hectare) floresçam exatamente na semana anterior à data comemorativa – nem antes, nem depois.
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Fim do Matérias recomendadas
Durante todo esse período, eles modulam a luz, a irrigação, o suprimentobvb pokerCO2 e oxigênio e os níveisbvb pokerumidade, para acelerar ou retardar a floração das roseiras.
Sabemos que a diferença entre duas florações varia conforme a iluminação, a nebulosidade, a temperatura, a umidade do ar, o suprimentobvb pokerágua,bvb pokerfertilizantes etc.
Acrescente-se a tudo isso os possíveis ataquesbvb pokerinsetos ou fungos, que são catastróficos no contexto da monocultura. Assim, podemos ter uma ideia do graubvb pokerincerteza e do estresse reinante nas estufas à medida que se aproxima o dia fatal.
Depoisbvb pokersair desses centrosbvb pokerprodução na zona tropical do planeta,bvb pokerflor irá passar por algumas horasbvb pokerviagem nos compartimentos refrigeradosbvb pokerum aviãobvb pokercarga. Um Boeing 747-Cargo, por exemplo, pode transportar até 120 toneladasbvb pokerrosas.
Ao chegar à Europa, ela irá transitar pela cooperativa Royal FloraHollandbvb pokerAalsmeer, perto do aeroporto Schipholbvb pokerAmsterdã, na Holanda.
Ali, no mesmo dia, ela será carregadabvb pokerum dos caminhões frigoríficos que percorrem o continente europeu e entregue para o seu florista – que, prevendo o 14bvb pokerfevereiro, terá multiplicado seus pedidos por quatro ou cinco vezes, já antes do Natal.
E seus preços certamente terão sido multiplicados por dois ou três, considerando o aumento brutal da demanda. Afinal, é no Diabvb pokerSão Valentim que o florista europeu recebe quase 15% do seu faturamento anual.
Fatores climáticos e políticos
Fazer as rosas viajarem milharesbvb pokerquilômetros não é um fenômeno novo.
Até o final dos anos 1970, a Europa era autossuficientebvb pokerrosas cortadas. Mas os seus colegas norte-americanos começaram a instalar estufas pertobvb pokerQuito, no Equador, alguns anos antes. Os holandeses começaram então a imitá-los, criando unidadesbvb pokerprodução no Quênia.
Mas por que a produçãobvb pokerrosas cortadas foi globalizada?
Bem, vários fatores motivaram esse deslocamentobvb pokerdireção à África. Alguns desses fatores eram atraentes, enquanto outros são repulsivos.
Em primeiro lugar, os produtores desejavam sair da Europa, com seus custosbvb pokermãobvb pokerobra e calefação, além das crescentes regulamentações fitossanitárias.
Com isso, os planaltos quenianos surgiram como destinos particularmente atraentes, devido a diversas vantagens climáticas.
Inicialmente, o ecossistema equatorialbvb pokeraltitude das áreasbvb pokerprodução quenianas (entre 1,6 mil e 2,3 mil metros) oferece temperaturasbvb poker12 °C à noite a 30 °C durante o dia, ao longobvb pokertodo o ano. Estas temperaturas são ideais para o crescimento e a produtividade das roseiras, sem necessidadebvb pokeraquecimento.
Além disso, essas regiões garantem a luminosidade necessária para dar às flores suas cores brilhantes e, aos talos, a rigidez necessária para a viagem, além do tamanho ideal para conquistar os mercados consumidores (entre 40 cm e 1 metro).
Outro ponto a considerar é o ecossistema geoeconômico pós-colonial do Quênia, que permitiu aproveitar ao máximobvb pokerposição equatorial.
Como antiga colônia britânica, o Quênia contava com uma diásporabvb pokerpopulação branca e indiana com experiência na gestão do trabalho na África e nas limitações do capitalismo internacional. E também havia uma mãobvb pokerobra negra numerosa, barata, com boa formação e pouco exigente.
Além disso, o Quênia era o motor econômico da África oriental e já contava com instalações logísticas, particularmente o aeroporto dabvb pokercapital, Nairóbi, acostumado ao fluxo turístico. Com isso, um voo para a Europa levava apenas oito horas.
Por fim, o regime liberal, pragmático e estável do Quênia oferecia segurança e liberdade aos investidores.
Foi assim que empresários pioneiros lançaram um exemplo que foi seguido nas décadasbvb poker1990, 2000 e 2010 por investidores quenianosbvb pokerorigem branca e indiana, bem como pelos políticos do Quênia.
O resultado foi que a quantidadebvb pokerestufas aumentou e, pouco a pouco, formou-se um verdadeiro centrobvb pokercultivobvb pokerrosas no país africano. Ebvb pokerprodução atraiu toda uma sériebvb pokerempresas relacionadas.
Atualmente, as estufas empregam diretamente 100 mil pessoas e geram 500 mil empregos indiretos relacionados às flores. Ao todo, 2 milhõesbvb pokerpessoas dependem das rosas para o seu sustento.
Do pontobvb pokervista macroeconômico, as exportaçõesbvb pokerrosas contribuembvb pokerforma decisiva para a balança comercial do país. Elas representam US$ 700 milhões (cercabvb pokerR$ 3,48 bilhões). As rosas são superadas apenas pelo chá, com US$ 1,4 bilhão (cercabvb pokerR$ 6,96 bilhões).
Nos anos 2000, depoisbvb pokerconquistar os planaltos quenianos, a rosa vermelha foi também introduzida na Etiópia, um país vizinho com características similares.
Ali, foram criados 50 mil postosbvb pokertrabalho graças ao cultivo da rosa. Alguns deles eram procedentes do Quênia a pedido das autoridades etíopes, que são mais intervencionistas.
Mas, na Etiópia, a cadeiabvb pokervalor não atingiu a mesma maturidade e gerou muito menos empregos indiretos,bvb pokerforma que a áreabvb pokerprodução etíope permanece na órbita do seu vizinho do sul, o Quênia.
O fato é que, se nos afastarmos um pouco, observaremos que o crescimento da culturabvb pokerrosas na África acompanhou o crescimento do consumo mundial e acabou com a produção europeia.
FloraHolland – a Wall Street das flores
Muitas das flores produzidas no Quênia e na Etiópia viajam para a Europa quando deixam as estufas africanas. Elas são embaladasbvb pokerramos e comercializadasbvb pokertrês formas:
- Pelos mercadosbvb pokerleilão (um sistemabvb pokerleilões eletrônicos projetados para garantir que os preços sejam fixadosbvb pokerforma rápida e transparente).
- Por contrato, geralmente anual, entre um produtor e uma centralbvb pokercompras ou atacadista europeu.
- Por fim, como partebvb pokeruma venda especial, pontual, entre um produtor e um comprador.
Seja qual for a formabvb pokervenda,bvb pokerNairóbi ou Adis Abeba (na Etiópia), a maior parte das rosas passa por Aalsmeer, nas proximidadesbvb pokerAmsterdã. Ali, fica a maior plataforma logísticabvb pokerplantas do mundo: a cooperativa, muito lucrativa, chamada FloraHolland.
Historicamente, a FloraHolland se impôs como a Wall Street das flores, onde o custo das rosas é determinado.
Nos últimos anos, o preço das rosas subiu mais do que a inflação, impulsionado pelo crescimento ininterrupto da demanda da classe média dos países emergentes e pelo aumento dos preços dos insumos.
Atualmente, não maisbvb poker40% das rosas cortadas leiloadas. Mas, mesmo com a queda da proporção, os mercadosbvb pokerleilão continuam desempenhando um papel fundamental na fixação dos preços do produto.
Este relativo declínio dos leilões é explicado pelo crescimento dos operadores europeus, especialmente as redesbvb pokersupermercado britânicas e alemãs. Elas têm condiçõesbvb pokernegociar com os produtores volumesbvb pokercompra consideráveis e regulares ao longobvb pokertodo o ano.
Esses grandes volumes regulares passam a ser objetobvb pokercontratos que estabelecem volumes e preços com base anual. Os contratos liberam os vendedores e os compradores dos leilões, que são mais aleatórios.
Mas a FloraHolland, mesmo com essas mudanças, permanece sendo o eixo hegemônico por onde passa a maior parte das rosas cortadas destinadas ao mercado europeu, o que se deve àbvb pokerfluidez, ao seu desempenho logístico, seu ativo lobby e suas estratégiasbvb pokerpromoção.
A cooperativa remunera seus associados e paga seus funcionários com as comissões recebidas pelos volumes vendidosbvb pokerleilão e também pelas vendas especiais ou por contrato que passem pelas suas instalações.
Globalização cada vez mais questionada
Mas as rosas que atravessam o mundo não estão livresbvb pokercríticas, como vêm mostrando regularmente os meiosbvb pokercomunicação desde o início dos anos 2000.
Entre os anos 2000 e 2005, a imprensa questionou as condiçõesbvb pokertrabalho e a remuneração dos funcionários.
Depois, entre 2005 e 2010, foi a vez do consumo excessivobvb pokerágua necessário para cultivar as rosas (3 a 9 litrosbvb pokerágua por dia, por metro quadrado), além da poluição da água causada pelos resíduos da produção.
Entre 2010 e 2015, a pegadabvb pokercarbono das flores, devido à necessidadebvb pokertransporte aéreo, foi objetobvb pokerquestionamento.
E, mais recentemente, entre os anos 2015 e 2020, surgiram controvérsias sobre a quantidadebvb pokerprodutos químicos usados na produção das flores e as estratégiasbvb pokerevasão fiscal dos empresários, que centralizam seus lucros na Holanda. Lá, a alíquotabvb pokerimposto ébvb poker12,5%, contra 35% no Quênia.
Cientes dos riscos que estavam correndo com essa ameaça midiática, os empresários responderam às críticas, até certo ponto, aumentando os salários e oferecendo melhores condiçõesbvb pokertrabalho aos seus funcionários.
Eles também diminuíram a pegada hídrica com a reciclagem e o "plantio"bvb pokerágua e reduziram a pulverizaçãobvb pokerpesticidas, com tratamentos seletivos e o controle biológico integrado.
Em outra mudança sem precedentes, surgiu, muito lentamente, a ideiabvb poker"ressazonalizar" o consumobvb pokerflores cortadas e relocar a produçãobvb pokerflores na França. Trata-sebvb pokeruma resposta à globalização da produçãobvb pokerflores e às críticas sobre os custos da produção tropical para o meio ambiente.
Nos países anglo-saxões, o movimento "slow flower" ("flor lenta",bvb pokerportuguês) promove esta mesma ideia. Ali, assistimos ao tímido surgimentobvb pokermicro-operaçõesbvb pokertorno das grandes cidades, muitas vezesbvb pokerreconversão oubvb pokermeio período.
Em 2017, uma jornalista e uma florista do norte da França criaram o Coletivo da Flor Francesa – uma associaçãobvb pokercercabvb poker600 floricultores ou floristas ecorresponsáveis.
Seu objetivo é promover a produção e a comercializaçãobvb pokerflores produzidas na França, alémbvb pokerpraticar a agriculturabvb pokerforma ecorresponsável.
Espinho no pé da sociedade globalizada?
A rosa vermelha também se tornou um produto cada vez mais ambíguo. Ao mesmo tempobvb pokerque aumentam as críticas,bvb pokerprodução não parabvb pokercrescer, impulsionada pelo aumento da demanda da classe média dos países emergentes.
Os profissionais falambvb pokerum crescimentobvb pokercercabvb poker5 a 6% por ano na última década.
O setor chegou até a enfrentar relativamente bem a pandemiabvb pokercovid-19.
As primeiras semanasbvb pokerconfinamento interromperam os voos e as compras, forçando os floricultores a descartarbvb pokerprodução. Mas, depois desse período, os negócios do setor se deram relativamente bem durante a pandemia, pela simples razãobvb pokerque as pessoas continuaram comprando flores – desta vez, online – e até com mais regularidade.
E este hábito continuou depois da covid-19! Na verdade, o consumo estético e trivial aumentou durante aquele período, para grande surpresa e imensa sorte do envolvidos no setor.
Como todo objeto globalizado, a rosa cristaliza as tensões entre a evidente insustentabilidade ambientalbvb pokerum cultivo forabvb pokerestação, dos seus processosbvb pokerprodução e, sobretudo,bvb pokercomercialização e, por outro lado, uma realidade econômica evidente.
A rosa fornece um meiobvb pokervida para vários milhõesbvb pokerpessoas e contribui para o desenvolvimentobvb pokerdiversas regiões do planeta – além do enriquecimentobvb pokeralguns poucos.
Por tudo isso, esta flor nos convida a fazer algumas perguntas bastante delicadas:
Até que ponto o inegável desenvolvimento promovido no Quênia justifica a manutenção do nosso consumo insustentável – que é a força motriz do setor – nestes temposbvb pokermudanças climáticas?
Devemos ceder à chantagem trabalhista imposta por este setor, que sobrevivebvb pokerum consumo ostentoso e supérfluo?
Além das rosas, na verdade, todo o conjunto dos produtosbvb pokerconsumo tropicais poderia, ou até deveria, ser questionado desta forma.
Afinal, se o forte senso simbólico que leva à comprabvb pokeruma rosa pode propiciar questionamentos sobre o seu modobvb pokerprodução, as mesmas considerações ambientais e econômicas podem ser estendidas para muitos outros produtos, como o café, chocolate, chá, abacate, mangas, bananas...
Não há críticas no Quênia
No Quênia, até o momento, apesar das polêmicas na imprensa sobre os modosbvb pokerprodução, não parece haver nenhuma mudançabvb pokerparadigma no horizonte.
O setorbvb pokerproduçãobvb pokerflores não enfrenta problemasbvb pokercontratação e seus trabalhadores dizem estar felizes por aproveitar os lucros do cultivo das rosas. O setor garante um salário fixo mais alto que a renda média do país e a possibilidadebvb pokerabrir uma conta bancária.
Mas eles não têm dúvidas sobre a assimetria dos benefícios e a repartição desigual dos valores.
O respeito visceral pela figura do empresário, a adesão universal ao ethos do capitalismo e,bvb pokerforma mais prosaica, as vantagens materiais e simbólicasbvb pokertrabalhar para uma empresa próspera e reconhecida contribuem para fazer da cultura das rosas um setor que raramente é questionado no país.
O próprio fatobvb pokerque as empresas abertas nos anos 1990 precisam cuidar dos problemasbvb pokersaúde dos seus funcionários com maisbvb poker50 anos demonstra a baixa rotatividadebvb pokeruma mãobvb pokerobra invejada pelas pessoas e fiel ao seu emprego.
Por outro lado,bvb pokerum país que valoriza a figura do político, o fatobvb pokerque certas empresas sãobvb pokerpropriedadebvb pokerhomens e mulheres da política contribui, sem dúvida, para a boa imagem das estufas e das flores.
Do lado europeu, conscientes das preocupações dos consumidores, atacadistas e varejistas começam a responder com transparência e rastreabilidade.
Este é um enfoque interessante, que consistebvb pokerassinalar a origem geográficabvb pokercada uma das variedades vendidas e revelar explicitamente o valor político do consumo.
Que sentido os consumidores dão às suas compras? Ecológico oubvb pokerdesenvolvimento? Local ou tropical?
Essa reinserçãobvb pokersentido no centro do consumo colabora, sem dúvida, para a segmentação do mercado.
O fato é que, como indicador convencional do amor e fascinante objetobvb pokerestudo da globalização para o geógrafo, a rosa resume as tensões e as contradições do capitalismo atual.
*Bernard Calas é professorbvb pokereconomia e geografia política da Universidade Bordeaux Montaigne, na França.
Este artigo foi publicado originalmente no sitebvb pokernotícias acadêmicas The Conversation e republicado sob licença Creative Commons. Leia a versão original em francês ou espanhol.